Decisão Monocrática Nº 5027328-19.2020.8.24.0018 do Quarta Câmara de Direito Público, 01-08-2022

Data01 Agosto 2022
Número do processo5027328-19.2020.8.24.0018
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
Classe processualApelação
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Apelação Nº 5027328-19.2020.8.24.0018/SC

APELANTE: MUNICÍPIO DE CHAPECÓ-SC (RÉU) APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) APELADO: ADRYAN COVER CORREA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)

DESPACHO/DECISÃO

Com fulcro nos princípios da celeridade e economia processuais, e por retratar com fidedignidade a tramitação do feito na origem, adota-se, a começar, o relatório elaborado pelo Juízo da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Chapecó na sentença apelada (Evento 230, 1G), in verbis:

Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer ajuizada por ADRYAN COVER CORREA, representado por sua mãe, em face do MUNICÍPIO DE CHAPECÓ e do ESTADO DE SANTA CATARINA, buscando, inicialmente, fornecimento de "terapia ocupacional, fototerapia e hidroterapia".

Na inicial, o autor alegou que foi diagnosticado com "atrasos no desenvolvimento de padrão global, com prejuízo na fala e socialização, bem como motor e traços importantes do espectro do autismo". Narrou que estava há mais de 6 meses aguardando atendimento, sem retorno.

Recebida a inicial, postergou-se a análise acerca do pedido de tutela de urgência para após esclarecimentos pelo réu (evento n. 9).

Os réus apresentaram petição e documentos nos eventos n. 16 e 17.

Na decisão do ev. 19, foi deferida a tutela de urgência, em conformidade com o pedido, isto é, "terapia ocupacional, fototerapia e hidroterapia em favor da autora, na forma prescrita no evento n. 1-OUT13".

Nos ev. 34 e 38, o Estado peticionou solicitando esclarecimentos sobre uma das terapias (fonoterapia ou fototerapia) e a frequência semanal prescrita para cada terapia.

No ev. 44, o autor prestou esclarecimentos, juntando documento médico, nos seguintes termos: "- Terapia Ocupacional 2 (duas) vezes por semana; - Fonoterapia 2 (duas) vezes na semana; - Em relação a hidroterapia, o médico elencou pela substituição pela psicopedagogia, uma por vez por semana para o segundo semestre de 2021, eis que o autor ainda não caminha para realizar a hidroterapia." Requereu a emenda da petição inicial, com retificação dos pedidos, inclusive, para fins de tutela de urgência.

No ev. 47, foi retificada a decisão do ev. 19, para fornecimento de "terapia ocupacional e fonoterapia, ambas 2 (duas) vezes por semana, em favor do autor, na forma prescrita no evento n. 1-OUT13 e ev. 44 (Laudo 2), sob pena de sequestro dos valores necessários ao pagamento do tratamento."

Na sequência sobreveio contestação oferecida pelo Estado de Santa Catarina (ev. 46) e pelo Município de Chapecó (ev. 71).

Réplica no ev. 75.

O Ministério Público se manifestou nos ev. 69 e 79.

O feito foi saneado (ev. 81), tendo sido admitida a alteração de tratamentos no curso do processo.

O Estado de Santa Catarina opôs embargos de declaração (ev. 93) contra a decisão do ev. 81.

Decisão rejeitando os aclaratórios no ev. 99.

No ev. 110, a parte autora requereu novamente a readequação dos tratamentos.

No ev. 124, foi deferida a alteração dos tratamentos para terapia ocupacional, fonoterapia, psicopedagogia e fisioterapia.

Os réus apresentaram complemento às contestações nos ev. 131 e 132.

Réplica no ev. 137.

O Ministério Público se manifestou no ev. 146.

Pelo despacho do ev. 148, as partes foram intimadas para esclarecerem acerca do interesse na produção de provas.

No ev. 162, foi deferida a produção de prova pericial.

Foi apresentado laudo pericial no ev. 214.

A parte autora e o Município réu se manifestaram nos ev. 220 e 223. O Estado réu foi intimado e ficou silente (ev. 226).

O Ministério Público manifestou-se favoravelmente à procedência do pedido (ev. 225).

É o relatório.

Sobreveio a sentença de procedência, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, para o fim de determinar que o Município de Chapecó e o Estado de Santa Catarina forneçam ao autor tratamentos/atendimentos de "terapia ocupacional, fonoterapia, fisioterapia e psicopedagogia", na forma especificada nos documentos médicos do ev. 44 e do ev. 214.

Como consequência, mantenho a tutela de urgência concedida no ev. 19, retificada no ev. 47

Sem custas e despesas processuais (Lei n. 8.069/1990, art. 141, § 2º).

Fixo os honorários advocatícios em favor da parte autora no valor de R$ 1.400,00, a serem pagos metade por cada réu (CPC, art. 85, § § 2.º e 8.º).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Oportunamente, arquivem-se.

Inconformado, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação, alegando, em resumo, que não há omissão estatal, porquanto o procedimento está padronizado nas políticas públicas para ente federado diverso e o paciente se acha devidamente cadastrado em fila de espera no Sistema Único de Saúde (SUS), que deve ser respeitada, e que houve violação à reserva do possível. Aduziu, ainda, que a parte autora não demonstrou urgência e que os honorários advocatícios merecem minoração, por se tratar de obrigação de fazer sem possibilidade de mensuração do proveito econômico. Requereu, ao final, o conhecimento e o provimento do recurso para declarar a improcedência do pedido, com a inversão do ônus sucumbencial ou, subsidiariamente, o arbitramento dos honorários advocatícios em valo fixo não superior a R$ 1.000,00 (Evento 240, 1G).

Também irresignado, o Município de Chapecó apelou, ao argumento, em resumo, da ausência de justificativa para desrespeito à fila de espera, ofensa à isonomia e que, de acordo o Tema 793/STF, deve ser direcionado o cumprimento da obrigação ao ente estadual, ressaltando que o autor foi incluído em fila de espera organizada e mantida pelo Estado (Evento 249, 1G).

Após as contrarrazões (Evento 244 e 253, 1G), os autos ascenderam a esta Corte, tendo lavrado parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Alexandre Herculano Abreu, pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (Evento 8, Eproc 2º Grau).

É o relatório.

Decido monocraticamente, amparada no disposto no art. 932, V e VIII, do Código de Processo Civil (CPC) e art. 132, inc. XVI, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, eis que se trata de matéria pacífica na jurisprudência desta Corte de Justiça.

Quanto à admissibilidade, por serem próprios e tempestivos, os recursos são conhecidos.

Quanto ao juízo de admissibilidade, por serem tempestivos e próprios, merecem ser conhecidos os recursos.

O ente estadual apelante, em linhas gerais, sustenta que não pode haver burla à fila de espera, na qual o autor se acha devidamente cadastrado no Sistema Único de Saúde (SUS, não há demonstração de urgência e que os honorários advocatícios devem ser arbitrados em quantia fixa.

O Município de Chapecó também argumenta, em resumo, que não é possível desrespeitar a fila de espera e que a obrigação há de ser direcionada ao ente estadual.

O recursos comportam parcial acolhimento, adianto.

Por primeiro, cumpre ressaltar que o Grupo de Câmaras de Direito Público deste Sodalício, motivado pelo contexto da judicialização na área da saúde, instaurou o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR - de n. 0302355.11.2014.8.24.0054/50000, de relatoria do nobre Des. Ronei Danielli, o qual foi julgado em 09-11-2016, com o estabelecimento das seguintes teses jurídicas:

1.1 Para a concessão judicial de remédio ou tratamento constante do rol do SUS, devem ser conjugados os seguintes requisitos: (1) a necessidade do fármaco perseguido e adequação à enfermidade apresentada, atestada por médico; (2) a demonstração, por qualquer modo, de impossibilidade ou empecilho à obtenção pela via administrativa (Tema 350 do STF). 1.2 Para a concessão judicial de fármaco ou procedimento não padronizado pelo SUS, são requisitos imprescindíveis: (1) a efetiva demonstração de hipossuficiência financeira; (2) ausência de política pública destinada à enfermidade em questão ou sua ineficiência, somada à prova da necessidade do fármaco buscado por todos os meios, inclusive mediante perícia médica; (3) nas demandas voltadas aos cuidados elementares à saúde e à vida, ligando-se à noção de dignidade humana (mínimo existencial), dispensam-se outras digressões; (4) nas demandas claramente voltadas à concretização do máximo desejável, faz-se necessária a aplicação da metodologia da ponderação dos valores jusfundamentais, sopesando-se eventual colisão de princípios antagônicos (proporcionalidade em sentido estrito) e circunstâncias fáticas do caso concreto (necessidade e adequação), além da cláusula da reserva do possível. 2. Aplicação ao caso concreto: 2.1 Recursos do Município e do Estado conhecidos e parcialmente providos para excluir da condenação o fornecimento dos fármacos não padronizados.

Ao contrário do alegado pelos recorrentes, a necessidade do tratamento está suficientemente demonstrada, especialmente pelo longo período em que o infante aguardava o atendimento, sem previsão para início, o qual, no ajuizamento da ação, constava com menos de dois anos de vida, assim como pelo laudo pericial que aponta que a ausência do tratamento "retarda de forma significativa o ganho de habilidades psicossociais e cognitivas, podendo dificultar a socialização e piorar a qualidade de vida do requerente", conforme, com acerto, assentou a togada a quo, in verbis:

No caso dos autos, em que se pretende o fornecimento de tratamentos padronizados pelo Sistema Único de Saúde, é necessário demonstrar que o tratamento perseguido é adequado à enfermidade apresentada, bem como a impossibilidade ou empecilho à obtenção pela via administrativa. Não é necessária a demonstração da hipossuficiência financeira.

Os tratamentos de saúde buscados pelo autor (ev. 110 e ev. 124), de terapia ocupacional, fonoterapia e fisioterapia, bem como o atendimento em psicopedagogia, conforme consta nos documentos médicos trazidos na inicial (ev. 1, doc. 13, p. 9), no ev. 44 (doc. 2), bem como no laudo pericial (ev. 214) são aptos a tratar a patologia narrada na inicial, sendo imprescindíveis à criança, que tem atualmente 3 anos de idade (primeira infância), sob pena de prejuízos...

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