Procedimentos especiais
Autor | Leonardo Tibo Barbosa Lima |
Páginas | 610-663 |
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Procedimentos Especiais
22.1 REGRAS GERAIS
Além dos dissídios tipicamente trabalhistas (individuais e coletivos), o Processo do Trabalho faz uso de
procedimentos especiais do processo comum, para satisfazer interesses de natureza cível, mas que, por decorrerem
da relação de trabalho, devem ser ajuizados perante a Justiça do Trabalho (art. 114, I e IX, da CF).
Como esses procedimentos possuem rito especial, muito se debateu acerca de como eles tramitariam na
Justiça trabalhista, até que o TST editou a IN n. 27, de 22.02.2005, que dispõe sobre normas procedimentais
aplicáveis aos procedimentos especiais cíveis ajuizados perante a Justiça do Trabalho.
Com efeito, foi estabelecido que procedimentos especiais cíveis ajuizados na Justiça do Trabalho tramitarão
pelo rito especial previsto para eles (art. 1º da IN n. 27/05). Não obstante, a sistemática recursal a ser observada
é a prevista na CLT, inclusive quanto à nomenclatura, à alçada, aos prazos e às competências (art. 2º da IN
n. 27/05). Dessa forma, por exemplo, ajuizada uma ação de consignação em pagamento na Justiça do Trabalho, o
recurso da decisão de primeira instância será o recurso ordinário, sendo exigidos até mesmo o depósito recursal,
se houver condenação (art. 2º, parágrafo único, da IN n. 27/05), e custas, estas, porém, regidas pelo princípio da
Tanto nos procedimentos especiais cíveis quanto nas ações decorrentes da relação de trabalho, isto é, naquelas
em que não há vínculo de emprego entre as partes, a presença do advogado é obrigatória (não há jus postulandi),
motivo pelo qual os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência (art. 5º da IN n. 27/05).
Nos termos do art. 6º da IN n. 27/05, o Juiz pode exigir o depósito prévio de honorários periciais, os quais
serão suportados, ao final, pela parte sucumbente no objeto da perícia, salvo se for beneficiária da justiça gratuita.
Todavia, a Lei n. 13.467/17 incluiu o § 3º, no art. 790-B, da CLT, segundo o qual “o juízo não poderá exigir
adiantamento de valores para realização de perícias”. Além disso, a citada lei modificou a redação do caput do
artigo em comento e acrescentou o § 4º, para estabelecer que o beneficiário da justiça gratuita responde pelo
pagamento dos honorários periciais, a não ser que “não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a
despesa referida no caput, ainda que em outro processo,” situação em que “a União responderá pelo encargo.” Com
Por fim, a IN n. 27/05 sublinha que aos emolumentos dessas ações aplicam-se as regras previstas na CLT,
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Vistas as regras gerais acerca das ações cíveis admitidas na Justiça do Trabalho, o próximo passo consiste em
conhecer suas peculiaridades.
22.2 AÇÃO RESCISÓRIA
A ação rescisória é uma ação autônoma, que tramita em sede de processo de conhecimento, com rito especial.
Sua finalidade é rescindir a coisa julgada, isto é, desconstituir uma decisão de mérito proferida em outro processo,
contra a qual já não caiba recurso. Ela difere, portanto, do recurso, uma vez que este é um meio de impugnação
(decorrente da extensão do direito de ação do autor ou de defesa do réu) incidental (dentro do mesmo processo)
cuja sentença ainda não transitou em julgado.
Devido a sua conexão com o instituto da coisa julgada e a complexidade do tema, essa ação foi examinada
em capítulo próprio (capítulo 16), ao qual remetemos o leitor.
22.3 AÇÃO ANULATÓRIA
22.3.1 CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA E FINALIDADE
A ação anulatória tem por fim desconstituir um ato ou negócio jurídico maculado de vícios, de maneira
autônoma ou incidental. Difere da ação rescisória, porque o seu objeto não é uma sentença transitada em julgado,
mas, sim, um ato ou negócio jurídico, frutos de uma relação jurídica material, como a cláusula de um contrato,
por exemplo.
22.3.2 FUNDAMENTO
Muito embora a ação anulatória tenha sido pensada como meio para anular ato ou negócio jurídico nas relações
materiais, o CPC a indicou como instrumento para desconstituir atos de disposição de direitos homologados
judicialmente e os atos processuais homologatórios praticados no curso da execução (art. 966, § 4º, do CPC(1156)).
Além disso, a doutrina e a jurisprudência têm admitido a ação anulatória para obter a declaração de inexistência
ou ineficácia de decisões judiciais.
22.3.3 ESPÉCIES
22.3.3.1 Ação anulatória genérica
Em sua forma genérica ou comum, a ação anulatória tem por finalidade desconstituir atos nas relações
materiais e processuais. Nestas, porém, desde que não se trate de uma sentença, salvo se ela for meramente
homologatória, isto é, que não se tenha manifestado sobre o mérito da causa. No primeiro caso, a ação é ajuizada
de forma autônoma; no segundo, de maneira incidental, fazendo-se uso de instrumentos, como a exceção de pré-
-executividade, os embargos à execução ou as impugnações.
22.3.3.1.1 Ação anulatória de cláusulas normativas
No Processo do Trabalho, o exemplo mais comum de ação anulatória de atos materiais é aquela ajuizada para
desconstituir cláusulas de convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Imagine-se, por exemplo, que uma convenção coletiva de trabalho tenha autorizado o desconto de
contribuições assistenciais de empregados não associados. Trata-se de uma cláusula nula, porque apenas a
(1156) Art. 966. [...] § 4ºOs atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados
pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.
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Contribuição Sindical pode ser cobrada de empregados não associados, pelo que ela pode ser anulada mediante
a ação anulatória genérica.(1157)
Nos termos do § 3º, do art. 8º, da CLT, introduzido pela Lei n. 13.467/17 (reforma trabalhista), a ação
anulatória de cláusulas convencionais deverá estar limitada à análise dos elementos de validade dos negócios
jurídicos previstos no art. 104 do Código Civil, quais sejam: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou
determinável; e forma prescrita ou não defesa em lei. O citado dispositivo criou, ainda, um princípio, chamado de
intervenção mínima, pelo qual o juízo deverá evitar anular as cláusulas para preservar ao máximo a autonomia da
22.3.3.1.1.1 Princípio da intervenção mínima
Princípios são postulados da Ciência Jurídica, máximas abstratas que sustentam todo o arcabouço normativo.
Eles possuem origem histórica, fruto que são da evolução da interpretação das normas jurídicas e dos valores da
sociedade. A ordem natural da criação de um princípio pode ser sintetizada em fato > valor > norma, isto é, o
problema surge na sociedade, esta manifesta seus valores, o caso se repete e o princípio surge com uma máxima
para resolver os casos semelhantes supervenientes. Finalmente, o legislador pode editar texto normativo calcado
no novo princípio, mas isso sequer é necessário.
Ocorre que, no princípio em comento, o legislador percorreu caminho inverso: criou o princípio e deseja
que a sociedade o incorpore como um valor, para resolver o caso concreto. É que, no Direito do Trabalho, o
princípio clássico é justamente oposto, tendo em vista que esse ramo do Direito é naturalmente intervencionista e
Essa função central do Direito do Trabalho (melhoria das condições de pactuação da força de trabalho na
ordem socioeconômica) não pode ser apreendida sob uma perspectiva meramente individualista, enfo-
cando o trabalhador isolado. Como é próprio ao Direito — e fundamentalmente ao Direito do Trabalho,
em que o ser coletivo prepondera sobre o ser individual —, a lógica básica do sistema jurídico deve ser
captada tomando-se o conjunto de situações envolvidas, jamais sua fração isolada. Assim, deve-se consi-
derar, no exame do cumprimento da função justrabalhista, o ser coletivo obreiro, a categoria, o universo
mais global de trabalhadores, independentemente dos estritos efeitos sobre o ser individual destacado.
(DELGADO, 2018, p. 57).
A intenção do legislador parece ter sido de acolher a tese do “negociado sobre o legislado”, que confere ao
art. 7º, XXVI, da CF, interpretação no sentido de que as normas coletivas (autônomas) devem prevalecer sobre
as normas estatais (heterônomas). Se foi essa a intenção, o princípio em comento pode ser reconhecido como
existente, de maneira que apenas o inusitado rótulo é que causa espécie.
13.3.3.1.1.2 Licitude do objeto
O que mais chama a atenção no novel dispositivo é a tentativa de limitar o exame de validade das normas
coletivas pelo Judiciário, notadamente quanto ao objeto, tendo em vista que os vícios de legitimidade e de forma
são mais raros.
Tocando diretamente na ferida, o que o legislador tentou fazer é impedir que o Judiciário anulasse cláusulas
normativas com base na constatação de que elas, em vez de melhorar, pioraram as condições de trabalho, violando
o art. 7º da CF. Todavia, se isso ocorrer, de fato o objeto será lícito, de maneira que, mesmo com novel regra, as
cláusulas poderão ser anuladas.
(1157) “[...] É inválida a cláusula contemplando contribuição assistencial quando dirigida, igualmente, a trabalhadores não sindicalizados.
À luz dos princípios da liberdade de associação sindical e da intangibilidade do salário, impõe-se o ajuste da cláusula aos termos do
Precedente Normativo n. 119 do TST, com redução do valor. Recurso Ordinário integralmente provido.” (TST-RO-4027-73.2012.5.04.0000,
Relatora: Ministra Maria de Assis Calsing, SDC, DEJT 15.04.2014).
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