Decisão monocrática nº 2015.04831835-90 Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, 08-01-2016

Data de Julgamento08 Janeiro 2016
Número do processo2015.04831835-90
Data de publicação08 Janeiro 2016
Acordao NumberNão Informado
Classe processualCÍVEL - Apelação / Remessa Necessária
Órgão3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA


        1. PROCESSO Nº 0009043-39.2010.814.0301 (20143018889-2)
        2. RECURSO EXTRAORDINÁRIO

RECORRENTE: ESTADO DO PARÁ

RECORRIDO: DARCILEA LAURENTINO DA SILVA MUNHOZ



Trata-se de Recurso Extraordinário, fls. 188/192, interposto pelo ESTADO DO PARÁ, com fundamento no art. 102, inciso III, alíneas “a”, da Constituição Federal, objetivando impugnar o acórdão nº 147.964, assim ementado:


Acórdão nº 147.964 (fls. 171/174):

AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL. FGTS. SERVIDOR PÚBLICO CONTRATADO DE FORMA TEMPORÁRIA. PRELIMINAR DE AUSENCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REJEITADA. OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO QUINQUENTAL. POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DOS DEPÓSITOS DE. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 19-A DA LEI N° 8.036/1990. RECURSO CONHECIDO E DADO PARCIAL PROVIMENTO. - O STJ firmou entendimento pela aplicabilidade do prazo quinquenal previsto no Decreto 20.910?32 nas ações de cobrança de crédito relativo a FGTS contra a Fazenda Pública. - A discussão de mérito cinge-se à possibilidade de condenação ao pagamento dos depósitos de FGTS. - Restou entendida a constitucionalidade do art. 19-A da Lei n° 8.036/1990, com a redação dada pela Medida Provisória (MP) 2.164-41/2001, que prevê o referido pagamento. Logo, devido o pagamento do valor correspondente ao FGTS. - Agravo Interno conhecido e improvido.

(2015.02271141-63, 147.964, Rel. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE, Órgão Julgador 3ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Julgado em 2015-06-25, Publicado em 2015-07-02)



Das questões veiculadas nas razões recursais, emerge como controvérsia central a discussão acerca do direito ao FGTS à pessoa contratada pela Administração Pública sem o devido concurso público quando evidenciada a prorrogação sucessiva do contrato temporário.

O Supremo Tribunal Federal, para essa hipótese, reconheceu o direito ao FGTS tanto no TEMA 191 RG (RE 596.478/RR) como no TEMA 308 RG (RE 705.140/RS), sob a sistemática da repercussão geral.

O RE 596478/RR, a saber, serviu de instrumento para que a questão constitucional (tese jurídica) a respeito do FGTS chegasse ao STF. Do referido recurso extraiu-se o Tema 191 da Repercussão Geral, cuja questão constitucional foi delimitada com base nos fundamentos constitucionais que amparam legalmente a pretensão processual. Inclusive, esses fundamentos constitucionais sobrepõem-se às particularidades do caso concreto, até porque seria impossível o STF decidir para todas as hipóteses do mundo dos fatos.

Eis a ementa do julgamento do paradigma:

Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (RE 596478, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013. Trânsito em julgado em 09/03/2015)



O paradigma, portanto, trouxe como questão de direito controvertida a constitucionalidade do Art. 19-A da Lei 8036/90, acrescido pela MP 2164-41/2001, que assegura o direito do FGTS à pessoa que tenha sido contratada sem concurso público pela Administração Pública. A tese jurídica (a questão constitucional), portanto, foi fixada de forma ampla, sobretudo porque considerou as características da decisão prolatada sob a sistemática da repercussão geral, a saber: efeito vinculante, erga omnes e de transcendência dos interesses das partes.

Como se vê, fez referência à pessoa contratada pela Administração Pública sem concurso público, não delimitando a questão constitucional no regime de contratação, se celetista ou estatutário. Da mesma forma não o fez com relação a quem contratou, se a Administração Direta ou Indireta. Não interessou, também, discutir se havia, ou não, depósito de FGTS em favor do autor da ação, até porque, reconhecido o direito, emerge a obrigatoriedade do depósito, caso não tenha sido feito.

Por força da sistemática da repercussão geral o julgamento transcende os interesses subjetivos das partes. As manifestações dos Ministros, que subsidiaram o entendimento vencedor pelo direito ao FGTS, confirmam o princípio da transcendência, senão vejamos:

  • A relatora, Min. Ellem Gracie, apesar de vencida, esclareceu que o acórdão recorrido decidiu com base na Súmula 363 do TST e que esta súmula teve origem em precedentes jurisprudenciais que defendiam princípios constitucionais que valorizassem a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e os direitos mínimos que colocassem a salvo o trabalhador público da condição similar a de escravo. A relatora registrou, ainda, que referidos princípios inspiraram o Art.19-A, da Lei 8.036/90, que passou a obrigar os depósitos do FGTS, pelos entes públicos, aos investidos em emprego público.



  • O Min. Cesar Peluso afirmou que a nulidade do contrato não acarreta invalidez total de todos os atos, tanto é que os atos praticados pelo trabalhador são aproveitados, isto é, a nulidade não apaga todas as consequências da relação estabelecida.

Disse, ainda, que essa nulidade não tem caráter absoluto a ponto de desconhecer qualquer vantagem ou qualquer direito que, eventualmente, possa ser reconhecido com base noutros princípios constitucionais.

A própria norma constitucional declara a nulidade do ato. A nulidade, portanto, está resguardada. A nulidade, porém, gera efeitos baseados em outros princípios. Afirmação apoiada na teoria geral do Direito. Na teoria das nulidades não há princípios absolutos, de modo que é possível reconhecer que, não obstante sua invalidez teórica, o ato é suscetível de produzir alguns efeitos, dentre os quais o reconhecimento do pagamento de salários e FGTS.



  • O Min. Gilmar Mendes, consignou que a investidura sem concurso público gera contrato nulo, cuja responsabilidade é do Estado de fiscalizar, não podendo a parte mais fraca da relação contratual ser onerada em demasia.

O reconhecimento ao direito do FGTS não é nenhuma heresia porque há outros valores envolvidos como a própria ideia da dignidade da pessoa humana.

Não se pode confundir invalidade com a situação de não existência. A invalidade traz consequências jurídicas.



  • O Min. Dias Toffoli, esclareceu que uma coisa é proibir a contratação sem concurso público; outra coisa é proibir os efeitos residuais de um fato existente e é existente juridicamente, embora inválido, é existente. A norma do art. 19-A explicitou que há efeito residual de um contrato nulo.



  • O Min. Lewandowski disse que o Agente Público é responsável pela contratação sem concurso público e, consequentemente, responde regressivamente, nos termos do art.37 da CF/88. Supõe-se que os contratos tenham sido celebrados com boa-fé com a Administração Pública.



  • O Min. Ayres Brito, por sua vez, reconheceu que as consequências de contrato nulo homenageia princípios constitucionais, e a interpretação sistemática da constituição federal. O empregado é hipossuficiente nos termos da Constituição, tanto é que lista trinta e quatro direitos do trabalhador frente ao empregador.

A Constituição, mesmo reconhecendo que o recrutamento se fez sem a regra do concurso público, estabilizou servidores que contassem mais de cinco anos de serviço à data dela própria- art.19.



Estes destaques revelam, portanto, a consciência jurídica que se construiu no julgamento do RE 596478, garantindo o direito do FGTS à pessoa contratada, sem concurso público, pela Administração Pública (Art.37, IX da CF/88).

Anote-se, por oportuno, que nos julgamentos realizados pela sistemática da repercussão geral há a participação do Amicus Curie, ou seja, todos os Entes da Federação, também, foram intimados para...

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