Decisão monocrática nº 2014.04463394-50 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, TRIBUNAL PLENO, 10-01-2014

Data de Julgamento10 Janeiro 2014
ÓrgãoTRIBUNAL PLENO
Número do processo2014.04463394-50
Classe processualCÍVEL - Petição Infância e Juventude Cível

PEDIDO DE FIXAÇÃO DE COMPETÊNCIA – n.º2013.3.027823-0

REQUERENTES: JAILSON DE ALMEIDA MACEDO; ADELSON MORAES NETO; ADEMAR PEREIRA VILA; BENEDITO LACERDA GUEDES e OUTROS;

ADVOGADO: FLAVIO CESAR CANCELA FERREIRA - DEF. PÚBLICO.

INTERESSADO: FUNDAÇÃO J. SEVERINO.

ADVOGADO: ROLAND RAAD MASSOUD (OAB/PA N.º5.192).

REQUERIDO: JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BREVES.


DECISÃO

Cuida-se de pedido de FIXAÇÃO DE COMPETÊNCIA com fundamento no parágrafo único do art. 1º da Resolução n.º018/2005-GP, deste Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, formulado por JAILSON DE ALMEIDA MACEDO, ADELSON MORAES NETO, ADEMAR PEREIRA VILA e OUTROS, representados pela Defensoria Pública do Estado do Pará (Defensoria Agrária da 1ª Região do Estado), em virtude de interesse público evidenciado pela natureza agrária da lide, requerendo, liminarmente, atribuição de efeito suspensivo à medida liminar de reintegração de posse proferida pelo Juízo da Comarca de Breves, em razão da incompetência absoluta e por força do poder geral de cautela.

Conforme despacho exarado à fl.166, esta Presidência, em juízo de cognição sumária e diante da presença de fundado receio de que o cumprimento da decisão reintegratória cause lesão grave ou de difícil reparação às partes, deferiu o pedido de atribuição de efeito suspensivo, até ulterior deliberação.

Determinou ainda, a expedição de ofício ao Juízo de origem requisitando informações, bem como, ao Comando de Missões Especiais da Polícia Militar do Estado do Pará.

Às fls. 172/173, a parte interessada, FUNDAÇÃO J. SEVERINO, apresentou petição requerendo a juntada aos autos de instrumento de substabelecimento de poderes, assim como prazo para manifestação.

Em resposta ao Ofício n.º1.176/2013-SJ-TJE/Pa, o Comandante Geral da PMPa encaminhou Ofício n.º329/13-Gabinete do Comando, anexando documentos referentes à Ação de Reintegração de Posse (Proc. n.º0000057-70.2013.814.0010), inclusive relatório de inteligência às fls.179/192.

O MM. Juízo a quo, às fls.217/220, encaminhou Ofício n.º314/2013-GJ, prestando informações acerca da ação possessória em trâmite na 1ª Vara da Comarca de Breves.

Às fls. 221/255, a Fundação J. Severino apresentou manifestação pugnando pelo indeferimento do pedido.

É o sucinto relatório.

DECIDO.

A questão debatida nestes autos refere-se à possibilidade de deslocamento do feito à Vara Agrária, que detém competência absoluta para dirimir conflitos coletivos sobre posse de terra rural, conforme previsão instituída pela Constituição Federal, para que os Tribunais Estaduais proponham a criação de varas especializadas com competência exclusiva para as questões agrárias, ex vi art. 126 da CF/88:


Art. 126. Para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº. 45, de 2004)”.


A Constituição Estadual, em observância ao referido comando constitucional, para fins de parametricidade, dispôs em seu art. 167, §1º, “b”, o seguinte:

Art. 167. Para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias.”


Assim, este Tribunal de Justiça do Estado do Pará definiu através da edição da Resolução n.º018/2005-GP, acerca da competência das Varas Agrárias, cujo texto prevê expressamente o pedido de fixação de competência, na forma proposta, cujo fundamento se encontra disposto no parágrafo único do art. 1º da referida resolução, assim redigido:


Art. 1º - As questões agrárias sujeitas à competência das Varas Agrárias são as ações que envolvem litígios coletivos pela posse e propriedade da terra em área rural.

Parágrafo único. Em outras ações em área rural, inclusive nas individuais, poderá ser estabelecida a competência das Varas Agrárias, desde que haja interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte, a ser definido por ato do Presidente do Tribunal, em cada caso concreto e em qualquer fase do processo, de ofício, por requerimento das partes, do Juiz, do Ministério Público, ou de órgão fundiário da União ou do Estado dirigido diretamente à Presidência do Tribunal, processado sem efeito suspensivo.”


Denota-se, pela exegese do dispositivo citado, que a competência das Varas Agrárias poderá ser estabelecida ainda, por ato do Presidente do Tribunal, em outras ações em área rural, inclusive nas ações de caráter individual, em cada caso concreto e em qualquer fase do processo, desde que haja interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte.

Analisando detidamente os autos, após as manifestações colhidas do Juízo da 1ª Vara da Comarca de Breves (fls.217/220), bem como do Comando da Polícia Militar (fls.174/216), vislumbra-se que as condições iniciais que motivaram o ajuizamento da Ação de Reintegração de Posse (proc. n.º0000057-70.2013.814.0010) se modificaram desde o início do curso processual. Explico:

Conforme consta da decisão proferida pelo Juízo de origem, que firmou a sua competência (fls. 25/27 dos autos), observa-se o seguinte fundamento:

A competência das varas agrárias do Estado do Pará consta do artigo 3º da Lei Complementar Estadual n. 14/1993 e, data maxima venia, não é adequada ao caso dos autos.

Em verdade, a questão dos autos é simples, especialmente por ser notória: duas ou três pessoas arregimentaram parcela da população de recursos modestos e simplesmente invadiu e loteou (de forma francamente irregular e avessa à qualquer procedimento legal) o imóvel, sendo que os organizadores de tal ato, até mesmo já empreenderam fuga da cidade, com o dinheiro pelo qual arrecadaram pelos serviços de medição e loteamento, sendo que o ocorrido muito mais se assemelhou a prática estelionatária. Não se trata de conflito com cunho de reforma, com efetiva discussão acerca de dúvida quanto à propriedade ou mesmo conflito oriundo de a propriedade não estar cumprindo sua função social. O que houve foi invasão consciente, do imóvel da parte autora. Neste sentido, não se enquadra em nenhuma das hipóteses de competência destinada às varas agrárias do Estado do Pará.

Firmo a competência.”


Segundo afirmado pelo Juízo a quo, duas ou três pessoas teriam invadido o imóvel para fins de loteamento, cuja parcela loteada teria sido oferecida à população de forma flagrantemente ilegal.

Ocorre que, embora não esteja devidamente limitado o período da ocorrência do fato que ensejou o ajuizamento da ação possessória contra os três invasores, em janeiro de 2013, denota-se uma modificação do quadro fático desde o início do curso processual, visto que estes requeridos, conforme afirma o Magistrado na decisão referida, até mesmo já empreenderam fuga da cidade, de modo que, a situação que estava configurada, em fevereiro de 2013, era de uma suposta invasão de cerca de 2.000 pessoas, conforme se observa do relato da petição inicial deste pedido de fixação de competência, corroborado pelo pronunciamento da Polícia Militar do Estado, à fl.202, que afirmou haver, em 16 de fevereiro de 2013, a quantidade aproximada 2.200 integrantes do movimento, sendo 1.200, na margem esquerda e 1.000 na margem direita.

Tal informação é corroborada pelo levantamento feito pela Defensoria Pública da 1ª Região Agrária no termo de vistoria em área de conflito juntado às fls.55/57, valendo citar a sua conclusão:


CONCLUSÃO: com a realização da vistoria que originou o presente termo, do qual assino abaixo, verifiquei, com plena certeza, que trata-se de típico conflito agrário coletivo sobre propriedade e posse de terras rurais. A destinação que as referidas terras tiveram no ano de 1999 ou 2000 fora tipicamente rural, pois consistiu no cultivo de açaí, do qual persistem, sem qualquer manutenção, cerca de 3 hectares. (...) A grande maioria dos ocupantes, mormente os associados da AMOESBRA, dão às terras ocupadas destinação agrária constituída pela criação de aves de pequeno porte, assim como plantação e cultivo, em fase inicial, de diversas culturas, a exemplo: coco, maniva, mandioca, arroz, cupuaçu, limão, caju, gergelim, maxixe, quiabo, acerola e laranja.”


Tal situação fática não pode ser ignorada pelo Poder Judiciário, de forma que o recebimento e a concessão de liminar, inaudita altera pars, ou sem a realização de audiência de justificação prévia, não deve ensejar a prorrogação da competência, mormente quando as partes adversas, no primeiro pronunciamento nos autos, arguiram a incompetência do Juízo de origem em razão da matéria.

Neste sentido, há que se ressaltar que o ajuizamento inicial em face de três invasores não encerra restritivamente o polo passivo da demanda possessória, visto que a sua indicação somente é exigida quando haja o conhecimento acerca das pessoas invasoras, o que não ocorreu em relação ao universo de famílias que lá estavam, conforme atestado da Polícia Militar do Estado do Pará (fls.174/216) e da Defensoria Pública da 1ª Região Agrária (fls.55/57), de tal maneira que a citação por edital determinada pelo Juízo de origem apenas reforça tal ideia.

Outrossim, importante destacar que este Egrégio Tribunal de Justiça, tem se pronunciado acerca da competência das Varas Agrárias para conflitos coletivos em área rural, com característica de transcendência de direitos, consoante os termos dos seguintes julgados:


EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE PRESENÇA DOS REQUISITOS CARACTERIZADORES DA COMPETÊNCIA DAS VARAS ESPECIALIZADAS AGRÁRIAS CONFLITO COLETIVO E IMÓVEL RURAL OBJETO DA LIDE - COMPETÊNCIA PARA JULGAR E PROCESSAR AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE VARA AGRÁRIA DA COMARCA DE REDENÇÃO LEI...

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