Decisão Monocrática Nº 0900343-29.2014.8.24.0036 do Quarta Câmara de Direito Público, 30-04-2020

Número do processo0900343-29.2014.8.24.0036
Data30 Abril 2020
Tribunal de OrigemJaraguá do Sul
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Cível n. 0900343-29.2014.8.24.0036 de Jaraguá do Sul

Apelante : Município de Jaraguá do Sul
Procurador Mun : Benedito Carlos Noronha (OAB: 21944/SC)
Apelado : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Promotor : Henrique da Rosa Ziesemer (Promotor)
Apelado : Estado de Santa Catarina
Procuradora : Camila Maria Duarte (OAB: 30154/SC)
Interessado : Sueli Esfoglia
Relatora: Desembargadora Sônia Maria Schmitz

DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA

1. Ministério Público do Estado de Santa Catarina ajuizou "ação civil pública com pedido de antecipação de tutela" em face do Estado de Santa Catarina e do Município de Jaraguá do Sul, objetivando instá-los a fornecer à Sueli Esfoglia os medicamentos Marevan 5mg (Varfarina Sódica) e Flavonid 450/50mg (diosmina + hisperidona) para tratamento da patologia que a acomete (tromboflebite em safena interna - CID 10: I80 - trombose recente) (págs. 01-13).

Deferida a medida antecipatória (págs. 52-56), citado, o Município de Jaraguá do Sul apresentou contestação suscitando, preliminarmente, ilegitimidade passiva ad causam e carência de ação por falta de interesse processual. No mérito, aduziu: a) ofensa ao devido processo legal; b) ausência de comprovação de que as medicações postuladas não podem ser substituídas por alternativas terapêuticas fornecidas pelo SUS; c) conflito entre os princípios da reserva do possível e da proporcionalidade; d) inexistência de comprovação da hipossuficiência da paciente; e) disponibilidade dos medicamentos na Farmácia Popular, para aquisição gratuita ou com valor acessível. Ao arremate, prequestionou a matéria abordada e pugnou pela improcedência dos pedidos exordiais (págs. 67-96).

Em sua peça defensiva, o Estado de Santa Catarina arguiu, prefacialmente, ilegitimidade ativa do Ministério Público, ausência de interesse de agir tocante ao medicamento Marevan 5mg (Varfarina Sódica), porquanto dispensado gratuitamente no âmbito do SUS, e necessidade de revogação da tutela antecipada. No mérito, asseverou impossibilidade de fornecimento de medicação distinta da padronizada nos programas oficiais, ausência de justificativa técnica pela escolha de tratamento não disponibilizado no âmbito do SUS, indispensabilidade de realização de perícia técnica e necessidade de fixação de contracautela (págs. 103-117).

Após instrução do feito e manifestação do Representante Ministerial (pág. 206), sobreveio a r. sentença, nos seguintes termos:

[...] III - Ante o exposto:

III.a) JULGO EXTINTA a presente ação, sem resolução do mérito, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, por ausência de interesse processual, relativamente ao medicamento Varfarina Sódica, e, em consequência, REVOGO a antecipação da tutela concedida às fls. 52/56 no que diz respeito ao fornecimento do referido fármaco.

III.b) JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA em face do ESTADO DE SANTA CATARINA e do MUNICÍPIO DE JARAGUÁ DO SUL e, em consequência, JULGO RESOLVIDO O MÉRITO, ex-vi do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para CONFIRMAR parcialmente e tornar definitiva a antecipação dos efeitos da tutela concedida às fls. 52/56, e CONDENAR os réus a fornecerem à interessada Sueli Esfoglia, de forma gratuita e enquanto perdure a necessidade de sua utilização, o medicamento cujo princípio ativo seja Diosmina + Hisperidina, na quantidade necessária ao tratamento, conforme receituário de fl. 51 ou outros que possam ser apresentados futuramente.

DEVERÁ a interessada, a cada 6 (seis) meses, comprovar a persistência da necessidade de utilização do medicamento concedido, por meio de receita médica atualizada, a ser apresentada diretamente à gerência/setor onde lhe for entregue a medicação.

DEIXO de condenar os réus nos honorários advocatícios, em razão de a demanda ter sido instaurada pelo Ministério Público (Nesse sentido: STJ,REsp. n. 493823/DF, rel. Min. Eliana Calmon).

Sem custas em face da isenção legal em favor dos réus (artigo33, caput, da Lei Complementar Estadual n. 156/1997).

Sentença não sujeita ao reexame necessário, já que o montante do valor dos medicamentos vencidos, com a soma de 12 (doze) parcelas vincendas,não ultrapassa o patamar de 100 (cem) salários mínimos (artigo 496, § 3º, inciso III,do Código de Processo Civil) (Nesse sentido: Apelação Cível n. 2012.032399-8, de Imaruí, Rel.: Des. Jorge Luiz de Borba, j. Em 04/09/2012)" (Juíza Candida Inês Zoellner Brugnoli - págs. 208-222).

Irresignado, o Município de Jaraguá do Sul apelou, suscitando, preliminarmente, cerceamento de defesa ante a não realização de perícia médica e, no mérito, sustentando, em linhas gerais, responsabilidade solidária dos Entes Federativos ao fornecimento do fármaco, visto tratar-se de medicamento de alto custo e, ao arremate, prequestionando a matéria abordada (págs. 234-257).

Com contrarrazões (págs. 264-269 e 270-276), os autos ascenderam a esta Corte, tendo a Procuradoria-Geral de Justiça se manifestado pelo conhecimento e desprovimento do apelo (págs. 282-287).

Remetidos os autos à Turma Recursal (págs. 300-305), o feito foi restituído a este Órgão Julgador, nos termos do Enunciado XI do Grupo de Câmaras de Direito Público deste Sodalício, para processar e julgar o reclamo (pág. 315).

É o relatório.

2. Inicialmente, firma-se a competência deste Tribunal de Justiça para julgamento do recurso, nos termos do Enunciado XI do Grupo de Câmaras de Direito Público. É que, tendo a demanda sido ajuizada em 14.10.2014 (antes, portanto, do marco temporal estabelecido no referido Enunciado - 23.06.2015), não se há falar na aplicação do rito do Juizado Especial da Fazenda Pública (Lei n. 12.153/09) e, via de consequência, na competência da Turma Recursal para apreciação e julgamento do reclamo.

Outrossim, nos termos do art. 932, VIII, do CPC, incumbe ao relator "exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal". Por sua vez, o art. 132 do atual Regimento Interno deste Tribunal de Justiça, passou a conter o inciso XV, segundo o qual, compete ao relator, por decisão monocrática:

XV - negar provimento a recurso nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Código de Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça;

Sendo assim, tem-se a possibilidade de julgamento do presente recurso por decisão unipessoal.

Importa destacar, ainda, que o decisum não está sujeito a reexame necessário, consoante apontado pela Togada a quo (pág. 222). À vista disso, segundo o princípio do tantum devolutum quantum apellatum, a matéria devolvida à instância ad quem é tão somente aquela impugnada no recurso.

Pois bem. Insurge-se o Ente Municipal contra sentença que o condenou, solidariamente com o Estado de Santa Catarina, ao fornecimento do medicamento Flavonid 450/50mg (Diosmina + Hisperidina) à paciente, acometida de tromboflebite em safena interna - trombose recente (CID 10: I80).

O recorrente suscita, preliminarmente, cerceamento de defesa ante a não realização de prova pericial, defendendo a necessidade de produção de perícia técnica a fim de comprovar a imprescindibilidade da medicação e eventual possibilidade de substituição do remédio por alternativas terapêuticas fornecidas pelo SUS, alegando não ser suficiente a prescrição do tratamento pelo Médico que assiste a paciente.

Sem razão.

Cediço que é viável o julgamento imediato do mérito se o feito, revelando desnecessidade da dilação probatória, já contiver elementos suficientes à formação do convencimento pleno e inabalável do magistrado.

Deveras, "cabe ao Juiz, na condição de presidente do processo e destinatário da prova, decidir sobre a necessidade ou não de realização de determinada prova, não implicando cerceamento de defesa, o julgamento antecipado com base nas existentes no processo, se a prova pericial que a parte pretendia produzir era desnecessária e inócua ao deslinde da causa [...]" (AC n. 0003862-05.2012.8.24.0037, de Joaçaba, rel. Des. Jaime Ramos, j. em 20.11.2018).

Segundo decisão proferida por este Tribunal, no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR n. 0302355-11.2014.8.24.0054/50000, o direito à obtenção de fármacos e procedimentos não oficializados para o tratamento elementar de vida e da saúde pressupõe a comprovação da sua necessidade, da ausência de política pública ou de sua ineficácia, bem como da hipossuficiência do enfermo(a). Confira-se, a propósito:

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDA REPETITIVA - IRDR. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTOS E TERAPIAS PELO PODER PÚBLICO. DISTINÇÃO ENTRE FÁRMACOS PADRONIZADOS DOS NÃO COMPONENTES DAS LISTAGENS OFICIAIS DO SUS. NECESSÁRIA REPERCUSSÃO NOS REQUISITOS IMPRESCINDÍVEIS AO NASCIMENTO DA OBRIGAÇÃO POSITIVA DO ESTADO.

Teses Jurídicas firmadas:

1.1 Para a concessão judicial de remédio ou tratamento constante do rol do SUS, devem ser conjugados os seguintes requisitos: (1) a necessidade do fármaco perseguido e adequação à enfermidade apresentada, atestada por médico; (2) a demonstração, por qualquer modo, de impossibilidade ou empecilho à obtenção pela via administrativa (Tema 350 do STF).

1.2 Para a concessão judicial de fármaco ou procedimento não padronizado pelo SUS, são requisitos imprescindíveis: (1) a efetiva demonstração de hipossuficiência financeira; (2) ausência de política pública destinada à enfermidade em questão ou sua ineficiência, somada à prova da necessidade do fármaco buscado por todos os meios, inclusive mediante perícia médica; (3) nas demandas voltadas aos cuidados elementares à saúde e à vida, ligando-se à noção de dignidade humana (mínimo existencial), dispensam-se outras digressões; (4) nas demandas claramente voltadas à concretização do máximo desejável, faz-se necessária...

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