Decisão monocrática nº 2015.04717837-62 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 5ª CAMARA CIVEL ISOLADA, 14-12-2015

Data de Julgamento14 Dezembro 2015
Número do processo2015.04717837-62
Data de publicação14 Dezembro 2015
Acordao NumberNão Informado
Classe processualCÍVEL - Apelação Cível
Órgão5ª CAMARA CIVEL ISOLADA

PROCESSO N. 2012.3.019404-9.

SECRETARIA DA 5ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA.

COMARCA DA CAPITAL.

APELAÇÃO CIVEL E REEXAME NECESSÁRIO.

APELANTE: ESTADO DO PARÁ.

PROCURADOR DO ESTADO: JOSÉ HENRIQUE MOUTA ARAÚJO.

APELADA: VALDIR BARROS DA COSTA.

ADVOGADO: PEDRO ROCHA JUNIOR.

RELATORA: DESEMBARGADORA DIRACY NUNES ALVES.



DECISÃO MONOCRÁTICA



Trata-se de Apelação Cível interposta pelo ESTADO DO PARÁ em face da Sentença (fls. 137/148) proferida pelo Juízo da 3ª Vara de Fazenda de Belém, que julgou parcialmente procedente para determinar ao recorrente a pagar o saldo de salário de dezesseis dias, férias proporcionais de 2008/2009 acrescidas de um terço e 13º salário proporcional referente.

Em sua peça recursal, fls. 149/162,a Fazenda argumenta, em breve resumo, que merece reforma a sentença vergastada porque o contrato celebrado entre as partes é nulo de pleno direito, já que o apelado se trata de servidor contratado sem concurso público, por consequências todas as parcelas deferidas não são devidas.

Contrarrazões às fls. 166/169, pugnando pela manutenção da decisão vergastada.

Após a devida distribuição coube-me a relatoria do feito (fl. 173), oportunidade que foi ordenada a sua remessa ao douto parquet (fl. 193), o qual deixou de emitir parecer por entender ausente interesse público na demanda (fls. 195/196).

Em decisão de fl. 198/199 foi determinado o sobrestamento do feito, tendo retornado à minha relatoria (fl. 201) e remetido novamente ao parquet (fl. 202), o qual novamente alegou não possuir interesse público na demanda (fl. 204).

É O RELATÓRIO.

VOTO.

Conheço do recurso porque satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

Sem preliminares, passo a analisar o mérito da demanda que versa apenas sobre a existência ou não do direito de servidor público temporário ao pagamento de 13º salário, férias e saldo de salário, sob o argumento da Fazenda de que nada é devido em função da nulidade do contrato havido entre as partes.

Pois bem, a questão merece análise com bastante cuidado.

A Administração possui discricionariedade para efetuar contratação temporária nos termos do art. 37, IX, da CF/88, vinculando-se o poder público à legalidade, necessidade e conveniência da contratação especial, como ensina Alexandre de Moraes1:

A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

(...)

A primeira exceção constitucional exige que a lei determine expressamente quais os cargos de confiança que poderão ser providos por pessoas estranhas ao funcionalismo público e sem a necessidade do concurso público.

(...)

Outra exceção prevista constitucionalmente, permitindo-se a contratação temporária sem concurso público, encontra-se no art. 37, IX, da Constituição Federal. O legislador constituinte manteve disposição relativa à contratação para serviço temporário e de excepcional interesse público, somente nas hipóteses previstas em lei.

Dessa forma, três são os requisitos obrigatórios para a utilização dessa exceção, muito perigosa, como diz Pinto Ferreira, por tratar-se de uma válvula de escape para fugir à obrigatoriedade dos concursos públicos, sob pena de flagrante inconstitucionalidade:

excepcional interesse público;

temporariedade da contratação;

hipóteses expressamente previstas em lei.

A lei mencionada no inciso IX do art. 37 da Constituição é a lei editada pela entidade contratadora, ou seja, lei federal, estadual, distrital ou municipal, conforme a respectiva competência legislativa constitucional."

É fato incontroverso que a contratação firmada entre o apelado e a municipalidade teve aparência temporária e emergencial, visando a atender a situação excepcional vivenciada pela Administração Pública, contração esta que apenas produz os direitos previstos na legislação específica, ou seja, no regime estatutário municipal.

A doutrina classifica os temporários como servidores públicos, conforme nos ensina José dos Santos Carvalho Filho2:

(...) na verdade, se configuram como um grupamento excepcional dentro da categoria geral dos servidores públicos. A previsão dessa categoria especial de servidores está contemplada no art. 37, IX, da CF, que admite a sua contratação por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público. A própria leitura do texto constitucional demonstra o caráter de excepcionalidade de tais agentes. Entretanto, admitido o seu recrutamento na forma da lei, serão eles considerados como integrantes da categoria geral dos servidores públicos”.

Desta forma, apesar do Apelante não ter sido admitido pela administração através de prévio concurso público na época das parcelas que agora requer, não pode deixar de considerar que mesmo a título precário estava regido por vínculo administrativo, não sendo aplicável o regramento celetista ao caso. Neste sentido já julgou o Excelso Supremo Tribunal Federal em caso que fixou o entendimento de nosso Judiciário acerca da matéria:

INCONSTITUCIONALIDADE. Ação Direita. Competência da Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas da relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, I, CF, introduzido pela Emenda Constitucional 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para afastar outra interpretação. O disposto no art. 114 da Constituição da República não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado pelo regime jurídico-estatutário (STF. ADI 3395-6, Rel. Min. Cezar Peluso. DJ 06.04.2006)”

Reclamação. Contrato temporário. Regime jurídico administrativo. Descumprimento da ADI 3.395. Competência da Justiça Federal. Contrato firmado entre a Anatel e a Interessada tem natureza jurídica temporária e submete-se ao regime jurídico administrativo, nos moldes da Lei 8.745/1993; do inciso XXIII do art. 19 da Lei 9.472/1997 e do Decreto 2.424/1997. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que lhe sejam vinculados por relação jurídico-administrativa. Precedentes. Reclamação julgada procedente.” (Rcl 4.762, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 2-3-2007, Primeira Turma, DJ de 23-3-2007.) No mesmo sentido: Rcl 5.171, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 21-8-2008, Plenário, DJE de 3-10-2008

Entretanto, é evidente que o contrato temporário celebrado entre as partes desvirtuou o mandamento constitucional, pois a manutenção de contrato por longo tempo para suprir atividades não emergenciais, mas sim perenes do Estado (como no caso a a manutenção de serviços públicos), viola o princípio da proporcionalidade e razoabilidade, na medida em que a municipalidade deveria promover concurso público para suprir suas necessidades. Desta forma, ao não se abrigar nas disposições constitucionais o Contrato de Trabalho Temporário é nulo e como tal deve ser considerado.

Por outro lado, é evidente que apesar de nulo o contrato gerou efeitos, principalmente porque os atos da Apelante não podem ser desfeitos e tampouco pode ser devolvida ao apelado a atividade e o trabalho desenvolvido, sendo assim evidente que faz jus ao saldo de salário (pagamento pelos dias efetivamente trabalhados).

Neste sentido há jurisprudência de nossa Egrégia Corte:

APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. NÃO-OBSERVÂCIA DOS REQUISITOS CONSTITUCIONAIS. ILEGALIDADE. PARCELAS REMUNERATÓRIAS CONSTITUCIONALMENTE GARANTIDAS. DEVER DE PAGAMENTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. As verbas pretendidas pelo recorrido estão elencadas tanto no art. 7º, quanto no art. 39, § 3º, da Constituição, isto é, tanto no regime celetista, como no estatutário, seriam devidos os valores correspondentes.

2. O valor correspondente ao salário do apelado nada mais é do que a contraprestação que qualquer empregador deve dispor ao seu empregado pela prestação...

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