Decisão Monocrática Nº 5031502-57.2022.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Público, 08-06-2022

Número do processo5031502-57.2022.8.24.0000
Data08 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualMandado de Segurança Cível
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Mandado de Segurança Cível Nº 5031502-57.2022.8.24.0000/SC

IMPETRANTE: BOSTON SCIENTIFIC DO BRASIL LTDA IMPETRADO: ESTADO DE SANTA CATARINA IMPETRADO: SECRETÁRIO DE SAÚDE - ESTADO DE SANTA CATARINA - FLORIANÓPOLIS IMPETRADO: SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE

DESPACHO/DECISÃO



1. Relatório

Cuida-se de Mandado de Segurança, impetrado por Boston Scientific do Brasil, contra ato acoimado de ilegal, supostamente atribuído ao Secretário de Estado da Saúde de Santa Catarina.

Narrou, em apertada síntese, que, no âmbito do Pregão Eletrônico n. 576/2022, a autoridade supostamente coatora desclassificou o ora impetrante sob o argumento de que este teria tido suspenso o seu direito de licitar e/ou contratar com a Administração Pública, uma vez que a referida sanção lhe foi aplicada pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal.

Argumentou, todavia, que consta da condenação, taxativamente, que a pena sofrida tem aplicação restrita ao Distrito Federal.

Nesse sentido, asseverou que o ato impugnado é manifestamente ilegal e fere direito líquido e certo, argumentando, ademais, que, com a sua indevida desclassificação, "o Estado de Santa Catarina está, na prática, renunciando à proposta vantajosa apresentada na licitação".

Desta forma, pugnou pela concessão da ordem in limine litis e, ao final, pela sua confirmação com a decisão de mérito, a fim de que declarar legítima a sua participação no certame.

Vieram conclusos em 08/06/2022.

É o essencial.

2. Fundamentação

2.1 Admissibilidade

Ressalta-se que a autoridade ora apontada como coatora é legítima para atuar no polo passivo do feito, pois é responsável direto pela prática do ato impugnado ou por sua correção, conforme dispõe o Enunciado I do Grupo de Câmaras de Direito Público.

Assim sendo, preenchidos os pressupostos necessários, conheço do presente remédio constitucional.

2.2 Mérito

Cuida-se de Mandado de Segurança, impetrado por Boston Scientific do Brasil, contra ato acoimado de ilegal, supostamente atribuído ao Secretário de Estado da Saúde de Santa Catarina.

A concessão de medida de urgência autorizada pelo art. 7º, inciso III, da Lei Federal n. 12.016, de 07.08.2009), segundo Hely Lopes Meirelles, não se presta como antecipação dos efeitos da sentença, tampouco afirma direitos, haja vista que seu desiderato é o de tão somente tutelar provisoriamente a eficácia da ordem judicial, se concedida ao final da causa:

"A medida liminar é provimento cautelar admitido pela própria lei de mandado de segurança quando sejam relevantes os fundamentos da impetração e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da ordem judicial, se concedida a final (art. 7º, III).

Para a concessão da liminar devem concorrer os dois requisitos legais, ou seja, a relevância dos motivos em que se assenta o pedido na inicial e a possibilidade da ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito fumus boni juris e periculum in mora. A medida liminar não é concedida como antecipação dos efeitos da sentença final, é procedimento acautelador do possível direito do impetrante, justificado pela iminência de dano irreversível de ordem patrimonial, funcional ou moral se mantido o ato coator até a apreciação definitiva da causa.

Por isso mesmo, não importa prejulgamento; não afirma direitos; nem nega poderes à Administração. Preserva, apenas, o impetrante de lesão irreparável, sustando provisoriamente os efeitos do ato impugnado. [...] "A liminar não é uma liberalidade da Justiça; é medida acauteladora do direito do impetrante, que não pode ser negada quando ocorrem seus pressupostos como, também, não deve ser concedida quando ausentes os requisitos de sua admissibilidade" (Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, 'habeas data', ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade. 26e., São Paulo: Malheiros, 2003. p. 76/77).

No caso em apreço, adianto que não vislumbro o preenchimento dos requisitos necessários para concessão da medida liminar.

Isso porque a questão, como bem delineada na exordial, é interpretativa, de modo que a decisão administrativa, ora impugnada, vai ao encontro da jurisprudência dominante nesta Corte de Justiça e no Superior Tribunal de Justiça.

O Desembargador Jaime Ramos, nos autos de n. 4023484-22.2018.8.24.0900, ao analisar pleito muito semelhante, firmou entendimento do qual coaduno, motivo pelo qual, até mesmo para evitar desnecessária tautologia, cito da fundamentação, para que figure como ratio decidendi, in verbis:

[...]

A impetrante busca a concessão da ordem para determinar que o Secretário de Estado da Educação, que considerou a empresa Blunac Distribuidora EIRELI habilitada para participar da licitação de que trata o Edital n. 15/2018 (pregão eletrônico), para aquisição e entrega de materiais para pintura, "se abstenha de assinar e/ou executar o contrato administrativo", porque referida empresa está temporariamente impedida de participar da licitação e de contratar com a Administração Pública, em razão das penas de suspensão que lhe foram aplicadas.

Então, a controvérsia restringe-se em saber se a empresa Blunac Distribuidora EIRELI, a quem foram aplicadas diversas penas de suspensão, impedindo-a de contratar com a Administração Pública, poderia, ou não, ter sido considerada habilitada para participar da licitação de que trata o Edital 15/2018 (pregão eletrônico), da Secretaria de Estado da Educação.

[...]

MARÇAL JUSTEN FILHO, acerca do assunto, ensina:

"16) Administração Pública

"A expressão é utilizada em acepção ampla e não deve ser identificada com 'Poder Executivo'. Indica as pessoas de direito público que participam de uma contratação, ainda quando essa contratação se efetive através de órgãos do Poder Judiciário ou do Poder Legislativo. Além da chamada 'Administração Direta' (União, Estados e Distrito Federal, Municípios), a expressão também abrange a 'Administração Indireta' (autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista). Além disso, as 'fundações' instituídas ou mantidas com recursos públicos e outras pessoas de direito privado sob controle estatal estão abarcadas no conceito.

"17) Administração

"A expressão isolada é utilizada para identificar a unidade específica que, no caso concreto, está atuando. A distinção entre Administração Pública e Administração é utilizada em algumas passagens na disciplina da Lei n. 8.666. A hipótese de maior relevância encontra-se no art. 87, incs. III e IV, a propósito das sanções de suspensão temporária do direito de licitar ou de contratar e de declaração de inidoneidade. A questão será mais bem examinada nos comentários pertinentes" (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15. ed., São Paulo: Dialética, 2012, p. 142).

No que diz respeito ao alcance da suspensão do direito de licitar e contratar, aplicada com base no art. 87, inciso III, da Lei Federal n. 8.666/1993, MARÇAL JUSTEN FILHO anotou:

"12) A suspensão temporária e a declaração de inidoneidade

"As sanções dos incs. III e IV são extremamente graves e pressupõem a prática de condutas igualmente sérias.

"[...]

"12.2) Distinção entre as figuras dos incs. III e IV

"Tem de partir-se do princípio de que seria um despropósito reputar que ambas as sanções são idênticas e intercambiáveis entre si: afinal, é evidente a vontade legislativa de instituir as duas figuras distintas.

"Cabe, então, um grande esforço hermenêutico para diferenciar as figuras da suspensão temporária do direito de licitar e contratar com a Administração Pública (inc. III) e da declaração de inidoneidade (inc. IV).

"[...]

"12.2.3) A distinção fundada na interpretação literal.

"A distinção mais evidente entre as duas figuras [dos incisos III e IV] envolve uma interpretação literal, fundada nas definições adotadas pelos incisos XI e XII do art. 6º da Lei. A suspensão do direito de licitar produziria efeitos no âmbito da entidade administrativa que a aplicasse, enquanto a declaração de inidoneidade alcançaria todos os órgãos da Administração Pública. Essa interpretação deriva da redação legislativa, pois o inc. III utiliza apenas o vocábulo 'Administração', enquanto o inc. IV contém 'Administração Pública'.

"No entanto, pode-se contrapor que a lógica excluiria o cabimento de sancionamento ao sujeito no estrito âmbito de um único e determinado sujeito administrativo. Se o agente apresenta desvios de conduta que o inabilitam para contratar com um determinado sujeito administrativo, os efeitos dessa ilicitude teriam de se estender a toda a Administração Pública. Assim se passa porque a prática do ato reprovável, que fundamentou a imposição da sanção de suspensão do direito de licitiar e contratar, evidencia que o infrator não é merecedor de confiança.

"Um exemplo prático permite compreender o raciocínio. Suponha-se que o contratado deixe de adimplir às obrigações assumidas num contrato de empreitada de obra pública. Entrega à Administração uma obra defeituosa. Sancionado com a suspensão do direito de licitar, estaria ele livre para contratar com outros entes da Administração Pública? Reputa-se que a resposta...

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