Decisão Monocrática Nº 0602105-52.2014.8.24.0005 do Quarta Câmara de Direito Público, 19-12-2019

Número do processo0602105-52.2014.8.24.0005
Data19 Dezembro 2019
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0602105-52.2014.8.24.0005 de Balneário Camboriú

Apelante : Oi S/A
Advogados : Renato Marcondes Brincas (OAB: 8540/SC) e outro
Apelado : Município de Balneário Camboriú
Proc.
Município : Anelise dos Santos Soares (OAB: 28212/SC)
Relatora : Desembargadora Sônia Maria Schmitz

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

1. Oi S.A. ajuizou ação anulatória de ato administrativo em face do Município de Balneário Camboriú, buscando eximir-se do pagamento de multa imposta pelo Procon municipal. Arguiu a inexistência de abuso ao direito do consumidor, ausência de motivação no ato administrativo, perda de objeto do processo administrativo e violação aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Finalizou protestando pela antecipação dos efeitos da tutela para afastar a cobrança e, ao final, pela procedência do pedido (p. 47-74).

Indeferido o pleito de tutela antecipada (p. 154-159), o ente público apresentou contestação, defendendo a regularidade da sanção imposta, bem como o devido amparo legal. Sustentou, outrossim, ser adequado o valor (p. 180-191).

Após réplica (p. 197-205), sobreveio a sentença de improcedência, com a condenação da parte autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (p. 217-226).

Inconformado, apelou a vencida, reiterando as teses da inicial (p. 231-245). Com as contrarrazões (p. 251-262), ascenderam os autos, manifestando-se a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, com parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Jacson Corrêa, pelo desprovimento do recurso (p. 159-164).

Posteriormente, o ente público requereu "a transferência do saldo da subconta vinculada ao presente processo para a subconta existente em nome do Município junto ao Sistema de Depósitos Judiciais - SIDEJUD" (p. 281-282).

É o relatório.

2. A r. Sentença foi publicada em 14.03.2017 (p. 227), ou seja, sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, de modo que o processamento do recurso obedecerá os comandos nele disciplinados.

Nos termos, do art. 932, inciso IV, "a" e "b", do CPC/2015, incumbe ao Relator negar provimento a recurso contrário a "súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal", bem como a "acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federa ou Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos". Cumpre-lhe, ainda, à luz do inciso VIII do mesmo artigo, "exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal".

Atendidos os pressupostos de admissibilidade conhece-se do recurso.

Cuida-se de recurso de apelação interposto por Oi S.A. em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos veiculados na presente ação anulatória, ao reconhecer a legalidade da sanção imposta pelo Procon do Município de Balneário Camboriú.

A apelante arguiu: a) inexistência de infração a direito do consumidor; b) ilegitimidade do Procon para impor obrigação; c) ausência de motivação no ato administrativo; d) perda de objeto do mérito administrativo; e, e) exorbitância do valor exigido.

Pois bem.

O art. 9º do Decreto n. 2.181/97 (dispondo sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC) determina que a fiscalização das relações de consumo será exercida, dentre outros, pelos órgãos de proteção e defesa do consumidor criados pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, em suas respectivas áreas de atuação e competência.

A possibilidade de o PROCON impor penalidade pelo descumprimento das normas consumeristas encontra respaldo nas disposições dos arts. 56 e 57 da Lei n. 8.078/90. Veja-se o que preveem os comandos:

Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:

I - multa;

II - apreensão do produto;

III - inutilização do produto;

IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;

V - proibição de fabricação do produto;

VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;

VII - suspensão temporária de atividade;

VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;

IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;

X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade;

XI - intervenção administrativa;

XII - imposição de contrapropaganda.

Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar, antecedente ou incidente de procedimento administrativo.

Art. 57. A pena de multa, graduada de acordo com a gravidade da infração, a vantagem auferida e a condição econômica do fornecedor, será aplicada mediante procedimento administrativo, revertendo para o Fundo de que trata a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, os valores cabíveis à União, ou para os Fundos estaduais ou municipais de proteção ao consumidor nos demais casos.

Parágrafo único. A multa será em montante não inferior a duzentas e não superior a três milhões de vezes o valor da Unidade Fiscal de Referência (Ufir), ou índice equivalente que venha a substituí-lo.

Como se observa das normas supramencionadas em análise perfunctória não se constata qualquer impedimento para que o órgão administrativo, no exercício de seu poder de polícia, sancione pecuniariamente as transgressões praticadas pelos fornecedores de produtos e serviços.

Dá-se que a interpretação jurisprudencial dos dispositivos sob comento hesitou, ora favoravelmente, ora contrária a tal prerrogativa.

Há, porém, posicionamento do Superior Tribunal de Justiça definitivo sobre a matéria.

A propósito, em decisão monocrática da lavra do Ministro Benedito Gonçalves anotou-se que:

Assim, resulta que os órgãos de defesa do consumidor possuem a atribuição legal de aplicar multas aos fornecedores de produtos ou serviços sempre houver infração às normas consumeiristas, mesmo em se tratando de dano individual, observada a proporcionalidade, mediante ponderação sobre a gravidade da infração, vantagem auferida e condição econômica do fornecedor.

Sobre as cláusulas abusivas, merece atenção o disposto no art. 51 do CDC e, em especial, a regulamentação da matéria para efeito de incidência das sanções administrativas, conforme previsão do art. 22 do Decreto 2.181/97, que segue transcrito, com grifo nos pontos mais relevantes para a hipótese dos autos:

[...]

Portanto, além de possível a aplicação de multa, incumbe aos órgãos administrativos de proteção do consumidor proceder à análise de cláusulas dos contratos mantidos entre fornecedores e consumidores para aferir situações de abusividade, mesmo que se trata de relação entre um consumidor e um fornecedor, razão pela qual, no ponto, equivocada a fundamentação do acórdão recorrido (REsp. n. 1.589.372/SC, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. em 23.05.2017).

Igualmente, são outros julgados do STJ: AgInt no REsp 1211793/SP, relª. Minª. Assusete Magalhães, j. em 03.04.2018; REsp. n. 1.714.227/SC, rel. Min. Francisco Falcão, j. em 21.02.2018; AgInt no REsp 1.594.667/MG, relª. Minª. Regina Helena Costa, j. em 04.08.2016; e, REsp 1523117/SC, rel. Min. Herman Benjamin, j. em 21.05.2015.

No Tribunal de Justiça catarinense, não mais persiste divergência sobre a matéria. As Câmaras de Direito Público, competentes para analisar essas causas, reconhecem a competência do Procon para impor multa por violação a direito de consumidor, merecendo destaque o seguinte precedente:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE MULTA ADMINISTRATIVA APLICADA PELO PROCON. MUNICÍPIO DE CAÇADOR. IMPOSIÇÃO DE SANÇÃO PECUNIÁRIA. ATUAÇÃO LEGÍTIMA. COMPETÊNCIA DETERMINADA PELOS ARTS. 55, §1º E 55 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E ARTS. 2º, 4º, INCISOS III E IV, 5º E 18, §2º DO DECRETO FEDERAL N. 2.181/97. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. POSSIBILIDADE. TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS. TARIFAS DE CADASTRO E DE REGISTRO DO CONTRATO. SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. CLÁUSULAS NÃO ABUSIVAS. LEGALIDADE DA COBRANÇA. MULTA INDEVIDA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA POR FUNDAMENTAÇÃO DIVERSA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

É pacífico o entendimento no Superior Tribunal de Justiça segundo o qual a sanção administrativa prevista no artigo 57 do Código de Defesa do Consumidor funda-se no Poder de Polícia que o PROCON detém para aplicar multas relacionadas à transgressão dos preceitos da Lei n. 8.078/1990, independentemente da reclamação ser realizada por um único consumidor, por dez, cem ou milhares de consumidores. (STJ, AgInt no REsp 1594667/MG, rel. Min. Regina Helena Costa, j. 04/08/2016).

Não se trata de usurpação da função típica do Poder Judiciário, nem tampouco de violação ao art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal de 1988 ("a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito"). Aplicação da chamada teoria dos poderes implícitos, pois negar ao PROCON a possibilidade de interpretação de cláusulas contratuais significa impedir a atuação regular do órgão administrativo instituído para a defesa do consumidor (art. 5º, XXXII, CF/88). (ACv n. 0500350-32.2012.8.24.0012, de Caçador, Rel. Desa. Vera Copetti, j. em 16.03.2017).

Em igual norte, destaca-se: AC n. 0328441-78.2015.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Jorge Luiz de Borba, Primeira Câmara de Direito Público, j. em 30.04.2019; Agravo Interno n. 4008151-82.2016.8.24.0000, de Balneário Camboriú, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. em 12.03.2019; AC n. 0013139-34.2014.8.24.0018, de Chapecó, rel. Des. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. em 07.08.2018; e, AC n. 0300123-94.2015.8.24.0020, de Criciúma, relª. Desª. Denise de Souza Luiz Francoski, Quinta Câmara de Direito Público,...

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