Decisão Monocrática Nº 5001538-19.2022.8.24.0000 do Primeira Câmara de Direito Civil, 04-04-2022

Número do processo5001538-19.2022.8.24.0000
Data04 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Agravo de Instrumento Nº 5001538-19.2022.8.24.0000/SC

AGRAVANTE: CONDOMINIO CIVIL PRO-INDIVISO DO SHOPPING CENTER NEUMARKT BLUMENAU ADVOGADO: EDUARDO BARBATO CORTES (OAB SC051468) ADVOGADO: DAVI LAGO (OAB SP127690) ADVOGADO: RODRIGO DUARTE (OAB SP358824) AGRAVADO: FABRICIO RIEG ADVOGADO: FERNANDO HENRIQUE BECKER SILVA (OAB SC017330)

DESPACHO/DECISÃO

I - Na Comarca de Blumenau, Fabrício Rieg ajuizou ação de prestação de contas n. 0310083-71.2019.8.24.0008 em face de Condomínio Civil Pro-Indiviso do Shopping Center Neumarkt Blumenau.

O agravo de instrumento, interposto pelo requerido, investe contra a decisão de mérito (EVENTO 46, PG) em se que decidiu a primeira fase do procedimento de prestação de contas, nos seguintes termos:

Trata-se da primeira fase do procedimento especial da Ação de Exigir Contas proposta por FABRICIO RIEG contra COND CIVIL PRO IND DO SHOPPING CENTER NEUMARKT BLUMENAU, na qual o autor pediu a citação do réu para prestar contas "na forma adequada, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver, acompanhado de toda a documentação comprobatória a referente os demonstrativos de pagamento e os critérios utilizados no cálculo correspondente ao coeficiente de rateio de despesas desde o início da contratualidade até a data da desocupação do imóvel (27/07/2018)".

Para tanto, afirmou que em 26 de junho de 2017, firmou com o réu "instrumento particular de contrato atípico de locação de salões comerciais do Shopping Center Neumarkt Blumenau e outras avenças", cujo objeto era a locação do espaço denominado L.231, do NEUMARKT SHOPPING.

Entretanto, disse que desde o início da relação locatícia o réu nunca apresentou os demonstrativos e os critérios utilizados no cálculo correspondente ao coeficiente de rateio de despesas condominiais, relativo a todas as lojas do empreendimento, limitando-se a apresentar faturas com valores já estabelecidos de condomínio, ar condicionado, energia, água, gás, dedetização, taxa de lixo, taxa administrativa, IPTU e cota ordinária do fundo de promoções, tendo apenas apresentado, mês a mês, um mero balancete econômico, balancete esse que, além de elaborado unilateralmente, não se fazia acompanhar dos comprovantes de gastos que respaldavam a cobrança.

À luz dessa narrativa, pediu a procedência dos pedidos.

Citado, o réu ofertou a contestação do Evento 10, na qual impugnou a pretensão autoral.

Sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial diante da não apresentação dos documentos relativos à contratualidade, a decadência com base no art. 54 da Lei nº 8.245/1991 e a ausência de interesse processual.

No mérito, afirmou que todas as contas já foram legalmente prestadas, "porque as prestações de conta são disponibilizadas trimestralmente na administração do shopping, onde o acesso é permitido a todos os lojistas".

Pediu assim a improcedência do pedido.

Houve réplica (Evento 15).

Relatei, na concisão necessária. Passo a decidir.

Antes de qualquer outra análise, ressalto que a decisão da primeira fase procedimento especial de Exigir Contas tem natureza de decisão interlocutória, porque não põe fim ao processo ou a uma de suas fases (art. 203, § 2.º, CPC). Por isso, comporta recurso por meio de agravo de instrumento (art. 1.015, II, CPC). Tem por objeto declarar existente ou inexistente o dever de prestar contas. Sendo o caso, tem de ordenar que o demandado preste contas no prazo de quinze dias (art. 550, § 5.º, CPC). Se o demandado não prestar as contas no prazo legal, não lhe será lícito impugnar as que o autor apresentar (art. 550, §§ 5.º, in fine, e 6.º, CPC). "Não há previsão de reabertura do prazo para reapresentação de contas se a própria lei prevê as consequências para o descumprimento do comando da sentença" (STJ, 3.ª Turma, AgRg no Ag 718.903/RS, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 25.09.2007, DJ 15.10.2007, p. 257). (MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil Comentado. Revista dos Tribunais - Thomson Reuters. 5.ª edição online, art. 550).

Dito isso, passo a apreciar as preliminares levantadas pelo réu, que devem ser totalmente afastadas.

Rejeito a preliminar de inépcia da petição inicial, pois toda a documentação referida pelo réu é comum às partes, ou seja, tanto o autor quando o demandado poderiam apresentá-la em juízo.

Rejeito a preliminar (prejudicial) de decadência pois, segundo o Superior Tribunal de Justiça, "o art. 54, §2º, da Lei nº 8.245/91, estabelece uma faculdade ao locatário, permitindo-lhe que exija a prestação de contas a cada 60 dias na via extrajudicial, o que não inviabiliza o ajuizamento da ação de exigir contas, especialmente na hipótese em que houve a efetiva resistência da parte em prestá-las mesmo após a delimitação judicial do objeto." (REsp 1746337/RS, Min. Nancy Andrighi).

Por fim, rejeito a preliminar de falta de interesse processual, pois além de não haver prova de que o réu tenha efetivamente prestado as contas postuladas pelo autor, a própria resistência formulada nos autos é suficiente a caracterizar a necessidade do autor em manejar a presente demanda.

Passando ao exame do mérito, ressalto que trato da primeira fase do procedimento especial da Ação de Exigir Contas (CPC, arts. 550-553), que é aquela que visa a exigir a prestação de contas. Serve a ação para tomar contas, para apuração de eventual crédito do demandante e respectiva execução. O dado fundamental para aferição de seu cabimento é a existência de administração de coisa alheia. (MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil Comentado, RT, 5.ª edição - art. 550).

Nesse contexto, a ação de exigir contas supõe, de um modo geral, a existência de administração de bens, negócios ou interesses de outrem (STJ, 4.ª Tuma, REsp 9.013/SP, rel. Min. Athos Gusmão Carneiro, j. 28.05.1991, DJ 09.09.1991, p. 12.209).

Tem o dever de prestar contas, por exemplo, o administrador judicial (arts. 159 e ss., 869, CPC, e 22, III, "p" e "r", e 23, Lei 11.101/2005), o advogado (art. 34, XXI, Lei 8.906, de 1994), o curador (arts. 570 e 756, § 1.º, V, CPC, e 1.755 e 1.774, CC), o gestor de negócios (art. 861, CC), o inventariante (arts. 553 e 618, VII, CPC), o mandatário (art. 668, CC), os pais (arts. 1.637 e 1.689, II, CC), o sucessor provisório (art. 33, CC) e o tutor (arts. 553, CPC e 1.755, CC). (MARINONI, Luiz Guilherme. Código de Processo Civil Comentado, RT, 5.ª edição - art. 550).

No caso dos autos, o contrato firmado entre as partes (Evento 1, INF5) e, especialmente, a forma de cálculo dos aluguéis (6% do faturamento bruto da locatária, observado o aluguel mensal mínimo de R$ 1.590,30) conferem ao autor legitimidade e interesse para compreender como tais cálculos são efetuados pelo demandado.

Além disso, adaptando o pensamento do Des. catarinense Helio David Vieira Figueira dos Santos em caso similar, interessa consignar que o réu integra um dos maiores grupos de empreendimento de centros comerciais do Sul do País e, nessa condição, certamente movimentam centenas de contratos locatícios e milhares (ou até mesmo milhões) de reais em despesas que cobram de seus locatários. É natural que, nesse contexto, os lojistas busquem evitar eventual locupletamento da administração do shopping, por meio de procedimento judicial especificamente criado para esse fim. Logo, não há como discutir que o autor é titular do direito de exigir contas e essa prerrogativa é o que basta para conduzir à procedência da primeira fase do procedimento especial. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5034490-22.2020.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Helio David Vieira Figueira dos Santos, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 04-03-2021).

Nesse sentido é a jurisprudência do e. TJSC: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE EXIGIR CONTAS. PRIMEIRA FASE. LOCAÇÃO DE SALA COMERCIAL EM SHOPPING CENTER. COBRANÇA DE TAXA DE CONDOMÍNIO, DESPESAS PRIVATIVAS, FUNDO DE PROMOÇÕES E OUTROS ENCARGOS. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO...

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