Decisão Monocrática N° 07310347720238070000 do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, 04-08-2023

JuizGETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA
Número do processo07310347720238070000
Data04 Agosto 2023
Órgão7ª Turma Cível

Vistos etc. Trata-se de agravo de instrumento interposto em ação inominada em que se pretende suspender os atos demolitórios empreendidos pelo Agravado, através da Secretaria e órgão competente, de residências situadas no denominado "Condomínio Residencial Arara Azul". O MM Juiz expendeu os seguintes argumentos para indeferir a pretensão: "A pretensão autoral investe frontalmente contra a lei, na medida em que propõe a cominação de "obrigação de não fazer" consistente na inobservância da função institucional da ré, que é incumbida exatamente do exercício do poder de polícia sobre o ordenamento urbanístico. O Código de Obras e Edificações do DF exige, para toda e qualquer construção, em terreno público ou particular, o prévio licenciamento administrativo, cominando a sanção de demolição para os que desobedeçam a tal preceito: Art. 22. Toda obra só pode ser iniciada após a obtenção da licença de obras, exceto nos casos de dispensa expressos nesta Lei. (...) Art. 124. Sem prejuízo das sanções penais cabíveis, o infrator se sujeita às seguintes sanções, aplicáveis de forma isolada ou cumulativa: (...) V - intimação demolitória; Dado que não há qualquer vestígio de licença para construir ou carta de habite-se para a construção mencionada na demanda, a implementação da sanção legal é medida que o órgão policial deve efetivar, sob pena de se configurar prevaricação ou improbidade administrativa. Se o procedimento adotado pelo órgão público segue a previsão legal, não se pode falar em violação ao devido processo legal, sem incidir em contradição. Afirmar que a região encontra-se "em regularização" é o mesmo que afirmar que está irregular (posto que não há necessidade de se "regularizar" o que é conforme a lei). A mera expectativa abstrata de um dia haver uma expansão urbana no local não confere a ninguém direito de construir ao seu bel-prazer, independentemente de qualquer observância às normas edilícias. A Constituição incumbe ao município e, por extensão, as atribuições de gestão da cidade e regularização fundiária. Se os poderes competentes entendem necessária a demolição da edificação ilegal, é lógico que reputa tal medida como necessária, em decisão respaldada pelo ordenamento jurídico e que não pode ser substituída pelo arbítrio do Judiciário, a quem incumbe apenas o estrito controle de legalidade dos atos administrativos, mas jamais a gestão da cidade. O direito de moradia não se sobrepõe aos demais interesses jurídicos tutelados constitucionalmente. Ao revés, deve ser exercitado de modo socialmente adequado - este, aliás, é o real significado da ideia de "função social da propriedade", um princípio consagrado constitucionalmente (art. 182, § 2º, da Carta), que, a contrário do que se defende em Brasília, confere prevalência ao interesse público sobre o particular. A moradia estabelecida em desconformidade com as leis urbanísticas e de proteção ambiental viola este princípio e, por ser antissocial, deve ser coibida, em prol da sobrevivência saudável da coletividade (valendo recordar que o meio ambiente é bem de uso comum do povo, direito difuso das presentes e futuras gerações). A exigência de subordinação da propriedade à sua função social é ratificada no âmbito constitucional local, sendo assim tratada na Lei Orgânica do Distrito Federal: Art. 314. A política de desenvolvimento urbano do Distrito Federal, em conformidade com as diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, garantido o bem-estar de seus habitantes, ele compreende o conjunto de medidas que promovam a melhoria da qualidade de vida, ocupação ordenada do território, uso de bens e distribuição adequada de serviços e equipamentos públicos por parte da população. Parágrafo único. São princípios norteadores da política de desenvolvimento urbano: (...) IX - a adequação do direito de construir aos interesses sociais e públicos, bem como às normas urbanísticas e ambientais previstas em lei; Art. 315. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende a exigências fundamentais de ordenação do território, expressas no plano diretor de ordenamento territorial, planos diretores locais, legislação urbanística e ambiental, especialmente quanto: I - ao acesso à moradia; II - à contraprestação ao Poder Público pela valorização imobiliária decorrente de sua ação; III - à proteção ao patrimônio histórico, artístico, paisagístico, cultural e ao meio ambiente. Do que se vê, a pretensão autoral afigura-se, mais que contrária à lei local, francamente inconstitucional, o que afasta a plausibilidade jurídica da pretensão posta. Atualmente, o Distrito Federal padece de preocupante deficit ambiental, que só tende a se agravar, causando o risco de inviabilizar a habitabilidade humana nesta unidade da Federação. A principal causa de tamanho desequilíbrio ambiental é por todos conhecida: a ocupação desordenada do solo urbano, ocasionada pela leniência das autoridades em coibir situações como a dos autos, a crescente expansão urbana completamente descomprometida com quaisquer cautelas para com a manutenção das condições mínimas de legalidade e preservação ambiental. Num contexto destes, autorizar a permanência de construções ilegais em expansão urbana ilegal é não apenas algo inteiramente incongruente com a função judiciária (a quem incumbe fazer concretizar a vontade legal, e não investir contra ela), mas verdadeira insensatez, próxima do suicídio coletivo. A zona rural do Gama vivencia atualmente o mesmo processo de expansão ilegal que acabou por resultar na cidade de Vicente Pires, uma localidade repleta de graves problemas urbanos, e que exigirá enorme dispêndio de esforços e recursos públicos para ser minimamente equacionada. Permitir-se o mesmo processo no Gama seria não apenas injurídico, mas insensato. Anoto, a...

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