Teoria geral do processo do trabalho

AutorLeonardo Tibo Barbosa Lima
Páginas63-99
Lições de Direito Processual do Trabalho Teoria e Prática 63
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Teoria Geral do Processo do Trabalho
2.1 CONCEITO
O Direito Processual do Trabalho é um r amo do Direito que reúne princípios, normas, institutos e instituições,
com a finalidade de concretizar o Direito Material do Trabalho, regendo as atividades jurisdicionais no âmbito da
Justiça do Trabalho.
O Direito Material do Trabalho é espécie de direito fundamental (arts. 6º e 7º, da CF), de segunda dimensão.(1)
Como tal, necessita de instrumentos que promovam a sua concretização, ou seja, que sejam capazes de tornar
realidade a norma constitucional abstrata. É aí que entra o Direito Processual do Trabalho, apresentando-se como
uma ferramenta destinada a aplicar a lei trabalhista.
A relação jurídica material estabelecida entre trabalhador e tomador de serviços(2) é privada,(3) regida por leis e
por cláusulas contratuais. Quando, eventualmente, surge um conflito entre eles, por vezes procuram a Jurisdição,(4)
que é uma atividade estatal destinada a solucionar conflitos, a qual é prestada pelo Poder Judiciário. No caso das
relações trabalhistas, a Constituição Federal de 1988 atribuiu essa atividade a um órgão especializado do Poder
Judiciário: a Justiça do Trabalho.
Ao provocarem a atividade jurisdicional, os interessados dão início a uma nova relação jurídica, autônoma
em relação àquela relação material, que é a relação jurídica processual. Nesta, tomador de serviços e trabalhador
passam a ser chamados de partes. A principal diferença entre essas relações é que, na processual, há a presença
do Estado, através do juiz.(5) Este ingressa na relação jurídica originariamente estabelecida só entre trabalhador e
tomador de serviços, a fim de decidir o conflito, fazendo uso de poderes e deveres estabelecidos na lei processual.
(1) Os direitos de primeira dimensão são os civis e políticos. Os de terceira dimensão são os metaindividuais.
(2) Antes da EC n. 45/04, a Justiça do Trabalho julgava apenas demandas entre empregados e empregadores, salvo singelas exceções, como a
do artífice (art. 652, “a, III, da CLT). A partir da Emenda, a competência foi ampliada, pelo que é mais adequado se referir às partes
como sendo trabalhador e tomador de serviços, figuras que englobam as de empregado e empregador.
(3) Prevalece na doutrina o entendimento de que a relação de trabalho é de natureza privada, uma vez que o Estado dela não é parte como
sujeito soberano. Isso não impede, contudo, a existência de normas cogentes de ordem pública, destinadas à tutela de direitos públicos
incidentais, como é o caso das regras de segurança e medicina do trabalho e as relativas ao FGTS, que é um fundo de interesse público.
(4) A Jurisdição não é o único método de resolução de conflitos, vale destacar. Além dela, existe a arbitragem.
(5) Por isso é que a relação jurídica processual é de natureza pública, com existência de normas cogentes.
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2.2 FUNDAMENTOS
2.2.1 FONTES
No processo, os atos das partes e do Juiz são regidos por normas e princípios específicos, daí porque se diz da
existência de um Direito Processual do Trabalho. Este retira sua validade da Constituição Federal, especialmente,
Além da Constituição, o Processo do Trabalho é regido, principalmente, pelas seguintes normas (ordem
cronológica):
a) CLT (1943), dos arts. 643 a 910;
b) Decreto n. 779/69, o qual versa sobre aplicação de normas processuais trabalhistas à União Federal e aos
Estados, Municípios, Distrito Federal e Autarquias ou Fundações de direito público que não explorem
atividade econômica;
c) Lei n. 4.725/65, que estabelece normas sobre o procedimento dos dissídios coletivos;
d) Lei n. 5.584/70, que dispõe sobre normas de Direito Processual do Trabalho, altera dispositivos da
CLT, disciplina a concessão e prestação de assistência judiciária na Justiça do Trabalho e dá outras
providências;
e) Lei n. 7.115/83, a qual confere à declaração de pobreza presunção de veracidade;
f) Decreto-lei n. 2.322/87, relativo à incidência de juros e correção monetária no Processo do Tr abalho;
g) Lei n. 7.701/88, que trata da especialização de Turmas dos Tribunais do Trabalho em processos coletivos;
h) Lei n. 8.177/91, que também rege os juros e a correção monetária dos débitos trabalhistas;
i) Lei Complementar n. 75/93, que estrutura o Ministério Público do Trabalho;
j) Lei n. 8.984/95, que firma a competência da Justiça do Trabalho para conciliar e julgar dissídios coletivos
com origem no cumprimento de Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho;
k) Lei n. 11.419/06, que institui o Processo eletrônico;
Quando nenhuma dessas normas for capaz de atender às necessidades surgidas na relação processual
trabalhista, o Juiz deverá aplicar o direito processual comum (art. 769 da CLT), se o processo estiver na fase de
conhecimento, e a Lei n. 6.830/80, que trata das Execuções Fiscais, caso o processo esteja na fase de execução
O direito processual comum é composto de uma infinidade de normas, mas as principais são: a) Código de
Processo Civil; b) Lei n. 7.347/85, da Ação Civil Pública; c) Lei n. 8.009/90, do bem de família; d) Lei n. 8.078/90,
o Código de Defesa do Consumidor; e) Lei n. 12.016/09, do Mandado de Segurança.(6)
Além dessas normas, o Direito Processual do Trabalho também retira seu fundamento dos princípios
processuais, os quais serão estudados oportunamente.
São dessas normas e princípios(7) que o Direito Processual do Trabalho nasce. Em outras palavras, essas são
as suas principais fontes. Contudo, a doutrina costuma enumerar outras fontes, classificando-as em materiais e
formais.
As fontes materiais dizem respeito aos fatos sociais. E isso decorre de uma condição lógica. Ora, um ramo
do Direito não surge ao sabor do acaso. Ele é pensado e criado em função de fatos sociais que demonstraram
(6) Vale lembrar uma curiosidade, que é a aplicação do Código de Processo Penal, o qual também é espécie de direito processual comum.
Como exemplo, cite-se o art. 239, que conceitua o instituto do indício, o qual não tem dispositivo equivalente na CLT, tampouco no CPC.
(7) Norma jurídica é o resultado da fusão entre regra e princípio. Sem desconhecer esse postulado, insta esclarecer que a referência feita
aos princípios, de forma separada, decorre apenas da necessidade de distinguir, para a boa compreensão do texto, as normas anteriormente
citadas dos princípios que ainda serão apresentados, em momento oportuno.
Lições de Direito Processual do Trabalho Teoria e Prática 65
a necessidade de sua concepção. Em sua origem, portanto, o Direito Processual do Trabalho era um clamor da
sociedade.
Já as fontes formais decorrem de atos. Se esses atos são do Estado, as fontes são chamadas de diretas, sendo
exemplo a Constituição Federal, a legislação trabalhista e as súmulas vinculantes do STF. São todas elas genéricas
e imperativas.
Caso o ato não provenha do Estado, ou, vindo dele, não seja genérico e abstrato, a fonte será chamada de
indireta. No primeiro caso, temos a doutrina, cuja elaboração é facultada a todos.(8) No segundo, a jurisprudência
dos tribunais, a qual guarda pertinência com casos específicos e concretos, sem poder de vinculação, em regra.(9)
Por fim, há ainda as fontes formais explicativas, as quais são destinadas à interpretação e aplicação das outras
fontes. É o caso da analogia, da equidade e dos princípios gerais do direito.
Existem atos, contudo, que intrigam a doutrina, a ponto de torná-los polêmicos quanto à sua natureza
enquanto fonte. Veja-se o caso dos Regimentos Internos dos Tribunais. Apesar de não serem leis em sentido formal,
a própria lei lhes delega o trato de determinados assuntos, como é o caso do art. 909, da CLT, o qual estabelece
que “a ordem dos processos no Tribunal Superior do Trabalho será regulada em seu regimento interno”. Em casos
como esse, não há como negar a natureza jurídica de fonte formal direta.
Outro caso curioso é o dos costumes, que são atos praticados com habitualidade, diferenciando-se dos usos,
por possuírem caráter obrigatório, enquanto estes são apenas facultativos. É exemplo de uso a cor das folhas de
papel utilizadas nos processos. Não há lei que obrigue o uso do papel branco, razão pela qual toda sorte de cor é
permitida. Entretanto, imagine-se que alguém queira fazer uso de um papel preto, com tintas brancas. Isso causará
estranheza ou talvez torne desconfortável a leitura, mas não será proibido.
Já o costume é diferente. Um exemplo dele seria o protesto, ato que consiste em declarar ao Juiz a discordância
em relação a uma decisão interlocutória, contra a qual não caiba recurso imediato. Imagine-se que, em uma
audiência, o Juiz indefira a produção de uma prova. A CLT não admite a interposição de recurso imediato dessa
decisão, tampouco apresenta alternativa. Daí que muitos advogados passaram a declarar sua discordância em
ata, fazendo constar os seus protestos. Isso se tornou costume, pois, caso a parte não proteste imediatamente, sua
reação não mais será admitida quando da eventual interposição de um recurso, uma vez que se terá operado a
preclusão (art. 507 do CPC).
Outro exemplo de costume processual é a concessão de prazo para a parte autora impugnar os documentos
juntados pela parte ré. No rito sumaríssimo, a Lei n. 9.957/00 expressamente fez referência a essa impugnação
(art. 852-H), mas ela continua existindo no rito ordinário por força do costume, para prestigiar os princípios da
ampla defesa e do contraditório.
É, pois, o costume uma fonte formal direta, quando for incorporado como ato estatal.
2.2.2 INSTRUÇÕES NORMATIVAS DO TST
Por fim, vale mencionar as Instruções Normativas do TST. Elas foram concebidas com a finalidade de esclarecer
a comunidade jurídica sobre as tendências interpretativas do TST sobre temas processuais polêmicos, para evitar
que nulidades processuais sejam decretadas na eventualidade de o processo chegar ao crivo daquela Corte.
Citem-se, como exemplo, as Instruções Normativas n. 27, que trata das modificações introduzidas pela
EC n. 45, as de n. 39 e n. 40, que versam sobre o CPC de 2015, e a n. 41, que dispõe sobre a Lei n. 13.467/2017
(reforma trabalhista).
(8) O leitor terá contato, ao longo desta obra, com inúmeros enunciados de juristas, aprovados em Fóruns de debate. A natureza jurídica
desses enunciados é de doutrina, de maneira que apenas constituem fonte formal indireta.
(9) Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, a jurisprudência dos Tribunais superiores passou a ser de observância obrigatória
pelos julgadores. Não se trata de jurisprudência vinculante, nos moldes da Súmula Vinculante (Lei n. 11.417/06), mas, na prática, a
jurisprudência consolidada dos tribunais deverá ser observada, pena de ensejar o ajuizamento de Reclamação ou simplesmente haver a
inadmissibilidade ou o julgamento antecipado de recursos, por exemplo. Esse tema será abordado com mais profundidade no capítulo
referente aos recursos.

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