Decisão Monocrática Nº 0900267-81.2015.8.24.0064 do Segunda Câmara de Direito Público, 28-01-2020

Número do processo0900267-81.2015.8.24.0064
Data28 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemSão José
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação Cível n. 0900267-81.2015.8.24.0064


ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0900267-81.2015.8.24.0064 de São José

Apelante : Estado de Santa Catarina
Procuradora : Rosangela Conceição de Oliveira Mello (OAB: 17103/SC)
Apelado : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Promotor : João Carlos Teixeira Joaquim (promotor)
Relator: Desembargador Sérgio Roberto Baasch Luz

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa Catarina contra a sentença que, na ação civil pública com pedido de tutela antecipada proposta pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina, em favor da idosa Maria Celeste de Souza, julgou procedentes os pedidos iniciais e condenou o Ente Público ao fornecimento dos fármacos pleiteados.

A parte recorrente sustenta que por não ter sido realizada perícia médica, não há prova do fato constitutivo do direito da autora, bem como, que o médico da autora não atestou terem sido utilizadas cada uma das alternativas padronizadas pelo SUS, ou a impossibilidade de uso para o seu caso específico.

Menciona não estarem preenchidos os requisitos do Tema 106 do STJ, e pleiteia, por fim, a anulação da sentença por cerceamento de defesa com a intimação da parte autora para juntada de laudo médico circunstanciado ou a realização de prova pericial .

Contrarrazões às fls. 215-222.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Exmo. Sr. Dr. Durval da Silva Amorim, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (fls. 231-233).

Este é o relatório.

Conforme art. 932 do CPC/2015, incisos III, IV, V e VIII, incumbe ao relator não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; julgar monocraticamente o recurso quando sua decisão fundar-se em súmula e entendimento firmado em julgamento de recursos repetitivos, de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência do STF, do STJ ou do próprio tribunal; e exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal.

Por sua vez, o art. 132, XV, XVI e XVII, do RITJSC, determina que compete ao relator, por decisão monocrática, julgar recurso e resolver conflito de competência quando sua decisão fundar-se em enunciado ou jurisprudência dominante deste Tribunal de Justiça.

Pois bem, a Constituição Federal (arts. , , 196 e 198), como não poderia deixar de ser, trata do direito à vida e à saúde, impondo ao Estado o correspondente dever de provê-la. A Lei n. 8.080/90, ao regular o Sistema Único de Saúde - SUS e dispor sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bem como sobre a organização e funcionamento dos serviços a ela correspondentes, estabelece no art. 6º que "estão incluídas ainda no campo de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS): I - a execução de ações: [...] d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica; (...)".

Este é o entendimento do STJ:

RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. SUS. LEI N. 8.080/90.

O v. acórdão proferido pelo egrégio Tribunal a quo decidiu a questão no âmbito infraconstitucional, notadamente à luz da Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990.

O Sistema Único de Saúde pressupõe a integralidade da assistência, de forma individual ou coletiva, para atender cada caso em todos os níveis de complexidade, razão pela qual, comprovada a necessidade do medicamento para a garantia da vida de paciente, deverá ser ele fornecido. Recurso especial provido. Decisão unânime. (REsp. n. 212346/RJ, Min. Franciulli Netto).

Vale destacar que não se pode argumentar a inexistência do direito subjetivo do cidadão ao recebimento gratuito de qualquer medicamento, tratamento ou aparelho médico-hospitalar de que necessite para melhorar seu estado de saúde.

Para rechaçar tal assertiva, suficiente a transcrição de julgado do Pretório Excelso:

O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável, o Poder Público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, inclusive àqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. O caráter programático da regra inscrita no art. 196 da Carta Política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTOS A PESSOAS CARENTES. - O reconhecimento judicial da validade jurídica de programas de distribuição gratuita de medicamentos a pessoas carentes, inclusive àquelas portadoras do vírus HIV/AIDS, dá efetividade a preceitos fundamentais da Constituição da República (arts. 5º, caput, e 196) e representa, na concreção do seu alcance, um gesto reverente e solidário de apreço à vida e à saúde das pessoas, especialmente daquelas que nada têm e nada possuem, a não ser a consciência de sua própria humanidade e de sua essencial dignidade. Precedentes do STF (AGRRE n. 271.286/RS, rel. Min. Celso de Mello, j. 24.11.2000).

Quanto à interpretação do art. 196 da CRFB e à suposta violação aos princípios da separação dos Poderes e da isonomia, já restou pacificado entendimento no sentido que todas as esferas do Poder Público estão obrigadas a atender os problemas de saúde da população, constituindo grave comportamento institucional a recusa ao atendimento de casos como o que ora se apresenta.

Não se trata de apenas disponibilizar o atendimento geral na rede pública, mas também de fornecer, quanto instado e restar comprovada a necessidade, os medicamentos excepcionais necessários ao tratamento de qualquer indivíduo.

Não se pode falar, neste contexto, que o atendimento de situação individualizada poderia ferir o princípio da igualdade ou de qualquer outro princípio constitucional.

O que importa, de fato, é que se atenda a todos os pedidos, sem distinção entre eles, mesmo nas situações que não são, de regra, atendidas na rede pública de saúde. Negar atendimento ao indivíduo nas situações de comprovada urgência, importa em grave violação ao seu direito fundamental à saúde, prestação constitucionalmente imposta ao Poder Público.

Demais, a falta de dotação orçamentária específica não pode servir de obstáculo à aquisição e ao fornecimento de medicamentos, sobretudo na necessária concretização do direito fundamental à vida e do direito de por ela lutar. Consoante o disposto no artigo 24 da Lei 8.666/93, em caso de comprovada urgência, é possível a dispensa de processo de licitação para a aquisição, pelo Estado, de medicamento necessário à manutenção da saúde de pessoa carente de recursos para adquiri-lo. É a presente hipótese.

O Grupo de Câmaras de Direito Público, em sede de Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva n. 0302355-11.2014.8.24.0054, julgado em 9/11/2016, de relatoria do eminente Des. Ronei Danielli, firmou a seguinte tese:

1.1 Para a concessão judicial de remédio ou tratamento constante do rol do SUS, devem ser conjugados os seguintes requisitos: (1) a necessidade do fármaco perseguido e adequação à enfermidade apresentada, atestada por médico; (2) a demonstração, por qualquer modo, de impossibilidade ou empecilho à obtenção pela via administrativa (Tema 350 do STF).

1.2 Para a concessão judicial de fármaco ou procedimento não padronizado pelo SUS, são requisitos imprescindíveis: (1) a efetiva demonstração de hipossuficiência financeira; (2) ausência de política pública destinada à enfermidade em questão ou sua ineficiência, somada à prova da necessidade do fármaco buscado por todos os meios, inclusive mediante perícia médica; (3) nas demandas voltadas aos cuidados elementares à saúde e à vida, ligando-se à noção de dignidade humana (mínimo existencial), dispensam-se outras digressões; (4) nas demandas claramente voltadas à concretização do máximo desejável, faz-se necessária a aplicação da metodologia da ponderação dos valores jusfundamentais, sopesando-se eventual colisão de princípios antagônicos (proporcionalidade em sentido estrito) e circunstâncias fáticas do caso concreto (necessidade e adequação), além da cláusula da reserva do possível.

Assim, em se tratando de remédio ou tratamento padronizado, devem ficar demonstrados a sua necessidade e adequação à enfermidade por meio de atestado médico, e ainda, a impossibilidade de sua...

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