O Preso

AutorFrancesco Carnelutti
Ocupação do AutorAdvogado e jurista italiano
Páginas23-29

Page 23

À solenidade, para não dizer à majestade dos homens em toga, contrapõe-se o homem na cela. Nunca esquecerei a impressão que me produziu a primeira vez em que, adolescente ainda, entrei na sala de uma sessão penal do Tribunal de Turim. Aqueles, poderia dizer, acima do nível do homem; este, por baixo deste nível, trancado na cela, como um animal perigoso. Só, pequeno, ainda que seja de elevada estatura, perdido, ainda quando tente parecer desenvolto, necessitado, necessitado, necessitado...

Cada um de nós tem suas preferências, inclusive em matéria de compaixão. Os homens são diferentes

Page 24

entre si, incluindo o modo de sentir a caridade. Também este é um aspecto de nossa carência. Há os que concebem o pobre com a figura do faminto, outros com a do vagabundo, outros com a do enfermo; para mim, o mais pobre de todos os pobres é o preso, o encarcerado.

Digo o encarcerado, observe-se bem, não o delinquente. Digo o encarcerado, como o disse o Senhor, naquele famoso discurso citado no capítulo vigésimo quinto do Evangelho de São Mateus, que exerceu sobre mim uma fascinação imensurável; e até ontem, poderia dizer, cri que preso se pronunciasse como sinônimo de delinquente, mas me equivocava e o equívoco foi um de tantos episódios, aptos a demonstrar que nunca se meditam o bastante os discursos de Jesus.

O delinquente, enquanto não está preso, é outro ser. Confesso que o delinquente me repugna; em certos casos me produz horror. Entre outras coisas, a mim, o delito, o grande delito, ocorreu-me vê-lo, ao menos uma vez, com meus próprios olhos: os que renhiam pareciam duas panteras; fiquei absolutamente horrorizado; e, sem dúvida, bastou que eu visse um dos homens que havia derrubado o outro com um golpe mortal, enquanto os guardas, que acudiram provi-

Page 25

dencialmente, colocavam-no as algemas, para que do horror nascesse a compaixão: a verdade é que, apenas algemado, a fera se converteu em um homem.

As algemas, também as algemas são um emblema do direito; quem sabe, pensando bem, o mais autêntico de seus emblemas, embora mais expressivo que a balança e a espada. É necessário que o direito nos ate as mãos. E precisamente as algemas servem para descobrir o valor do homem, o qual é, segundo um grande filósofo italiano, a razão e a função do direito. Quidquid latet apparebit, repete ele a este respeito com o Dies irae: tudo o que está oculto, saltará a luz. O que estava oculto, na manhã em que vi um dos homens lançar-se contra o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT