O efeito disposicao na industria brasileira de Fundos de Investimento em Acoes.

AutorTizziani, Elton
CargoReport
  1. Introdução

    O mercado de capitais brasileiro tem apresentado grande evolução nos últimos 10 anos, tornando-se cada vez mais importante para a consolidação do desenvolvimento econômico brasileiro. Esta evolução é suportada, de um lado, pelo aumento da credibilidade do país advinda da continuidade do Plano Real e controle da inflação e dívida externa. Por outro lado, o mercado brasileiro vem evoluindo em termos de regulação, tornando-se mais confiável para os investidores nacionais e estrangeiros (Velloso, 2008, Filho, 2008).

    Embora o mercado de capitais brasileiro já disponha de infra-estrutura ampla, com capacidade para suportar sofisticadas operações financeiras, ainda é subutilizado no financiamento do setor privado e tímido em relação às operações de longo prazo, quando comparado com mercados mais desenvolvidos. Isso, por um lado, pode ser entendido como uma fraqueza nacional, mas, por outro lado, evidencia o potencial de crescimento do mercado brasileiro, especialmente após ter conquistado o grau de investimento (De la Torre et alii, 2008).

    O mercado de ações levou muito tempo para ser percebido pelo investidor brasileiro, o qual estava acostumado com taxas de juros estratosféricas, muitas vezes alcançando e permanecendo no posto de mais alta do mundo. Com o equilíbrio econômico e controle da inflação, há uma tendência de redução da taxa básica de juros no longo prazo, o que pode trazer ainda mais movimento financeiro para a bolsa de valores, auxiliando o desenvolvimento do mercado acionário brasileiro (Wald, 2008).

    Neste cenário, os fundos de investimento constituem-se em um dos principais mecanismos de entrada do mercado de capitais, já que foram responsáveis por 30% da movimentação da Bolsa de Valores de São Paulo no ano de 2007, perdendo apenas para os investidores estrangeiros, que movimentaram mais de 37% do volume total. Embora os fundos de investimento estejam divididos em diversas classes, quando se trata especificamente do mercado acionário, os fundos de ações ganham extrema relevância, visto que eles detêm 83% das ações que compõem as carteiras de todos os fundos de investimento (ANBTD, 2008).

    A forma pela qual os investimentos são realizados pode estar relacionada exclusivamente a uma técnica, mas também pode envolver traços do comportamento do investidor. Assim, nos últimos anos, tem sido dada grande importância a uma linha de pesquisa chamada de Finanças Comportamentais, que incorpora teorias não-exatas à precificação dos ativos, provenientes de outras áreas de conhecimento tais como Psicologia e Sociologia. A hipótese principal por trás da linha de pesquisa das Finanças Comportamentais é que o investidor nem sempre segue os preceitos das Finanças Modernas na hora de tomar decisões de investimentos, preceitos estes, baseados amplamente na Teoria da Utilidade Esperada. (Ackert e Deaves, 2010). Ao contrário, na maioria das vezes, na hora de tomar decisões importantes envolvendo risco, os investidores cometem desvios do que se esperaria de uma decisão racional, desvios esses conhecidos como ilusões cognitivas (Kah-neman et alii, 1982). Tversky e Kahneman (1974) enfatizam também o conceito de probabilidade subjetiva, que mostra como certas heurísticas e vieses fazem com que as pessoas se desviem de uma tomada de decisão racional baseada em regras concretas de probabilidade. Eles citam a representatividade, a disponibilidade e a ancoragem como principais vieses e heurísticas básicos influenciando a avaliação de probabilidades objetivas.

    Dentro desses desvios do comportamento racional está inserido o efeito disposição, que é definido como a tendência dos investidores em venderem mais rapidamente seus ativos com ganhos em detrimento daqueles que apresentam perdas de capital. O efeito disposição é resultante da Teoria do Prospecto, desenvolvida por Kahneman e Tversky (1979), que prediz que os tomadores de decisão tendem a ser avessos ao risco quando estão no campo dos ganhos e propensos ao risco quanto estão no campo das perdas (Barberis e Xiong, 2009).

    O objetivo principal deste artigo é testar o efeito disposição no mercado brasileiro de fundos de investimento em ações no período de novembro de 2003 a março de 2008. Para analisar o efeito disposição, foi testada a hipótese de que a proporção de ganhos realizados é superior à proporção de prejuízos realizados, replicando a metodologia desenvolvida por Odean (1998). Os resultados mostram que não é possível comprovar o efeito disposição quando são considerados os volumes transacionados. O efeito disposição só se mostra visível, e mesmo assim com baixa significância estatística, quando é considerado apenas o número de transações realizadas pelos fundos de investimentos para fins de cómputo do percentual de ganhos e perdas realizadas.

    Esse artigo contribui para o estudo das Finanças Comportamentais devido ao fato de o efeito disposição ser de grande relevância nos mercados financeiros, já que exerce grande influência no comportamento do investidor e, por conseguinte na formação do preço dos ativos no mercado. Além do mais, ele não é só um fenômeno que acontece nos mercados desenvolvidos, mas também em mercados emergentes. Por fim não afeta somente o mercado secundário de ações, mas também se aplica a Ofertas Públicas Iniciais e também no mercado futuro, como provam estudos recentes (Brown et alii, 2006, Choe e Eom, 2009).

    Em relação a outros estudos já feitos no Brasil esse artigo se diferencia por testar o efeito disposição através da negociação de fundos de investimento em ações em um período mais recente que outros estudos. Como dito anteriormente, fundos de investimento em ações representam no Brasil um dos principais mecanismos de entrada no mercado de capitais e é de se esperar que as transações efetuadas por parte dos gestores dos fundos exerçam influência na formação dos preços dos ativos. Além disso, e como será detalhado posteriormente na metodologia, a base para as composições das carteiras teóricas foi o IBrX-50 e não o Ibovespa. O IBrX-50 é um índice quadrimestral composto por 50 ações escolhidas em termos de liquidez, ponderado pela capitalização de mercado das ações disponíveis para negociação que integram o índice. Este último critério constitui-se no diferencial de escolha do IBrX-50 em detrimento do Ibovespa, índice de maior divulgação no mercado de capitais brasileiro, já que este último pondera a participação das empresas de acordo com o número de negócios e volume financeiro transacionado (BMFBOVESPA, 2010).

    De forma a testar o efeito disposição, o artigo está assim dividido: na próxima seção será apresentada a linha de pesquisa em Finanças Comportamentais, incluindo a teoria do prospecto, da qual advém o efeito disposição, e estudos sobre o próprio efeito disposição, realizados tanto no Brasil como em outros mercados. Depois da análise da base teórica do estudo, será descrita a metodologia, que contempla a coleta de dados bem como a descrição do teste empírico realizado com as carteiras dos fundos de investimento em ações no período de novembro de 2003 a março de 2008. Em seguida serão apresentados os resultados dos testes efetuados e as conclusões sobre tais resultados. A partir daí é apresentada uma breve discussão, além de recomendações para testes futuros.

  2. Referencial Teórico

    Muitos autores defendem que a Teoria Moderna de Finanças surgiu a partir das premissas de racionalidade dos tomadores de decisão e da imprevisibilidade dos mercados, o que se constituiu numa ruptura à Teoria Tradicional de Finanças que defendia a previsibilidade dos mercados e a concentração dos investimentos.

    Diversos estudos foram fundamentais para a consolidação da Teoria Moderna de Finanças, dentre os quais merecem destaque os de Markowitz (1952), Miller e Modigliani (1961), Sharpe (1964), Fama (1970) entre outros.

    Tal teoria está calcada em diversas hipóteses, quais sejam: concorrência perfeita; homogeneidade das expectativas; racionalidade na tomada de decisões; e ausência de fricções (ativos homogêneos, divisíveis e ausência de custos de transações). Fama (1970) acrescenta ainda que, uma vez que as informações são compartilhadas uniformemente no mercado, informações e notícias passadas não podem ser utilizadas como vantagem competitiva, já que elas estariam refletidas no preço. De acordo com o autor, distorções nos preços seriam rapidamente corrigidas pela presença de arbitradores.

    Nos últimos anos, diversos artigos têm fornecido evidências de que existem desvios na Hipótese de Mercados Eficientes, da racionalidade do mercado, a qual não é capaz de explicar por completo a formação de preço e a tomada de decisão do investidor.

    As finanças comportamentais estudam o comportamento do investidor, particularmente no que tange à forma como ele toma a decisão. Ela considera que os investidores não agem sempre racionalmente e que muitas vezes são afetados por ilusões cognitivas (tendência dos investidores a cometerem erros sistemáticos de avaliação) que na maioria das vezes são prejudiciais aos investidores (Nofsinger, 2001). Além do efeito disposição, que é objeto deste artigo, podemos citar, por exemplo, o excesso de confiança como outra ilusão cognitiva, que é a tendência dos investidores em sobreestimar a exatidão das informações de que dispõem ou de superestimar seu nível de conhecimento em relação a outros agentes do mercado. Isto acaba levando-os a transacionar mais freqüentemente do que deveriam, incorrendo em altos custos de transação (Barber e Odean, 2001).

    Kahneman e Tversky (1979), em sua Teoria do Prospecto, criticam a Teoria da Utilidade Esperada e mostram, que, diante de situações de risco, nem sempre o indivíduo age no sentido de maximizar o retorno esperado. Os autores mostram que, em diversas situações, os indivíduos são avessos ao risco e escolhem as opções mais certas (mesmo que tenham menor valor esperado), o que foi chamado de efeito certeza. No mesmo estudo também pode ser visto o efeito reflexão, pelo qual os...

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