Ownership concentration and governance quality of brazilian firm/Concentracao de propriedade e qualidade da governanca da empresa brasileira.

AutorBrandao, Isac de Freitas
CargoTexto en portugués - Ensayo
  1. Introducao

    A literatura tem documentado evidencia na direcao de que o ambiente legal e institucional parece levar a especificidades no sistema de governanca corporativa em funcao da protecao dada a acionistas minoritarios e credores. Mais elevada protecao destes stakeholders parece estar associada a melhor qualidade da governanca corporativa, ao contrario da mais fragil governanca (Chhaochharia & Laeven, 2009; Durnev & Kim, 2005; Claessens & Yurtoglu, 2013; Klapper & Love, 2004). O caso brasileiro apresenta sinais de fraca protecao a pequenos acionistas e credores e elevada concentracao de propriedade (Aldrighi & Mazzer Neto, 2005, 2007; Leal, Silva, & Valadares, 2002).

    A importancia de um sistema de governanca corporativa fortalecido, dotado de um conjunto de boas praticas de governanca e de um conselho de administracao bem estruturado, tem sido destacada como relevante para o alinhamento de interesses entre propriedade e controle. Os avancos mais notorios nos sistemas de governanca corporativa tem sido observados em mercados caracterizados por mais baixa concentracao de propriedade, nos quais a diretoria executiva da empresa tem muito poder e os acionistas tem interesse em estruturar um bom sistema de governanca corporativa para se contrapor ao poder da direcao da empresa (Young, Peng, Ahlstrom, Bruton, & Jiang, 2008). Em outra direcao, ha ambientes nos quais a alta concentracao de propriedade, nas maos de um ou poucos acionistas que compoem uma coalizao de controle, faz com que se atinja mais facilmente o alinhamento de interesses entre propriedade e gestao da empresa, sendo esta menos poderosa. Neste cenario, o excesso de poder nas maos de acionistas controladores pode levar a uma situacao de desalinhamento de interesses entre estes e os acionistas minoritarios. A gestao deste conflito de interesses esta associada ao problema "principal-principal" que tem recebido atencao da pesquisa (Chen, Kao, Tsao, & Wu, 2007; Larcker, Richardson, & Tuna, 2007). Neste entorno, acionistas minoritarios estao interessados em um sistema governanca corporativa capaz de protege-los da acao indevida de gestores como tambem de acionistas controladores (Claessens & Yurtoglu, 2013). Este e o caso do Brasil, como de paises latinoamericanos e outros orientados pelo sistema legal baseado em codigos (La Porta, Lopez-de-Silanes, Shleifer, & Vishny, 1998).

    No contexto de mercados com poucos acionistas compondo uma coalizao de controle, tais acionistas sao motivados a manter o controle para usufruir dos beneficios privativos deste controle, que podem ser prejudiciais para pequenos acionistas (Connelly, Hoskisson, Tihanyie & Certo, 2010; Dyck & Zingales, 2004; Shleifer & Vishny, 1997).

    A estruturacao de um sistema de governanca corporativa capaz de alinhar interesses de acionistas majoritarios, gestores e acionistas minoritarios e uma questao central sob o marco teorico do problema "principal-principal". Ter-se um sistema que incorpore boas praticas de governanca que protejam acionistas minoritarios implica ter-se regras que controlem a acao de gestores e, principalmente, outras que sejam capazes de limitar o uso de beneficios privados de controle de acionistas majoritarios. Por sua vez, o elevado poder de acionistas controladores lhes permite controlar facilmente a direcao e parece nao se compatibilizar com a adocao de praticas de governanca que possam restringir sua autoridade (Bozec & Bozec, 2007; Connelly, Hoskisson, Tihanyie & Certo, 2010; Dyck & Zingales, 2004)

    Este trabalho objetiva avaliar o efeito da concentracao de propriedade sobre a qualidade da governanca corporativa da empresa brasileira. Deste modo, pretende-se contribuir adicionalmente para a literatura que tem pesquisado o efeito de aspectos da estrutura de propriedade sobre o nivel de adocao de boas praticas de governanca. Trabalhos anteriores tem documentado evidencia que aponta para o efeito negativo do excesso de poder de acionistas controladores sobre a governanca corporativa (Bozec & Bozec, 2007; Silveira & Barros, 2008; Silveira, Leal, Barros, & Luiz, 2009; Silveira, Leal, Silva & Barros, 2010).

    O trabalho propoe um Indice de Qualidade da Governanca Corporativa (IQGC) que engloba praticas de boa governanca recomendadas pelos principais codigos de boa governanca editados no Brasil, nao se restringindo a uma ou poucas delas. Aspectos relativos a estrutura de propriedade nao sao incluidos no indice uma vez que se propoe a hipotese que a governanca e influenciada por ela.

    Estimou-se modelos pelo metodo generalizado de momentos sistemico (GMM-SYS) para uma amostra de 85 empresas listadas na BM&FBovespa com maior valor de mercado no periodo 2010-2013. Os resultados indicam que a concentracao de direitos de voto esta negativamente relacionada com a qualidade da governanca corporativa, sobretudo em altos indices de concentracao. A relacao quadratica encontrada entre qualidade da governanca e concentracao de direitos de voto sugere que, em baixos de concentracao, ha uma relacao positiva da concentracao sobre a qualidade da governanca, o que se inverte com a elevacao da concentracao.

    O trabalho esta estruturado em quatro secoes, alem desta introducao. A segunda secao apresenta a revisao da literatura e as hipoteses acerca do efeito da concentracao de propriedade sobre a qualidade da governanca. A terceira secao descreve a amostra e os procedimentos metodologicos. Os resultados sao discutidos na quarta secao. A ultima secao do texto apresenta as conclusoes do trabalho e sugestoes para futuras pesquisas.

  2. Concentracao de Propriedade, Governanca Corporativa e Hipoteses

    A luz da Teoria da Agencia, a governanca corporativa pode ser entendida como um conjunto de mecanismos que contribui para a reducao de conflitos e de custos de agencia residuais decorrentes de agentes imperfeitos e contratos incompletos, ao buscar o alinhamento de interesses entre principal e agente (Claessens & Yurtoglu, 2013; Love, 2011; Hart & Moore, 1995; Silveira & Barros, 2008; Shleifer & Vishny, 1997).

    Em paises nos quais ha forte protecao legal aos direitos dos acionistas e credores (enforcement), o proprio ambiente institucional prove garantias a estes (Durnev & Kim, 2005). Por outro lado, em ambientes com fraca protecao legal, como no Brasil, a pressao do mercado de capitais para que as empresas aprimorem seus sistemas intemos de governanca passa a ser mais necessaria (Claessens & Yurtoglu, 2013; Klapper & Love, 2004; Leal, 2004). Neste sentido, destaca-se a importancia da adocao de praticas voluntarias de governanca corporativa que abranjam um conjunto de normas sobre o papel e a composicao do conselho de administracao, relacoes com acionistas e alta gerencia, auditoria e divulgacao de informacoes, e selecao, remuneracao e demissao dos principais executivos (Aguilera & Cuervo-Cazurra, 2004).

    A adocao de boas praticas de governanca tem custos associados que devem ser arcados pelos acionistas. Os acionistas aceitam assumir estes custos visando o beneficio da protecao a seu investimento o que pode levar a uma relacao direta entre proporcao na propriedade e a disposicao para arcar com tais custos como abordado na literatura sob a argumentacao do problema free-rider (Shleifer & Vishny, 1997). Grandes acionistas controladores da empresa estariam mais propensos a dedicar recursos para a manutencao de um sistema de governanca que proteja seus interesses. E ai surge o problema do eventual conflito destes interesses com aqueles de pequenos acionistas. A tendencia a um comportamento free-rider de pequenos acionistas pode contribuir para que seus interesses sejam, eventualmente, nao priorizados (Denis & McConnell, 2003; Dyck & Zingales, 2004; Shleifer & Vishny, 1997).

    Em quadros de alta concentracao de propriedade, acionistas controladores podem ser levados a interferir ativamente na definicao de um sistema de governanca corporativa que viabilize a manutencao de seus interesses, concretizados em beneficios privados de controle nao acessiveis a pequenos acionistas, como a literatura tem registrado (Kang & Shivdasani, 1995; Yafeh & Yosha, 2003). Sob este marco de pesquisa sobre os conflitos de interesses entre grandes e pequenos acionistas (conflito de agencia "principal-principal"), duas proposicoes tem ganhado relevo: a do possivel efeito "expropriacao", e a do possivel efeito "substituicao".

    De acordo com o argumento do efeito expropriacao, acionistas controladores poderiam utilizar-se de sua posicao acionaria para usar beneficios privados de controle que podem ocasionar prejuizo para acionistas minoritarios (Dyck & Zingales, 2004; La Porta et al., 1999). A possibilidade do uso indevido de tais beneficios esta presente quando acionistas controladores vislumbram ganhos privativos mesmo as expensas de pequenos acionistas. Como exemplos de tais circunstancias tem-se o estabelecimento de politicas peculiares de beneficio a outras empresas nas quais os grandes acionistas tenham interesse, tais como: troca de insumos; realizacao de operacoes de venda e compra de participacoes (OPAs); protecao propria na posicao de executivo (Holderness, 2003; Johnson et al., 2000; Shleifer & Vishny, 1997). Um sistema de governanca corporativa fragil facilita a ocorrencia deste tipo de situacao, o que e interessante para os acionistas controladores (Bozec & Bozec, 2007; Renders & Gaeremynck, 2012).

    Segundo o argumento do efeito substituicao, a maior concentracao de direitos de voto incentiva e facilita a acao direta de acionistas controladores na restricao de eventual acao indevida por parte dos gestores (risco moral). Acionistas controladores tem a habilidade e o incentivo para exercer mais diretamente o controle da diretoria executiva de modo a substituir esta tarefa que e funcao do Conselho de Administracao, uma importante estrutura formal do sistema interno de governanca corporativa (Bozec & Bozec, 2007; La Porta et al. 2000; Denis & McConnell, 2003). O beneficio incremental de praticas voluntarias de...

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