Decisão Monocrática N° 07158499620238070000 do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, 04-05-2023

JuizALVARO CIARLINI
Número do processo07158499620238070000
Data04 Maio 2023
Órgão2ª Câmara Cível

Poder Judiciário da União Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios Gabinete do Desembargador Alvaro Ciarlini Autos nº 0715849-96.2023.8.07.0000 Classe judicial: MS - Mandado de Segurança Impetrante: Breno Candeira Nunes Impetrado: Secretário de Estado de Planejamento, Orçamento e Gestão do Distrito Federal. D e c i s ã o Trata-se de mandado de segurança, com requerimento liminar, impetrado por Breno Candeira Nunes contra o ato atribuído ao Secretário de Planejamento, Orçamento e Administração do Distrito Federal. Em sua causa de pedir afirma que foi indevidamente eliminado do certame realizado para o provimento do cargo de policial penal do Distrito Federal, de acordo com o edital normativo nº 1/2022, na etapa de ?sindicância da vida pregressa?, em virtude da existência de ocorrência policial alusiva à suposta prática de atos infracionais. Requer o deferimento da medida liminar para que seja determinada a suspensão dos efeitos do ato administrativo que determinou a sua eliminação na 4ª etapa do certame, com o objetivo de que possa prosseguir nas fases subsequentes do concurso público. O autor trouxe aos autos a guia de recolhimento do valor alusivo às despesas processuais e o comprovante de pagamento. (Id. 156572039) É a breve exposição. Decido. A tutela específica, possível no procedimento especial do mandamus, exige a demonstração, desde o início, dos elementos de prova suficientes e necessários a respeito da violação da esfera jurídica dos impetrantes, ilegalmente ou com abuso de poder (art. 1º da Lei nº 12.016/2009), por parte do Poder Público, seja por suas respectivas autoridades ou mesmo por indivíduos que exerçam funções delegadas, à luz da regra prevista no art. 7º, inc. III, da mesma lei. A eficácia dessa ação é, por regra, preponderantemente mandamental, uma vez que o pedido tem por finalidade a expedição de ordem (mandado) dirigido à autoridade impetrada, para que cessem ou sejam evitados os efeitos de determinado ato administrativo, ou, no caso de omissão, para que seja dada consecução ao ato administrativo vinculado que tutele a esfera jurídica do impetrante. Diante do requerimento liminar previsto no art. 7º, inc. III, da Lei nº 12.016/2009, poderá haver a suspensão dos efeitos do ato administrativo impugnado à vista da relevância dos fundamentos da impetração e do risco da demora. Na presente hipótese a questão em análise diz respeito à possibilidade de eliminação do candidato em concurso público, na fase de investigação social, por ter omitido a ocorrência relacionada com a suposta prática de atos infracionais. No âmbito normativo do Distrito Federal, a Lei nº 4.949/2012 prevê as seguintes regras a respeito da cognominada etapa de sindicância da ?vida pregressa? em concursos públicos: ?Art. 65. A pesquisa e a busca de dados sobre a conduta social e ética de vida pregressa do candidato só podem ser usadas como instrumento de avaliação em concurso público quando a lei assim o determinar. § 1º Os critérios para a pesquisa e a busca de dados de que trata este artigo são os fixados no edital normativo do concurso público, vedados os de natureza subjetiva. § 2º A habilitação ou a inabilitação decorrentes de pesquisa e busca de dados é necessariamente fundamentada. § 3º Ao candidato inabilitado é assegurada a interposição de recurso. § 4º É vedado o aproveitamento de pesquisa e busca de dados feitas em outro concurso público?. (Ressalvam-se os grifos) As normas em destaque harmonizam-se com o dever de motivação inerente aos atos praticados pelo poder público e também com a ?presunção de inocência?, que deve ser observada no exercício da função administrativa. A propósito, atente-se às seguintes lições doutrinárias: ?O princípio do contraditório consiste na garantia do administrado de que lhe será aberta a oportunidade de esclarecimento e de ampla defesa, de apresentação de prova e de acompanhamento de todo o procedimento, sempre que o processo verse sobre interesses cuja proteção lhe foi assegurada, sejam individuais, coletivos ou difusos (CF, art. 5.º, LV). O princípio da motivação, já enunciado constitucionalmente (art. 93, X), determina a exposição clara e consequente das razões fáticas e jurídicas que embasem quaisquer decisões administrativas?[1]. ?Entre as disposições alojadas sob este rótulo de critérios a serem observados nos processos administrativos ou inclusas nos denominados direitos dos administrados e eventualmente esparsas sob outras titulações encontram-se cânones que, na verdade, compõem um amplo leque de disposições, ora protetoras dos administrados, ora simplesmente qualificadoras da índole do processo administrativo, os quais, em larga medida, coincidem com os conteúdos dos que dantes indicamos serem os princípios fundamentais do processo administrativo. Assim, vale a pena colocar em realce, ao lado dos já referidos princípios: 1) da motivação e 2) da proporcionalidade, também estes preceitos contemplados sob rotulação distinta, isto é, os que mencionam: 3) atuação da Administração segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé; 4) garantia do direito de defesa contra aplicação de sanções, cabendo acrescentar, embora o dispositivo em questão não o diga, que tal defesa deve ser prévia, quer por força do princípio do devido processo legal, quer pelo da presunção de inocência, conforme se depreende da Constituição (...)? (Ressalvam-se os grifos)[2]. É preciso ressaltar, igualmente, as regras previstas na Lei nº 9.784/1999 a respeito do tema ora em análise: ?Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: (omissis) VI - adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público; VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão; VIII ? observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados; (omissis) Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório; (omissis) § 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato?. (Ressalvam-se os grifos) No caso em deslinde, ao declarar a inaptidão do autor na 4ª fase do certame o impetrado indicou o seguinte (Id. 46142697): ?consta em desfavor do candidato a OC 3468/2005 (porte ilegal de arma de fogo de uso permitido). Convém esclarecer que o candidato não informou na FIC a aludida Ocorrência Policial, omitindo assim tal informação. Dessa forma, não atendeu ao Item 16.11, Inciso XVI do Edital nº 01/2022: ?São feitos que afetam a idoneidade e conduta ilibada do candidato (...) Declaração falsa ou omissão de registro relevante sobre sua vida pregressa?, importando em eliminação do Certame, conforme prescreve o item 16.12, alínea ?i? do Edital nº 01/2022?. (Ressalvam-se os grifos) A despeito de ter suscitado a existência de ocorrência policial em desfavor do candidato, a autoridade impetrada não esclareceu como a referida circunstância o inabilitaria para o exercício das funções inerentes ao cargo público, pois se limitou a abordar a afirmada omissão atribuída ao impetrante. Por esse motivo, não foi observado o dever de motivação do ato administrativo, de acordo com a norma prevista no art. 65, §2º, da Lei nº 4.949/2012. O ato administrativo em questão também não prestou a devida hamenagem ao preceito constitucional da razoabilidade. Para Robert Alexy, diferentemente do que ocorre com as regras jurídicas, ?os princípios costumam ser relativamente gerais, porque não estão referidos às possibilidades do mundo real ou normativo.?[3] É importante ressaltar que para o referido doutrinador os princípios não podem ser aplicados plenamente nas situações concretas da vida, mas são identificados como autênticos ?mandados de otimização?. Nesse sentido, os princípios são espécies do gênero ?normas jurídicas?, mas sua aplicação se dirige a resultados ?otimizáveis?, ou seja, a ?algo que seja realizado na maior medida possível?. A esse respeito, assim ensina o Jurista: ?Princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização, que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e que a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais, como também das jurídicas. De outro lado, as regras são normas que só podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, então se deve fazer exatamente o que ela exige, nem mais nem menos. Portanto, as regras contêm determinações no âmbito do fático e juridicamente possível?.[4] Para o festejado professor alemão, portanto, os princípios ?não contêm mandados definitivos, mas somente prima facie?[5]. Assim, muito embora um princípio possa ser aplicado a uma determinada situação fática, essa peculiaridade não conduz à constatação no sentido de que esse resultado seja definitivo. É conveniente perceber que diferentemente das regras, que contêm comandos expressos, a vincular situações em um dado âmbito jurídico e fático [6], os princípios devem ser vistos como autênticas razões prima facie[7]. Por essa razão, os princípios funcionam como autênticos comandos de otimização,...

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