Decisão monocrática nº 1007655-15.2017.8.11.0006 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, 30-06-2021

Data de Julgamento30 Junho 2021
Case OutcomeAnulação de sentença/acórdão
Classe processualCível - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - TURMA RECURSAL CÍVEL
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público e Coletivo
Número do processo1007655-15.2017.8.11.0006
AssuntoÍndice de 11,98%

PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO

PJE - RECURSO INOMINADO (460) 1007655-15.2017.8.11.0006

Vistos etc.

Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por ABILIO MALDONADO QUINA, contra sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Cáceres, que nos autos da Ação de Cobrança nº 1007655-15.2018.8.11.0006, extinguiu o feito por ausência de interesse de agir, com fulcro no art. 485, VI, do CPC.

Alega o Apelante que a sentença não merece prosperar pois “a exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação, como é o caso dos autos, tendo em vista que o Recorrido apresenta objeção frontal ao pedido, sob o argumento de ter adotado procedimento escorreito de correção de moeda, ou seja, existindo [ou não] o prévio requerimento administrativo.”

Sustenta ainda, que a propositura da presente ação não reclama o prévio e/ou exaurimento da via administrativa, já que busca apenas a recomposição salarial.

Assim, requer a declaração de nulidade da sentença, determinando o retorno dos autos ao juízo originário para a reabertura da instrução processual e o regular prosseguimento do feito.

As contrarrazões foram apresentadas sede em que a parte adversa pugna pelo desprovimento do recurso (id.7751342).

É o relatório.

Decido.

O recurso visa à cassação da sentença que extinguiu o feito, por ausência de interesse de agir.

Para melhor análise do feito, mister se faz um retrocesso dos fatos.

Consta dos autos, que o Apelante ingressou com ação de cobrança buscando perceber diferenças salariais, relativas à errônea conversão da moeda (URV), oportunidade, que requereu a concessão da gratuidade da justiça.

Ao despachar a inicial o Juízo “a quo”, indeferiu o pleito de justiça gratuita e determinou a “juntada do requerimento administrativo da questão posta em Juízo e/ou indeferimento da pretensão pela Administração Pública, tudo no prazo de 15 (quinze) dias úteis, sob pena de extinção do feito, forte no art. 320 e 321 CPC/2015.” (id. 7751329).

Posteriormente, por meio de petição o autor da ação postulou pela devolução do prazo, pois não tem acesso aos documentos, tampouco dinheiro para pagar às custas processuais. Na oportunidade, requereu ainda, a dispensa do prévio requerimento administrativo, ante a desnecessidade para ajuizar ação de cobrança.(id.7751322).

Ato seguinte aportou a sentença extinguindo o feito, sob os seguintes fundamentos:

[...]Pertinente à celeuma processual, este Juízo filia-se ao entendimento da imprescindibilidade do requerimento administrativo, a fim de constatar a pretensão resistida, condição essencial da ação. Aos cidadãos é assegurado o acesso ao Poder Judiciário, nos termos do art. 5.º, XXXV CR/88. Entretanto, o conhecimento da respectiva ação depende do preenchimento de alguns requisitos de natureza processual, entre eles o interesse processual configurado através da pretensão resistida.Na espécie, vê-se claramente que a parte autora não se reportou à esfera administrativa, vindo bater diretamente às portas do Poder Judiciário.

Ora, à evidência, ainda que seu direito tenha lastro, não se infere pretensão resistida da Administração Pública, fato verificado pela ausência de pedido ou indeferimento administrativo, porque a autora optou diretamente pela via judicial, o que se demonstra inaceitável pelas regras processuais civis vigentes.

Acerca do tema, trago voto elucidativo do Ministro Herman Benjamin no REsp que trata da necessidade de requerimento administrativo para ajuizamento de processos de benefícios beneficiários, aplicável, “mutatis mutandi”, ao caso:

“O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Os autos foram recebidos neste gabinete em 18.4.2012.Considero preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão por que conheço do Recurso Especial.Aberta a instância, passo ao exame do mérito.

Desde já destaco que o Supremo Tribunal Federal admitiu o Recurso Extraordinário 631.240/MG, sob o regime da Repercussão Geral, com controvérsia relativa ao presente caso: necessidade de prévio requerimento administrativo perante o INSS para os segurados exercerem o direito de ação no Judiciário. Inicio por tal consideração para estabelecer, com o devido respeito a entendimentos em contrário e ciente da pendência de decisão na Corte Suprema, que a resolução da problemática jurídica em debate não se resolve no âmbito constitucional.O principal argumento para levar a matéria ao plano constitucional é a previsão do art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que transcrevo:

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Em uma análise perfunctória, concluir-se-ia facilmente que o direito fundamental de ação, garantido pelo preceito acima transcrito, é o centro da discussão aqui travada. Afinal, impor o requerimento administrativo como condição de acesso à Justiça seria a fixação da quaestio no exame do cumprimento do preceito constitucional em comento.Tenho a convicção, todavia, de que a resolução da matéria gravita no âmbito infraconstitucional, o que passo a fundamentar.Primeiro cabe ressaltar que a verificação das condições da ação (aí incluído o interesse de agir) não caracteriza ofensa ao próprio direito de ação, afinal o segurado teve acesso à Justiça materializado pelo presente processo. Nesse sentido convém transcrever doutrina de Luiz Guilherme Marinoni (Curso de Processo Civil, V. 1, 4ª edição, pág. 219), que, ao comentar sobre o preceito constitucional aqui debatido, assim estabelece:“Entretanto, tal apreciação, segundo o art. 267, VI, do CPC, requer a presença de determinados requisitos, chamados de condições da ação, exigência que não viola a garantia constitucional de ação nem é com ela incompatível. A falta de um desses requisitos obstaculiza a apreciação da afirmação de lesão ou ameaça, mas não exclui o direito de pedir essa apreciação. A sentença que reconhece a ausência de uma das condições da ação apenas impede que ação continue a se desenvolver, mas não nega que a ação foi exercida”.

Cândido Rangel Dinamarco (Instituições de Direito Processual Civil, volume I, 6ª edição) comunga do mesmo entendimento, acrescentando importante conclusão no sentido de as condições da ação serem limitadoras do direito de ação:“Razões de ordem ética ou econômica legitimam certas limitações impostas pela lei ao direito ao provimento de mérito. Quando se diz que todos tem direito ao pronunciamento dos juízes sobre suas pretensões, esse todos não significa que qualquer pessoa o tenha, em qualquer circunstância (Liebman). A tendência à universalização da tutela jurisdicional é refreada pela legítima conveniência de impedir a realização de processos sem a mínima condição de produzir algum resultado útil ou predestinados a resultados que contrariem regras fundamentais da Constituição ou da própria lei. Daí os requisitos do interesse de agir, (...); da legitimatio ad causam , (....); e da possibilidade jurídica da demanda (....). Presente todas essas condições da ação, diz-se que o sujeito tem direito de ação – e consequentemente só o terão aqueles que se encontrarem amparados por elas. Carece de ação quem não esteja amparado por esses requisitos, ainda que apenas um deles lhe falte.”Tenho que efetivamente o direito de ação garantido pelo art. 5º, XXXV, da CF tem como limitador as condições da ação. Essa premissa induz à ilação de que a presente matéria não se resolve no âmbito constitucional, mas na análise da legislação processual infraconstitucional, especificamente na configuração do interesse de agir do segurado.

Nessa linha já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. LEI 6.024/74. LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. RESPONSABILIDADE. BANCO CENTRAL. PREJUÍZOS AOS INVESTIDORES. CARÊNCIA DA AÇÃO. MATÉRIA PROCESSUAL. OFENSA REFLEXA. 1. O Tribunal a quo limitou-se a reconhecer a carência da ação dos agravantes, por falta de interesse de agir. Tal questão, ante seu manifesto caráter processual e infraconstitucional, é insuscetível de exame em sede de recurso extraordinário, a título de ofensa ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal que, se existente, seria meramente reflexa ou indireta. 2. O mérito da demanda sequer foi examinado. Inviável, portanto, a discussão em torno do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, para se definir a responsabilidade do Banco Central pelos prejuízos causados aos investidores. 3. Agravo regimental improvido (RE 234371 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, DJ 13-02-2004 PP-00016 EMENTA VOL-02139-02 PP-00303).

EMENTA: AÇÃO DE NUNCIAÇÃO DE OBRA NOVA. PRETENSAO DO PROPRIETARIO DO PREDIO VIZINHO AO EMBARGO DE OBRA DE TERCEIRO, POR SUPOSTA VIOLAÇÃO DE POSTURAS MUNICIPAIS. CARÊNCIA DA...

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