Decisão Monocrática Nº 4030710-78.2018.8.24.0900 do Grupo de Câmaras de Direito Civil, 16-01-2019

Número do processo4030710-78.2018.8.24.0900
Data16 Janeiro 2019
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Civil
Classe processualAção Rescisória
Tipo de documentoDecisão Monocrática


Ação Rescisória n. 4030710-78.2018.8.24.0900, Joinville

Autor : Auto Viação 1001 Ltda.
Advogados : Caue Vecchia Luzia (OAB: 20219/SC) e outro
Ré : Maria Rosa Pereira Dematte

Relator: Desembargador Sebastião César Evangelista

Vistos etc.

1 Auto Viação 1001 Ltda. ajuizou ação rescisória, com o objetivo de desconstituir a decisão transitada em julgado que encerrou a fase de conhecimento no processo n. 0004128-91.2009.8.24.0038, sendo parte adversa Maria Rosa Pereira Dematte.

A ré na ação rescisória, Maria Rosa, foi autora na demanda cuja decisão se pretende rescindir. Ela ajuizou em fevereiro de 2009 uma ação contra Auto Viação 1001 Ltda. para a reparação dos danos de acidente ocorrido em 26 de março de 1989, quando "o preposto da Requerida, conduzindo veículo de propriedade desta, envolveu-se num acidente, causando-lhe gravíssimas lesões corporais à requerente e vitimando fatalmente seu filho e esposo" (excerto da petição inicial, cópia a p. 56).

Após regular instrução, o Dr. Juiz de Direito, no ano de 2016, julgou parcialmente procedente a demanda, nos seguintes termos:

- JULGO PROCEDENTE o pedido de indenização por danos materiais e, via de consequência, CONDENO a ré Auto Viação 1001 Ltda. ao pagamento, em favor da autora Maria Rosa Pereira Dematte de pensão mensal vitalícia decorrente da perda parcial de sua capacidade laborativa, no percentual de 75% (setenta e cinco por cento) do salário mínimo vigente, desde a data do evento danoso (26.03.1989), sem incluir o 13º salário. As parcelas vencidas deverão ser acrescidas, a contar dos respectivos vencimentos, considerado, para tanto, o dia 26 de cada mês, de correção monetária pelos índices oficiais e de juros de mora de 0,5% ao mês (CC/1916, art. 1.062) até a entrada em vigor do novo Código Civil (11.01.2003), a partir de quando passam a ser calculados à taxa de 1% ao mês (CC/2002, art. 406). As parcelas vincendas terão como vencimento o dia 26 de cada mês.

- JULGO PROCEDENTE o pedido de indenização por danos materiais e, via de consequência, CONDENO a ré Auto Viação 1001 Ltda. ao pagamento, em favor da autora Maria Rosa Pereira Dematte de pensão mensal decorrente da morte de seu cônjuge, no percentual de 2/3 do salário mínimo, desde a morte da vítima no acidente de trânsito (26.03.1989) até a data em que completaria 70 anos (05.05.2018), incluído o 13º salário.

As parcelas vencidas deverão ser acrescidas, a contar dos respectivos vencimentos, considerado, para tanto, o dia 26 de cada mês, de correção monetária pelos índices oficiais e de juros de mora de 0,5% ao mês (CC/1916, art. 1.062) até a entrada em vigor do novo Código Civil (11.01.2003), a partir de quando passam a ser calculados à taxa de 1% ao mês (CC/2002, art. 406). As parcelas vincendas terão como vencimento o dia 26 de cada mês.

- JULGO PROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais e, via de consequência, CONDENO a ré Auto Viação 1001 Ltda. ao pagamento, em favor da autora Maria Rosa Pereira Dematte da importância de R$ 260.000,00 (duzentos e sessenta mil reais), acrescida de juros de mora de 1% ao mês (CC/2002, art. 406) e correção monetária pelos índices oficiais (Provimento CGJ-SC nº 13/1995), desde o arbitramento.

- JULGO PROCEDENTE o pedido de indenização por danos estéticos e, via de consequência, CONDENO a ré Auto Viação 1001 Ltda. ao pagamento, em favor da autora Maria Rosa Pereira Dematte da importância de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), acrescida de juros de mora de 1% ao mês (CC/2002, art. 406) e correção monetária pelos índices oficiais (Provimento CGJ-SC nº 13/1995), desde o arbitramento.

Para garantir o efetivo cumprimento da obrigação no tocante aos danos materiais, deverá a requerida constituir capital, na forma do art. 533 do novo Código de Processo Civil.

Ambas as partes apelaram da decisão. Os recursos foram julgados pela Primeira Câmara de Direito Civil em 2017. Na decisão, de relatoria do Des. Raulino Jacó Brüning, o recurso da parte ré não foi conhecido ante a existência de vício de representação que não foi saneado mesmo após a abertura de prazo para tal fim. Já o recurso da autora foi parcialmente provido, para fim de modificar o termo inicial da incidência de juros de mora.

O recurso especial foi inadmitido em decisão da Vice-Presidência do TJSC, seguindo-se o trânsito em julgado. Em maio de 2018, foi iniciada na origem a fase de cumprimento de sentença.

A Auto Viação 1001 Ltda., inconformada, ajuizou a presente demanda, em que sustenta a rescisão do julgado com base nos seguintes argumentos:

a) documento novo, expedido pelo Deter em 2018, que certifica que a empresa Auto Viação 1001 Ltda. "nunca possuiu registro nesta Autarquia para transporte regular e/ou fretamento. Referente à linha Itajaí/Joinville é operada pelas empresas Auto Viação Catarinense e Santo Anjo da Guarda" (p. 2);

b) dolo da autora da ação indenizatória (CPC, art. 966, VIII). "O dolo da Ré fica evidente porque o seu ex-marido, Ademar José Dematte, cujo falecimento é causa do pedido de indenização, era motorista da empresa Guaratuba Joinville Ltda. O finado não estava dirigindo o ônibus quando do acidente. Ele retornava, na companhia da Ré e do filho, de viagem que fez a trabalho. Às fls. 36 dos autos consta documento do Instituto Nacional de Previdência Social, indicando que Ademar José Dematte era empregado da Empresa Guaratuba Joinville Ltda." (p. 4). Apesar de o boletim de ocorrência indicar que a autora seria a proprietária do veículo, o ônibus havia sido, antes do sinistro, alienado à sociedade empresária Guaratuba Joinville Ltda. O fato de ser a Guaratuba a responsável foi, ademais, amplamente divulgado pela imprensa. Duas outras circunstâncias concorreriam para a configuração do dolo: o lapso de quase duas décadas para ajuizamento da demanda, e a provável ciência de que a sociedade Guaratuba Joinville "pelo que consta, entrou em falência e foi desconstituída" (p. 7);

c) a decisão fundamenta-se em erro de fato (CPC, art. 966, VIII), pois ampara-se na falsa premissa de que a Auto Viação 1001 teria realizado o transporte, quando de fato o ônibus estava sendo utilizado pela Guaratuba Joinville. O erro era verificável a partir do exame dos autos, já que "há uma série de reportagens de jornais juntadas aos autos dando conta que quem realizou o transporte foi a empresa Guaratuba Joinville Ltda. (fls. 44-53)" (p. 10). Tal circunstância não foi objeto de controvérsia entre as partes, estando satisfeito, pois, o requisito do art. 966, § 1º, do CPC;

d) incompetência absoluta das Câmaras de Direito Civil para julgamento da questão, que é de Direito Público. Isso porque o fundamento para a responsabilização reside no art. 36, § 7º, da Constituição da República, e não no Decreto n. 2.681/1912, equivocadamente referido na decisão rescindenda. Dessa feita, respeitado o disposto no Ato Regimental n. 135/2016, a matéria deveria ter sido analisada, em Segunda Instância, por uma das Câmaras de Direito Público.

Ao final, requereu a concessão de tutela provisória de urgência. Defendeu a probabilidade do acolhimento da ação rescisória, repisando os argumentos já descritos, e sustentou que se encontra configurado risco de dano, tendo-se em vista a iminente possibilidade de levantamento de valores pela parte adversa, em fase de cumprimento de sentença.

É o relatório.

2 Conforme se observa na movimentação processual, a decisão rescindenda transitou em julgado em 3 de fevereiro de 2018, ao passo que a ação rescisória foi ajuizada em 8 de novembro de 2018, dentro, portanto, do prazo de dois anos de que cuida o art. 975 do CPC. A petição inicial especifica os motivos por que considera cabível a rescisória, bem como o enquadramento no art. 966 do CPC. A peça veio acompanhada de comprovante de recolhimento do preparo (p. 538), bem como do depósito em garantia de que cuida o art. 968, II, do CPC (p. 546). Os autos foram instruídos, ainda, com cópia integral dos autos do processo n. 0004128-91.2009.8.24.0038. Encontram-se satisfeitos, pois, os requisitos de admissibilidade.

Em relação, especificamente, ao enquadramento do pleito no art. 966 do CPC, é necessário diferenciar os casos em que há manifesto desatendimento da norma (caso em que a solução adequada seria o indeferimento da petição inicial) daqueles em que é discutível o acerto do enquadramento, caso em que o exame da questão termina por se confundir com o mérito. No caso em apreço, ao menos no tocante à tese de erro de fato, existe verossimilhança da alegação, o que justifica o recebimento e processamento da ação rescisória.

3 Ao disciplinar a tutela provisória, o art. 969 do CPC nada especifica em relação aos seus requisitos. Nesse caso, deve-se compreender que são aplicáveis os mesmos critérios do art. 300 do CPC, com as adaptações necessárias, a começar pelo requisito do perigo de dano.

Em relação à urgência no provimento, o fato de o processo encontrar-se em fase de cumprimento (de decisão transitada em julgado, sendo, portanto, dispensada caução) e a dívida ser de elevada monta (mais de dois milhões de reais), é circunstância suficiente para se ter por configurado o risco de dano. Acrescente-se que, in casu, a autora da rescisória informou que "os valores supostamente devidos já se encontram depositados em conta vinculada ao juízo e que, a depender de mero despacho, podem vir a ser levantados pela ré" (p. 20). De fato, compulsando-se os autos digitais, na origem, observa-se que a parte executada efetuou o depósito de R$ 2.691.840,14 (p. 83). Nesse contexto, é justificável a urgência no provimento, cumprindo avaliar se há probabilidade a justificar o deferimento da tutela de urgência.

4 No tocante à "probabilidade do direito" (CPC, art. 300), deve-se compreender o requisito, aplicado à ação rescisória, como uma avaliação, por parte do relator, de que a parte provavelmente terá êxito do pedido rescisório. Passa-se, assim, ao...

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