Decisão Monocrática Nº 0315302-62.2017.8.24.0064 do Primeira Câmara de Direito Civil, 31-05-2021

Número do processo0315302-62.2017.8.24.0064
Data31 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Apelação Nº 0315302-62.2017.8.24.0064/SC

APELANTE: RICARDO ALEXANDRE BORGES (AUTOR) APELADO: METROPOLITAN LIFE SEGUROS E PREVIDENCIA PRIVADA SA (RÉU)

DESPACHO/DECISÃO

Trata-se de apelação cível interposta por Ricardo Alexandre Borges em face da sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de São José que, nos autos da ação de cobrança de seguro de vida em grupo aforada contra Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S.A., julgou improcedentes os pleitos exordiais, nos seguintes termos (evento 69, eproc 1G):

ANTE O EXPOSTO, na forma do art. 487, I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por RICARDO ALEXANDRE BORGES contra METROPOLITAN LIFE SEGUROS E PREVIDÊNCIA PRIVADA S.A.

Condeno a parte autora, com fulcro no artigo 82, § 2º, do CPC, ao pagamento das despesas processuais.

Condeno também a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da requerida, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, o que faço com fundamento no artigo 85, caput, do CPC, atendidos os critérios do § 2º, incisos I a III, do mesmo dispositivo. No entanto, a exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa e condicionada à cessação da situação de insuficiência de recursos, desde que ocorra no prazo de 5 (cinco) anos contados do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 98, § 3o, do CPC, visto que a parte autora goza do benefício da justiça gratuita.

Expeça-se alvará ao perito para levantamento dos honorários depositados no evento 32, observados os dados bancários informados no evento 57.

Irresignado, o recorrente sustentou a configuração de invalidez permanente e a inobservância da obrigação de informar o consumidor sobre cláusulas limitativas, tendo direito à indenização securitária. Pugnou pela reforma da sentença (evento 74, eproc 1G).

Com as contrarrazões (evento 81, eproc 1G), ascenderam os autos a este Sodalício.

É o relatório.

Presentes assim os requisitos legais, conheço do recurso.

O insurgente pretende seja reconhecida a invalidez, evento coberto pelo contrato de seguro de vida em grupo. Aponta a incidência do Código de Defesa do Consumidor e alega não ter sido informado pela companhia de seguros sobre nenhuma condição limitadora. Postula, deste modo, a condenação da demandada ao pagamento da apólice no valor integral.

A pretensão malogra, todavia.

De plano, vale destacar o escólio de Arnaldo Rizzardo, para quem o seguro configura-se no negócio jurídico em que "um dos contratantes se obriga a indenizar o outro, ou terceiros, mediante o recebimento de determinada importância, denominada prêmio, de prejuízos decorrentes de riscos futuros e especificamente previstos" (in Contratos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 539).

Com efeito, nos contratos de seguro torna-se possível listar as limitações à abrangência do risco, sobre o qual o prêmio é computado. As seguradoras não estão obrigadas a indenizar o bem submetido a qualquer tipo de dano, sem restrições, o que poderia inviabilizar a própria atividade delas.

Entrementes, tais ressalvas devem seguir os ditames do Código de Defesa do Consumidor, cujo § 4º, do art. 54, determina:

Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. [...]§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.

Se persistirem dúvidas acerca do significado e alcance dos termos contratuais, especialmente aqueles que limitam direitos do consumidor, a solução é dada pelo comando do art. 47 do CDC: "as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor". Aliás, o art. 46, do CDC, enuncia a imprescindibilidade da cognição prévia do contrato aos que a ele anuírem. Confira-se dos referidos dispositivos:

Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance.

Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

Sobre o tema, leciona Nelson Nery Junior:

Os princípios da teoria da interpretação contratual se aplicam aos contratos de consumo, com a ressalva do maior favor ao consumidor, por ser a parte débil da relação de consumo. Podemos extrair os seguintes princípios específicos da interpretação dos contratos de consumo: a) a interpretação é sempre do que à literalidade da manifestação de vontade (art. 85, Código Civil); c) a cláusula geral de boa-fé reputa-se ínsita em toda relação jurídica de consumo, ainda que não conste expressamente do instrumento do contrato (arts. 4º, caput e nº III, e 53, nº IV, do CDC); d) havendo cláusula negociada individualmente, prevalecerá sobre as cláusulas estipuladas unilateralmente pelo fornecedor; e) nos contratos de adesão as cláusulas ambíguas e contraditórias ser fazem contra sitpulatorem, em favor do aderente (consumidor); f) sempre que possível interpreta-se o contrato de modo a fazer com que suas cláusulas tenham aplicação, extraindo-se delas um máximo de utilidade (princípio da conservação). (Grinover, Ada Pelegrini; et. al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 7. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p. 488/489).

Por outro lado, torna-se impossível a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC), porquanto "tal benefício não exclui a obrigação do recorrente de carrear aos autos elementos probatórios mínimos a corroborar seus argumentos" (AC n. 2013.059228-0, rel. Des. Jairo Fernandes Gonçalves, j. em 30.06.2014).

Cumpre observar, ainda, que as seguradoras fazem parte do Sistema Nacional de Seguro Privados (SNSP), encimado pelo Ministério da Economia, responsável por formular a política de seguros privados, estabelecer as normas e fiscalizar as operações no mercado nacional, o qual é igualmente integrado pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), com competência para regulamentar a oferta e fiscalizar a comercialização dos contratos de seguro.

O CNSP editou a Resolução n. 117/2004, consolidando as regras de funcionamento e os critérios para operação das coberturas de risco oferecidas em plano de seguro de pessoas, ao passo que a SUSEP publicou a Circular n. 302/2005, com regras complementares de funcionamento e os critérios para operação das coberturas de risco oferecidas em plano de seguro de pessoas, passando a prever as seguintes coberturas relacionadas à incapacidade do segurado: invalidez permanente por acidente (IPA); invalidez laborativa permanente total por doença (ILPD); e invalidez funcional permanente total por doença (IFPD).

Da mencionada Circular n. 302/2005 extraem-se vários conceitos:

Art. 11. A cobertura de invalidez permanente por acidente garante o pagamento de uma indenização relativa à perda, à redução ou à impotência funcional definitiva, total ou parcial, de um membro ou órgão por lesão física, causada por acidente pessoal coberto.[...]Art. 15. Garante o pagamento de indenização em caso de invalidez laborativa permanente total, conseqüente de doença.§ 1º Para todos os efeitos desta norma é considerada invalidez laborativa permanente total por doença aquela para a qual não se pode esperar recuperação ou reabilitação, com os recursos terapêuticos disponíveis no momento de sua constatação, para a atividade laborativa principal do segurado.§ 2º Atividade laborativa principal é aquela através da qual o segurado obteve maior renda, dentro de determinado exercício anual definido nas condições contratuais.§ 3º Consideram-se também como total e permanentemente inválidos, para efeitos da cobertura de que trata este artigo, os segurados portadores de doença em fase terminal atestada por profissional legalmente habilitado.§ 4º Não podem configurar como segurados, para a cobertura de invalidez laborativa permanente total por doença, pessoas que não exerçam qualquer atividade laborativa, sendo vedado o oferecimento e a cobrança de prêmio para o seu custeio, por parte da sociedade seguradora.[...]Art. 17. Garante o pagamento de indenização em caso de invalidez funcional permanente total, conseqüente de doença, que cause a perda da existência independente do segurado.§ 1º Para todos os efeitos desta norma é considerada perda da existência independente do segurado a ocorrência de quadro clínico incapacitante que inviabilize de forma irreversível o pleno exercício das relações autonômicas do segurado, comprovado na forma definida nas condições gerais e/ou especiais do seguro.§ 2º Consideram-se também como total e permanentemente inválidos, para efeitos da cobertura de que trata este artigo, os segurados portadores de doença em fase terminal atestada por profissional legalmente habilitado.

Doutro viso, o Superior Tribunal de Justiça reconhece a validade das normas regulamentares. Confira-se:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO COM ADICIONAL DE COBERTURA POR INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA - IFPD. PATOLOGIA DA COLUNA LOMBAR CONTROLADA POR CIRURGIA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE PARA A PROFISSÃO. DESEMPENHO DE ATIVIDADES LABORAIS LEVES. DEFINIÇÃO DA APÓLICE: INVALIDEZ FUNCIONAL. ATIVIDADES AUTONÔMICAS DA VIDA DIÁRIA. PRESERVAÇÃO. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA INDEVIDA.1. A Circular SUSEP nº 302/2005 vedou o oferecimento da cobertura de Invalidez Permanente por Doença (IPD), em que o pagamento da indenização estava condicionado à impossibilidade do exercício, pelo segurado, de toda e qualquer atividade laborativa, pois era difícil a sua caracterização ante a falta de especificação e de transparência quanto ao conceito de "invalidez" nas apólices...

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