Decisão Monocrática Nº 4003784-10.2019.8.24.0000 do Quarta Câmara de Direito Público, 08-04-2019

Número do processo4003784-10.2019.8.24.0000
Data08 Abril 2019
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoDecisão Monocrática




Agravo de Instrumento n. 4003784-10.2019.8.24.0000, da Capital

Agravante : Plasson do Brasil Ltda
Advogado : Bruno Pereira Zilli (OAB: 35428/SC)
Agravado : Diretor da Administração Tributária - DIAT da Secretaria de Estado da Fazenda de Santa Catarina
Interessado : Estado de Santa Catarina
Procuradora : Celia Iraci da Cunha (OAB: 22774/SC)

Relator: Desembargador Odson Cardoso Filho

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA

1. Trata-se de agravo de instrumento interposto por Plasson do Brasil Ltda. em face da decisão que, no Mandado de Segurança Preventivo n. 0300480-26.2019.8.24.0023, impetrado pela ora agravante contra o Diretor de Administração Tributária do Estado de Santa Catarina, indeferiu o pedido liminar, deixando de determinar à autoridade coatora que se abstivesse de lançar, inscrever e exigir ICMS, bem como de apreender mercadorias em trânsito, nas operações de transferência, a qualquer tempo, da matriz da impetrante a suas filiais, atuais e futuras, em outros Estados.

Em suas razões recursais, a agravante afirma, em síntese, que no envio de mercadorias entre sua matriz, na cidade de Criciúma, neste Estado, e as filiais localizadas em Lucas do Rio Verde/MT e Rinópolis/SP, não ocorre o fato gerador do ICMS, pois não há circulação jurídica da mercadoria, mas mera circulação fática, com a transferência de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, entendimento que encontra amparo na jurisprudência consolidada deste Sodalício e dos Tribunais Superiores, inclusive em súmula do Superior Tribunal de Justiça e tese firmada pela mesma Corte em julgamento de recurso repetitivo.

Pretende a concessão da antecipação da tutela recursal, para "suspender e afastar a tributação do ICMS nas operações de transferência de mercadorias entre estabelecimentos da Agravante", considerando que a manutenção da decisão agravada "acarretará oneração tributária excessiva desnecessária e, por consequência de eventual inadimplemento, o lançamento e cobrança de multa, juros e correção monetária em execução fiscal, impedindo também a emissão da Certidão Negativa de Débitos Estaduais, essencial ao exercício da atividade econômica da Agravante, e necessária para obtenção de recursos junto às instituições financeiras e participação em licitações públicas".

No mérito, requer a confirmação da tutela antecipada, a fim de que o Estado se abstenha de lançar, inscrever e exigir ICMS, bem como se abstenha de apreender mercadorias em trânsito, nas operações de transferência, a qualquer tempo, de mercadorias entre matriz e filiais atuais e futuras da agravante em outros Estados (fls. 1-13).

É o breve relatório.

Decido.

2. Considerando que o agravo foi interposto em face de decisão interlocutória que indeferiu pedido liminar (art. 7º, § 1º, da Lei n. 12.016/2009 e art. 1.015, I, CPC/2015); que aparentemente foram preenchidos os demais requisitos de admissibilidade e que não se cogita de aplicação do art. 932, III e IV, do CPC/2015, admito o seu processamento.

O art. 1.019, I, do CPC estabelece que o relator "poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão".

Por sua vez, o art. 300, caput, da lei processual civil, dispõe que "a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo".

No mesmo sentido, segundo o art. 7º, III, da Lei n. 12.016/2009, o juiz ordenará a suspensão do ato que ensejou a impetração de mandado de segurança "quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica".

No caso, a agravante pretende a antecipação da tutela recursal, a fim de determinar ao Diretor de Administração Tributária do Estado de Santa Catarina que se abstenha de lançar, inscrever e exigir ICMS sobre as operações de transferência de mercadorias entre a matriz e as filiais da agravante, sob o argumento de que ausente a circulação jurídica dos bens, não ocorre o fato gerador do tributo.

O pedido, adianto, deve ser parcialmente deferido.

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços é assim previsto na Constituição Federal:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

[...]

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

Consoante lição doutrinária, a circulação é a "mudança de titularidade jurídica do bem (não é mera movimentação física, mas circulação jurídica do bem). O bem sai da titularidade de um sujeito e passa à titularidade definitiva de outro" (SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 1256; grifo no original).

Em outros termos:

Apesar de o texto constitucional vigente não mais fazer referência a operações relativas à circulação de mercadorias realizadas por "produtores, industriais e comerciantes", o caráter mercantil do imposto ficou evidenciado pela expressão "operações relativas à circulação de mercadorias", isto é, só são relevantes juridicamente as operações que digam respeito à "circulação de mercadorias", e não qualquer operação que implique, por exemplo, mero deslocamento físico da mercadoria. Circulação de algo objeto de comércio (mercadoria) só pode ser aquela que implica transferência de sua propriedade ou posse. Dizer que uma mercadoria circula quando se desloca de um lugar para outro de um estabelecimento comercial ou industrial do mesmo titular é o mesmo que afirmar que o dinheiro circula quando alguém muda esse dinheiro do bolso esquerdo para o seu bolso direito (HARADA, Kiyoshi. ICMS: doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2017, p. 16).

Nesse sentido, diante do art. 12, I, da Lei Complementar n. 87/1996, segundo o qual ocorre o fato gerador do ICMS "no momento da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular" (mesmo teor do art. 3º, I, do RICMS-SC), a doutrina esclarece que:

O disposto no inciso I deve ser lido com restrição, pois sabemos que a saída da mercadoria de um estabelecimento para outro do mesmo titular não enseja circulação jurídica. Em outras palavras, nesse caso não ocorre o fato gerador do ICMS. Apenas a circulação jurídica, e não a física, implica ocorrência efetiva do fato gerador fazendo nascer a obrigação tributária. Nesse sentido, a Súmula 166 do Superior Tribunal de Justiça (HARADA, Kiyoshi. ICMS: doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2017, p. 147).

O entendimento jurisprudencial não diverge.

Como bem assinalou a agravante, as Cortes Superiores adotam firme posição quanto à não incidência do ICMS na hipótese de mero deslocamento físico de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, ainda que localizados em Estados distintos, uma vez que não há, nessa situação, efetiva circulação jurídica, isto é, não se observa mudança da titularidade das mercadorias.

A esse respeito, a Súmula n. 166 do Superior Tribunal de Justiça orienta que "não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte", compreensão ratificada pela Corte Superior ao julgar, segundo a sistemática do então vigente art. 543-C do CPC/1973, o Recurso Especial n. 1.125.133/SP (Tema n. 259), com relatoria do Ministro Luiz Fux:

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. ICMS. TRANSFERÊNCIA DE MERCADORIA ENTRE ESTABELECIMENTOS DE UMA MESMA EMPRESA. INOCORRÊNCIA DO FATO GERADOR PELA INEXISTÊNCIA DE ATO DE MERCANCIA. SÚMULA 166/STJ. DESLOCAMENTO DE BENS DO ATIVO FIXO. UBI EADEM RATIO, IBI EADEM LEGIS DISPOSITIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.

1. O deslocamento de bens ou mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa, por si, não se subsume à hipótese de incidência do ICMS, porquanto, para a ocorrência do fato imponível é imprescindível a circulação jurídica da mercadoria com a transferência da propriedade. (Precedentes do STF: AI 618947 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 02/03/2010, DJe-055 DIVULG 25-03-2010 PUBLIC 26-03-2010 EMENT VOL-02395-07 PP-01589; AI 693714 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-157 DIVULG 20-08-2009 PUBLIC 21-08-2009 EMENT VOL-02370-13 PP-02783. Precedentes do STJ: AgRg nos EDcl no REsp 1127106/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2010, DJe 17/05/2010; AgRg no Ag 1068651/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/03/2009, DJe 02/04/2009; AgRg no AgRg no Ag 992.603/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 04/03/2009; AgRg no REsp 809.752/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2008, DJe 06/10/2008; REsp 919.363/DF, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/06/2008, DJe 07/08/2008) 2. "Não constitui fato gerador de ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte." (Súmula 166 do STJ).

3. A regra-matriz do ICMS sobre as operações mercantis encontra-se insculpida na Constituição Federal de 1988, in verbis: "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;"

4. A circulação de mercadorias versada no dispositivo constitucional refere-se à...

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