Direitos e deveres dos motoristas profi ssionais de maneira geral

AutorTereza Aparecida Asta Gemignani, Daniel Gemignani
Páginas96-148
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DIREITOS E DEVERES DOS MOTORISTAS
PROFISSIONAIS DE MANEIRA GERAL
O art. 2º da Lei n. 12.619/2012 foi revogado pelo art. 21 da Lei n. 13.103/2015 que, em
seu art. 2º passou a tratar dos direitos dos motoristas prof‌i ssionais em geral.
Referido dispositivo legal, contudo, não é exaustivo ante o marco protetivo mais
amplo, constitucionalmente assegurado pelos arts. 6º a 11º, que disciplinam os direitos
sociais fundamentais — Capítulo II do Título II da CF/1988 — e os discriminados entre os
arts. 194 a 204, que tratam da seguridade social — Capítulo II do Título VIII da CF/1988.
Com efeito, seja com o controle de jornada (limites de duração, intervalos, tempo de
direção), seja com vedação a modalidades remuneratórias que incentivem a exposição
dos motoristas a riscos que possam comprometer a saúde e a segurança, seja pela exigên-
cia de implantação de programas de gerenciamento de riscos, a interpretação da Lei
n. 13.103/2015 não pode se afastar da senda principal, aberta pela Lei n. 12.619/2012
quanto à importância de redução das situações de risco e de incentivo a condutas de
prevenção, questões que passaremos a analisar de forma mais detalhada.
4.1. O ACESSO GRATUITO A PROGRAMA DE FORMAÇÃO E
APERFEIÇOAMENTO PROFISSIONAL E ATENDIMENTO
PROFILÁTICO, TERAPÊUTICO E REABILITADOR — ART. 2º,
INCISOS I, II E IV DA LEI N. 13.103/2015
O novo preceito legal realça a necessidade de aperfeiçoamento e treinamento con-
tínuo dos motoristas prof‌i ssionais. Assim, em cotejo com a disposição anterior da Lei
n. 12.619/2012, tem-se:
I — ter acesso gratuito a programas de formação e
aperfeiçoamento profissional, em cooperação com
o poder público;
I — ter acesso gratuito a programas de formação e
aperfeiçoamento profissional, preferencialmente me-
diante cursos técnicos e especializados previstos
setembro de 1997 — Código de Trânsito Brasileiro,
normatizados pelo Conselho Nacional de Trânsito
— CONTRAN, em cooperação com o poder público;
II — contar, por intermédio do Sistema Único de Saú-
de — SUS, com atendimento profilático, terapêutico
e reabilitador, especialmente em relação às enfermi-
dades que mais os acometam, consoante levanta-
mento oficial, respeitado o disposto no art. 162 da
II — contar, por intermédio do Sistema Único de Saúde
— SUS, com atendimento profilático, terapêutico, reabi-
litador, especialmente em relação às enfermidades que
mais os acometam;
IV — contar com serviços especializados de medi-
cina ocupacional, prestados por entes públicos ou
privados à sua escolha;
OBS: Os grifos indicam as novidades do texto da Lei n. 13.103/2015.
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Tais dispositivos têm por f‌i nalidade preservar as condições de segurança e resguar-
dar a vida e a integridade física não só dos motoristas prof‌i ssionais, mas também de
terceiros, sejam os passageiros transportados, sejam os demais usuários da malha viária.
Estes direitos têm como responsáveis por sua implementação não somente os emprega-
dores, mas também os tomadores de serviço, aos quais cabe não só ministrar, mas
também possibilitar o acesso a cursos de formação e aperfeiçoamento, exigindo a cons-
tante atualização desses prof‌i ssionais.
Novidade trazida pela nova lei é a preferência por cursos técnicos e especializados
previstos no CTB(138), normatizados pelo CONTRAN. Visa-se, com isso, a uniformização
de conteúdos e a facilitação da f‌i scalização da sua qualidade, possibilitando meios e pa-
râmetros de controle.
Contudo, imperioso interpretar o dispositivo legal não apenas sob a perspectiva do
trânsito, mas principalmente da saúde e segurança do trabalho. Restringir o alcance de
tão importante previsão legal é fechar os olhos para os riscos a que estão sujeitos os mo-
toristas prof‌i ssionais, bem como o risco que esses prof‌i ssionais, quando despreparados,
representam para toda a sociedade.
Como exemplo, pode-se citar o estudo da OIT titularizado por Bruce A. Millies, ao
destacar(139):
Los accidentes de los vehículos a motor constituyen uno de lós riesgos más
graves con que se enfrentan los conductores de camiones y autobuses. Este
riesgo se agrava si el mantenimiento del vehículo no es el adecuado, sobre
todo si los neumáticos están desgastados o el sistema de frenos falla. La fatiga
provocada por horarios de trabajo prolongados o irregulares o por otros facto-
res de estrés aumenta la probabilidad de accidente. Una velocidad excesiva o
el transporte de cargas con pesos superiores a lo aconsejable agravan la situa-
ción, al igual que el tráf‌i co denso y las condiciones meteorológicas adversas,
que disminuyen la tracción y la visibilidad. (...)
Los conductores afrontan diversos riesgos ergonómicos. Los más obvios son
las lesiones de espalda y de otro tipo por levantamiento de grandes pesos o
por emplear técnicas de izado inadecuadas. (...)
Con frecuencia, los asientos del conductor están mal diseñados y no disponen
de medios de ajuste para mejorar el apoyo y la comodidad en períodos prolon-
gados, lo que da lugar a molestias de espalda y daños musculares y óseos. (...)
Los conductores corren el riesgo de sufrir pérdidas auditivas por exposición
prolongada al fuerte ruido emitido por el motor. (...)
Algunos camioneros están expuestos a riesgos de carácter químico, radiactivo
o biológico asociados con la carga que transportan. (...).
(138) Assim preceitua o art. 145, inciso IV do CTB: “Art. 145. Para habilitar-se nas categorias D e E ou para condu-
zir veículo de transporte coletivo de passageiros, de escolares, de emergência ou de produto perigoso, o candidato
deverá preencher os seguintes requisitos: IV — ser aprovado em curso especializado e em curso de treinamento de
prática veicular em situação de risco, nos termos da normatização do CONTRAN.”.
(139) Enciclopédia em saúde e segurança do trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT) 102 — “In-
dustria del transporte y el almacenamiento”, Diretor do capítulo LaMont Byrd, que, em seu ponto “Transporte por
carretera”, Bruce A. Millies, p. 102.25.
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Portanto, a questão joga luz sobre a necessidade de treinamento do motorista pro-
f‌i ssional não só quanto às questões de trânsito, mas também em relação às questões que
envolvem a saúde e a segurança própria e de terceiros.
Neste passo, nos termos das Normas Regulamentadoras n. 7, 9 e 17(140) do então
Ministério do Trabalho, surge a necessidade de orientar os motoristas prof‌i ssionais a
respeito do controle dos riscos ambientais relacionados à carga transportada, às medidas
de controle em caso de acidente e demais situações adversas, bem como as relativas a
condições ergonômicas inadequadas a que podem estar submetidos, tendo como norte
os incisos II e VIII do art. 200 da CF/1988, de modo que tal controle deve ser coordenado
com avaliação médica específ‌i ca, individual e coletiva desses trabalhadores, a f‌i m de
detectar, preventivamente, a existência de situações que os exponham, ou exponha ter-
ceiros, a situações de risco.
Importante, também, trazer à discussão a previsão do art. 147, § 3º, do CTB, que
dispõe:
Art. 147. O candidato à habilitação deverá submeter-se a exames realizados pelo órgão executivo de
trânsito, na seguinte ordem:
§ 2º O exame de aptidão física e mental será preliminar e renovável a cada cinco anos, ou a cada três
anos para condutores com mais de sessenta e cinco anos de idade, no local de residência ou domicílio
do examinado.
§ 3º O exame previsto no § 2º incluirá avaliação psicológica preliminar e complementar sempre que a
ele se submeter o condutor que exerce atividade remunerada ao veículo, incluindo-se esta avaliação
para os demais candidatos apenas no exame referente à primeira habilitação.
Assim, para os motoristas prof‌i ssionais empregados, deve constar do Programa de
Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) todo o instrumental clínico epidemio-
lógico voltado à prevenção, nos termos delineados pela Norma Regulamentadora n. 7 do
Ministério do Trabalho.
Conforme assentamos em trabalho diverso(141), faz-se o seguinte registro:
Neste ponto, interessantes são os apontamentos de Luiz Antonio Rabelo Ro-
cha, que assim aduz(142):
Para a elaboração/construção do Programa de Controle Médico de Saúde Ocu-
pacional em qualquer empresa, é necessário que tenhamos alguns dados que
são essenciais para a concretização do pretendido programa: o conhecimento
detalhado da população trabalhadora que será alvo de suas ações, a avaliação
mais aprofundada dos riscos ocupacionais envolvidos nas atividades desen-
volvidas por aqueles trabalhadores, tudo isso após visita técnica do médico
aos locais de trabalho para verif‌i cação in loco das diversas tarefas, do f‌l uxogra-
ma de produção ou da organização do trabalho, do clima psico-organizacional
existente na empresa, além de outros aspectos, como jornada e descanso.
(140) Mencionadas normas regulamentam, respectivamente, o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacio-
nal (PCMSO), o Programa de Riscos Ambientais Relacionados ao Trabalho (PPRA) e a Análise Ergonômica do
Trabalho (AET).
(141) GEMIGNANI, Daniel. Pausas como instrumento de saúde e segurança do trabalho — As pausas no meio rural,
em empresas de abate e processamento de carnes e derivados e de mecanografistas, digitadores, telefonistas e
operadores de telemarketing. In: GEMIGNANI, Daniel; GEMIGNANI, Tereza Aparecida Asta. Direito constitucional
do trabalho: da análise dogmática à concretização de questões polêmicas. São Paulo: LTr, 2014. p. 102-103.
(142) ROCHA, Luiz Antonio Rabelo. PCMSO, teoria e prática. São Paulo: LTr, 2011. p. 31.

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