Processo Nº 01/1999 da Comissão de Valores Mobiliários, 19-12-2001

Número do processo01/1999
Data19 Dezembro 2001
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INQUÉRITO ADMINISTRATIVO CVM N° 01/99
INDICIADOS: Mafra Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda. - em liquidação extrajudicial
(atualmente falida), Marco Antonio Faria França, Luiz Fernando Alves da Cruz,
Estratégia Investimentos S.A. Corretora de valores e Câmbio, Alexandro Marcel,
Câmara de Liquidação e Custódia S.A. – CLC, João Batista Fraga, Bolsa de Valores
de São Paulo, Gilberto Mifano, Alexandre Medaber e Antonio Carlos Barillari Fontes
Pitanga
RELATOR: Diretor Marcelo F. Trindade
Ementa:
I. Desvio de custódia de ações e apropriação indevida de valores e títulos de propriedade de clientes de
sociedade distribuidora. Comprovação do destino dos recursos desviados, apropriados em parte pelo
acionista controlador. Operações fraudulentas, como definidas na Instrução CVM 08/79. Multa de 3 vezes o
valor apropriado.
II. Inobservância de formalidades e vedações estabelecidas na Instrução CVM 220/94, permitindo a
consecução das fraudes e desvios. Multa.
III. Operador e agente autônomo como clientes de outra sociedade, além daquela a que estavam vinculados.
Advertência.
RELATÓRIO
1. Trata-se de Inquérito instaurado em 11/01/1999 para "apurar possíveis irregularidades relacionadas com a
movimentação da custódia de clientes da Mafra Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda." (a seguir
referida simplesmente como Mafra - cf. fls. 1).
2. A proposta de abertura de inquérito pela Superintendência de Proteção e Orientação de Investidores – SOI,
datada de 03/12/1998 (cf. fls. 2), teve origem em reclamações de clientes da Mafra as quais, apuradas em
inspeção, e posteriormente neste inquérito, revelaram a ocorrência de prejuízos para pelo menos 50
(cinqüenta) clientes da instituição, cujas carteiras de ações foram indevidamente transferidas a terceiros, e
alienadas, entre 1996 e 1998.
3. O Relatório da Comissão de Inquérito (a seguir referido simplesmente como o "Relatório") está a fls.
6.064/6.188, e dele consta uma detalhadíssima descrição dos atos lesivos a cada um dos 50 (cinqüenta)
investidores antes referidos (cf. fls. 6.072/6.172).
4. Após tal análise, o Relatório concluiu pela ocorrência de prejuízos de R$ 3.999.000,00 (três milhões,
novecentos e noventa e nove mil reais), dos quais R$ 3.566.000,00 (três milhões, quinhentos e sessenta e seis
mil reais) ter-se-iam dado através da apropriação indevida de ações da custódia de clientes, e R$ 433.000,00
(quatrocentos e trinta e três mil reais) ter-se-iam dado através da apropriação indevida de quantias entregues
pelos clientes para a realização de operações não efetivadas (cf. fls. 6.172/6.173).
5. Os beneficiários dos valores desviados também foram identificados pelo Relatório (cf. item 20, fls.
6.172/6.173).
6. Diversos instrumentos ilícitos foram utilizados, segundo o Relatório, para a perpetração do desvio de custódia:
(i) a venda de ações sem autorização dos clientes, com o desvio dos recursos correspondentes para contas
correntes de terceiros; (ii) a transferência de ações entre clientes da Mafra, atuando os "clientes destinatários"
das ações em conluio com os agentes do desvio; (iii) a emissão de OT1 (Ordem de transferência de ações
escriturais) com falsificação da assinatura dos clientes; (iv) o endosso fraudulento dos cheques nominais
relativos às vendas — tudo por vezes antecedido da alteração dos endereços dos clientes lesados para o da
própria Mafra, visando a evitar o efetivo recebimento dos avisos de movimentação de ações e dos extratos
verdadeiros de posições em custódia (cf. fls. 6.173/6.175).
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7. Já quanto à apropriação de recursos entregues por clientes para a compra de ações e a realização de outras
operações bursáteis, o mecanismo da fraude, segundo o Relatório, consistiu na apropriação pura e simples
das quantias, sendo emitidas notas de faturamento simulando as operações ordenadas, porém não realizadas
(cf. fls. 6.174).
8. O Relatório imputa a realização das fraudes basicamente a três agentes:
a. Carlos Augusto dos Santos Santana – chefe da custódia da Mafra, e que faleceu pouco depois da
descoberta das fraudes, teria sido não só o realizador dos desvios, como deles teria se beneficiado diretamente
com R$ 1.200.000,00 (cf. fls. 6.183), cerca de 30% do total desviado. A conduta do referido senhor está
detalhadamente descrita nos itens 36 a 39 do Relatório (fls. 6.181/6.183);
b. Marco Antonio Faria França – sócio majoritário da Mafra (embora sem função executiva por estar inabilitado
pelo Banco Central do Brasil), detentor de cerca de 70% do capital social (cf. fls. 2.212), que teria sido
beneficiado diretamente por três depósitos de recursos provenientes dos desvios, no valor total de R$
1.622.564,02 (hum milhão, seiscentos e vinte e dois mil, quinhentos e sessenta e quatro reais e dois centavos),
cerca de 40% do total desviado. A conduta do senhor está detalhadamente descrita nos itens 30 a 33 do
Relatório (fls. 6.180/6.181); e,
c. Luiz Fernando Alves da Cruz – sócio minoritário da Mafra, detentor de cerca de 30% do capital social (cf. fls.
2.212), e sócio gerente responsável pela supervisão das operações com valores mobiliários, a quem o
Relatório imputa condutas comissivas — assinatura de ordens de transferência não determinadas por clientes,
e de cheques destinados ao pagamento de operações fraudulentas — e omissivas — consistentes na
aceitação de procedimentos operacionais que permitiram as fraudes, como a não confecção de boletos
relativos às ordens de compra e venda e a não emissão de recibos. O Relatório não logrou identificar qualquer
participação do referido senhor como beneficiário do produto das fraudes (fls. 6.181).
1. Além disto, o Relatório imputa condutas omissivas a terceiros, considerando que tais condutas teriam
contribuído para o sucesso das fraudes praticadas no âmbito da Mafra. Esse grupo de acusados é composto
das seguintes pessoas jurídicas e naturais:
a. Câmara de Liquidação e Custódia S.A. e Bolsa de Valores de São Paulo, e seus responsáveis João
Batista Fraga e Gilberto Mifano – tais instituições, à época custodiantes dos valores mobiliários desviados
dos clientes da Mafra, teriam, segundo o Relatório, se omitido nos procedimentos necessários à comunicação
aos clientes da distribuidora de que suas ações estavam sendo movimentadas. O Relatório não identifica nem
sugere qualquer participação das pessoas ou instituições citadas no produto dos desvios de ações e valores
(fls. 6.183/6.184); e,
b. Estratégia Investimentos S.A. CVC e seu diretor responsável pela área de bolsa Alexandro Marcel – no
entender do Relatório duas teriam sido as omissões verificadas quanto à conduta desejável da Estratégia: (i) a
permissão de abertura de conta de cliente da corretora por Carlos Augusto dos Santos Santana, chefe da
custódia da Mafra, facilitando a apropriação por este de ações de clientes da Mafra no montante aproximado de
R$ 111.000,00 (cento e onze mil reais) e (ii) a falta de diligência quando da análise da legitimidade das
assinaturas de clientes da Mafra nas OT1 falsificadas. O Relatório não identifica nem sugere qualquer
participação da corretora ou de seu responsável no produto dos desvios (fls. 6.184).
1. Finalmente, por força da investigação realizada neste inquérito, a Comissão de Inquérito identificou duas
condutas de terceiros que, embora não relacionadas com as fraudes na Mafra, foram incluídas no bojo do
Relatório. Tais condutas e seus agentes são as seguintes:
a. Alexandre Medaber – gerente da mesa de operações da Corretora Exata desde 1997, e responsável pelas
operações de clientes da Mafra realizadas através daquela corretora, teria mantido conta como cliente da
Mafra, e realizado diversas operações através daquela distribuidora, e assim violado a proibição de negociar
através de instituição diversa daquela com que mantinha vínculo empregatício; e,
b. Antonio Carlos Barillari Fontes Pitanga – agente autônomo de investimentos credenciado pela Theca
Corretora desde 1996, e que teria mantido uma conta de cliente na Mafra entre agosto de 1997 e março de
1998, violando assim a proibição de negociar através de instituição diversa daquela em que estava credenciado
como agente autônomo.
1. Em razão dos fatos assim suscintamente descritos, o Relatório fez as seguintes imputações às pessoas antes
mencionadas, e à Mafra:
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"a) Mafra Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda. e seu sócio majoritário, Marco Antonio Faria
França, como os principais responsáveis:
a.1) pelos desvios de ações da custódia de clientes, utilizando-se de ardis e causando-lhes elevados prejuízos,
caracterizando a realização de operações fraudulentas no mercado de valores mobiliários, conforme
conceituadas no inciso II, alínea "c", da Instrução CVM nº 8, de 08 de outubro de 1979, contrariaram o inciso I
dessa mesma instrução;
a.2) por não manterem preenchidas corretamente as fichas cadastrais de seus clientes, descumpriram o
disposto no artigo 5º, "caput" e inciso I, combinado com o art. 16, ambos da Instrução CVM nº 220, de 15 de
setembro de 1994;
a.3) pela não identificação em documento próprio dos valores recebidos ou direcionados a seus clientes,
referentes a operações no mercado de valores mobiliários, bem como do número da conta corrente do cliente e
do nome dos destinatários dos cheques infringiram o artigo 10, incisos I e II, combinado com o art. 16, da
Instrução CVM nº 220, de 15 de setembro de 1994.
b) O sócio-gerente da Mafra Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S.A., Luiz Fernando Alves da Cruz
:
b.1) pelos desvios de ações da custódia de clientes, utilizando-se de ardis e causando-lhes elevados prejuízos,
caracterizando a realização de operações fraudulentas no mercado de valores mobiliários, conforme
conceituadas no inciso II, alínea "c", da Instrução CVM nº 8, de 08 de outubro de 1979, contrariaram o inciso I
dessa mesma instrução;
b.2) por não manter preenchidas corretamente as fichas cadastrais de seus clientes, descumprir o disposto no
artigo 5º, "caput" e inciso I, combinado com o art. 16, ambos da Instrução CVM nº 220, de 15 de setembro de
1994;
b.3) pela não identificação em documento próprio dos valores recebidos ou direcionados a seus clientes,
referentes a operações no mercado de valores mobiliários, bem como do número da conta corrente do cliente e
do nome dos destinatários dos cheques, infringir o artigo 10, incisos I e II, combinado com o art. 16, da
Instrução CVM nº 220, de 15 de setembro de 1994.
c) A Estratégia Investimentos S/A Corretora de Valores e Câmbio e seu diretor responsável pela área de
bolsa, Alexandro Marcel:
c.1) pela abertura da conta nº 055.00.2204-4 para o chefe de custódia da Mafra Distribuidora de Títulos e
Valores Mobiliários Ltda., Carlos Augusto dos Santos Santana, sabendo tratar-se de profissional de mercado
vinculado à Distribuidora, descumpriram o artigo 12 combinado com o artigo 16, da Instrução CVM nº 220, de
15 de setembro de 1994, prestando-se como veículo para ocorrência dos desvios de ações, conforme descrito
no item 36;
c.2) por não terem sido diligentes na administração da Corretora ao aceitar como legítimas as "Ordens de
Transferência de Ações Escriturais" (OT1) emitidas pela Mafra com falsificação das assinaturas de clientes,
permitindo, assim, as transferências a terceiros para alienação das ações pertencentes à Myrna Ribeiro de
Souza - 1.700.000 Unibanco PN e 1.100.000 Unibanco ON; ao Douglas Pohl Martins - 221.164 Telerj PN; à
Maria Regina Rosa Pohl Martins - 126.632 Telerj PN; à Ingried Pohl Monteiro - 76.046 Telerj PN, infringiram o
Art. 153 da lei nº 6404/76.
d) A Câmara de Liquidação e Custódia S.A – CLC - e seu diretor geral João Batista Fraga: pelo não envio
aos acionistas, clientes da Mafra Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda., dos avisos de
movimentação de suas ações, dificultando-lhes a detecção de operações fraudulentas praticadas pela
Distribuidora, infringiram o artigo 13, incisos I e II, da Instrução CVM nº 89, de 8 de novembro de 1988,
combinado com o artigo 5º da Instrução CVM nº 115 de 11 de abril de 1990.
e) A Bolsa de Valores de São Paulo (responsável à época dos fatos pela Custódia BOVESPA – atual
Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia) e seu Superintendente Geral, Gilberto Mifano : pelo não envio
aos acionistas, clientes da Mafra Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda., dos avisos de
movimentação de suas ações, dificultando-lhes a detecção de operações fraudulentas praticadas pela
Distribuidora, infringiram o artigo 13, incisos I e II, da Instrução CVM nº 89, de 8 de novembro de 1988,
combinado com o artigo 5º da Instrução CVM nº 115 de 11 de abril de 1990.
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