Decisão Monocrática Nº 0308139-81.2018.8.24.0036 do Primeira Câmara de Direito Público, 17-07-2019

Número do processo0308139-81.2018.8.24.0036
Data17 Julho 2019
Tribunal de OrigemJaraguá do Sul
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualRemessa Necessária Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



Remessa Necessária Cível n. 0308139-81.2018.8.24.0036


Remessa Necessária Cível n. 0308139-81.2018.8.24.0036, de Jaraguá do Sul

Impetrante: André Cristiano Monteiro da Silva

Impetrado: Município de Jaraguá do Sul

Relator: Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

André Cristiano Monteiro da Silva impetrou mandado de segurança contra ato do Diretor da Vigilância Sanitária Municipal de Jaraguá do Sul.

A ordem foi concedida para "DETERMINAR que a autoridade impetrada expeça alvará sanitário em favor de ANDRÉ CRISTIANO MONTEIRO DA SILVA para o exercício das atividades de Técnico em Optometria constantes na Classificação Brasileira de Ocupações - Portaria n. 397/2002-MTE, desde que preenchidas as demais exigências legais" (f. 149/162).

Sem recursos, os autos ascenderam para reexame necessário, manifestando-se a d. Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da Dra. Eliana Volcato Nunes, pelo desprovimento da remessa (f. 180/184).

DECIDO

A sentença prolatada pela MM. Juíza Candida Inês Zoellner Brugnoli merece ser confirmada por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razão de decidir:

II Pretende o impetrante a concessão de alvará sanitário, autorizando o exercício das atividades inerentes a Técnico em Optometria, que não lhe teria sido concedido na forma pretendida.

Antes de adentrar ao mérito, ressalto que "O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida" (STJ, EDcl no AgRg nos EREsp 1483155/BA, Rel.

Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/06/2016, DJe 03/08/2016), ou seja, desde que o magistrado analise o cerne da questão, e enfrente todos os argumentos capazes de influenciar, efetivamente, na conclusão do decisum, não precisará apreciar e rebater pontualmente todas as ilações apresentadas pelas partes (artigo 489, § 1º, inciso IV, do CPC).

Também "No tocante ao prequestionamento dos artigos de lei (...), é certo que o juiz não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, nem a citar, textualmente, os dispositivos a que se amoldam os fatos decididos, bastando a declinação de sua motivações fáticas, devendo elas conformar-se com as normas precipitadas do Estado, sem que precise, a cada passo, na sentença, decidir uma questão e mencionar o dispositivo de lei em que se assenta a decisão" (TJSC, Apelação Cível n. 2004.011665-9, de Concórdia, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben, j. 03-05-2007).

Primeiramente, saliento que o objeto da demanda não diz respeito ao reconhecimento da validade do Curso de Optometria frequentado pelo impetrante, ou de qualquer outro, mas sim aos limites legais para o exercício da referida profissão.

Analisando os documentos acostados aos autos, verifica-se que o impetrante possui diploma do Curso Técnico em Optometria, registrado junto à Secretaria da Educação de Santa Catarina, bem como no Conselho Regional de Óptica e Optometria do Estado de Santa Catarina. Além disso, o curso em referência também está incluído no Cadastro Nacional de Cursos Técnicos reconhecidos pelo Ministério da Educação MEC, vide os diplomas e certificados das fls. 79/80, 82/83 e 84/85.

Não bastasse, denota-se que o impetrante detém Carteira Profissional de Técnico em Optometria, expedida pelo Conselho Brasileiro de Ótica e Optometria, conforme demonstrado à fl. 81.

O documento de fls. 28/33 comprova que o alvará sanitário pleiteado foi emitido com as referidas ressalvas, sob o fundamento de que a legislação vigente veda aos optometristas a instalação de consultório e a prescrição de fórmulas de grau, que serão permitidas apenas "para cumprimento de decisões judiciais".

Registro, nesse ponto, que as informações prestadas pela autoridade impetrada e pelo Município de Jaraguá do Sul não modificam a situação fática ou jurídica acerca do que já foi decidido às fls. 101/112, motivo pelo qual reedito as razões do referido decisum.

A profissão de Optometrista está prevista no artigo 3º do Decreto n. 20.931/1932, que assim dispõe:

"Art. 3º - Os optometristas, práticos de farmácia, massagistas e duchistas estão também sujeitos à fiscalização, só podendo exercer a profissão respectiva se provarem a sua habilitação, a juízo da autoridade sanitária."

A propósito, regram ainda os artigos 38, 39 e 41 do Decreto n. 20.931/1932, in verbis:

"Art. 38 É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas, optometristas e ortopedistas, a instalação de consultórios para atender clientes, devendo o material aí encontrado ser apreendido e remetido para o depósito público, onde será vendido judicialmente a requerimento da Procuradoria dos Feitos da Saúde Pública a quem, a autoridade competente oficiará nesse sentido. O produto do leilão judicial será recolhido ao Tesouro, pelo mesmo processo que as multas sanitárias.

"Art. 39 É vedado às casas de ótica confeccionar e vender lentes de grau sem prescrição médica, bem como instalar consultórios médicos nas dependências dos seus estabelecimentos.

(...)

Art. 41 As casas de ótica, ortopedia e os estabelecimentos eletro, rádio e fisioterápicos de qualquer natureza devem possuir um livro devidamente rubricado pela autoridade sanitária competente, destinado ao registo das prescrições médicas." Grifei.

Por sua vez, estabelecem os artigos 9º, 13 e 14 do Decreto n. 24.492/1934:

"Art. 9º Ao ótico prático do estabelecimento compete:

a) a manipulação ou fabrico das lentes de gráu;

b) o aviamento perfeito das fórmulas óticas fornecidas por médico oculista;

c) substituir por lentes de gráu idêntico aquelas que lhe forem apresentadas danificadas:

d) datar e assinar diariamente o livro de registro do receituário de ótica."

(...)

Art. 13 É expressamente proibido ao proprietário, sócio gerente, ótico prático e demais empregados do estabelecimento, escolher ou permitir escolher, indicar ou aconselhar o uso de lentes de gráu, sob pena de processo por exercício ilegal da medicina, além das outras penalidades previstas em lei.

Art. 14 O estabelecimento de venda de lentes de gráu só poderá fornecer lentes de gráu mediante apresentação da fórmula ótica de médico, cujo diploma se ache devidamente registrado na repartição competente." Grifei.

A possibilidade, ou não, da instalação de consultórios por profissional optometrista é, ainda hoje, extremamente controversa, tanto que motiva o ingresso de inúmeras demandas judiciais.

Não obstante, é imprescindível analisar a questão partindo-se dos pressupostos constitucionais, notadamente ao livre exercício de qualquer profissão, bem como a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, previstos, respectivamente, nos artigos 5º, inciso XIII, e 170, caput, ambos da Constituição Federal de 1988:

"XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

(...)

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios (...)".

Os Decretos n. 20.931/1932 e n. 24.492/1934, ainda vigentes, em virtude da suspensão do ato normativo (artigo 4º do Decreto n. 99.678/1990) que os revogou pelo Supremo Tribunal Federal (ADIn n. 533-2/MC), bem como pelo reconhecimento, em algumas decisões, acerca de suas recepções pela atual Carta Magna, foram editados muito antes da promulgação desta, em uma ordem constitucional muito diversa e indiscutivelmente mais restritiva.

Bem por isso, os termos dos Decretos em questão devem ser interpretados não de forma literal, mas sim de forma sistemática com a atual Constituição e demais dispositivos legais sobre o assunto.

A matéria em questão restou pacificada, ao menos no Estado de Santa Catarina, no Incidente de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2006.030031-7, de São José, de relatoria do eminente Desembargador Luiz Cézar Medeiros, quando foi reconhecido o direito à atuação do profissional Optometrista, vedada, contudo, a prática das funções privativas de médico oftalmologista:

"ADMINISTRATIVO - OPTOMETRIA - RESTRIÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL ILEGALIDADE 1 Afronta o princípio da razoabilidade a restrição ao exercício da optometria com embasamento nos ultrapassados Decretos ns. 20.931/32 e 24.492/34, já que, a toda evidência, a ratio legis desses diplomas não mais se afeiçoa à realidade da vida moderna. 2 Se existe curso superior reconhecido pelo Ministério da Educação que habilita profissionais para o exercício das atividades de optometria, não tem sentido impedir que aqueles que colam grau e providenciam o registro no respectivo órgão fiscalizador exerçam em toda a sua plenitude a profissão que escolheram. O exercício profissional da optometria, no entanto, deverá se restringir àquelas atividades facultadas pelas normas de regência, sendo vedado, em absoluto, as práticas privativas do médico oftalmologista" (TJSC, Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2006.030031-7, de São José, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 11-03-2009). Grifei.

Do corpo do acórdão do Incidente de Uniformização extrai-se fundamentação acerca da necessidade de aplicação dos referidos Decretos com reservas, notadamente em virtude do contexto fático e histórico no qual foram editados:

"Desse modo, é de se concluir que a ação da vigilância sanitária até poderia se justificar em atendimento a posturas reguladas no direito local, sem, no entanto, afrontar a garantia do...

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