Decisão Monocrática Nº 5037699-96.2020.8.24.0000 do Primeira Câmara de Direito Civil, 29-03-2021

Número do processo5037699-96.2020.8.24.0000
Data29 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoDecisão Monocrática
Agravo de Instrumento Nº 5037699-96.2020.8.24.0000/SC

AGRAVANTE: ACAO SOCIAL SAO FRANCISCO DE ASSIS ADVOGADO: MATHEUS KRUGER SANTIN (OAB SC045249) ADVOGADO: JOAO CARLOS SANTIN (OAB SC009377) AGRAVADO: ASSOCIACAO CATARINENSE DE EMISSORAS DE RADIO E TELEVISAO DE SANTA CATARINA - ACAERT ADVOGADO: EMERSON RONALD GONÇALVES MACHADO (OAB SC018691) MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

DESPACHO/DECISÃO

I - Na Comarca de Palhoça, Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão - ACAERT ajuizou ação cominatória em face de Ação Social São Francisco de Assis (autos n. 5004645-04.2020.8.24.0045).

Em suma, a pretensão da ACAERT cinge-se em obstar a ré a realizar atos de concorrência desleal, especificamente: a) proibir a rádio comunitária de veicular propagandas de natureza comercial - restringindo-se somente ao que se entende como Apoio Cultural, conforme legislação vigente; b) obrigar a ré, ao divulgar seus patrocinadores, que revele somente o nome, telefone e endereço dos apoiadores, respeitando a restrição da cobertura ao raio de 1 km a partir da antena de transmissão, conforme prevê a Lei 9.612/1998 e o Decreto n. 2.615/1998; c) coibir contratações da rádio comunitária com o Poder Público.

O agravo de instrumento investe contra a decisão em que o Magistrado singular deferiu parcialmente a antecipação dos efeitos da tutela, nos seguintes termos (EVENTO 14):

Em síntese, alega que a ré, atua com o serviço de radiofusão comunitária e, "vem sistematicamente descumprindo as normas regulamentares de regência da outorga e concessão dos serviços, em razão de vender publicidade em seus anúncios, contratar com a administração pública e ainda extrapolar os limites de abrangência do seu respectivo raio de outorga" [EV. 01, INIC1 (p. 01)]; que em razão disso, ocasiona severos prejuízos comerciais às rádios da região que atuam sobre os preceitos e ditames legais; que é vedada às rádios comunitárias transmitirem propaganda ou publicidade comercial com finalidade econômica; que, além disso, a menção aos patrocinadores deve observar o raio de cobertura de 1 km a partir da antena de transmissão, conforme prevê a Lei 9.612/1998 e o Decreto n.º 2.615/1998; que a acionada também mantém contratos com a Administração Pública, em latente ilegalidade; que tudo isso acarreta a prática de concorrência desleal em detrimento das rádios comerciais.

A título de tutela de urgência, requereu:

Vieram-me os autos conclusos.

1) Prejudicada a análise do pedido de juntada do pen drive [EV. 01, INIC1 (p. 17, item "III")], porque as mídias, aparentemente, foram protocoladas no sistema EPROC no EV. 01, ÁUDIO6 e ÁUDIO7.

2) Prevê o art. 223 da CRFB:

"Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal."

Ao comentar o referido dispositivo, a Doutrina faz menção a Lei n.º 9.612/1998 que instituiu o serviço de radiodifusão comunitária:

"O serviço de radiodifusão é público e, portanto, de acordo com o art. 175 da CF, incumbe ao Poder Público, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre por meio de licitação, a prestação dos serviços públicos. Por óbvio, de acordo com a necessidade de expansão, a iniciativa privada participa do serviço que, apesar disso, continua sendo público. Desse modo, o Poder Público sempre será aquele que deverá, de acordo com os parâmetros constitucionais e legais, verificar a obediência dos prestadores aos dispositivos normativos e, em caso de descumprimento, aplicar as sanções legais. Deve ser citado, ainda, que a Lei n. 9.612/98 instituiu o Serviço de Radiodifusão Comunitária, operada em baixa potência e cobertura restrita, outorgada a fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos, com sede na localidade de prestação do serviço." [Melo, Adriana Zawada [Constituição Federal interpretada: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo 10ª ed. Editora Manole, 2019. Minha Biblioteca. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books /9788520460269/] (grifei)

Dispõem os arts. 3.º e 18 da Lei n.º 9.612/98:

"Art. 3º O Serviço de Radiodifusão Comunitária tem por finalidade o atendimento à comunidade beneficiada, com vistas a:I - dar oportunidade à difusão de idéias, elementos de cultura, tradições e hábitos sociais da comunidade;II - oferecer mecanismos à formação e integração da comunidade, estimulando o lazer, a cultura e o convívio social;III - prestar serviços de utilidade pública, integrando-se aos serviços de defesa civil, sempre que necessário;IV - contribuir para o aperfeiçoamento profissional nas áreas de atuação dos jornalistas e radialistas, de conformidade com a legislação profissional vigente;V - permitir a capacitação dos cidadãos no exercício do direito de expressão da forma mais acessível possível."

"Art. 18. As prestadoras do Serviço de Radiodifusão Comunitária poderão admitir patrocínio, sob a forma de apoio cultural, para os programas a serem transmitidos, desde que restritos aos estabelecimentos situados na área da comunidade atendida."

Prevê o art. 6.º do Decreto n.º 2.615/1998, ao regulamentar a cobertura de uma emissora de radiofusão comunitária:

"Art. 6º. A cobertura restrita de uma emissora do RadCom é a área limitada por um raio igual ou inferior a mil metros a partir da antena transmissora, destinada ao atendimento de determinada comunidade de um bairro, uma vila ou uma localidade de pequeno porte."

No caso concreto, a demandante imputa as seguintes infrações à acionada: I) propagandas comerciais; II) transmissão de patrocinadores além do raio de 1 km a partir da antena de transmissão; III) contratação com o poder público.

No tocante à proibição de contratar com o poder público, a demandante não colacionou qualquer elemento de prova favorável à sua versão (CPC, art. 373, I).

Em relação à transmissão de propagandas comerciais e patrocinadores fora do raio de 1 km, apresentou as mídias do EV. 01, ÁUDIO6 e ÁUDIO7, bem como imagens do google earth [EV. 01, INIC1 (p. 10)], as quais respaldam o relato de violação da legislação de regência e atestam a verossimilhança das alegações contidas na peça de ingresso.

A Lei 9.612/1998 e o Decreto n.º 2.615/1998 estabelecem, de forma muito clara e precisa, que as rádios comunitárias não podem veicular anúncios (propagandas) de natureza comercial; podem divulgar apenas patrocínios, sob a forma de apoio cultural, para os programas transmitidos, desde que restritos aos estabelecimentos dentro de sua área de cobertura (1.000 metros a partir da antena de transmissão).

Nesse rumo, já se pronunciou o Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

A prova encartada aos autos, não há como negar, revela que a agravante, na sua programação normal, transmite propagandas com conteúdo publicitário, de cunho inequivocamente comercial, como se observa da mídia envolvendo os anunciantes [...].Tal prática é absolutamente vedada às rádios comunitárias, estando em absoluto descompasso com a norma timbrada no art. 18 da Lei n. 9.612/98:

"Art. 18. As prestadoras do Serviço de Radiodifusão Comunitária poderão admitir patrocínio, sob a forma de apoio cultural, para os programas a serem transmitidos, desde que restritos aos estabelecimentos situados na área da comunidade atendida." (Grifei).

O "patrocínio" a que alude a norma suso transcrita não se confunde, obviamente, com a propaganda comercial, justo que o "apoio cultural" que obrigatoriamente deve ornar a veiculação admitida pela lei possui clara delimitação no item 3.1 da Portaria nº 462/2011 do Ministério de Estado das Comunicações, revelando-se pela "...divulgação de mensagens institucionais para pagamento dos custos relativos à transmissão da programação ou de um programa específico, em que não podem ser propagados bens, produtos, preços, condições de pagamento, ofertas, vantagens e serviços que, por si só, promovam a pessoa jurídica patrocinadora, sendo permitida a veiculação do nome, endereços físico e eletrônico e telefone do patrocinador situado na área de execução do serviço" (Grifei).

Inequivocamente, a prova apresentada pela agravada, cujo conteúdo sequer foi impugnado pela agravante, demonstra que a propaganda transmitida pela rádio comunitária recorrente não guarda qualquer observância a tais balizamentos.

Acresça-se, nesse âmbito, que o art. 40, inc. XV, do Decreto 2.615/98, que aprova o Regulamento do Serviço de Radiodifusão Comunitária, é enfático ao dispor sobre a inviabilidade da divulgação de propagandas, como aquelas transmitidas pela agravante. Veja-se:

"Art. 40. São puníveis com multa as seguintes infrações na operação das emissoras...

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