Recursos

AutorLeonardo Tibo Barbosa Lima
Páginas447-501
Lições de Direito Processual do Trabalho Teoria e Prática 447
18
Recursos
18.1 TEORIA GERAL
A CLT dispõe de regramento próprio sobre recursos, de maneira que é possível falar em uma teoria
geral dos recursos trabalhistas, com aplicação apenas subsidiária ou supletiva do CPC (art. 769 da CLT c/c
art. 15 do CPC).
Para a boa compreensão do tema, esclarecemos que juízo a quo é prolator da decisão recorrida, enquanto
juízo ad quem é o que vai julgar o recurso.
18.1.1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA
Na relação jurídica processual, recurso é um remédio voluntário e incidental destinado a invalidar, reformar,
esclarecer ou integrar uma decisão judicial. Ele é uma extensão do direito de ação, para o reclamante, e do direito
de defesa, para o reclamado.
18.1.2 PRINCÍPIOS
18.1.2.1 Duplo grau de jurisdição
Apesar de não estar previsto na Constituição, este princípio consta do art. 8º, § 2º, “h”, da Convenção
Americana de Direitos Humanos (1969)(845) e das leis processuais, determinando que os órgãos jurisdicionais se
organizem, de maneira a permitir a revisão dos julgados por juízes mais experientes.
Os princípios têm a característica de se harmonizarem, sem se excluírem. Por isso é que admitem certas
exceções, como ocorrem com a alçada recursal(846) no Processo do Trabalho em relação ao princípio do duplo grau
de jurisdição.
(845) “Artigo 8º — Garantias judiciais. [...] 2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não
for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
[...] h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.”
(846) As decisões dos dissídios de alçada (com valor da causa de até dois salários mínimos) são irrecorríveis, salvo se versarem sobre matéria
constitucional (art. 2º, § 4º, da Lei n. 5.584/70)
448 Leonardo Tibo Barbosa Lima
18.1.2.2 Taxatividade ou tipicidade
Para que um recurso exista, ele deve estar expressamente previsto na lei. Não há, pois, uma espécie genérica
ou residual de recursos, mas tão somente aqueles regidos pela lei, para os fins que ela determina.(847)
18.1.2.3 Fungibilidade ou conversibilidade
A interposição equivocada de um recurso por outro não prejudicará a sua análise, desde que estejam
preenchidos os pressupostos do recurso correto. Isso ocorre por economia processual, pela instrumentalidade das
formas e também pelo fato de que, na relação processual trabalhista, as nulidades só devem ser decretadas quando
causarem prejuízo (art. 794 da CLT).
O TST vem aplicando o princípio da fungibilidade, por exemplo, no caso da interposição errônea de recurso
ordinário contra liminar deferida em ação rescisória ou mandado de segurança, o qual deve ser recebido como
agravo regimental, que é, em verdade, o recurso cabível.(848) De outra face, a fungibilidade não tem lugar quando
o recurso interposto está calcado em erro grosseiro, como é o caso da interposição do recurso de revista em vez
do recurso ordinário.(849)
18.1.2.4 Voluntariedade
A interposição de recursos não é obrigatória. Ela constitui um ônus para a parte, cuja consequência, no caso
de optar por não recorrer, será a preclusão máxima, operando-se o trânsito em julgado da decisão.
O instituto da remessa necessária (art. 1º, V, do Decreto-lei n. 779/69 e art. 496 do CPC) não afeta a
voluntariedade dos recursos, uma vez que sua natureza jurídica é de condição de eficácia da sentença e não de
recurso.
18.1.2.5 Non reformatio in pejus
Aquele que recorreu não pode ter sua situação piorada por ocasião do julgamento do recurso por ele interposto.
Esse princípio é um corolário do princípio da congruência (art. 492 do CPC). No entanto, vale lembrar que é
comum que a outra parte também recorra, circunstância que autoriza a piora da decisão para a parte recorrida.
18.1.2.6 Variabilidade e unirrecorribilidade
Na eventualidade de poderem ser interpostos dois recursos contra a mesma decisão, o segundo implica na
desistência tácita do primeiro, pelo que se diz que a espécie recursal pode variar de uma para outra (variabilidade).
Imagine-se, por exemplo, que a parte oponha embargos de declaração contra uma sentença que lhe pareceu
contraditória, porque não apreciou corretamente uma prova constante dos autos. Todavia, no dia seguinte, resolva
interpor recurso ordinário, o qual considerou ser mais adequado para o fim que pretendia (obter a reapreciação
da prova). O segundo recurso (o ordinário) fará com que o primeiro (embargos de declaração) perca seu objeto e
será admitido em lugar deste, pelo princípio da variabilidade.
(847) Enunciado n. 12 do FNPT. “[...] O art. 22 da Constituição Federal confere privativamente à União a competência para legislar em
matéria processual. O ordenamento legal não comporta a criação de remédio jurídico de natureza recursal, denominado de reclamação
correicional e disposto em regimento interno de Tribunal. Aplicação do art. 22 da CF/88 e art. 709 da CLT.”
(848) Orientação jurisprudencial da SDI-II do TST n. 69. “Fungibilidade recursal. Indeferimento liminar de ação rescisória ou mandado de
segurança. Recurso para o TST. Recebimento como agravo regimental e devolução dos autos ao TRT. Recurso ordinário interposto contra
despacho monocrático indeferitório da petição inicial de ação rescisória ou de mandado de segurança pode, pelo princípio de fungibilidade
recursal, ser recebido como agravo regimental. Hipótese de não conhecimento do recurso pelo TST e devolução dos autos ao TRT, para que
aprecie o apelo como agravo regimental.
(849) Orientação Jurisprudencial n. 152 da SDI-II, do TST. “Ação rescisória e mandado de segurança. Recurso de revista de acórdão regional
que julga ação rescisória ou mandado de segurança. Princípio da fungibilidade. Inaplicabilidade. Erro grosseiro na interposição do recurso
(DEJT divulgado em 03, 04 e 05.12.2008) A interposição de recurso de revista de decisão definitiva de Tribunal Regional do Trabalho em
ação rescisória ou em mandado de segurança, com fundamento em violação legal e divergência jurisprudencial e remissão expressa ao art.
896 da CLT, configura erro grosseiro, insuscetível de autorizar o seu recebimento como recurso ordinário, em face do disposto no art. 895,
“b”, da CLT.”
Lições de Direito Processual do Trabalho Teoria e Prática 449
Todavia, se o primeiro recurso interposto já tiver sido conhecido, o princípio da variabilidade ficará
prejudicado, porque não se pode recorrer da mesma decisão mais de uma vez (unirrecorribilidade), por força da
preclusão consumativa.(850)
18.1.2.7 Dialeticidade
Esse princípio está fortemente ligado à voluntariedade da interposição de recursos. Ora, se a parte não é
obrigada a recorrer, quando o faz deve demonstrar em que parte a decisão recorrida lhe foi desfavorável (interesse)
e apontar os fundamentos para pleitear a respectiva anulação ou a reforma. Em outras palavras, cabe ao recorrente
explicitar qual é a matéria que pretende devolver para ser novamente julgada, pela via recursal.
Nos termos do art. 932, III, do CPC, não será conhecido o recurso que não tiver “impugnado especificamente
os fundamentos da decisão recorrida”. Todavia, esse princípio tem aplicabilidade mínima no recurso ordinário,
tendo em vista que ele é interposto por mera petição, sem a necessidade de apresentação de razões recursais
(Súmula n. 422 do TST). Mas é preciso que a parte, na petição de interposição do recurso, ao menos demonstre
o interesse em recorrer, identificando a parte da decisão com a qual não concorda e pretende ver anulada ou
modificada.
18.1.2.8 Irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias
No Processo do Trabalho, as decisões interlocutórias só podem ser objeto de recurso interposto contra a
decisão final (sentença ou acórdão), desde que não estejam preclusas (art. 893, § 1º, da CLT). Para tanto, a parte
poderá fazer uso do protesto oral (quando a decisão for tomada em audiência) ou escrito (quando a decisão for
escrita).
Mesmo com o advento do CPC de 2015, o TST reafirmou seu entendimento pela prevalência desse princípio,
salvo as exceções da Súmula n. 214 (art. 1º, § 1º, da IN n. 39/16).
Caso a decisão interlocutória fira direito líquido e certo da parte, esta poderá fazer uso do Mandado de
Segurança, em algumas hipóteses, para corrigir a ilegalidade, tema que será objeto de exame mais detalhado no
item 22.4.1.4.1.1.
Como o instituto da reclamação (art. 988 do CPC) ainda é recente no Processo do Trabalho, as cortes
trabalhistas ainda não possuem entendimento consolidado quanto ao seu cabimento para atacar decisões
interlocutórias, já que a reclamação só é admissível quando esgotados os meios de impugnação da decisão
(art. 988, § 5º, II, do CPC). A nosso ver, contundo, os meios de impugnação às decisões interlocutórias, no Processo
do Trabalho, só se esgotam após a interposição do recurso da decisão definitiva (recurso ordinário, por exemplo,
na 1ª instância). O que a CLT veda é o recurso imediato das decisões interlocutórias, as quais podem ser atacadas,
no entanto, por ocasião do recurso da decisão definitiva. Assim é que a reclamação do art. 988 do CPC não é
cabível para atacar decisões interlocutórias no Processo do Trabalho.
18.1.3 CLASSIFICAÇÃO
18.1.3.1 Quanto à finalidade
Considerando o fim colimado pelo recorrente, os recursos podem se destinar: a) à reforma — para reexame
do mérito da demanda; b) à invalidação — para anular a decisão que contenha vícios processuais, com a prolação
(850) “[...] A interposição de recurso eivado de irregularidade de representação processual, ainda que considerado inexistente, produz
efeitos processuais, acarretando a preclusão consumativa. Desse modo, a interposição do segundo apelo não possui o condão de sanar os
vícios que contaminaram o primeiro recurso, porquanto nem sequer é passível de exame. Na hipótese, a reclamada, ao impugnar a decisão
monocrática que denegou seguimento ao seu agravo de instrumento, interpôs dois agravos internos na mesma data, havendo diferença de
horas na protocolização. A Turma não conheceu do primeiro agravo, visto que assinado por advogados sem poderes nos autos, reputando-o
inexistente, nos termos da então vigente Súmula n. 164 do TST. Além disso, deixou de examinar o segundo agravo, com fundamento
no princípio da unirrecorribilidade e na preclusão consumativa. [...]” (TST-E-ED-Ag-AIRR-150700-20.2009.5.02.0057, SBDI-I, rel. Min.
Alexandre de Souza Agra Belmonte, 08.11.2018)

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT