Decisão Monocrática Nº 5016869-75.2021.8.24.0000 do Órgão Especial, 07-05-2021

Número do processo5016869-75.2021.8.24.0000
Data07 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5016869-75.2021.8.24.0000/SC

AUTOR: PARTIDO DOS TRABALHADORES SOMBRIO SC MUNICIPAL RÉU: MUNICÍPIO DE SOMBRIO/SC

DESPACHO/DECISÃO

O Partido dos Trabalhadores Sombrio SC Municipal propôs ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, em face do Decreto n. 220, de 23 de novembro de 2020, que estabeleceu o calendário fiscal dos tributos municipais para o exercício de 2020 e deu outras providências, do Decreto n. 221, de 23 de novembro de 2020, que atualizou o valor venal dos imóveis de que trata as tabelas constantes dos anexos VIII e IX do Código Tributário Municipal e o valor de referência para cálculo das taxas e do ISSQN e deu outras providências, e do Decreto n. 79, de 15 de março de 2021, que alterou o Decreto n. 220, de 23 de novembro de 2020, todos do Poder Executivo do Município de Sombrio.

Afirmou a legitimidade do partido político para integrar o polo ativo da ação constitucional, com respaldo no art. 85, V, da Constituição do Estado de Santa Catarina e no art. 2º, V, da Lei Estadual n. 12.069/2001, a competência originária e exclusiva deste Tribunal de Justiça para processar e julgar as ações diretas de inconstitucionalidade das leis e atos normativos estaduais e municipais que afrontam a Carta Estadual, e a tempestividade da demanda, decorrente da impossibilidade de a norma inconstitucional ser convalidada pelo decurso do tempo, consoante posicionamento expresso no julgamento que originou a Súmula 360 do STF.

No mérito, sustentou que o Decreto n. 221, de 23 de novembro de 2020, ao "atualizar elevadamente o valor venal do imóvel em plena pandemia, violou os princípios da capacidade contributiva, não confisco, legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, artigo 145, §1º; 150, inciso IV; 5º, inciso II c/c 60, §4º, inciso IV, todos da Constituição Federal".

Asseverou que a capacidade contributiva "é princípio a ser observado para fins de distribuição da carga tributária levando em consideração a capacidade econômica do contribuinte, devendo se amoldar a situação em que se vivencia o cidadão e a sociedade" e "a capacidade contributiva dos cidadãos sombrienses sofreu - e vem sofrendo - sérios prejuízos em decorrência da pandemia causada pelo COVID-19, sendo o maior deles o desemprego", o que torna a população "cada vez mais indisposta a quitar com tantas contas e impostos que não param de aumentar, e, assim, uma população que já se encontrava em situação precária, agora se encontra cada vez mais perto da inadimplência, tendo que optar entre o sustento da casa ou o custeio de altos impostos".

Defendeu, sob pena de ofensa ao princípio do não-confisco, da razoabilidade e da proporcionalidade, ser "inadmissível que o ente público onere o particular a ponto de cercear o pleno gozo do exercício do direito de propriedade ou outros direitos fundamentais resguardados pela Magna Carta".

Alegou que a atualização de 24,52% sobre o valor venal dos imóveis situados nas localidades delineadas nos anexos VIII e IX do Código Tributário Municipal, com base no que o decreto considerou como variação do Índice Geral de Preços de Mercado nos últimos doze meses (período de dezembro de 2019 a novembro de 2020), desrespeitou parâmetros legais e índices oficiais, pois "o Executivo municipal fez constar erroneamente o período de dezembro de 2019 a novembro de 2020 (11 meses), quando o correto seria dezembro de 2019 a dezembro de 2020 (12 meses), haja vista que 'O percentual de aumento corresponde a variações do IGP-M (Índice Geral de Preços de Mercados) nos últimos doze meses [...]' (Parágrafo Único, Decreto nº 221)", o que deveria resultar no percentual de 23,14%.

Arguiu ofensa ao art. 150, I, da Constituição Federal e art. 128, I, da Constituição Estadual sob o fundamento de que a espécie "não se enquadra na exceção de aumento de tributo pela via do Decreto - quando respeitados os índices oficiais". Citou precedente do Supremo Tribunal Federal, oriundo do julgamento do Recurso Extraordinário 648.245/MG, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com Repercussão Geral reconhecida (Tema 211), do qual destacou que "a orientação assentada na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o valor cobrado a título de imposto sobre propriedade territorial urbana (IPTU) pode ser atualizado, anualmente, independente da edição da lei, desde que o percentual empregado não exceda a inflação acumulada nos doze meses anteriores".

Aduziu que o Prefeito, ao usurpar prerrogativas legais por meio da edição de norma eivada de vício formal de constitucionalidade, ofendeu o princípio da separação dos poderes e violou "os artigos precitados, bem como entendimento pacificado pelo Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário nº 648245/MG, com Repercussão Geral reconhecida pelo Tema 211); e a Súmula 160 do Superior Tribunal de Justiça (STJ)", porquanto o aumentado da base de cálculo do IPTU somente poderia ocorrer mediante a aprovação de lei complementar pela maioria absoluta dos membros da Câmara de Vereadores (arts. 45 e 46 da Lei Orgânica do Município de Sombrio).

Registrou que "o Município de Sombrio feriu gravemente os princípios basilares da Administração Pública, mais especificamente a publicidade e a transparência de seus atos, conforme preceitua o artigo 37 da Constituição Federal e a Lei nº 12.527/2011 (Lei da Transparência)", pois "nos sites oficiais não constam qualquer registro acerca da publicação dos Decretos nº 220 e 221, de 23/11/2020, e Decreto 79, de 15/03/2021". Esclareceu "que as datas de pesquisa levaram em consideração a suposta data de assinatura e publicação das normas contestadas, observando os marcos temporais e os termos contidos no documento versão PDF demonstrando a suposta publicação do Decreto nº 221 em um jornal de circulação da cidade (Jornal Correio do Sul), no dia 09 de dezembro de 2020, entretanto, sem aportar qualquer fonte de acesso ou meio de comunicação oficial para fins de aferir a legitimidade do documento apresentado".

Mencionou que a pandemia gerada pelo coronavírus "vem destruindo de forma avassaladora a economia de governos e seus respectivos cidadãos. No Brasil, os impostos não param de aumentar em decorrência da súbita majoração da inflação, tendo em vista a grande alta de atualização dos índices oficiais", em razão disso "em recentes julgados o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo determinou, na esfera das relações contratuais entre particulares, a alteração do índice a ser utilizado para fins de atualização, impondo a substituição do IGP-M pelo IPCA".

Requereu a concessão de medida cautelar para suspender os efeitos dos decretos a fim de sustar a cobrança do IPTU do ano de 2021 e, ao final, a procedência do pedido para declarar inconstitucional as normas questionadas, com "efeitos ex tunc e erga omnes e, ainda, proíba a atualização do IPTU 2021". Juntou documentos (ev. 1).

Recebidos os autos, determinei a regularização da representação processual, uma vez que a procuração outorgada aos causídicos não conferia poderes específicos para a impugnação dos decretos (ev. 3), o que restou cumprido (ev. 7).

Diante da alegação de "falta de publicidade e transparência dos decretos", reforçada em novo peticionamento (ev. 7), reputei prudente a formação de contraditório mínimo e concedi 24 horas para manifestação da parte demandada (ev. 9).

O Município de Sombrio afirmou que os decretos "foram amplamente divulgados através de publicação em jornal impresso e digital, de circulação diária e abrangência em todos os 15 (quinze) municípios do Vale do Araranguá, especialmente na cidade de Sombrio" e que "é fato que há praticamente 3 (três) meses o tema tem sido matéria de grande discussão em toda a sociedade sombriense, especialmente na Câmara Municipal de Vereadores onde tramitou Decreto Legislativo que buscava revogar referidos atos, com ampla veiculação pelas mídias sociais (Facebook, Instagram e Youtube), outdoors e cobertura pelos órgão de imprensa da região".

Asseverou que o "chefe do executivo municipal ao expedir o Decreto n. 221/2020 apenas cumpriu a legislação municipal vigente, especialmente o Código Tributário Municipal (Lei n. 780/1990), (...) logo, não há que se falar em ato administrativo inconstitucional decorrente da violação ao princípio da separação dos poderes ou afronta a harmonia entre os poderes, posto que o próprio legislador municipal autorizou o chefe do poder executivo a atualizar anualmente o Valor de Referência Municipal (V.R.M.), através do IGP-M, (...) trata-se de um ato administrativo vinculado, ou seja, mesmo se desejasse, o chefe do poder executivo não poderia utilizar outro índice de atualização dos tributos municipais (INPC, IPCA, IGP-DI, IPC-B, INCC), posto que seu ato está completamente adstrito ao que determina a lei municipal", consoante entendimento doutrinário e jurisprudencial.

Aduziu inexistência de confisco e de ofensa à capacidade contributiva, porquanto o impacto do reajuste sobre a base de cálculo do IPTU, utilizando-se como exemplo um imóvel de R$ 150.000,00, atualiza o valor devido de R$ 611,17 em 2020 para R$ 761,02 em 2021, ou seja, resulta em aumento efetivo de aproximadamente R$ 150,00, correspondente a 0,1% sobre o valor venal do imóvel.

Consignou que a administração municipal tem possibilitado ao contribuinte alternativas ao adimplemento de impostos sem prejuízo das necessidades básicas; bem como parcela significativa da população (47,35%), até mesmo superior aos exercícios fiscais pretéritos, já se encontra em dia com as obrigações tributárias.

Arguiu que "o valor venal dos imóveis na cidade de Sombrio para fins tributários é significativamente inferior ao real valor de mercado, posto que a planta genérica de valores encontra-se demasiadamente defasada" e que "os impactos da pandemia também tem influenciado diretamente no orçamento do ente público municipal resultando no aumento significativa das despesas públicas, especialmente na área da...

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