Decisão Monocrática Nº 0301585-85.2017.8.24.0030 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 19-05-2020

Número do processo0301585-85.2017.8.24.0030
Data19 Maio 2020
Tribunal de OrigemImbituba
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0301585-85.2017.8.24.0030 de Imbituba

Apelante : Evaldo Liduino
Advogado : José Martins das Neves (OAB: 25681/SC)
Apelada : BV Financeira S/A Crédito Financiamento e Investimento
Advogado : Sergio Schulze (OAB: 7629/SC)
Relator: Desembargador Monteiro Rocha

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Evaldo Liduino ajuizou ação de revisão contratual em face de BV Financeira S/A Crédito Financiamento e Investimento, aduzindo ter firmado com a requerida, em 25-06-2013, cédula de crédito bancário para aquisição de veículo Chevrolet Onix, ano/modelo 2013, no valor de R$ 21.544,00, que seria pago em 48 prestações de R$ 584,84.

Alegou abusividade das cláusulas contratuais que preveem a cobrança de juros capitalizados, tarifas administrativas e comissão de permanência cumulada com demais encargos moratórios.

Requereu o acolhimento da pretensão para revisar o contrato e, mediante aplicação do Código de Defesa do Consumidor e respectiva inversão do ônus da prova, declarar a nulidade das cláusulas contratuais abusivas e determinar a repetição de indébito. Ao final, postulou a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Em decisão de fls. 23-26, dispensou-se a realização de audiência de conciliação e deferiu-se a gratuidade da justiça ao requerente.

Citada, a requerida ofertou contestação (fls. 30-41). Preliminarmente, impugnou a justiça gratuita concedida ao requerente e arguiu ausência de interesse de agir. No mérito, repisou os argumentos da inicial e defendeu a regularidade do contrato. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos exordiais.

Houve réplica (fls. 72-77).

Sobreveio sentença (fls. 78-89), com o seguinte dispositivo:

"ANTE O EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por EVALDO LIDUINO em face de BV FINANCEIRA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO.

Consequentemente, CONDENO o(a) autor(a) ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários de sucumbência, estes últimos os quais fixo em 12,5% (doze vírgula cinco por cento) do valor atualizado da causa.

Fica, no entanto, suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial devida pelo(a) autor(a), vez que beneficiário(a) da justiça gratuita".

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o autor interpôs apelação cível (fls. 93-114), sustentando, em síntese: a) a limitação dos juros remuneratórios; b) o afastamento da capitalização de juros não contratada; c) a ilegalidade das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC) e do imposto sobre operações financeiras (IOF); d) a impossibilidade de cumulação da comissão de permanência com encargos moratórios.

Requereu o provimento do recurso para julgar procedentes os pedidos iniciais, declarando-se a nulidade das cláusulas contratuais abusivas, determinando-se a devolução dos valores pagos indevidamente pelo autor e condenando-se a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.

Intimada, a apelada apresentou contrarrazões (fls. 118-135).

Este é o relatório.

O recurso envolve matéria pacificada em firme jurisprudência e o princípio da colegialidade informa a desnecessidade de submeter ao colegiado questão que não encontra dissenso entre os emitentes pares.

- Dos juros remuneratórios - inovação recursal

Em suas razões recursais, o apelante alega que "a Constituição Federal trouxe a limitação dos juros remuneratórios em 12% (doze por cento) ao ano, o que por si só já é capaz de promover a remuneração do capital" (fl. 98).

Entretanto, a matéria aludida - alegada abusividade dos juros remuneratórios - não foi objeto de decisão judicial, sendo, inclusive, inovação recursal que é vedada em nosso sistema jurídico.

Trago aos autos entendimento jurisprudencial que reputo aplicável ao caso vertente:

"Se a questão não se encontra compreendida dentre aquelas passíveis da análise de ofício, é vedado ao magistrado sobre ela decidir sem pedido correspondente da parte, sob pena de proferir sentença ultra petita, passível de anulação parcial em sede de recurso" (TJSC - 1ª Câm. Dir. Civ., Relª. Desª. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, ACV n. 2001.000658-3, de Joaçaba, j. 12-4-2005).

Nesse sentido é a lição de Nelson Nery Junior:

"Por inovação entende-se todo elemento que pode servir de base para a decisão do tribunal, que não foi argüido ou discutido no processo, no procedimento de primeiro grau de jurisdição. [...]" (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Extravagante. 7ª ed. São Paulo: RT, p. 888, nota 2).

A jurisprudência deste Sodalício ratifica:

"Proíbe-se a inovação no juízo de apelação, sendo permitido às partes somente o que foi objeto da matéria sujeita à discussão e decisão pelo juiz de inferior instância, segundo interpretação do art. 515, parágrafo 1º do CPC." (TJSC - 1ª Câm. Dir. Com., rel. Des. Salim Schead dos Santos, ACV n. 2000.020772-1, de Xaxim, j. 8-9-2004).

Portanto, como a alegação de abusividade contratual em relação aos juros remuneratórios não foi objeto de análise pelo juiz em primeiro grau, porquanto não arguida na inicial da demanda revisional, não pode ser conhecida por esta instância superior.

Nesse sentido, colaciona-se entendimento desta Câmara:

- "APELAÇÃO CÍVEL. REVISÃO DE CONTRATO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO EM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE. INSURGÊNCIA DO AUTOR. PRELIMINARES. INOVAÇÃO RECURSAL. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E INDELEGABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE. PLEITOS RECURSAIS NÃO FORAM OBJETO DE DEBATE AO LONGO DO FEITO [...]" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., rel. Des. Guilherme Nunes Born, ACV n. 0301901-42.2015.8.24.0039, j. 13-10-2016, grifou-se).

- "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA AUTORA. JUSTIÇA GRATUITA. BENEFÍCIO DEFERIDO EM PRIMEIRO GRAU QUE COMPREENDE TODOS OS ATOS DO PROCESSO, EM TODAS AS INSTÂNCIAS (ART. 9º DA LEI N. 1.060/1950). DESNECESSIDADE DE NOVO REQUERIMENTO EM GRAU RECURSAL. PEDIDO NÃO CONHECIDO. CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. MATÉRIA OBJETO DA AÇÃO UNICAMENTE DE DIREITO. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE OUTRAS PROVAS. PRELIMINAR AFASTADA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA INDELEGABILIDADE DOS PODERES E DA LEGALIDADE. MATÉRIA NÃO SUSCITADA EM PRIMEIRO GRAU. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO [...]" (TJSC, 5ª Cam. Dir. Com., rel.ª Des.ª Soraya Nunes Lins, ACV n. 0502466-02.2013.8.24.0036, j. 23-05-2019, grifou-se).

Logo, não conheço do pleito recursal.

- Da capitalização de juros

Alega o recorrente que não havendo pactuação expressa da capitalização de juros, e, não tendo o apelante, na condição de consumidor, concordado com sua incidência no contrato, esta deve ser declarada nula.

Razão não lhe assiste.

A aplicação de juros capitalizados deve ser precedida por contratação expressa e de ato normativo autorizador àquela operação bancária.

É o que estabelece a Súmula 539 STJ: "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP 1.963-17/00, reeditada como MP 2.170-36/01), desde que expressamente pactuada".

Com a edição da MP 2.170-36/01, estabeleceu-se que "nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano" (art. 5ª).

Destarte, para as operações de crédito em que se pretende a revisão contratual por abusividade de cláusula de capitalização de juros, é mister expressa celebração do respectivo encargo adicional, se sua celebração foi após a edição da MP 2.170-36/01.

Por previsão expressa entende-se a tratada em cláusula própria e também a indicação de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça editou Súmula 541 que dispõe: "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada".

Na hipótese, verifica-se que a cédula de crédito bancário (fls. 42-43) foi celebrada em 25-06-2013, ou seja, após 31-03-2000, e a capitalização de juros foi demonstrada, porquanto a taxa de juros anual de 14,53% é superior ao duodécuplo da taxa de juros mensal de 1,14% (1,14% X 12 meses = 13,68%).

Nesse sentido, traz-se aos autos entendimento jurisprudencial aplicável ao caso vertente:

- "CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. CONTRATO FIRMADO APÓS A EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 1.963/2000. SÚMULA 539 DO STJ. PACTUAÇÃO IMPLÍCITA. POSSIBILIDADE. PERCENTUAL ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCUPLO DO MENSAL. SÚMULA 541 DO STJ. VIABILIDADE DE INCIDÊNCIA DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS.

Para a declaração da legalidade de juros capitalizados far-se-á necessário que a pactuação seja posterior a 31/03/2000, bem como haja contratação expressa do encargo ou que da multiplicação do juros mensais por doze meses resulte percentual inferior ao constante no pacto como juros anual." (TJSC, 1ª Cam. Dir. Com., rel. Des. Guilherme Nunes Born, ACV n. 0301126-55.2014.8.24.0041, j. 30-05-2019).

- "AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA. INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. DECISÃO AGRAVADA QUE INDEFERIU A LIMINAR. INSURGÊNCIA DO AUTOR. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. NECESSIDADE DA OBSERVÂNCIA DA ORIENTAÇÃO N. 4 DO RESP N. 1.061.530/RS. AUSÊNCIA, NO ENTANTO, DE DEMONSTRAÇÃO DA VEROSSIMILHANÇA DA ALEGAÇÃO DE COBRANÇA DE ENCARGOS ABUSIVOS NO PERÍODO DA NORMALIDADE CONTRATUAL. JUROS REMUNERATÓRIOS PACTUADOS ABAIXO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. TAXA DE JUROS ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCUPLO DA TAXA MENSAL. INCIDÊNCIA DO ENCARGO ADMITIDA. ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA. REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA NÃO SATISFEITOS. DECISÃO MANTIDA, AINDA QUE POR FUNDAMENTO DIVERSO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO"...

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