Decisão Monocrática Nº 0900501-39.2018.8.24.0038 do Segunda Vice-Presidência, 02-12-2019

Número do processo0900501-39.2018.8.24.0038
Data02 Dezembro 2019
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoSegunda Vice-Presidência
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática



ESTADO DE SANTA CATARINA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Recurso Especial n. 0900501-39.2018.8.24.0038/50001, de Joinville

Recorrente : Nelson Pedro Wanzuita
Advogado : Sandro Paulo Tonial (OAB: 13017/SC)
Recorrido : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Proc.
de Just. : Abel Antunes de Mello (Procurador de Justiça)

DECISÃO MONOCRÁTICA

Nelson Pedro Wanzuita interpôs recurso especial, com fulcro no art. 105, III, "a", da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, contra acórdão prolatado pela Quinta Câmara Criminal que, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso de apelação por ele interposto "para, tão somente, tornar definitiva a pena do apelante em 01 (um) ano, 01 (um) mês e 01 (um) dia de detenção, além do pagamento de 18 (dezoito) dias-multa fixados em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos" (fl. 224 dos autos principais), mantendo, no mais, a sentença que o condenou por infração ao disposto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, na forma do art. 71 do Código Penal.

Em suas razões, sustentou ter o acórdão contrariado o teor dos arts. 23, I, e 24 do Código Penal e do art. 386, VI, do Código de Processo Penal, asseverando ser hipótese de estado de necessidade ou inexigibilidade de conduta diversa, já que teria deixado de recolher o tributo em razão de dificuldades financeiras. Aduziu violação ao art. 71 do Código Penal, defendendo não se tratar de hipótese de continuidade delitiva, mas de crime habitual impróprio, motivo pelo qual requereu a exclusão da causa geral de aumento ou, sucessivamente, a redução de sua fração. Suscitou ofensa ao art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, postulando a fixação de regime aberto, e não do semiaberto. Alegou afronta ao art. 44, II, § 3º, do Código Penal, requerendo a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Com as contrarrazões (fls. 17-27 deste incidente), vieram os autos conclusos à 2ª Vice-Presidência.

É o relatório.

1. Do estado de necessidade e da inexigibilidade de conduta diversa (suposta ofensa aos arts. 23, I, e 24 do CP e ao art. 386, VI, do CPP):

Quanto às excludentes de ilicitude em questão, a pretensão recursal deduz controvérsia a respeito das premissas fáticas fixadas no acórdão recorrido, pressupondo reexame de provas, e não sua mera revaloração, o que é vedado em sede de recurso especial, em conformidade com a Súmula 07 do Superior Tribunal de Justiça: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial".

Com efeito, não é possível cotejar as conclusões exaradas no acórdão com aquelas defendidas no recurso a respeito do estado de necessidade e da inexigibilidade de conduta diversa sem revisar as provas atinentes à situação financeira da empresa por ele gerida.

É que as excludentes de ilicitude em alusão foram afastadas com base nos elementos probatórios a respeito da situação financeira da empresa contribuinte, conforme se depreende da conclusão exarada no acórdão recorrido:

"Mesmo que o acusado tenha juntado aos autos documentação limitando-se em demonstrar instabilidade financeira da empresa (fls. 86-115), antevejo a ausência de qualquer elemento de prova na utilização dos valores sonegados no intuito de resguardar interesses sociais decorrentes de sua atividade, a corroborar a aventada dificuldade à época dos fatos.

Insta esclarecer que, ao alegar falta de recursos financeiros que impossibilitaram o acusado em honrar seus débitos fiscais com o Fisco Estadual, ocorreu uma inversão do ônus da prova, transferindo ao réu o encargo de demonstrar meios probatórios à pretendida absolvição nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal, mas não o fez.

Entrementes, o acusado transparece da reiteração de condutas, isso porque já respondeu a outras ações criminais pelo mesmo delito, conforme certidão de antecedentes criminais às fls. 35-38, o que leva a crer na utilização indevida de tributos fiscais em benefício diverso inerente à sua atividade empresarial, o que não se coaduna, pela perda do caráter de exceção, com a causa de exclusão de ilicitude." (fls. 229-230 dos autos principais)

Como se vê, concluiu-se no acórdão que o acusado deixou de recolher o ICMS sem demonstrar situação que justificasse a impossibilidade de efetuar o pagamento.

Assim, considerando que para rever essa posição demandar-se-ia o reexame dos elementos probatórios acostados aos autos, a insurgência transborda as funções do Superior Tribunal de Justiça de primar pela correta interpretação do direito federal infraconstitucional e uniformizar a jurisprudência pátria.

A respeito do assunto, oportuno mencionar os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça, mutatis mutandis:

"AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 2º, II, DA LEI N. 8.137/90. APROPRIAÇÃO INDÉBITA TRIBUTÁRIA. 1) TIPICIDADE DA CONDUTA. 2) ABSOLVIÇÃO. ÓBICE DO REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO, VEDADO CONFORME SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. 3) PRISÃO POR DÍVIDA. VIOLAÇÃO AO ART. 7º DA CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS - CADH. INOCORRÊNCIA. 4) VIOLAÇÃO AO ART. 1º DA LEI N. 6.830/80. INOCORRÊNCIA. 5) VIOLAÇÃO DA LEI N. 6.830/80. ARTIGO DA LEI VIOLADO NÃO APONTADO. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA N. 284 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF. 6) AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Conforme se depreende de julgado da 3ª Seção desta Corte (HC 399.109/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 31/8/2018), a falta de recolhimento aos cofres públicos de ICMS discriminado em nota fiscal de venda de produtos a consumidor final configura o delito do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, sendo certo que a declaração do ICMS devido ao Fisco não afasta a tipicidade.

2. O Tribunal de origem manteve a sentença condenatória em razão dos fatos apurados que demonstraram a tipicidade da conduta e não configuraram inexigibilidade de conduta diversa. O afastamento de tal conclusão demandaria o reexame fático-probatório, providência vedada pelo enunciado n. 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça - STJ.

3. Eventual prisão pelo cometimento do delito do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, não se confunde com prisão por dívida.

4. O processo penal decorrente de cometimento do delito do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, não se confunde com execução judicial para cobrança de dívida ativa.

5. A falta de apontamento do dispositivo legal violado configura deficiência da fundamentação, conforme Súmula n. 284/STF. Precedentes.

6. Agravo regimental desprovido." (STJ, AgRg nos EDcl no REsp 1.671.998/SC, rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. em 21/02/2019) [grifou-se]

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTARIA. NÃO RECOLHIMENTO DE ICMS. FATO QUE SE AMOLDA AO CRIME PREVISTO NO ARTIGO 2º, INCISO II, DA LEI 8.137/1990. AUSÊNCIA DE DOLO. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N.º 7 DA SÚMULA DO STJ.

1. A colenda 3ª Seção desta Corte Superior de Justiça, no julgamento do HC 399.109/SC, pacificou o entendimento de que em qualquer hipótese de não recolhimento de ICMS, comprovado o dolo, configura-se o crime tipificado no artigo 2º, inciso II, da Lei 8.137/1990. Ressalva do ponto de vista do Relator.

2. O Tribunal a quo concluiu pela configuração da conduta imputada ao denunciado, salientando que o mesmo agiu com dolo ao não repassar os valores recolhidos de terceiros à título de ICMS, e que a existência de dificuldades financeiras não justifica o não reconhecimento do tributo devido.

3. O apelo especial não se presta a desconstituir o julgado e operar a absolvição pretendida, mediante reconhecimento da ausência de dolo, dada a necessidade de revolvimento do material probante, procedimento de análise exclusiva das instâncias ordinárias e vedado ao Superior Tribunal de Justiça, a teor do óbice constante do Enunciado n. 7 da Súmula desta Corte.

OMISSÃO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO JULGADO. REDISCUSSÃO DO ENTENDIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Nos limites estabelecidos pelo artigo 619 do Código de Processo Penal, os embargos de declaração destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou ambiguidade eventualmente existentes no julgado combatido.

2. Ausente qualquer omissão quanto ao exame das provas dos autos que fundamentaram a condenação do agente pelo crime contra a ordem tributária, fica afastada a hipótese de ofensa ao art. 619 do Código de Processo Penal.

DENÚNCIA. INÉPCIA. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. DISCUSSÃO PREJUDICADA.

1. Quanto à alegação de inépcia da denúncia, é imperioso consignar que se firmou nesta Corte Superior de Justiça o entendimento no sentido de que a discussão sobre o art. 41 do CPP perde força diante de um édito repressivo, no qual houve exaustivo juízo de mérito acerca dos fatos delituosos denunciados e comprovados ao longo de toda instrução processual.

2. Agravo desprovido." (STJ, AgRg no REsp 1.612.200/SC, rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, j. em 04/12/2018) [grifou-se]

Portanto, o recurso não merece ser admitido com base nesse fundamento.

2. Da continuidade delitiva (aventada violação ao art. 71 do CP):

O recorrente aduziu violação ao art. 71 do Código Penal, defendendo não se tratar de hipótese de continuidade delitiva, mas de crime habitual impróprio, motivo pelo qual requereu a exclusão da causa geral de aumento ou, sucessivamente, a redução de sua fração.

Quanto à tese de que as condutas configuram crime habitual impróprio em vez de continuidade delitiva, não se verifica na decisão recorrida qualquer juízo decisório sobre a essa questão.

Com efeito, o acórdão abordou tão somente a pluralidade de condutas a fim de concluir pela caracterização da continuidade delitiva, sem, entretanto, analisar a tese defensiva no sentido de que a situação configuraria crime habitual...

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