Decisão Monocrática Nº 0600489-14.2014.8.24.0079 do Terceira Câmara de Direito Público, 04-10-2019

Número do processo0600489-14.2014.8.24.0079
Data04 Outubro 2019
Tribunal de OrigemVideira
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualRemessa Necessária Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Remessa Necessária Cível n. 0600489-14.2014.8.24.0079 de Videira

Autor : Vilmar Godoy (Representado por seu pai) Juvenal Godoy
Advogados : Johny Marcos Tibes de Souza (OAB: 34564/SC) e outro
Réu : Estado de Santa Catarina
Procurador : Andre Martinez Rossi (OAB: 32778/SC)
Relator : Desembargador Jaime Ramos

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Na Comarca de Videira, V. G., representado por seu genitor e curador, J. G. ajuizou "ação revisional de benefício - pensão especial" contra o Estado de Santa Catarina aduzindo que, por ser portador de deficiência mental que o incapacita para o provimento de sua manutenção, aufere benefício assistencial do réu destinado a excepcionais; que, nos termos dos art. 203, inciso V, da Constituição Federal e do art. 157, V, da Carta Estadual, tem direito de auferir referido benefício assistencial no valor de um salário mínimo, porém, isso não ocorreu de forma integral, daí porque o réu lhe deve pagar todas as diferenças em razão do pagamento inferior ao devido; que a jurisprudência é pacífica quanto ao direito alegado.

Requereu a concessão da justiça gratuita e, ao final, a procedência dos pedidos para que seja determinada a revisão do benefício de pensão elevando o seu valor a um salário mínimo e condenado o réu ao pagamento das diferenças apuradas desde a implantação do benefício.

A justiça gratuita foi deferida à parte autora (pág. 38).

Citado, o Estado de Santa Catarina contestou arguindo, preliminarmente: a) falta de autorização do juiz do processo de interdição; b) ausência de interesse de agir em relação às parcelas futuras e às vencidas desde 27/7/2013; c) prescrição da postulação no prazo trienal ou, subsidiariamente, quinquenal. No mérito, alegou a inexistência do direito à majoração em período anterior à vigência da Lei Estadual n. 16.063/2013, vez que a pensão é decorrente de lei estadual, e sendo assim, não está amparada pela Constituição do Estado e ou Federal, pois não se trata de um benefício previdenciário, mas de uma pensão graciosa, cujo benefício não incide o valor de 01 (um) salário mínimo. Sustentou, por fim, violação aos princípios da separação dos poderes e da justeza, além de ofensa ao orçamento público e do impacto financeiro à Fazenda Pública.

Intimada, a parte autora apresentou réplica à contestação.

O representante do Ministério Público opinou pela procedência do pedido.

Na sequência, o douto Magistrado, ao sentenciar o feito, julgou procedente o pedido formulado na inicial, consignando na parte dispositiva do decisório:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos iniciais para:

a) reconhecer o direito do autor de perceber a pensão mensal instituída pela Lei Estadual n. 6.185/1982 em valor equivalente a um salário mínimo de 16.4.1985 a 24.7.2013;

b) condenar o Estado de Santa Catarina a pagar os valores das respectivas diferenças, acrescidas de correção monetária e juros de mora, na forma da fundamentação, ressalvada a possibilidade de alteração quando da fase de liquidação, nos termos do que for julgado em definitivo pelo STF acerca do tema 810.

Sem custas processuais.

Arca o Estado, no entanto, com os honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da soma dos valores devidos até a data desta sentença, a teor do art. 85, §3º, do CPC.

Sentença sujeita a reexame necessário.

Em razão da ausência de interposição de recurso voluntário, os autos ascenderam a este Tribunal para análise da remessa necessária.

Com vistas dos autos, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Américo Bigaton, opinou pelo conhecimento e provimento parcial do reexame necessário.

É o relatório.

Trata-se de remessa necessária da sentença que, nos autos da "ação revisional de benefício - pensão especial" ajuizada por V. G., representada por seu genitor e curador J. G., em face do Estado de Santa Catarina, reconheceu o direito de majoração da pensão especial auferida pela parte autora e, dessa forma, condenou o réu a proceder à revisão do benefício assistencial concedido com base na Lei Estadual n. 6.185/1982, a fim de que corresponda a 1 (um) salário mínimo nacionalmente unificado, a partir de 16/4/1985 até 24/7/2013, bem como a pagar as diferenças havidas, de uma só vez, acrescidas dos consectários legais.

Da prescrição

Contra a parte autora, pessoa absolutamente incapaz à época da aquisição do direito à complementação de sua pensão graciosa, não corre a prescrição.

Embora o Decreto n. 20.910/32 estabeleça em favor da Fazenda Pública a prescrição quinquenal para fulminar as pretensões contra ela deduzidas, e o inciso II do § 3º do art. 206 do Código Civil determine que prescreve em 03 (três) anos a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias, no caso dos autos, por figurar como parte autora pessoa absolutamente incapaz, incide a hipótese prevista no artigo 198, I do Código Civil, que dispõe:

"Art. 198. Também não corre a prescrição:

"I - contra os incapazes de que trata o art. 3º".

Por sua vez, o artigo 3º, II, do mesmo Código, previa à época em que a parte autora adquiriu o direito à complementação de sua pensão:

"Art. 3º. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

"II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos".

Logo, na condição de absolutamente incapaz, contra a parte autora não corriam à época quaisquer prazos prescricionais, fazendo jus ao pagamento da diferença entre o valor pago e o salário-mínimo então vigente desde a promulgação da Constituição do Estado de Santa Catarina, a menos que a pensão graciosa tenha sido concedida posteriormente, caso em que as diferenças deverão ser pagas desde a concessão do benefício.

No caso dos autos, não há dúvida de que a parte autora é pessoa absolutamente incapaz para todos os atos da vida civil, conforme averbado em sua certidão de nascimento (pág. 29).

Os documentos apresentados nos autos dão conta da existência do pagamento do benefício desde 17/04/1985 (págs. 82/84) e de vínculo assistencial ativo até os dias atuais.

Não tem aplicação ao caso o disposto no art. 4º, incisos II e III, do Código Civil de 2002, na redação vigente à época da propositura da ação, que classifica como relativamente incapazes para certos atos da vida civil ou à maneira de os exercer, "os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido" e "os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo"; também sujeitos a curatela (art. 1.767, incisos III e IV, do mesmo Estatuto).

Nesse sentido são os precedentes desta Corte de Justiça:

"O art. 3º do Código Civil consignou expressamente que é absolutamente incapaz aquele que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiver o necessário discernimento para a prática desses dos atos da vida civil, razão pela qual, contra estes, não corre o prazo prescricional. 'A teor do artigo 198, inc. I, do Código Civil, a incapacidade absoluta obsta o curso da prescrição, qualquer que seja seu lapso, e, inclusive, em desfavor da Fazenda Pública' (TJSC, AC n. 2012.022737-3, relª. Desª. Sônia Maria Schmitz, j. 21.6.12)" (TJSC, Apelação / Reexame Necessário n. 0304228-16.2014.8.24.0064, de São José, Rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 06-03-2018).

"AÇÃO OBJETIVANDO A REVISÃO DA PENSÃO GRACIOSA CONCEDIDA COM BASE NA LEI ESTADUAL N. 6.185/1982. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. [...] PRETENSÃO VEICULADA POR PESSOA ABSOLUTAMENTE INCAPAZ, CATEGORIA IMUNE À PRESCRIÇÃO. ART. 198, INCISO I, DO CÓDIGO CIVIL. PRELIMINAR AFASTADA. [...]" (TJSC, AC n. 0600069-95.2014.8.24.0018, de Chapecó, Rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 06-02-2018).

"'O comando previsto no Código Civil beneficia a todos os incapazes e não se restringe apenas a relações reguladas pelo próprio Código - a Fazenda Pública também está sujeita a essa regra 'e o curso da prescriçãonão corre se o titular do direito violado é um absolutamente incapaz'. (Desembargador Jânio Machado, AC n. 2007.059453-9)' (Apelação Cível n. 2008.030726-9, de São José do Cedro. Rel. Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva)" (TJSC, Apelação Cível n. 2015.003182-9, de Chapecó, Rel. Des. Vanderlei Romer, julgada 17.03.2015).

E do Superior Tribunal de Justiça:

"ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. PRESCRIÇÃO. INCAPAZ. INTERDIÇÃO. CURATELA. PRAZO. INTERRUPÇÃO. 1. O prazo prescricional não flui contra os absolutamente incapazes, inclusive interditados, ainda que submetidos à curatela. 2. Assim, afastada a prescrição quanto à recorrente absolutamente incapaz, os autos devem retornar à instância de origem para que examine o recurso de apelação como entender de direito, inclusive quanto à repercussão desse ponto sobre o quantum indenizatório devido. 3. Recurso especial a que se dá provimento" (STJ - REsp 1684125/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, DJe 13/03/2018).

"A prescrição não corre contra os absolutamente incapazes (arts. 167, I, do CC/1916 e 198, I, do CC/2002). [...]" (STJ - REsp 1529971/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 19/09/2017).

Assim, correta a decisão que afastou a prejudicial de prescrição de fundo de direito e também das prestações anteriores ao quinquênio do ajuizamento da ação, tendo em vista que a parte autora era pessoa absolutamente incapaz, contra quem não corria a prescrição (art. 198, inciso I, do Código Civil de 2002).

Em face disso, também não têm aplicação ao caso as disposições do art. 206, § 3º, inciso II, do Código Civil de 2002, que considera a prescrição de três anos para a pretensão de receber prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias".

Em relação ao tema de fundo, no Estado de Santa Catarina a pensão graciosa especial, devida aos excepcionais incapazes para o trabalho, foi...

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