Decisão Monocrática Nº 0302661-65.2018.8.24.0045 do Primeira Câmara de Direito Civil, 17-06-2020

Número do processo0302661-65.2018.8.24.0045
Data17 Junho 2020
Tribunal de OrigemPalhoça
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0302661-65.2018.8.24.0045, Palhoça

Apelante : Aparício Garcez Neto
Advogado : Fabio Lopes de Lima (OAB: 16277/SC)
Apelados : Paysage Parque Verde Empreendimentos Imobiliários LTDA e outro
Advogados : Alceu Rodrigues Chaves (OAB: 99776/SC) e outros
Relator : Desembargador Raulino Jacó Brüning

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

I - Adoto o relatório da r. sentença de fls. 500/509, da lavra do Magistrado Ezequiel Rodrigo Garcia, por refletir fielmente o contido no presente feito, in verbis:

APARÍCIO GARCEZ NETO ajuizou ação de conhecimento, submetida ao procedimento comum, contra PAYSAGE PARQUE VERDE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. e CSEK PARTICIPAÇÕES LTDA., todos devidamente qualificados e representados no feito.

Em suma, alegou o autor que adquiriu das rés o lote 23, da quadra A18, localizado no Loteamento Parque Vale Verde, no valor de R$69.116,80. Informou que até o ajuizamento da ação, pagou o total de R$19.882,20 (entrada, parcelas e comissão de corretagem). Relatou que está passando por problemas de saúde e dificuldades financeiras e não tem mais como arcar com o pagamento das parcelas assumidas. Sustentou que notificou extrajudicialmente a vendedora, com o intuito de rescindir o contrato e ser restituído do montante que pagou, mas não houve resposta. Apontou abusividade nas cláusulas contratuais que estabeleceram a retenção de 10% sobre o valor do imóvel, a irretratabilidade e irrevogabilidade do contrato. Comunicou que suspendeu o pagamento das parcelas. Postulou o reconhecimento de nulidade das cláusulas contratuais n. 17.1 e 17.4.1.1, a rescisão do contrato de compra e venda e a condenação da ré à "devolução do valor pago pelo Autor totalizando o valor de R$ 17.893,98 (dezessete mil oitocentos e noventa e três reais e noventa e oito centavos), valor esse que está descontado a multa de 10% sobre o valor pago pelo Autor, que totaliza em R$1.988.22 (um mil novecentos e oitenta e oito reais e vinte e dois centavos)" (p. 07). A título de tutela de urgência, requereu "que o Réu se abstenha de inscrever o nome do Autor no cadastro de inadimplentes enquanto estiver tramitando a presente ação, aplicandose multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) em caso de possível descumprimento da decisão judicial" (p. 07, item 2). Juntou documentos.

O pedido de tutela antecipada foi deferido às ps. 86/87, por decisão atacada em agravo de instrumento, ao qual o TJSC deu integral provimento (ps. 482/488).

Regularmente citadas, as rés apresentaram contestação única. Impugnaram a gratuidade da justiça deferida ao autor. Suscitaram a preliminar de ilegitimidade passiva. No mérito, relataram que o autor pagou R$ 4.400,00 a título de comissão de corretagem diretamente à imobiliária e, por isso, não tem cabimento a restituição da verba pelas rés. Defenderam a legalidade do pagamento da comissão de corretagem pelo comprador, conforme previsão contratual. Argumentaram que o contrato de compra e venda firmado com o demandante tem cláusulas expressas de irrevogabilidade, irretratabilidade e alienação fiduciária, o que não permite a resilição, sem motivo juridicamente relevante. Atribuíram ao autor a culpa por eventual extinção do contrato. Defenderam a legalidade das cláusulas contratuais. Pugnaram, em caso de resilição do contrato, pela compensação entre os prejuízos sofridos e os valores a serem ressarcidos ao demandante, bem como pela condenação do comprador ao pagamento de taxa de fruição do imóvel. Ao final, postularam a improcedência da ação.

Houve réplica.

Acresço que o Togado a quo julgou improcedentes os pedidos, conforme parte dispositiva que segue:

Ante o exposto, rejeito os pedidos articulados na petição inicial.

A decisão de ps. 86/87 já foi revogada pelo acórdão de ps. 482/488.

Revogo o benefício da gratuidade da justiça concedido ao demandante.

Condeno o autor ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% do valor atualizado da causa.

Irresignado, Aparício Garcez Neto apela, pugnando pela concessão do benefício da justiça gratuita (fls. 513/519).

Contrarrazões às fls. 523/528, nas quais rebateu os argumentos do apelo.

II - Em observância ao inciso LXXVIII do art. da Constituição Federal, o qual preceitua que: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação" e mediante autorização dos arts. 932, IV, e 1.011, I, ambos do Código de Processo Civil de 2015 e 132, XV, do Regimento Interno deste Tribunal, passa-se a analisar monocraticamente a presente apelação cível, que é tempestiva (fl. 512), está dispensada do preparo, em razão do pedido de justiça gratuita e não merece provimento.

1. Da justiça gratuita

Pretende o demandante a reforma da sentença que revogou o benefício outrora concedido-lhe.

Adianta-se, a gratuidade judiciária não merece ser deferida à parte recorrente. Explico nos tópicos a seguir.

1.1. Benefício da justiça gratuita e seus requisitos

O art. 98 do Código de Processo Civil de 2015 trata do tema:

Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

Para usufruir da benesse não basta que o interessado apresente declaração de hipossuficiência. Tal documento goza de presunção relativa de veracidade, que pode ser afastada mediante prova em sentido contrário (art. 99, § 3º, da lei processual civil).

É permitido ao Magistrado, portanto, não convencido da hipossuficiência da parte: (i) exigir a juntada de documentos que comprovem a situação de pobreza e, após, (ii) indeferir o benefício, se presentes fundadas razões para tanto (art. 99, § 2º, do Codex processual civil).

Sobre a matéria, destaca-se da doutrina:

[...] A presunção da veracidade da alegação de insuficiência, apesar de limitada à pessoa natural, continua a ser a regra para a concessão do benefício da gratuidade da justiça. O juiz, entretanto, não está vinculado de forma obrigatória a essa presunção e nem depende de manifestação da parte contrária para afastá-la no caso concreto, desde que existam nos autos ao menos indícios do abuso no pedido de concessão da assistência judiciária. Afastada a presunção, o juiz intimará a parte requerente para que ele comprove efetivamente a sua necessidade de contar com a prerrogativa processual (STJ, 2ª Turma, AgRg no AREsp 257.029/RS, rel. Min. Herman Bejamin, j. 5-2-2013, DJe 15-02-2013). (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil Comentado. Salvador: JusPodivm, 2016. p. 155).

Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência: TJSC, Agravo de Instrumento n. 4025840-08.2017.8.24.0000, de Itajaí, rel. Des. Sebastião César Evangelista, j. 15-3-2018.

Logo, somente deve ser deferido o benefício em questão quando presentes os requisitos para tanto.

Ademais, a concessão da justiça gratuita não é definitiva. Ocorre a suspensão da exigibilidade da verba pelo prazo de cinco anos (art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil). Durante este período, se constatada a cessação da hipossuficiência da parte beneficiária, ser-lhe-á exigido o pagamento das despesas posteriores ao deferimento da benesse. Daí, então, a necessidade de o Juiz sempre fixar honorários advocatícios, mesmo nos casos de gratuidade judiciária.

A doutrina ensina:

[?] o benefício, integral ou modulado, somente afasta a responsabilidade provisória do sujeito e, mesmo quanto a ela, apenas abrange os atos futuros isto é, tem eficácia apenas prospectiva (OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Benefício da justiça gratuita. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno (Cord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016).

1.2. Prejuízo aos cofres públicos

Importante termos em mente o seguinte cenário:

- Uma pequena parte da arrecadação do Judiciário provém das custas pagas pelos litigantes (remuneração da prestação da atividade jurisdicional). No entanto, esse montante representa apenas cerca de 12% do valor total do orçamento deste Poder, ou seja, é bastante limitado principalmente se consideradas as despesas dos processos. As custas judiciais, em geral, não superam o valor dos gastos processuais.

- Estima-se que, neste Tribunal de Justiça de Santa Catarina, dentre os recursos pendentes de julgamento (área cível), mais de 36% deles contam com, pelo menos, uma parte que é beneficiária da gratuidade da justiça.

- O beneplácito da gratuidade judiciária constitui uma espécie de renúncia de receita tributária, na modalidade "concessão de isenção em caráter não geral" (art. 14, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal). O deferimento, portanto, deve ser feito caso a caso, mediante o preenchimento dos diversos requisitos previstos em lei.

Ora, uma vez que incumbe ao vencido, de acordo...

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