Decisão Monocrática Nº 5001090-73.2021.8.24.0067 do Quarta Câmara de Direito Público, 24-03-2023

Número do processo5001090-73.2021.8.24.0067
Data24 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoDecisão Monocrática









Apelação Nº 5001090-73.2021.8.24.0067/SC



APELANTE: INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE DE SANTA CATARINA (RÉU) APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP) APELADO: AUTO POSTO CANARINHO LTDA (AUTOR) APELADO: OS MESMOS


DESPACHO/DECISÃO


Na comarca de origem, travaram embate as partes, resultando desfecho agora fustigado em recurso.
Irresignados, Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina e Ministério Público do Estado de Santa Catarina objetivam a reforma do decisum, articulando argumentos que julgam aplicáveis ao caso prático.
Oportunizadas contrarrazões.
É o relatório.
O art. 932, IV e V, do CPC reporta hipóteses de julgamento unipessoal quando o dissenso alçado ao Pretório condiz com precedentes oriundos das Cortes Superiores ou até mesmo de posicionamentos estampados em súmula, ou entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas, tanto quanto em assunção de competência.
Essa previsão foi adrede lançada no Regimento Interno de nossa Corte, no seu art. 132, que entre outras vertentes congregou também a possibilidade do julgamento monocrático exsurgir a partir "jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça".
Tais endossos propiciam o enfrentamento imediato da celeuma, dispensando a formação do colegiado, pois o caso prático colide celeumas atreladas ao distanciamento de cursos hídricos, de franco debate perante os tribunais superiores, exempli gratia, o Tema n. 1.010 do Superior Tribunal de Justiça, ou ainda a perspectiva da Súmula n. 613 da Corte da Cidadania, também sub judice na espécie.
Ao mais, o julgamento unipessoal antecipa-se à abertura de vista à Procuradoria-Geral de Justiça, na conformidade da previsão contida no art. 1.011 do CPC, que impele apreciação da celeuma de pronto:
Art. 1.011. Recebido o recurso de apelação no tribunal e distribuído imediatamente, o relator:
I - decidi-lo-á monocraticamente apenas nas hipóteses do art. 932, incisos III a V ;
II - se não for o caso de decisão monocrática, elaborará seu voto para julgamento do recurso pelo órgão colegiado.
In casu, o juízo a quo encartou decisão fundamentada com base nas seguintes premissas: a) "deve haver uma conciliação entre a atividade comercial desenvolvida e o crescimento econômico com a conservação do meio ambiente, numa relação harmônicas entre os homens e os recursos naturais"; b) "sopesando a situação concreta, mais precisamente o exercício da atividade empresarial sob crivo do órgão ambiental por todos esses anos e a boa-fé da parte autora, não vislumbro nenhum prejuízo ao meio ambiente de se compensar os 30 metros de extensão da APP em outro imóvel, nos termos dos fundamentos lançados pela autora em sua inicial"; c) "a compensação em outra área ambiental irá atingir o objetivo de proteção ao meio ambiente de forma mais ampla do que a determinada pelo órgão ambiental, bem como oportunizar a parte autora a continuação de sua atividade empresarial sem qualquer prejuízo" (Evento 114, 1G).
Inconformado, o IMA - Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina arguiu: a) "Exatamente pelo fato de ter havido a concessão das licenças ambientais para operação da atividade fora dos 15 metros mínimos é que o órgão ambiental exigiu a recuperação desses 15 metros, impedindo a continuidade da intervenção irregular, com a compensação do remanescente"; b) "tal análise do órgão ambiental ocorreu em procedimento administrativo - licenciamento ambiental - no qual observou-se a continuidade da operação da atividade principal da Autora/Apelada do comércio de combustíveis, identificando que as atividades anexas da borracharia e lavação de veículos não são licenciáveis ambientalmente, motivo que fogem ao escopo do licenciamento ambiental"; c) "Alternativamente, mantendo a decisão de primeira instância, impõe-se requerer que se determine, no mínimo, a recuperação da faixa mínima de 5 (cinco) metros existentes no local hoje - inclusive objeto de proposta da própria Apelada - com a compensação em outro local a ser decidida em proposta a ser apresentada no prazo de 30 (trinta) dias ao IMA para análise, na mesma região e bioma, com demonstração do ganho ambiental da compensação, seja por quantidade e qualidade, mantendo o índice de ocupação atual" (Evento 123, 1G).
Também irresignado, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina aviou recurso, alegando: a) "em que pese autora alegue que deu início às suas atividades em 1983, afirmando que a metragem para afastamento do curso hídrico era de 5 (cinco) metros, razão não lhe assiste, porquanto a metragem em 1979 passou a ser de 15 (quinze) metros, conforme previsão do art. 3º, par. único, V, e art. 4º, III, da Lei n. 6.766/79"; b) "Também quando do julgamento do paradigmático Tema n. 1010, o Superior Tribunal de Justiça deixou claro que: A definição da norma a incidir sobre o caso deve garantir a melhor e mais eficaz proteção ao meio ambiente natural e ao meio ambiente artificial, em cumprimento ao disposto no art. 225 da CF/1988, sempre com os olhos também voltados ao princípio do desenvolvimento sustentável (art. 170, VI,) e às funções social e ecológica da propriedade"; c) "A mera tolerância ao longo dos anos da ocupação de área de preservação permanente não gera direito subjetivo de continuar a degradar (Súmula n. 613 do STJ)" (Evento 125, 1G).
Pois bem, ressoa nítido que o embate propugnado importa sindicar a intersecção de variados princípios e normas cogentes e de metragens objetivas acerca da situação fática locacional da localidade, alvo de antropização, mas também de reivindicada defesa ambiental.
A relação homem e espaço evidentemente é atemporal, porque, enquanto se fomenta a preservação de biomas para gerações porvindouras, também é crível aferir o contexto das ações humanas operadas no pretérito.
O Ministro Luiz Fux já externou com pertinácia essa interação entre o ser humano e o bioma - gerando necessária ponderação acerca do Tema n. 1.010 -, ao abordar que "o homem é parte indissociável do meio ambiente, uma vez que, por intermédio das interações genéticas biologicamente evolutivas que se sucederam nos últimos milhares de anos, o meio ambiente produziu a espécie humana, cuja vida depende dos recursos nele contidos":
DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO AMBIENTAL. ART. 225 DA CONSTITUIÇÃO. DEVER DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. NECESSIDADE DE COMPATIBILIZAÇÃO COM OUTROS VETORES CONSTITUCIONAIS DE IGUAL HIERARQUIA. ARTIGOS 1º, IV; 3º, II E III; 5º, CAPUT E XXII; 170, CAPUT E INCISOS II, V, VII E VIII, DA CRFB. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. JUSTIÇA INTERGERACIONAL. ALOCAÇÃO DE RECURSOS PARA ATENDER AS NECESSIDADES DA GERAÇÃO ATUAL. ESCOLHA POLÍTICA. CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. IMPOSSIBILIDADE DE VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO. EXAME DE RACIONALIDADE ESTREITA. RESPEITO AOS CRITÉRIOS DE ANÁLISE DECISÓRIA EMPREGADOS PELO FORMADOR DE POLÍTICAS PÚBLICAS. INVIABILIDADE DE ALEGAÇÃO DE VEDAÇÃO AO RETROCESSO. NOVO CÓDIGO FLORESTAL. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES. 1. O meio ambiente é tutelado constitucionalmente pela regra matriz do artigo 225, caput, da Constituição, que dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 2. O meio ambiente assume função dúplice no microssistema jurídico, na medida em que se consubstancia simultaneamente em direito e em dever dos cidadãos, os quais paralelamente se posicionam, também de forma simultânea, como credores e como devedores da obrigação de proteção respectiva. 3. O homem é parte indissociável do meio ambiente, uma vez que, por intermédio das interações genéticas biologicamente evolutivas que se sucederam nos últimos milhares de anos, o meio ambiente produziu a espécie humana, cuja vida depende dos recursos nele contidos. Nesse ponto, nem os mais significativos avanços tecnológicos permitirão ao homem, em algum momento futuro, dissociar-se do meio ambiente, na medida em que a atividade humana inventiva e transformadora depende da matéria nele contida, sob todas as suas formas, para se concretizar. 4. A capacidade dos indivíduos de desestabilizar o equilíbrio do conjunto de recursos naturais que lhes fornece a própria existência tem gerado legítimas preocupações, que se intensificaram no último século. Afinal, recursos naturais têm sido extintos; danos irreversíveis ou extremamente agressivos à natureza tornaram-se mais frequentes; disfunções climáticas são uma realidade científica; diversas formas de poluição se alastram pelos grandes centros, entre...

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