The political ecology of Enrique Dussel: approaches for social struggles in Latin America/A ecologia politica de Enrique Dussel: aproximacoes para as lutas sociais na America Latina.

AutorCosta, Cesar Augusto

Enrique Dussel: uma critica ambiental para a America Latina

O filosofo argentino Enrique Dussel e considerado pelos historiadores da America Latina (AL) como um pensador que contribuiu e construiu solidas bases para a etica latino-americana da libertacao (PINTO; RAPOSO, 2014). O pensador argentino notabilizou-se pela genese e sistematizacao da filosofia da libertacao, a partir da leitura critica e subsuncao das filosofias de Ricoeur, Levinas, Marx, entre outros, formulando uma filosofia politica latino-americana (DUSSEL, 2007a) e, alem disso, tambem da etica da libertacao (DUSSEL, 2000). Ou seja, entendemos sua importancia no panorama latino-americano da seguinte forma:

uno de los intelectuales mas destacados de America Latina, por su capacidad de interpretar la realidad social y cultural de la segunda mitad del siglo XX y principios del XXI. Este trabajo describe el perfil de un intelectual del mas alto nivel academico, surgido de la lucha politico-ideologica de la decada de 1960 en Argentina y Mexico [...]. se sintetiza lo que constituye una teoria latinoamericana de la liberacion a partir del ejercicio etico en el ambito de las luchas politicas de los grupos marginales en America Latina y de aquellos sectores que participaron decididamente en estas luchas. (ARIAS, 2010, p. 183).

Partindo desta consideracao inicial, indicamos que este autor problematiza a filosofia da America Latina. Esta, tendo carater europeu, fez prevalecer a manutencao teorica e ideologica do colonizador sobre o colonizado. No entanto, Dussel, Zea e outros apontam que ha uma filosofia latino-americana tencionada por uma filosofia que nao se moldada apenas pelo pensamento eurocentrico, mas que reivindica para si uma consciencia critica com metodo e epistemologia proprios (CAVALCANTE JR., 2012).

Atraves de sua filosofia da libertacao, o autor analisa o processo opressivo da dominacao colonial dos povos e culturas no plano mundial, questionando o discurso da modernidade. Sua filosofia e sua etica da liber tacao fazem claramente uma opcao politica pelas vitimas do sistemamundo, compreendido como o processo de ampliacao da influencia cultural de um sistema civilizatorio a outras culturas, e que tem no capitalismo sua expressao mais evidente (DUSSEL, 2000). Dussel pretende nos posicionar em um horizonte planetario global para alem do eurocentrismo, o que impoe reconhecer a America Latina (a partir da periferia), visando interpelar a globalidade europeia. Sua etica da libertacao e um "principio material" (DUSSEL, 2007a) que parte do sujeito negado a luz do mundo periferico, cujo capitalismo, em seu processo de globalizacao-exclusao, foi determinado pelo sistema-mundo colonial eurocentrico.

A incursao de Dussel ao pensamento marxista e fundamental para entender sua visao critica no contexto periferico. Talvez a mais paradigmatica de suas obras sobre Marx seja A producao teorica de Marx: um comentario aos Grundrisse (DUSSEL, 2012), no qual ele faz uma reconstrucao analitica da obra do pensador alemao, com enfase na "mais-valia" e no "trabalho excedente", assim como em suas derivacoes e consequencias nos paises da America Latina, na periferia do capitalismo mundial (ARIAS, 2010).

Dussel (2011) tem contribuido nao somente com a discussao completa acerca dos manuscritos preparatorios de O capital, mas tambem com uma reconstrucao dos planos gerais do trabalho feito por Marx. Nesse movimento, o filosofo argentino incluiu na analise aguda do sociometabolismo do capital, oriunda do pensamento marxiano, reflexoes provenientes do discurso libertario latino-americano. Sendo assim, "en las obras criticas sobre el discurso marxista, Dussel toma uma sana distancia para ejercer su accion analitica de todos y cada uno de los conceptos clave para entender el proceso de acumulacion y explotacion capitalistas en el marco del materialismo historico" (ARIAS, 2010, p. 188). E sob as influencias dessas categorias assinaladas que:

Dussel plantea que, la liberacion, es una etica de la vida; la negacion de la vida humana es el tema central, el punto de arranque decisivo de toda la critica y la toma de conciencia de toda negatividad expresada en el sufrimiento de las victimas, de los dominados, como el obrero, el indio, el esclavo africano o explotado asiatico del mundo colonial; como la corporalidad femenina, la raza no-blanca, generaciones futuras que sufriran en su corporalidad las consecuencias del deterioro ecologico; como viejos sin destino en la sociedad de consumo, ninos de la calle, inmigrantes, refugiados, etcetera. (ARIAS, 2010, p. 195).

Alem disso, ele soube se apropriar de categorias marxianas que auxiliaram na compreensao de como as relacoes sociais alienadas sao determinantes na degradacao ambiental, evitando discursos hipostasiados da moral ou da tecnologia como causas primarias da destruicao, comuns no campo ambiental. Em uma passagem magistral, Ao tratar da questao tecnologica, Dussel (2011, p. 235-236--grifos no original) sintetiza:

De manera que la tecnologia, tal como hoy la conocemos, no es sino una tecnologia de las posibles y cuyo criterio de realidad o existencia queda determinado por ser la que mayor tasa de ganancia produjo a corto plazo (y debe ser a corto plazo, porque la 'competencia' no permite largos plazos, porque en esse lapso el capital en cuestion habria sido aniquilado por la dicha competencia por otros capitales (individuales, ramas o naciones) mas desarrollados, o tecnologicamente mejor implementados en cuanto a producir por unidad productos con menor valor y proporcionalmente mas plusvalor). Es decir, y esto es lo que se escapa a un cierto ecologismo ingenuo, la tecnologia no es en si un factor destructivo de la vida en la naturaleza (eticamente perversa por atentar contra la dignidad de la vida, que es en nuestro caso lo que interesa como lo mas vulnerable de la naturaleza), sino que lo peligroso es el 'todo' que la usa y subsume para un fin antiecologico (eticamente perverso): el aumento cosico (y no humano ni etico) del plusvalor del capital. En este caso no es la tecnologia la antiecologica sino el criterio cuya esencia es el capital: el capital constituye a la naturaleza, a la vida y a la persona del trabajador como mediaciones para la 'valorizacion del valor'. Ha invertido el principio de toda etica: ha colocado a la persona como medio, y a las cosas (el plusvalor) como fin (ya Kant lo habia formulado explicita y correctamente). La causa creadora del plusvalor (el trabajo vivo) es ahora una mediacion del aumento cosico del plusvalor (fundamento de la ganancia). La naturaleza, la vida, por su parte, es para el capital (y no para la humanidad) algo apropiable, explotable, pura mediacion sin dignidad propia (componente esencial de la realidad sin valor 'de cambio', sin precio, diria Marx). Esta es la razon de la destruccion ecologica de la vida en la tierra, y lo peor es que el capital no tiene ninguna posibilidad de establecerse a si mismo un limite (toda limitacion es su total aniquilacion como capital). Colocar al capital un limite ecologico es destruirlo en su esencia, es negar su propia 'logica', que consiste en luchar mortalmente (homo homini lupus) en la 'competencia' por contrarrestar el tendencial descenso de la tasa de ganancia destruyendo todos los limites: the civilicing power of capital. A argumentacao central de sua filosofia considera o sofrimento do outro como a consequencia do projeto civilizatorio, no qual sujeitos subjugam outros (negros, pobres, indios, camponeses, trabalhadores, marginais) por meio de relacoes desiguais e opressivas de poder. Alguns estudos foram relevantes para ajudar o autor a fundamentar e criticar teoricamente, uma vez que ele partiu da miseria do povo para suscitar um pensamento filosofico tendo em vista essa realidade sofrida:

A descoberta da miseria do meu povo, percebida desde a minha infancia no campo quase desertico, levou-me a Europa e a Israel. Ia, assim, descobrindo, como frisava o filosofo mexicano Leopoldo Zea, em sua obra America en la historia (1957), que a America Latina se encontra fora da historia. Era preciso encontrar para ela um lugar na Historia Mundial, partindo da sua pobreza, e, assim, descobrir a sua realidade oculta. (DUSSEL, 1995, p. 14).

Dessa forma, a filosofia latino-americana pode ser vista assim:

E uma filosofia que brota do olhar do colonizado, daquele que historicamente foi oprimido e excluido. Organiza-se a partir do lado que foi negado. E uma filosofia que constrange o discurso da ordem, sendo, portanto, libertadora. Constitui-se, desta forma, como uma Filosofia da Libertacao, a qual busca mostrar a possibilidade do dialogo mediante a afirmacao da diferenca e da alteridade numa perspectiva do diferente. Daquele que ficou a margem das construcoes ideologicas sociais. (CAVALCANTE JR., 2012, p. 3-4)

Assim, cabe perguntar: em termos de uma reflexao ambiental para a America Latina, quais pistas o pensador argentino poderia indicar? Entendemos que a questao social vem sendo pensada em contraposicao a questao ambiental nos marcos do pensamento eurocentrico e a luz do espectro economico, social e politico inerente ao capitalismo. Isto porque "e o consenso que se ve, hoje, em curso na America Latina onde as divergencias entre esses campos politicos nao se distinguem diante da questao ambiental (PORTO-GONCALVES, 2015a, p. 2).

Na America Latina, desde finais dos anos 1990, precisamente apos o ano de 2000, os movimentos sociais conseguiram pautar uma questao central para os governos progressistas na regiao: a desigualdade social. Desde entao, os niveis de desigualdade social diminuiram visivelmente, conforme consta em varios relatorios da Comissao Economica para a America Latina (Cepal). Segundo a Cepal (2012), as taxas de pobreza tambem declinaram de forma significativa, ancoradas, sobretudo, em politicas e programas sociais direcionados aos setores mais vulnerabilizados. Com a generalizacao da terceirizacao como principal forma de organizacao da...

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