Decisão Monocrática Nº 5005680-66.2022.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Civil, 22-06-2022

Data22 Junho 2022
Número do processo5005680-66.2022.8.24.0000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
Classe processualAgravo de Instrumento
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Agravo de Instrumento Nº 5005680-66.2022.8.24.0000/SC

AGRAVANTE: FRANCISCA DIAS PEDROSO AGRAVADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.

DESPACHO/DECISÃO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela parte autora da decisão interlocutória que indeferiu o benefício da justiça gratuita.

Em vista da quantidade expressiva de processos envolvendo o mesmo advogado, mesma causa de pedir e pedido, associado a informação passada pelo Núcleo de Monitoramentos de Perfis de Demanda (NUMOPEDE) da Corregedoria-Geral de Justiça, dando conta de haver em tramitação no Poder Judiciário Catarinense, apuração ocorrida em 2-8-2021, mais de dez mil ações em curso representadas pelo advogado Luiz Fernando Cardoso Ramos, tendo como clientes indígenas, sem falar na verificação de que diversas ações representadas por esse causídico estavam sendo extintas por falta de pressuposto processual em vista das procurações terem sido preenchidas em formato cópia, jamais no original, e pratica de fraude pelo causídico na informação do endereço residencial da parte (Autos n. 5001030-46.2021.8.24.0085) via apresentação de declaração falsa, foi determinado por este relator que trouxesse ele comprovação da residência da parte autora por meio de documentos oficiais e atualizados, juntasse instrumento de mandato atual e com firma reconhecida do seu cliente e comprovação de estar devidamente regularizado com inscrição na OAB neste Estado, de acordo com o parágrafo 2º do artigo 10 da Lei n. 8.906/1994, em vista do grande número de ações em curso e se apresentar com OAB de estado diverso.

Em cumprimento ao comando judicial, o causídico deixou de apresentar integralmente os documentos exigidos, preferindo apresentar argumentações evasivas com o objetivo de dar guarida ao que foi por ele ofertado nos autos.

É, em síntese, o relato.

Inicialmente, esclareço da possibilidade de julgamento unipessoal do presente recurso de apelação, conforme previsão regimental constante no inciso XIV do art. 132 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

"Art. 132. São atribuições do relator, além de outras previstas na legislação processual:

[...]

XIV - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; .

O Regimento Interno encontra respaldo no inciso III do artigo 932 do Código de Processo Civil, o qual assim estabelece ao relator " não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida".

Por sua vez, extrai-se do art. 1.011 do Código Processual Civil:

Art. 1.011. Recebido o recurso de apelação no tribunal e distribuído imediatamente, o relator:

I - decidi-lo-á monocraticamente apenas nas hipóteses do art. 932, incisos III a V ;

Autorizado, assim, o julgamento monocrático do presente recurso, o que se passa à análise do mérito.

BREVE PREFACIAL DE JULGAMENTO

É dado ao relator promover, em juízo de prelibação do recurso interposto, a análise dos pressupostos de admissibilidade recursal classificado como intrínsecos e extrínsecos, para fins de autorizar o exame e o julgamento de mérito do recurso manejado.

Assim, eventual irregularidade na representação processual, autoriza que seja dado oportunidade a parte omissa juntar o instrumento de mandato para fins regularização e possibilidade de análise meritória do recurso pela Câmara.

Sobre o tema, colhe-se paradigma jurisprudencial:

PRESSUPOSTOS EXTRINSECOS DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL. IRREGULARIDADE DA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. AUSENCIA DE PROCURAÇÃO VÁLIDA NOS AUTOS. NÃO CONHECIMENTO DO AGRAVO DE PETIÇÃO POR INEXISTENTE.

A ausência de procuração válida nos autos a favor do advogado que subscreve o recurso na data de sua interposição importa o não conhecimento do apelo por inexistente (TRT 4ª Região, AP n.0020153-75.2021.5.04.0521, Desa. Cleusa Regina Halfen , j. em 21-2-2022).

Logo, não há ilegalidade no comando do relator em proceder a averiguação dos pressupostos processuais quando do recebimento do recurso, ainda que o processo já se encontre com sentença de mérito proferida sem trânsito em julgado.

Tal autorização ofertada ao relator de assim proceder encontra respaldo na lei processual civil:

Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:

[...]

IV - verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo;

[...]

§ 3º O juiz conhecerá de ofício da matéria constante dos incisos IV, V, VI e IX, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado. (grifou-se).

No poder geral de cautela que permeia a atuação do magistrado na fiscalização do processo, o que permite reconhecer, de ofício, a falta de pressupostos de constituição válida em qualquer tempo e grau de jurisdição, não se aventa irregularidade pelo reconhecimento dessa ilegalidade nesta instância recursal.

Sobre pressuposto processual, colhe-se:

Para que o processo exista e possa tramitar validamente, há necessidade de observar os chamados pressupostos processuais. Os pressupostos processuais, segundo a doutrina já consolidada, são requisitos de existência e validade da relação jurídica processual. Enquanto as condições da ação são requisitos para viabilidade do julgamento de mérito, os pressupostos processuais estão atrelados à validade da relação jurídica processual. Por isso, a avaliação dos pressupostos processuais, em nossa visão, deve anteceder às condições da ação. Não há consenso na doutrina sobre a classificação dos pressupostos processuais. Cada doutrinador acaba adotando um critério diferente. Em nossa visão, com suporte em doutrina já consolidada, são pressupostos processuais de existência da relação processual: a) investidura do juiz: O juiz que irá julgar o processo tem de estar previamente investido na jurisdição, vale dizer: a pessoa que preenche os requisitos previstos na lei constitucional e infraconstitucional para o exercício da magistratura; b) demanda regularmente formulada: A demanda está regularmente formulada quando contém: partes, o pedido, causa de pedir e quando é apresentada em juízo atendendo aos requisitos legais (art. 319 do CPC, e art. 840, da CLT). São pressupostos de validade: a) competência material: Somente poderá julgar o processo o órgão jurisdicional que seja competente em razão da matéria. Se o juiz não tiver competência material para atuar no processo, ele será nulo; b) imparcialidade do juiz: A imparcialidade do juiz é um pressuposto processual de validade do processo. Por isso, caso um juiz impedido atue no processo, ele será nulo. Se o juiz for suspeito, o processo será anulável; c) capacidades das partes: As partes devem ter capacidade para ser parte e para estar em juízo. A capacidade de ser parte é adquirida com o nascimento com vida (capacidade de direito); já a capacidade para estar em juízo (capacidade de fato), somente os absolutamente capazes a possuem nos termos da lei civil, podendo estar em juízo por si sós. Os absolutamente incapazes serão representados em juízo por seus pais, tutores ou curadores. Os relativamente incapazes serão assistidos em juízo. A capacidade de postular em juízo (jus postulandi) é atribuída aos advogados regularmente habilitados na Ordem dos Advogados do Brasil (art. 133 da CF em cotejo com a Lei n. 8.906/94). A lei admite que a parte possa postular em juízo sem a necessidade de advogado se for advogado, no juizado especial civil, para as causas de até 20 salários mínimos (Lei n. 9.099/95) e, na Justiça do Trabalho, quando a controvérsia envolver empregados e empregadores (art. 791 da CLT); d) inexistência de fatos extintivos da relação jurídica processual: Os fatos extintivos provocam a extinção prematura da relação jurídica processual. A doutrina também os denomina de pressupostos processuais negativos, quais sejam: a inexistência de perempção, litispendência, convenção de arbitragem, etc.; e) respeito às formalidades do processo: Os atos processuais devem ser praticados em consonância com os requisitos previstos em lei, sob consequência de nulidade (https://www.trt7.jus.br/escolajudicial/arquivos/files/busca/2015/O_novo_CPC_e_os_pressupostos_processuais_e_condicoes_da_acao.pdf).

Frisa-se que cabe ao relator oportunizar a parte autora sanar a irregularidade conferindo prazo hábil para correção.

Da jurisprudência:

Não encerra abusividade a intimação da parte para demonstrar a regularidade de sua representação processual. Atento ao poder geral de cautela que lhe é próprio, o juízo singular apenas está buscando certeza quanto à efetiva ciência da parte autora da existência de demanda por ela promovida, com todas as implicações daí decorrentes. Não vislumbro qualquer mácula na conduta da magistrada, que, ancorada em recomendações constantes de atos administrativos da Corregedoria-Geral de Justiça - em especial nas demandas do tipo massificadas, como essa - e através de uma exigência que nada tem de dificultosa - apenas visa a salvaguardar o interesse da parte, evitando-lhe sérios prejuízos. APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJRS, Apelação Cível Nº 70075363150, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, j. em 25-10-2017).

Aqui cabe um parênteses, deve imperar no processo o princípio da boa-fé em que "Os sujeitos processuais devem comportar-se de acordo com a boa-fé, que, nesse caso, deve ser entendida como uma norma de conduta ('boa-fé objetiva') 1. Esse é o princípio da boa-fé processual, que se extrai do art. 5º do CPC brasileiro: 'Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé'". [...] É fácil constatar que o princípio da boa-fé é a fonte da proibição do exercício inadmissível de posições jurídicas processuais, que podem ser reunidas sob a rubrica "abuso do direito" processual (desrespeito à boa-fé objetiva). Além disso, o princípio da boa-fé processual torna ilícitas as condutas processuais animadas pela má-fé (sem boa-fé subjetiva). Ou seja, a boa-fé objetiva...

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