Interacao dos dispendios de publicidade com ciclos economicos e o valor da empresa: analise empirica das empresas Norte-Americanas do setor de bens de consumo.

AutorFortunato, Graziela
CargoReport
  1. Introdução

    Em janeiro de 2002, o Marketing Science Institute (MSI), organização americana sem fins lucrativos que visa atender às demandas de pesquisa de acadêmicos e profissionais na área de marketing, promoveu uma exposição de artigos com a proposta de estimular o debate entre marketing e finanças na área de negócios. Mais especificamente, pretendeu avaliar ativos e ações de marketing em termos financeiros, e não somente em termos de marketing. Os objetivos eram: (i) provocar uma alteração de linha de pesquisa, associando as atividades de marketing a resultados financeiros, (ii) estender as análises de curto para longo prazo; (iii) superar as limitações de dados e metodologias; e (iv) tornar os resultados mensuráveis, mais precisos e conclusivos. Em contrapartida, no ano de 2005, o Journal of Business Research (JBR), publicou uma edição especial de trabalhos em marketing com o intuito de ilustrar as aplicações e modelagens das áreas de negócios e finanças, revelando a diversidade de problemas e contribuições que o marketing pode oferecer. O objetivo era desenvolver modelos empíricos que englobassem: (i) a difusão de novos produtos e tecnologias; (ii) a eficácia da publicidade; (iii) o gerenciamento das decisões e provisões; e (iv) inovações e lideranças com o emprego de sistemas dinâmicos (Richardson e Otto, 2008). Percebe-se um esforço nas duas disciplinas, contrariando opiniões divergentes.

    Segundo Barwise e Farley (2004) e Rao e Bharadwaj (2008), a literatura não tem conseguido alinhar as duas disciplinas e conciliar marketing e finanças. Já para Hyman e Mathur (2005) e Zinkhan e Verbrugge (2000, 2), as visões de marketing e finanças não são necessariamente contraditórias e não conciliadoras, e sim, complementares.

    As duas disciplinas se encontram à medida que as ações de marketing vêm reconhecendo a necessidade de auto sustentar-se e justificar seus dispêndios e/ou orçamento, principalmente quando associado ao valor da empresa. Srivastava et alii (1998) já haviam percebido que a ausência de um entendimento completo que identifica e integra as relações entre marketing e finanças tem graves implicações na alocação de recursos às atividades de marketing e ao bem estar financeiro da empresa. Isso dificulta e limita os dispêndios em marketing, além de restringir a habilidade da empresa de criar valor, ou avaliar tal valor. Aspectos negativos, tais como dispêndios de marketing sem retorno financeiro e/ou destruição de riqueza para o acionista podem tornar-se indesejáveis e devem ser descontinuados (Stewart, 2008). Por exemplo, Lehmann (2004) acredita que a obsessão pelo cliente pode obscurecer a rentabilidade da empresa. Por outro lado, aspectos positivos, como dispêndios de marketing em mudança de slogan, introdução de marca e publicidade, podem causar reação positiva no valor das ações (Dekimpe e Hanssens, 2000, Hozier e Schatzberg, 2000, Kim e Morris, 2003, Mathur e Mathur, 1996, 2000).

    Muitas teorias dão ênfase ao processo e à criação de valor através do cliente, produto e marca, existindo uma lacuna na análise empírica dessa relação com a criação de valor para a empresa (Barwise e Farley, 2004, Dekimpe e Hanssens, 2000, Hyman e Mathur, 2005, Rao e Bharadwaj, 2008, Rust et alii, 2004, Zinkhan e Verbrugge, 2000). Por isso, cada vez mais, empresas incluem em sua missão o comprometimento com o objetivo financeiro.

    A maioria dos testes empíricos utilizam os dispêndios em publicidade como proxy das ações de marketing devido à sua representatividade em volume financeiro e à disponibilidade dos dados. No entanto, os modelos teóricos fracassam ao primeiro sinal de dúvidas quanto à verificação empírica dos valores de publicidade investidos/gastos sobre os resultados da empresa, por não considerar tanto o efeito dinâmico inerente a esses dispêndios como as incertezas provenientes da economia (Erickson e Jacobson, 1992). Nestes casos, o efeito dinâmico e estocático, característicos dos dispêndios de publicidade, não são considerados, visto que os modelos mais comuns são estáticos e determinísticos.

    Dessa forma, a relevância deste estudo se concentra no desenvolvimento e aplicação do modelo de otimização dos dispêndios de publicidade, considerando a incerteza dos ciclos econômicos e a relação com o valor da empresa. Em muitos estudos, quando se menciona dispêndios ou gastos de marketing, mostram-se explicitados os dispêndios de publicidade e promoção, tal como em Graham e Frankberg (2000), Heiens et alii (2007), Luo e Donthu (2006), O'Sullivan e Abela (2007), Srivastava et alii (1998), Rust et alii (2004). Outros dispêndios de publicidade são: gastos em programas de lealdade do cliente, melhoria da qualidade do produto, mala-direta, entre outros. Dispêndios de publicidade, segundo Chang e Chan-Olmsted (2005), e, especificamente no presente estudo, referem-se à soma em valor monetário (dólares) gastos em propaganda na mídia de massa -- televisão, internet, revista, rádio e etc.

    O teste empírico consiste na otimização da relação entre o valor da empresa, os dispêndios de publicidade e os ciclos econômicos. Esta relação foi desenvolvida a partir de regressões múltiplas com dados em painel. Para obtenção dos resultados, foram utilizados dados de empresas norte-americanas de bens de consumo (consumer staples) em bases anuais de 1997 a 2008. Os resultados corroboram a expectativa, sugerindo que existe uma interação entre os dispêndios de publicidade e os ciclos econômicos. Essa interação permite a racionalização dos dispêndios de publicidade, contribuindo positivamente para o valor da empresa. Para a ilustração da contribuição do valor da empresa, após a otimização, foi aplicada simulação de Monte Cario, tornando possível comparar dispêndios de publicidade sob otimização com dispêndios de publicidade a valores reais, sem otimização.

    Algumas delimitações do estudo dizem respeito ao escopo. Primeiro, a comparação de dispêndios de publicidade com e sem o processo de otimização não define o valor monetário ótimo que a empresa deve atingir a fim de maximizar seu valor, e nem seria a pretensão deste estudo. A intenção é ilustrar a contribuição dos dispêndios de publicidade no valor da empresa. Segundo, abordar todas as variáveis da teoria de marketing e estratégia, tais como o efeito da concorrência, tornaria inviável a análise do modelo proposto. Terceiro, dentre os dispêndios de publicidade, a qualidade, o tipo de campanha e os varios veículos publicitários que possam ser utilizados foram assumidos como constantes (Albright e Winston, 1979, Danaher e Rust, 1996, Herremans et alii, 2000).

    Espera-se que os profissionais de marketing possam beneficiar-se do modelo apresentado, no sentido de tornar justificáveis suas decisões de gastos, visando valor à empresa. Essa abordagem demonstra a complexidade do tema e o caráter inovador do estudo.

    O artigo está organizado da seguinte forma: a parte dois apresenta o referencial teórico. A parte três descreve a metodologia, com sub-ítens sobre a amostra, variáveis, tratamento dos dados e apresentação do modelo. A parte quatro apresenta a análise dos resultados, seguida da conclusão na parte cinco.

  2. Referencial Teórico

    A literatura de marketing, que lança um olhar sobre os aspectos financeiros, inclui estudos que dispararam a discussão da importância de avaliar o impacto das ações de marketing e definir métricas mais confiáveis. Os trabalhos iniciais foram de Day e Fahey (1988) e Srivastava et alii (1998), que defenderam a importância da avaliação dos ativos, ações e orientação para marketing pela ótica financeira e não somente pela ótica do marketing. Day e Fahey (1988) destacam a necessidade de avaliar as estratégias de mercado além das medidas financeiras tradicionais como o retorno sobre investimento, crescimento da parcela de mercado e de vendas, seguindo para a criação de valor final da empresa. Uma década depois, o trabalho de Srivastava et alii (1998) avança nesta linha, com referência mais específica aos ativos de marketing. O trabalho desenvolve um modelo conceituai que associa os ativos de marketing e a criação do valor para o acionista e inicia vários caminhos nos quais o valor das ações de marketing pode ser identificado. Srivastava et alii (1999) estendem seu estudo ao analisar como o marketing exerce influência nos processos da empresa a fim de obter valor ao acionista. Yamamoto (2002), ao testar empíricamente o modelo conceituai de Srivastava et alii (1999) para as empresas brasileiras, conclui que há uma associação entre os ativos de marketing e a aceleração dos fluxos de caixa das empresas. No entanto, não obteve dados suficientes para afirmar que eles diminuem a volatilidade desses fluxos.

    Os estudos de Srivastava et alii (1998, 1999) revelam o cliente como o ativo de marketing que mais contribui para a criação de valor da empresa, concordando com Rust et alii (2004). A razão por trás deste processo é simples. O cliente satisfeito está mais propenso a reincidir na compra (Yeung e Ennew, 2000). Essa lealdade reduz os custos e a sensibilidade a preço que, perfazendo num longo prazo, tem importante implicação na valorização da empresa. Além disso, a satisfação e lealdade do cliente representam um ativo de geração de receita que é custoso de desenvolver e manter. Por conseguinte, quando atingido, deveria fazer parte de um conjunto de informações a ser divulgado no mercado, conclusões baseadas num estudo de meta-análise, associando satisfação do cliente e diversas métricas financeiras (Szymanski e Henard, 2001). A discussão avança com o estudo de Zinkin (2006). Este defende que se a concentração for somente no valor da empresa com pouco investimento no cliente, este pode ser destruído ao longo do tempo. No entanto, o marketing pode destruir valor da empresa se direcionar recursos demais ao cliente e este não trouxer retorno (Lovett e Macdonald, 2005). Por fim, as ações de marketing criam vantagem competitiva através do cliente quando o intuito é aumentar as...

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