Decisão Monocrática Nº 4030064-18.2019.8.24.0000 do Terceira Vice-Presidência, 17-07-2020

Número do processo4030064-18.2019.8.24.0000
Data17 Julho 2020
Tribunal de OrigemBrusque
ÓrgãoTerceira Vice-Presidênci
Classe processualRecurso Especial
Tipo de documentoDecisão Monocrática


Recurso Especial n. 4030064-18.2019.8.24.0000/50000, Brusque

Recorrente : Oregon Administradora de Shopping Centers Ltda.
Advogados : Antonio Carlos Goedert (OAB: 12076/SC) e outros
Recorridos : Vorlei Rogério Felisbino Id e outros
Advogados : Paulo Augusto do Nascimento Schön (OAB: 37559/PR) e outros

DECISÃO MONOCRÁTICA

Oregon Administradora de Shopping Centers Ltda., com base no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, interpôs o presente recurso especial alegando violação ao artigo 3º, inciso VIII, da Lei n. 8.009/1990; além de divergência jurisprudencial relacionada à possibilidade de penhora do imóvel - bem de família - do fiador de contrato de locação comercial.

Cumprida a fase do artigo 1.030, caput, do Código de Processo Civil.

Presentes os requisitos extrínsecos, passo à admissibilidade recursal.

A insurgência não merece ascender pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, no que tange à aventada afronta ao art. 3º, inciso VII, da Lei n. 8.009/1990, e ao dissídio pretoriano pertinente à possibilidade de penhora do imóvel - bem de família - do fiador de contrato de locação comercial, por óbice da Súmula 83 do Superior Tribunal de Justiça, haja vista que o acórdão recorrido está em consonância com a recente orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria, conforme se depreende do seguinte excerto (fls. 504/506):

[...] Não se desconhece que a natureza de bem de família não configura, em regra, obstáculo à penhora quando se trata de imóvel pertencente a fiador em contrato de locação, nos termos do art. 3º, inciso VII, da Lei 8.009/1990. Veja-se:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

[...]

VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Também não se olvida que o STJ expediu o comando sumular n. 459, pelo qual "é válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação" (Segunda Seção, j. 14-10-2015).

Nada obstante, a jurisprudência deste Tribunal, com supedâneo em julgado recente proferido pelo STF, é assente ao preconizar que a possibilidade de penhora, como exceção à regra prevista na lei regente, apenas se verifica nos específicos casos de locação residencial.

Segue a ementa do precedente emanado da Corte Máxima:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO MANEJADO CONTRA ACÓRDÃO PUBLICADO EM 31.8.2005. INSUBMISSÃO À SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. PREMISSAS DISTINTAS DAS VERIFICADAS EM PRECEDENTES DESTA SUPREMA CORTE, QUE ABORDARAM GARANTIA FIDEJUSSÓRIA EM LOCAÇÃO RESIDENCIAL. CASO CONCRETO QUE ENVOLVE DÍVIDA DECORRENTE DE CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL COMERCIAL. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. INCOMPATIBILIDADE COM O DIREITO À MORADIA E COM O PRINCÍPIO DA ISONOMIA.

A dignidade da pessoa humana e a proteção à família exigem que se ponham ao abrigo da constrição e da alienação forçada determinados bens. É o que ocorre com o bem de família do fiador, destinado à sua moradia, cujo sacrifício não pode ser exigido a pretexto de satisfazer o crédito de locador de imóvel comercial ou de estimular a livre iniciativa. Interpretação do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990 não recepcionada pela EC nº 26/2000. 2. A restrição do direito à moradia do fiador em contrato de locação comercial tampouco se justifica à luz do princípio da isonomia. Eventual bem de família de propriedade do locatário não se sujeitará à constrição e alienação forçada, para o fim de satisfazer valores devidos ao locador. Não se vislumbra justificativa para que o devedor principal, afiançado, goze de situação mais benéfica do que a conferida ao fiador, sobretudo porque tal disparidade de tratamento, ao contrário do que se verifica na locação de imóvel residencial, não se presta à promoção do próprio direito à moradia. 3. Premissas fáticas distintivas impedem a submissão do caso concreto, que envolve contrato de locação comercial, às mesmas balizas que orientaram a decisão proferida, por esta Suprema Corte, ao exame do tema nº 295 da repercussão geral, restrita aquela à análise da constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador em contrato de locação residencial. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE n. 605709, Rel. Min. Dias Toffoli, Rel. p/ Acórdão: Mina. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 18-2-2019, sem destaque no original)

Em idêntica orientação, colacionam-se julgados desta Corte: AI n. 4004606-33.2018.8.24.0000, de Armazém, Rela. Desa. Rosane Portella Wolff, j. 5-12-2019; AI n. 4027466-28.2018.8.24.0000, de Balneário Camboriú, Rel. Des. José Agenor de Aragão, j. 26-9-2019; e AI n. n. 4010451-12.2019.8.24.0000, de Itajaí, Rela. Desa. Cláudia Lambert de Faria, j. 13-8-2019.

A hipótese em liça, contudo, espelha conjuntura distinta, uma vez que se cuida à origem de execução aforada por dívida oriunda de contrato de locação comercial - a inviabilizar, em princípio, a penhora sobre o imóvel em discussão neste agravo.

Cediço que, sob a égide da repercussão geral, o STF outrora assentou a constitucionalidade da penhora de bem de família pertencente a fiador em contrato de locação, conforme o Tema n. 295 daquela Corte.

Sem embargo, entende-se que o precedente ora esposado como razão de decidir, também exarado pelo STF, não colide com a orientação antes sufragada; diversamente, almeja-se emprestar ao dispositivo interpretação compatível com o intento do legislador de salvaguardar o direito à moradia pela via da locação de imóveis - preocupação não constatada, realmente, na seara das locações comerciais.

Com efeito, nos dizeres do citado ministro relator, o bem de família do fiador, destinado à sua moradia, é sacrifício que "não pode ser exigido a pretexto de satisfazer o crédito de locador de imóvel comercial ou de estimular a livre iniciativa".

Em face de tais considerações, porque exarada em consonância com a jurisprudência consolidada neste Tribunal sobre a matéria, não comporta reparo a decisão vergastada.

Mantém-se, por corolário, reconhecida a impenhorabilidade do imóvel matriculado sob o n. 45.220 no Registro de Imóveis da comarca de Brusque.

Sobre a questão jurídica enfocada, destacam-se julgados do Superior Tribunal de Justiça que afastam a aplicação do Tema 708 ("Discussão referente à penhora do bem de família no contrato de locação quando decorrente de fiança locatícia"), nos casos que tratam de garantia prestada em locação para fins comerciais, em razão do entendimento mais recente do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria:

[...] 2. Aponta, ainda, a parte recorrente, violação aos artigos e 3º, VII, da Lei 8.009/1990, sustentado a impenhorabilidade do único imóvel do fiador, em que reside com sua família, cuja garantia fora prestada em contrato de locação para fins comerciais.

A Magistrada de primeiro grau (fls. 48/49, e-STJ) desconstituiu a penhora, com base em entendimento mais recente da Suprema Corte.

Confira-se:

Nesse contexto, diante da evolução jurisprudencial operada pelo recente precedente do pretório excelso e por cautela, não se revela razoável manter-se a constrição e efetivar a expropriação do imóvel destinado à moradia da executada.

Em sede de agravo de instrumento, a Corte de origem, por maioria, reformando a decisão que desconstituiu a constrição, entendeu pela possibilidade de penhora do bem do fiador em contrato de locação comercial ao argumento de que a tese firmada pela Primeira Turma do STF, no julgamento do RE 605.709, não pode se sobrepor àquela firmada no Tema nº 295, estabelecida pelo Plenário da Corte Suprema em sede de RE repetitivo, bem como à do Superior Tribunal de Justiça, também firmada em recurso representativo de controvérsia, em que restou estabelecida a possibilidade de penhora do bem do fiador em contrato de locação.

A propósito, trechos do acórdão (fls. 102/109, e-STJ):

No caso em exame, a ora recorrente pretende impugnar o fundamento empregado pela decisão recorria no sentido de que o bem imóvel pertencente ao acerco patrimonial do fiador, em contrato de locação, indicado à penhora pela agravante, deve ser reconhecido como impenhorável, nos termos da Lei nº 8.009/1990.

[...] Aliás, quanto ao ponto, a Lei nº 8.245/1991 acrescentou ao art. 3º da Lei nº 8.009/1990 a notória exceção à regra geral da impenhorabilidade, justamente nos casos de obrigação decorrente de "fiança concedida em contrato de locação" (inc. VII).

[...] No entanto, em 8 de fevereiro de 2006, uma vez submetida a matéria à análise pelo Plenário da Suprema Corte, o entendimento anteriormente afirmado monocraticamente foi alterado por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário nº 407.688-SP. Na referida hipótese, o fiador recorreu da decisão proferida pelo Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, ao entender que a penhora de seu bem de família para o adimplemento das dívidas decorrentes do contrato de locação consubstanciaria afronta aos preceitos constitucionais estabelecidos pela Emenda Constitucional nº 26/2000, relativamente ao direito à moradia. No entanto, sagrou-se vencedora, naquele momento, a tese defendida pelo Eminente Relator, Ministro Cezar Peluso, no sentido de que a penhora do bem de família do fiador não é causa de ofensa ao teor do art. 6° da Constituição Federal.

Em consonância com essa orientação, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos recursos repetitivos, de acordo com o detalhamento a ser procedido abaixo, estabeleceu que "é legítima a penhora de apontado bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, ante o que dispõe o art. 3º, inciso VII, da Lei nº 8.009/1990" (Tema 708; Súmula 549-STJ).

No mesmo sentido, o Excelso Supremo Tribunal Federal, por meio do julgamento do RE nº 612.360-SP, cuja Relatora foi a Eminente Ministra Ellen Gracie (data do julgamento: 13/08/2010, data da publicação: DJe-164...

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