Decisão Monocrática Nº 5007074-45.2021.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Comercial, 18-01-2022

Número do processo5007074-45.2021.8.24.0000
Data18 Janeiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Comercial
Classe processualAção Rescisória (Grupo Civil/Comercial)
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Ação Rescisória (Grupo Civil/Comercial) Nº 5007074-45.2021.8.24.0000/

AUTOR: GLOBAL SECURITIZADORA S/A RÉU: MURILO GHISONI BORTOLUZZI RÉU: MAURICIO GHISONI BORTOLUZZI RÉU: REGINA GHISONI BORTOLUZZI

DESPACHO/DECISÃO

GLOBAL SECURITIZADORA S.A. opôs embargos de declaração com efeitos infringentes em face da decisão monocrática que indeferiu a petição inicial e julgou extinta a ação rescisória, sem resolução de mérito.

Afirmou omissão da decisão por deixar de analisar as teses dispostas no item 3.1 da peça inaugural da ação rescisória ("3.1. Da ação rescisória pelo art. 966, V do NCPC. Da inobservância do princípio da adstrição e consubstanciação e do julgamento extra e ultra petita").

Sustentou, ademais, que "a decisão embargada também foi omissa quanto a análise dos seguintes dispositivos legais: Do princípio da segurança jurídica [CF/1988, artigo 5º, inciso XXXVI]; Do princípio da adstrição/congruência [CPC/2015 artigos 141 e 492]; Da necessidade de realizar pedido certo e determinado [CPC/2015, artigos 322 e 324]".

Requereu, ao final, o acolhimento dos aclaratórios para "suprir a omissão apontada, analisando-se o Item 3.1. da Ação Rescisória (Evento 1 - INIC1 - Páginas 6 a 17), momento em que a Embargante Global demonstrou que o acórdão rescindendo trata-se de julgamento extra petita e ultra petita, o que acarreta na nulidade do referido julgado".

É o relatório.

A lei faculta a utilização dos embargos declaratórios para corrigir vícios de fundamentação na decisão judicial, consistentes em obscuridade, contradição, omissão ou erro material (art. 1.022 do CPC).

Os aclaratórios, portanto, constituem recurso sui generis, que não se destina precipuamente a reformar ou anular a decisão judicial, mas a integrá-la ou aperfeiçoá-la com vistas a assegurar uma tutela jurisdicional plena e precisa.

No presente caso, a embargante aduziu ocorrência de omissões na decisão monocrática objurgada, ao argumento de ausência de enfrentamento das teses dispostas no item 3.1 da petição inicial - o qual versou, precipuamente, sobre julgamento extra e ultra petita - bem como por não haver análise de determinados dispositivos legais.

A omissão relaciona-se à amplitude do pronunciamento judicial, uma vez que o oblívio de ponto ou questão sobre o qual o magistrado deveria se manifestar consiste, no limite, em denegação de justiça. Incide no mesmo vício, consoante a lei adjetiva civil, a decisão que ignora os precedentes vinculantes ou contenha defeito de fundamentação.

A partir dessas premissas, verifico que não existe omissão a ser sanada. Isso porque todos os argumentos lançados pela parte embargante foram considerados na ocasião da análise que resultou no indeferimento da petição inicial.

A decisão terminativa decorreu, no ponto ora embargado, do reconhecimento da inexistência dos requisitos de admissibilidade da demanda rescisória (iudicium rescindens) em face da tese de violação manifesta de norma jurídica (art. 966, V, do CPC) apresentada pela embargante.

A leitura do subsequente excerto da decisão embargada afasta qualquer dúvida sobre a existência da mácula apontada pela parte, senão vejamos:

Da violação manifesta de norma jurídica (art. 966, V, do CPC)O Código de Processo Civil prescreve que a decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando violar manifestamente norma jurídica.A afronta ao preceito normativo que deveria regular a situação concreta submetida ao crivo judicial é vício que resulta na inadequação da decisão à ordem jurídica e exige, para a sua correção, a adoção de medida excepcional concebida para eliminar ilegalidades e injustiças graves. Por essa razão, a ação rescisória não pode ser tratada com excessiva liberalidade, sob risco de transmudá-la em nova instância recursal com prazo bienal. Ao se cogitar sobre a rescisão de uma sentença, transita-se entre dois valores fundantes do ordenamento jurídico, os quais invariavelmente caminham juntos: a resposta juridicamente correta e a segurança jurídica, razão de ser da garantia constitucional da coisa julgada.Para ser legítima, portanto, a sindicabilidade da decisão que viola manifestamente norma jurídica deve inicialmente perscrutar, conforme orientação sumular do Supremo Tribunal Federal, se o entendimento adotado na decisão rescindenda se baseou em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais (Súmula 343), porquanto é razoável admitir que o pronunciamento que eventualmente opte por um dos entendimentos em confronto não tem condições de ser qualificado como manifestamente violador da norma de sentido não unívoco.Ao comentar o assunto, Marinoni, Arenhart e Mitidiero transmitem interessante lição calcada na acepção de norma como produto da interpretação do texto:Em um sistema lógico-argumentativo pautado por precedentes (arts. 102, III e 105, III, da CF, e 926 e 927 do CPC), é natural que exista em um dado espaço de tempo diferentes interpretações de um dado dispositivo constitucional ou legal. Como inexiste uma única resposta correta para os problemas interpretativos, é preciso considerar legítima a decisão que, na falta de precedente constitucional ou de precedente federal, confira determinada interpretação que posteriormente não foi sufragada pelas Cortes Supremas. Justamente para proteger o espaço de desacordo interpretativo inerente a um sistema de precedentes, não cabe ação rescisória para desconstituição da coisa julgada quando ao tempo da sua formação havia controvérsia na jurisprudência sobre a questão enfrentada (Súmula 343, STF). Pouco importa a índole constitucional ou federal do debate: em ambas as hipóteses a ação rescisória não é cabível. Vale dizer: quem narra, a título de violação manifesta da ordem jurídica, hipótese em que havia controvérsia jurisprudencial à época da formação da coisa julgada, não narra na realidade hipótese de manifesta violação da ordem jurídica: é por essa razão que a ação rescisória é incabível, porque o demandante nesse caso sequer chega a narrar uma das suas hipóteses típicas de cabimento. Não cabe ação rescisória por manifesta violação de norma jurídica, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais (Súmula 343, STF), ainda que posteriormente tenha se fixado interpretação favorável ao pedido do demandante (Súmula 134, TFR).A ação rescisória constitui remédio extremo e assim não pode ser confundida com mero recurso. Em outras palavras: a sentença que possui interpretação divergente daquela que é estabelecida pela doutrina e pelos tribunais, exatamente pelo fato de que interpretações diversas são plenamente viáveis e lícitas enquanto inexistente precedente constitucional ou federal firme sobre a questão, não abre ensejo para a ação rescisória. A ação rescisória somente é cabível nos casos de ofensa manifesta à norma jurídica. Esse requisito de indiscutibilidade vale, desde a origem do instituto, para qualquer espécie de norma jurídica. Assim, é irrelevante saber a categoria da norma jurídica em discussão (se constitucional ou infraconstitucional), razão pela qual é incorreto admitir ação rescisória no caso em que o Supremo Tribunal Federal conferiu à norma constitucional interpretação divergente daquela que lhe foi dada pela sentença que se pretende rescindir. De outro modo, estar-se-ia legitimando evidente paradoxo no sistema jurídico nacional, em que o ordenamento pátrio autorizaria mais de uma interpretação adequada e aceitável aos textos normativos infraconstitucionais, mas não faria o mesmo com os preceitos constitucionais, para os quais somente uma interpretação seria correta e, por consequência, válida. (Novo Curso de Processo Civil, Vol. 2, 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, p. 465, edição digital).Da mesma ordem de ideais comunga Daniel Amorim Assumpção Neves:Não é qualquer violação da lei que admite o ingresso da ação rescisória, entendendo a melhor doutrina e a jurisprudência que a literal violação exige que no momento de aplicação da norma por meio da decisão judicial não exista interpretação controvertida nos tribunais. Há inclusive súmula nesse sentido. Significa dizer que, se havia polêmica à época da prolação da decisão, ainda que à época da ação rescisória o entendimento tenha se pacificado em torno da tese defendida pelo autor dessa ação, não será possível a desconstituição. Note-se que a divergência deve ser real, ou seja, que efetivamente haja quantidade significativa de decisões fundadas em diferentes interpretações. (Manual de Direito Processual Civil, Volume Único. 10ª ed. rev. amp. e atual. São Paulo: Editora JusPodivm, 2018, p. 1471/1472).No presente caso, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina possui vasta jurisprudência, contemporânea ao julgado rescindendo, que respalda o entendimento adotado pela 3ª Câmara de Direito Comercial:APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA EMITIDA COMO GARANTIA DE CONTRATO DE FACTORING. SENTENÇA DE ACOLHIMENTO DOS EMBARGOS E EXTINÇÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO, PELA INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO (ARTS. 618, I, E 267, IV, AMBOS DO CPC/1973). RECURSO DA EMBARGADA/EXEQUENTE. ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. ANÁLISE DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA QUE INDEPENDE DE PLEITO EXPRESSO DAS PARTES. INTELIGÊNCIA DO ART. 267, § 3º, DO CPC/1973. IRREGULARIDADE DA EXECUÇÃO QUE PODE SER CONHECIDA DE OFÍCIO (ART. 618, I, DO CPC/1973). CASO CONCRETO. NOTA PROMISSÓRIA EMITIDA EM GARANTIA DE CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL. PRÁTICA INCOMPATÍVEL COM A REFERIDA ATIVIDADE. AUSÊNCIA DE OBRIGAÇÃO CERTA, LÍQUIDA E EXIGÍVEL APTA A EMBASAR O PROCEDIMENTO EXECUTÓRIO. PRESSUPOSTOS DE CONSTITUIÇÃO E DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO NÃO PREENCHIDOS. IMPOSITIVA MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Consoante disposição dos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil revogado, e em respeito à congruência da decisão judicial, não pode o Magistrado, ao entregar a prestação jurisdicional, ir além, fora ou aquém dos...

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