Decisão Monocrática N° 07475966420238070000 do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, 27-11-2023

JuizLEONOR AGUENA
Número do processo07475966420238070000
Data27 Novembro 2023
Órgão2ª Turma Cível

Poder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS Juíza Convocada Maria Leonor Leiko Aguena Número do processo: 0747596-64.2023.8.07.0000 Classe judicial: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) AGRAVANTE: CELSO SOUZA E SILVA AGRAVADO: BANCO DO BRASIL S/A D E C I S Ã O Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a decisão que homologou os cálculos periciais (id 174928257 dos autos originários) em liquidação provisória da sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública n. 0008465-28.1994.4.01.3400 (94.0008514-1). O exequente, ora agravante, afirma que não é possível acolher abatimentos no caso em tela. Alega que o Juízo de Primeiro Grau descumpriu o art. 509, § 4º, do Código de Processo Civil. Cita julgados favoráveis à tese por ele defendida. Pede o provimento do recurso para reformar a decisão agravada e acolher o cálculo por ele apresentado. Preparo efetuado (id 53193472). As partes foram intimadas para se manifestarem sobre o eventual reconhecimento da incompetência da Justiça do Distrito Federal e dos Territórios para o processamento e julgamento do feito originário, diante da escolha aleatória e injustificada de foro para a propositura da demanda. O agravante apresentou petição na qual defendeu a competência da Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. O prazo transcorreu sem manifestação do Banco do Brasil S.A., ora agravado. Brevemente relatado, decido. Os recursos não impedem a eficácia da decisão recorrida (art. 995, caput, do Código de Processo Civil). O Relator poderá suspender a eficácia da decisão ou, caso esta apresente conteúdo negativo, conceder a medida pleiteada como mérito do recurso, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso (art. 995, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Há, portanto, dois (2) pressupostos, cumulativos, a serem considerados pelo Relator: a probabilidade de provimento e o perigo da demora. O deferimento está condicionado ao preenchimento concomitante dos dois (2) requisitos acima citados. As partes devem respeitar as regras objetivas estabelecidas para determinação de competência, sob pena de violação ao princípio do juiz natural. A competência é a medida da jurisdição. A função jurisdicional é distribuída pela Constituição Federal e pelas leis processuais e de organização judiciária entre os órgãos jurisdicionais. Elas fixam os limites para cada um deles processar e julgar as causas que lhes são previamente atribuídas. Há juiz natural para emitir o correspondente provimento jurisdicional para cada ação proposta, estabelecido antecipadamente por norma jurídica válida (art. 5º, incs. XXXVII e LIII, da Constituição Federal).[1] A lei processual elege critérios para determinar a competência do órgão jurisdicional. A competência é fixada pelos critérios material, funcional, territorial e valor da causa. Os critérios de fixação de competência devem ser analisados para identificar o órgão jurisdicional que detém a jurisdição para o caso concreto.[2] O critério material está relacionado à especialização do órgão jurisdicional para apreciar e julgar determinada matéria estabelecida pela lei, com exclusão dos demais órgãos jurisdicionais. O critério funcional está relacionado à função que cada órgão jurisdicional exerce no processo. O critério territorial é a distribuição da causa a órgãos jurisdicionais com a mesma competência e objetiva facilitar a defesa dos direitos das partes e possibilitar ao juízo do local o exercício da função jurisdicional de maneira mais eficiente. O critério do valor da causa considera o proveito econômico pretendido pela parte autora.[3] A competência absoluta está relacionada aos critérios material e funcional. Prevalece o interesse público na fixação da competência absoluta, que se caracteriza por ser improrrogável e insuscetível de modificação por convenção das partes. A incompetência absoluta pode ser alegada pelas partes ou pelo Ministério Público, em qualquer tempo ou grau de jurisdição, ou declarada de ofício pelo juiz ou tribunal (art. 64, § 1º, do Código de Processo Civil). A competência relativa está vinculada aos critérios territorial e valor da causa. Prevalece o interesse ou comodidade das partes, especificamente quanto ao autor para viabilizar o acesso ao Poder Judiciário ou em relação ao réu para facilitar a sua defesa. Pode ser modificada por convenção das partes interessadas ou por lei pela conexão ou pela continência. Prorroga-se a competência relativa se não for arguida pelo réu em preliminar de contestação ou pelo Ministério Público nas causas em que atuar (art. 65 do Código de Processo Civil). O órgão jurisdicional inicialmente incompetente para decidir a causa torna-se competente de forma definitiva.[4] A Súmula n. 33 do Superior Tribunal de Justiça orienta que o magistrado não pode reconhecer de ofício a incompetência relativa. O enunciado originou-se dos Conflitos de Competência n. 245, 872, 1.496, 1.506, 1.519 e 1.589. A orientação é bastante utilizada como base para resolver conflitos de competência territorial. A experiência jurídica, no entanto, demonstra a inadequação de se aplicar o entendimento sem verificar se os fundamentos determinantes se estendem a casos significativamente distintos. As situações fáticas discutidas nos precedentes que levaram à elaboração do enunciado da Súmula n. 33 do Superior Tribunal de Justiça envolviam partes com alguma relação com o foro escolhido. O caso concreto é substancialmente diferente, pois o foro foi escolhido sem respeito às normas e sem justificativa plausível. Outro aspecto relevante é que nenhum dos precedentes discutiu o abuso do direito na escolha aleatória de foro sem qualquer conexão com a demanda, seja o domicílio das partes, seja o local do fato ou da coisa ou o local do cumprimento da obrigação. As súmulas dos tribunais devem se ater às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação (art. 926, § 2º, do Código de Processo Civil). A aplicação do entendimento aos casos posteriores ocorre por analogia, com base nos parâmetros do caso concreto considerados como relevantes pelo tribunal para fixar a orientação.[5] O entendimento exposto na Súmula n. 33 do Superior Tribunal de Justiça continua aplicável, porém é necessário considerar que foi firmado há mais de trinta (30) anos. A realidade mudou sensivelmente ao longo das décadas. Uma das mudanças mais significativas diz respeito ao processo judicial eletrônico. Noventa e sete inteiros e dois décimos por cento (97,2%) dos novos processos ingressaram na Justiça em formato eletrônico em 2021. Foram vinte e sete (27) milhões de casos novos ingressados pelo sistema virtual.[6] A tramitação virtual dos processos pôs fim às barreiras geográficas, que funcionavam como uma espécie de estabilizador natural das demandas entre os foros próximos das partes. Havia barreiras físicas para litigar em comarcas distantes, especialmente por elevar os custos da demanda. O processo judicial eletrônico permite que advogados de outros estados patrocinem os interesses de partes localizadas em cidades distantes para demandar em uma determinada comarca ou circunscrição judiciária contra réus sem vínculo com o local. A escolha, feita em detrimento do foro previamente estabelecido pela lei, baseia-se geralmente em critérios extralegais, como o baixo valor das custas, eventual entendimento do julgador favorável à tese do autor e até mesmo a mera conveniência do advogado. O fenômeno é capaz de comprometer os serviços do Poder Judiciário quando ocorre em uma escala elevada, especialmente em demandas de massa. Os principais problemas provocados pela distribuição ilegal de processos são: o comprometimento do planejamento e da execução da prestação jurisdicional; o comprometimento do orçamento; o número limitado de Juízes, Desembargadores e órgãos auxiliares da função jurisdicional do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios; a preterição do atendimento das demandas relativas ao jurisdicionado do Distrito Federal; e a privação das custas processuais pelo Poder Judiciário do Estado competente. A experiência jurídica verificou situações que envolvem a competência territorial e que não se enquadram nas razões que levaram à elaboração da Súmula n. 33 do Superior Tribunal de Justiça. O Superior Tribunal de Justiça passou, em uma série de julgados, a diferenciar essas situações e a vedar a escolha aleatória do foro sem obedecer a qualquer regra processual. É necessário justificativa plausível para a escolha, uma vez que a prática pode causar prejuízo à defesa ou esconder a finalidade de obter vantagem com o entendimento favorável de determinado tribunal, em detrimento do juízo previamente determinado pela lei.[7] A possibilidade de prorrogação da competência territorial prevista no art. 65 do Código de Processo Civil, se o réu não alegar a incompetência em preliminar de contestação, deve ser analisada sistematicamente, pois pressupõe que os demais limites legais sejam observados. A ideia de que a competência territorial nem sempre será fixada somente em atenção ao interesse das partes não é inédita. Cândido Rangel Dinamarco lembra que doutrinadores de peso defendiam a possibilidade de declinação de ofício da competência territorial. O autor, embora fosse contrário à ideia, admitia a declinação em situações de anormalidade ou abuso de direito, como de foro longínquo, com o objetivo de restabelecer a igualdade entre os litigantes.[8] Giuseppe Chiovenda listava uma série de hipóteses de competência absoluta no direito italiano que envolviam o elemento territorial, como o sequestro de conservação, processo de delibação, processo falencial, ações para pagamento de despesas judiciais, convalidação de oferta real, dentre outras, denominadas por ele de competências territoriais funcionais.[9] Piero Calamandrei evitou o uso do termo funcional e...

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