Dos responsáveis secundários na execução no processo do trabalho (hipóteses típicas)

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP
Páginas181-219

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3.1. Sucessão de empresas (empregadores)

Nas palavras de Coviello6, sucessão, em sentido jurídico, consiste na substituição de uma pessoa por outra na mesma relação jurídica: a identidade da relação e a diversidade dos sujeitos caracterizam a verdadeira sucessão.

Sob o enfoque trabalhista, conceitua Mauricio Godinho Delgado7:

Sucessão de empregadores é figura regulada pelos arts. 10 e 448 da CLT. Consiste no instituto justrabalhista em virtude do qual se opera no contexto da transferência de titularidade de empresa ou estabelecimento, uma completa transmissão de crédito e assunção de dívidas trabalhistas entre alienante e adquirente envolvidos. (grifos do autor)

Alguns doutrinadores preferem utilizar a expressão sucessão de empregadores8, pois a alteração se dá em face do empregador, e não da empresa que continua. Outros sustentam a possibilidade de haver sucessão de empresas9.

Segundo a melhor doutrina, a sucessão trabalhista, disciplinada nos arts. 10 e 448 da CLT, tem fundamento nos princípios da continuidade do contrato de trabalho, despersonalização do empregador e na inalterabilidade do contrato de trabalho. Por isso, quem responde pelo crédito trabalhista é a empresa, e não quem esteja no seu comando.

Dispõe o art. 10 da CLT:

Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.

No mesmo sentido é o art. 448 da CLT:

A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.

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Como bem adverte Wagner D. Giglio10, "responsável pelo pagamento da condenação é, portanto, a empresa, ou seja, o conjunto de bens materiais (prédios, máquinas, produtos, instalações etc.) e imateriais (crédito, renome etc.) que compõe o empreendimento. São esses bens que, em última análise, serão arrecadados através da penhora, para satisfazer a condenação, pouco importando quais são as pessoas físicas detentoras ou proprietárias deles".

São hipóteses típicas de sucessão para fins trabalhistas: a transferência de titularidade da empresa, fusão, incorporação e cisão de empresas, contratos de concessão e arrendamento e também as privatizações de antigas estatais.

Para a doutrina clássica, são requisitos da sucessão para fins trabalhistas: a) transferência de uma unidade empresarial econômica de produção de um titular para outro; b) inexistência de solução de continuidade do contrato de trabalho, vale dizer: o empregado da empresa sucedida deve trabalhar para a empresa sucessora11. Para a moderna doutrina, à qual me filio, com apoio da atual jurisprudência dos Tribunais, não há necessidade de que o empregado ou o reclamante em processo trabalhista tenha prestado serviços para a empresa sucessora, basta apenas que tenha havido a transferência total ou parcial de alguma unidade de produção de uma empresa para outra, para que ocorra a sucessão para fins trabalhistas.

Nesse sentido, destaca-se a seguinte ementa:

Sucessão. A sucessão é a transferência total ou parcial, provisória ou definitiva da titularidade de empresa, pública ou privada, desde que haja continuidade, pelo sucessor, da atividade-fim, explorada pelo sucedido. Apoiam-se nos princípios da continuidade da relação de emprego, da despersonalização da pessoa jurídica e da intangibilidade salarial, tendo como escopo a regra dos arts. 10 e 448 da Consolidação das Leis do Trabalho. (TRT - 1ª R. - 5ª T. - RO n. 6.605/2000 - rel. João Mário de Medeiros - DJRJ 28.6.2001 - p. 223) (RDT 07/2001 - p. 65)

Pensamos estar correta a moderna doutrina ao exigir apenas o requisito da transferência da unidade econômica de produção de um titular para outro para que se configure a sucessão, pois os arts. 10 e 448 da CLT não exigem que o empregado tenha trabalhado para a empresa sucedida. Além disso, tal interpretação está em consonância com o princípio protetor e propicia maior garantia de solvabilidade do crédito trabalhista.

Nesse mesmo diapasão, adverte Jorge Luiz Souto Maior12:

A circunstância de não ter o empregado prestado serviços para a nova pessoa jurídica constituída é totalmente irrelevante, apesar de se ter firmado na doutrina trabalhista o entendimento de que a sucessão trabalhista somente

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tem lugar quando se dá o fenômeno da continuidade da prestação de serviço por parte do trabalhador para a nova pessoa jurídica. Uma leitura atenta dos arts. 10 e 448, da CLT, entretanto, desautoriza tal entendimento.

No mesmo sentido, Mauricio Godinho Delgado13:

(...) a sucessão pode se verificar sem que haja, necessariamente, a continui-dade na prestação de serviços. Tal singularidade é que foi percebida nos últimos anos pela jurisprudência, ao examinar inúmeras situações novas criadas pelo mercado empresarial; nessas situações ocorriam mudanças significativas no âmbito da empresa, afetando significativamente (ainda que de modo indireto) os contratos de trabalho, sem que tivesse se mantido a prestação laborativa e a própria existência de tais contratos.

A moderna doutrina defende a existência da sucessão, mesmo na transferência parcial de uma unidade econômica de produção empresarial, desde que afete de forma significativa os contratos de trabalho. Por exemplo, a transferência de propriedade da produção de um determinado produto de uma empresa para outra.

Nesse sentido, Godinho Delgado14:

(...) também configura a situação própria à sucessão de empregadores a alienação ou transferência de parte significativa do(s) estabelecimento(s) ou da empresa de modo a afetar significativamente os contratos de trabalho. Ou seja, a mudança na empresa que afete a garantia original dos contratos empregatícios provoca a incidência do tipo legal dos arts. 10 e 448 da CLT. Isso significa que a separação de bens, obrigações e relações jurídicas de um complexo empresarial, com o fito de se transferir parte relevante dos ativos saudáveis para outro titular (direitos, obrigações e relações jurídicas), preservando-se o restante de bens, obrigações e relações jurídicas no antigo complexo - agora significativamente empobrecido -, afeta, sim, de modo significativo, os contratos de trabalho, produzindo a sucessão trabalhista com respeito ao novo titular (arts. 10 e 448 da CLT).

Nesse sentido, destaca-se a seguinte ementa:

Sucessão parcial - Responsabilidade do sucessor pelas obrigações trabalhistas a ela relativas. A alteração na estrutura jurídica da empresa, ainda que parcial, não afeta o direito dos empregados e dos trabalhadores já desligados da parte do empreendimento por ela abrangida. A sucessão pode ser parcial, como ocorre na cisão, caso em que o sucessor responde pelas obrigações trabalhistas que a ela dizem respeito, nos termos do art. 10 da CLT. (TRT - 12ª R. - 2ª T. - AG-PET n. 238.2003.009.12.00-8 - relª. Martha M. V. Fabre - DJSC 23.4.04 - p. 189) (RDT n. 5 - Maio de 2004)

A sucessão não exige prova formal, pode ser demonstrada por indícios e presunções, tais como: a transferência do fundo de comércio, transferência do principal bem imaterial da

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atividade, entre outros elementos. De outro lado, a simples transferência de maquinários ou a compra do imóvel empresarial não configura a sucessão.

Nesse sentido, destaca-se a seguinte ementa:

Sucessão de empresas. A sucessão se consubstancia quando a nova pessoa jurídica ocupa o mesmo lugar, explora o mesmo ramo e se utiliza dos mesmos utensílios. Portanto, é caracterizada pelos elementos fáticos que conduziram a alteração na propriedade sucedida, independentemente da forma legal adotada, sendo que o patrimônio que guarnece o estabelecimento se constitui na garantia para os créditos trabalhistas. (TRT - 12ª R. - 1ª T. - Ac. n. 2550/2000 - rel. Juiz Idemar Antônio Martini - DJSC 21.3.2000 - p. 137)

A sucessão de empresas pode ser reconhecida pelo Juiz do Trabalho em qualquer fase do processo, inclusive na execução, uma vez que o sucessor tenha a chamada responsabilidade patrimonial, independentemente de ter figurado na fase de conhecimento, seus bens podem ser atingidos. Diante do caráter cogente dos arts. 10 e 448 da CLT, autores há que sustentam a possibilidade de o Juiz do Trabalho conhecer de ofício a sucessão de empresas. Na execução, a possibilidade de reconhecimento da sucessão de ofício se justifica por força do art. 878 da CLT15.

Nesse sentido, destacamos a seguinte ementa:

Sucessão de empregadores - Responsabilidade patrimonial. A legitimidade do sucessor para figurar no polo passivo da execução em nada é afetada pelo fato de não ter participado da fase de conhecimento. O direito constitucional de resposta foi devidamente resguardado, sendo concedido ao sucedido a oportunidade de defender-se amplamente, passando o novo titular a responder imediatamente pelos contratos de trabalho que lhe forem transferidos, de acordo com o que dispõe os arts. 10 e 448 da CLT. (TRT - 1ª R. - 3ª T. - Ap. n. 3542/2001 - relª. Maria das Graças C. V. Paranhos - DJRJ 7.2.2002 - p. 144)

A empresa sucessora poderá cobrar a empresa sucedida dos débitos trabalhistas que teve de quitar, do período laborado, para a empresa sucedida. Desse modo, a empresa sucedida pode integrar a lide como terceira juridicamente...

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