Decisão Monocrática Nº 0302346-67.2018.8.24.0035 do Primeira Câmara de Direito Civil, 30-10-2019

Número do processo0302346-67.2018.8.24.0035
Data30 Outubro 2019
Tribunal de OrigemItuporanga
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0302346-67.2018.8.24.0035, Ituporanga

Apelante : Celesc Distribuição S/A
Advogada : Caroline Testoni Wehmuth (OAB: 51611/SC)
Apelado : Jackson Dias
Advogado : Ivanor Coelho (OAB: 27316/SC)
Relator : Desembargador Raulino Jacó Brüning

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

I - Adoto o relatório da r. sentença de fls. 106/113, da lavra do Magistrado Rodrigo Vieira de Aquino, por refletir fielmente o contido no presente feito, in verbis:

Trata-se de ação de indenização movida por Jackson Dias contra Celesc Distribuição S/A, ambos qualificados nos autos. Objetiva a parte autora, basicamente, ser ressarcida de danos sofridos em razão da perda na qualidade de fumo que estava em processo de secagem e cura, em estufa que deixou de funcionar, por seguidas horas, em virtude da interrupção no fornecimento de energia elétrica, conforme dados informados na inicial. Valorou a causa, estimou os danos com base em laudo extrajudicial, juntou documentos e requereu a procedência da pretensão inaugural.

Citada, a parte ré apresentou resposta em forma de contestação. Disse não ser caso de responsabilidade objetiva. Defendeu a ausência de culpa e a possibilidade de interrupção do fornecimento de energia elétrica em casos emergenciais. Em suma, negou qualquer responsabilidade no evento. Impugnou o valor requerido pela parte autora. Aduziu ser necessária a realização de média ponderada entre as produções das safras anteriores e da safra reclamada. Pugnou pela improcedência do pedido inicial e juntou documentos.

Houve réplica.

Determinou-se a realização de perícia, cujo laudo aportou às fls. 90-99.

Intimadas as partes, não houve impugnação à perícia judicial.

Acresço que o Togado a quo julgou procedentes os pedidos, conforme parte dispositiva que segue:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora contra Celesc Distribuição S/A., na forma do artigo 487, I, do Novo Código de Processo Civil e, em consequência, CONDENO a ré ao pagamento de R$9.701,00, devendo o valor ser corrigido a partir da data do efetivo prejuízo em 25/12/2017, pelo índice adotado pela e. Corregedoria Geral de Justiça (Provimento n. 13/95), com juros moratórios de 1% ao mês contados a partir da citação.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, conforme art. 85, § 2º, do Novo Código de Processo Civil.

Irresignada, Celesc Distribuição S.A. apela, sustentando que: a) não houve falha na prestação do serviço, uma vez que as interrupções noticiadas nos autos não ultrapassaram os limites de tempo e frequência estipulados pela ANEEL; b) além disso, aconteceram em razão de caso fortuito e força maior, cujo agravamento do dano deu-se em decorrência da plantação de eucaliptos e árvores de grande porte por proprietários omissos; c) o fumicultor deveria ter providenciado um gerador de energia elétrica alternativo, para prevenir eventuais danos; d) o processo de secagem de fumo provocou aumento da carga instalada na unidade consumidora, o que não fora informado à concessionária para que esta realizasse as adequações necessárias na rede de distribuição de energia elétrica; e) mostra-se inadmissível a inversão do ônus da prova no presente caso; f) o nexo causal entre o prejuízo e eventual falha da apelante não restou demonstrado; g) em caso de manutenção da condenação, o termo inicial dos juros de mora e da correção monetária deve ser fixado na data da prolação da aludida decisão (fls. 119/138).

Contrarrazões do autor às fls. 144/149, nas quais rebateu os argumentos do apelo.

II - Em observância ao inciso LXXVIII do art. da Constituição Federal, o qual preceitua que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação", e mediante autorização do art. 932, VIII, do Código de Processo Civil e do art. 132, XV, do Regimento Interno desta Corte de Justiça, passo a analisar monocraticamente o presente recurso, que é tempestivo (consulta ao SAJ) e está munido de preparo (fls. 139/140).

Responsabilidade da concessionária de serviço público

Em suas razões recursais, a ré, concessionária de serviço público de abastecimento de energia elétrica, aduz que não pode ser responsabilizada pelos danos advindos da interrupção do serviço ao autor. Refere que o consumidor não informou a necessidade de adequação na rede de energia elétrica - para suportar a secagem do fumo -, bem como deveria ter providenciado um gerador de energia elétrica alternativo, para prevenir eventuais danos. Afirma, também, que não houve falha na prestação do serviço, porquanto as quedas de energia foram causadas por eventos climáticos imprevisíveis e inevitáveis.

Razão não lhe assiste.

A Constituição Federal, em seu art. 37, § 6º, estabelece:

Art. 37. [...]

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Segundo a diretriz constitucional, portanto, a Administração Pública Direta e Indireta, bem como as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, respondem objetivamente pelos danos decorrentes da sua atuação, ou seja, independentemente de culpa do agente público. Trata-se da teoria do risco administrativo, segundo a qual o Estado somente se exime do dever de indenizar se comprovar culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior.

Sobre o tema, colhe-se da doutrina de Hely Lopes Meirelles:

O exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 622).

Retira-se da jurisprudência deste Tribunal os seguintes precedentes:

Por força da responsabilidade civil objetiva consagrada pelo art. 37, § 6º, da CF/88, a fazenda pública e os concessionários de serviços públicos estão obrigados a indenizar os danos causados em virtude de seus atos, e somente se desoneram se provarem que o ato ilícito se deu por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior (TJSC, Apelação Cível n. 2015.084383-9, de Itaiópolis, rel. Des. Jaime Ramos, j. 26-1-2016).

Não se pode deslembrar que a responsabilidade do Estado se assenta no risco administrativo e independe de prova da culpa, bastando que se demonstre o nexo causal entre o acidente e o dano. Aliás, sequer se exige a prova de culpa do servidor causador do dano. Em casos que tais o ônus da prova é invertido: ao Estado é que compete provar a existência de uma das causas de exclusão da responsabilidade, como a culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito ou a força maior (Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 282) (TJSC, Apelação Cível n. 2013.064549-5, de Garopaba, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 13-10-2015).

De acordo com o art. 37, § 6º, da Carta Magna, 'as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa'. Tratando-se de responsabilidade civil objetiva, se o dano e o nexo causal entre este e a conduta do ente público foram devidamente demonstrados, caracterizado está o dever de indenizar por parte do Estado. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2011.082751-0, da Capital, Rel. Des. Francisco Oliveira Neto, j. em 12/08/2014). (TJSC, Apelação Cível n. 2011.099858-9, da Capital, rel. Des. Rodolfo C. R. S. Tridapalli, j. 9-12-2014).

In casu, os prejuízos referidos pelo consumidor estão diretamente relacionados a uma omissão específica da Celesc Distribuição S.A., a qual tinha o dever legal de agir, fornecendo energia elétrica de maneira adequada e eficaz, de acordo com a demanda, preocupando-se com os fatores internos e externos que poderiam influenciar na estabilidade da rede elétrica, de modo a evitar que a falta de seus serviços, considerados essenciais, acarretasse danos.

Assim, a responsabilização da concessionária é objetiva, dispensando a configuração de dolo ou culpa. Pressupõe, apenas, a comprovação de (a) uma omissão específica; (b) um dano; (c) relação de causalidade entre ambos.

Convém salientar que a responsabilidade objetiva do ente público também está inscrita no Código de Defesa do Consumidor, a saber:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

O art. 14 da lei consumerista, por sua vez, preconiza que "o fornecedor de serviços responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços".

Na hipótese específica dos autos, embora o fumicultor não utilize os serviços prestados pela concessionária como destinatário final, pode ser equiparada à figura do consumidor em virtude da sua...

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