Decisão Monocrática Nº 4016835-88.2019.8.24.0000 do Quinta Câmara de Direito Público, 07-06-2019

Número do processo4016835-88.2019.8.24.0000
Data07 Junho 2019
Tribunal de OrigemOrleans
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoDecisão Monocrática


Agravo de Instrumento n. 4016835-88.2019.8.24.0000, Orleans

Agravante : Hofmann Comércio de Combustiveis Ltda
Advogado : Emerson Baggio (OAB: 19262/SC)
Agravado : Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Promotor : Marcelo Francisco da Silva (Promotor de Justiça)
Interessado : Jacinto Redivo
Interessada : Patrícia Librelato Massuco
Interessado : Librelato Indústria e Comércio de Britas Ltda
Interessado : Baggio Serviços de Terraplanagem Ltda
Interessado : Concretos Comelli Ltda Me
Interessado : Volpato e Cia Me
Interessada : Cleimon Comércio de Materiais de Construção Ltda
Interessado : Ita Guinchos e Entulhos Ltda Me
Interessado : Azulão Churrascaria Ltda Me
Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira

DECISÃO MONOCRÁTICA INTERLOCUTÓRIA

1. Hoffmann Comércio de Combustíveis Ltda. foi acusada de se beneficiar financeiramente de atos ímprobos praticados por agentes públicos do Município de Orleans (um deles o ex-Prefeito da cidade, também réu na correspondente ação).

Depois de defesa preliminar, a ação foi recebida.

Neste agravo de instrumento a recorrente contesta essa admissão processual: afirma que o sistema judiciário não pode ser utilizado como inquérito, função típica do órgão de investigação, e que a "inicial deve conter o mínimo de elementos, a demonstração da intenção de lesar o erário ou obter vantagens e provas ou indícios neste sentido" - hipóteses não configuradas aqui, pois "não há uma única linha descrevendo conduta irregular ou sequer um indício ou prova de irregularidade por parte do agravante".

A inicial, assim, prejudica o exercício pleno de sua defesa, porque não sabe do que está sendo efetivamente acusada (a não ser quanto ao fato de ter participado de uma disputa pelo fornecimento de combustíveis ao Poder Público - ato perfeitamente regular, afirma, pois não há conduta sua apontada como ímproba). Ausente descrição individualizada do ato, não há justa causa que valide a pretensão.

Desse modo, não se demonstram plausíveis os argumentos que levaram ao recebimento da inicial, o que ofende disposição constitucional (art. 93, inc. IX).

Quer, por isso, a antecipação de tutela recursal para que a inicial não seja recebida ou ao menos que, concedido efeito suspensivo, a causa fique paralisada relativamente à agravante.

2. Na ação de improbidade, como é sabido, há um rito peculiar. Apresentada a inicial, notificam-se (não se citam) os acionados para que possam apresentar defesa prévia. Depois, mediante decisão obviamente sob cognição sumária, o juízo avalia se é caso de dar seguimento à causa. O objetivo é claramente impedir acusações que de antemão se mostrem precipitadas. Há um sentido negativo inato a esse tipo de demanda e, mal ou bem, a intenção legislativa é coarctar aquilo que não traga uma plausibilidade bastante.

Sob outro enfoque, como o caso não pode implicar muito menos um veredicto antecipado de culpa, clama-se por comedimento. A avaliação é - digo de novo - mediante apreciação rarefeita. Apura-se um mínimo de probabilidade e juízos definitivos (a menos que seja para a inocência, conforme art. 17, § 8º, da LIA) não são cabíveis em tal instante.

Bem por isso, sem originalidade, já decidimos na 4ª Câmara de Direito Público que deve mesmo haver economia de palavras:

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - RECEBIMENTO DA INICIAL - COGNIÇÃO SUMÁRIA - MERA POSSIBILIDADE DE ATO ILÍCITO, SEM PRECLUSÃO QUANTO À TIPIFICAÇÃO.

A Lei de Improbidade foi alterada e exige, desde a MP 2.225/2001 (ainda em vigor), decisão fundamentada que, posterior à notificação que permita manifestação preliminar, afaste uma possível acusação abusiva. A regra, porém, é o respeito ao devido processo legal, também creditado em prol do Ministério Público: defesa prévia, recebimento da inicial, contestação, instrução, novo debate e sentença.

Somente no caso de imputações visivelmente levianas ou até mesmo de inocências macroscópicas é que se justifica o encerramento prematuro do feito. Daí a necessidade de a decisão que receber a inicial, autorizando a citação, ser avara quanto às palavras, evitando algum compromisso com o futuro reconhecimento da culpa. Quer-se a derrogação liminar somente das descrições sem substrato fático ou normativo bastante.

(...) (TJSC, AI 0156739-36.2015.8.24.0000, de Campo Erê, rel. o subscritor)

A decisão deve "Ser avara quanto às palavras", foi dito, mas há necessidade de enfrentamento concreto das teses defensivas. Por isso há uma defesa prévia. Desse modo, mesmo que suavizando os termos - quase que por meio da precisão de uma balança de farmacêutico -, o juízo deve fazer o confronto ente o posto pelo acionado e as teses do autor, a partir daí detectando se existe verossimilhança, ainda mais que a absolvição de plano é uma possibilidade legal.

Só que para isso é preciso que antes se saiba do que especificamente estão sendo acusados os acionados. É dizer, a medida daquela dita confrontação com os argumentos de defesa é exatamente o explanado inicialmente pela acusação. Dito de outro modo, a causa de pedir próxima. Falha ou inexistente, a petição inicial é inepta - ao menos quanto àquela parte da correspondente postulação -, sendo inviável que se permita o prosseguimento diante até do inegável prejuízo ao contraditório. Afinal, do que o réu pode se defender se nem ao certo sabe de que está sendo demandado? (E isso ganha maior relevo em ações de improbidade).

3. A partir daí se pode dizer que aqui essa avaliação ficou prejudicada, haja vista, ao menos quanto à agravante, a perspectiva de reconhecimento da inépcia da inicial (art. 330, § 1º, do NCPC) - tese que encampo neste primeiro contato com a causa e que dispensa até mesmo a análise dos demais argumentos ora levantados. (Aliás, no mesmo processo que corre na origem já tive a oportunidade, por duas vezes, de relatar agravos de instrumento em que a situação era praticamente idêntica).

Veja-se, nessa linha, que embora a recorrente não negue a formação do contrato sobre o qual repousam os questionamentos do autor, não há na narração da causa de pedir alguma sorte de comprometimento subjetivo capaz de levar a empresa agravante para aquele cenário comprometedor. O evento que o autor reputa atrair a reclamante para tal contexto é o fato de ter firmado o mencionado pacto. Nada mais. Não identifiquei nas trinta laudas da petição inicial, vale reforçar, nenhuma passagem, nem sequer genérica, relacionada ao nome da agravante. O máximo que se pode extrair de lá, além da qualificação pessoal (fls. 2 da ação principal), é uma conjectura de que a ré figura no polo passivo na condição de terceira beneficiada por ato ímprobo praticado por outrem (fls. 4 da exordial), ou, quando muito, em decorrência de pecados meramente formais relacionados à dispensa de licitação (em nada, vale registrar, que comprometa a empresa Hoffmann de alguma forma desabonatória).

Aliás, o que se pode tirar da descrição dos fatos quanto a alguma perspectiva de fraude diz respeito apenas a alguns dos corréus, tendo o Ministério Público assim afirmado:

Em 18 de janeiro de 2011, o então Prefeito de Orleans e ora requerido Jacinto Redivo editou o Decreto n. 3.207/2011, declarando situação anormal no Município por 90 dias, por conta das chuvas ocorridas em 14 de janeiro (fls. 8/9).

No dia 26 de janeiro, o Governador do Estado assinou o Dec. 20/2011, homologando situação de emergência objeto do Decreto Municipal 3.207/11 de Orleans. A homologação foi publicada no diário oficial do dia 26/1/11 (fl. 361).

Antes mesmo da homologação, mais propriamente no dia 25/1/2011, o requerido Jacinto Redivo, na condição de Prefeito, deu início e finalizou os trâmites que entendeu necessários para firmar 8 Contratos administrativos, que totalizaram a quantia de R$ 1.309.143,40 (um milhão, trezentos e nove mil, cento e quarenta e três reais e quarenta centavos), em tese, para atender a situação de anormalidade.

Os contratos tinham como objeto: a) aquisição de madeiras para reforma de pontes (Volpato&Cia); b) aquisição de tubos de concreto (Concretos Comelli); c) aquisição de areia/brita e locação de trator de esteira (Librelato Britas); d) locação de caminhão, escavadeira e retroescavadeira (Baggio Terraplenagem); e) aquisição de materiais de construção (Cleimon Materiais Construção); f) combustível para tais veículos (Hoffmann Combustíveis); g) marmitas (Azulão Churrascaria); h) locação de caminhão guincho (Ita Guinchos).

Dentre outros atos, na mesma data, o requerido Jacinto Redivo escolheu as empresas, arrecadou pareceres contábil e jurídico, homologou os certames em comento e assinou os contratos administrativos, de modo que, com isso, reverteu em favor das empresas beneficiárias vultosas receitas públicas do tesouro da Prefeitura Municipal de Orleans.

Como se verá a seguir, o então prefeito efetuou avenças por preços aleatórios, já que os procedimentos não são instruídos da justificativa de preços exigida por lei para as contratações emergenciais, e ainda escolheu empresas por critérios não declarados. Isso porque não há nos autos a necessária justificativa para a escolha dos fornecedores, sequer qualquer comprovação de habilitação jurídica, técnica e fiscal, omissão que permitiu a contratação de pessoa jurídica que não tinham dentre suas atividades econômicas declaradas a locação de bens objeto do procedimento de dispensa. As dispensas de licitações também não atenderam os requisitos mínimos de publicidade previstos na Lei n. 8.666/93.

Não bastasse, contando com a colaboração de Patrícia Librelato Massuco, Jacinto Redivo promoveu a contratação de empresas que apresentavam relação de proximidade com Vice-Prefeito e o então Secretário de Infraestrutura, situação que desrespeitou proibições dispostas em legislação federal e em Princípios Constitucionais da Administração Pública.

Curiosamente, os oito procedimentos de dispensa de licitação se iniciaram a partir...

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