The rupture between economics and politics in the world of capital/A ruptura entre economia e politica no mundo do capital.

AutorOsorio, Jaime

1 Denominamos de capital a unidade diferenciada de rela coes sociais de exploracao e dominio. No mundo do capital, toda relacao de dominio de classes (a diferenca de formas de opressao ou de poder que nao sao constitutivamente de classes: pai/filho; professor/aluno; homem/ mulher; medico/paciente, etc.) e relacao de exploracao (direta, sobre trabalhadores ativos, ou indireta, sobre trabalhadores inativos) e toda relacao de exploracao e, por sua vez, relacao de dominio de classes.

2 O capital nao pode se revelar no mundo fenomenico como exploracao e dominio. Pelo contrario, o capital promete a construcao de um mundo de homens livres e iguais. E embora violente essa promessa, deve, contudo, reconstitui-la. Para isso tem que conformar a ficcao real de um mundo de homens livre e iguais. Ficcao, pois encobre e desvirtua a essencia do seu ser. Real, porem, pois esta inversao atua e ganha consistencia. Opera efetivamente. Em poucas palavras, o capital precisa se apresentar de modo distorcido, ao contrario do que e de fato. Isto faz parte do processo de fetichizacao do capital, que lhe permite "criar um mundo encantado, de ponta cabeca". (MARX, 1973, v. Ill, p. 768). Atraves da fetichizacao, o serse manifesta se ocultando. Aqui nos interessa desvendar alguns dos processos que tornam possivel sustentar essa ficcao.

3 Um primeiro passo do capital, neste processo de se ocultar e se revelar de modo distorcido, implica a ruptura da sua unidade economico-politica, conformando tais dimensoes como esferas autonomas e independentes, e nao mais como diferencas no seio de uma unidade. O desenvolvimento desta tendencia conduz a formacao de saberes com "objetos" particulares: a ciencia da economia ou ciencia economica, e a ciencia da politica ou ciencia politica. Dai a se constituirem como disciplinas--em momentos nos quais os saberes sociais se disciplinam--parecera um passo normal

4 Para compreender em sua complexidade a unidade economico/politica do capital e o processo de ruptura desta unidade e pertinente considerar a particularidade da primeira fase da circulacao, onde se realiza a compra e venda de meios de producao e de forca de trabalho. E quando os portadores de capital e de trabalho se apresentam como sujeitos livres, que soberanamente realizam o processo de troca. Por isso, diz Marx (v.l, 1973), o mercado aparece como reino da liberdade. (1) O trabalhador e dono de sua forca de trabalho e, livremente, sem coercao visivel nem sujeicao a ou-tros sujeitos, se apresenta para vender sua mercadoria, da mesma forma que o burgues, que, tambem livremente, chega ao mercado com a mercadoria dinheiro, disposto a comprar forca de trabalho.

5 Neste processo de livre troca, e importante destacar o obscurecimento dos processos politicos que o tornam possivel e que deixam manifesto a coercao e a ficcao de liberdade em que se encontra o vendedor de forca de trabalho. (2) Primeiro, porque ele e sua classe foram objeto de violencia nos processos de despojo e expropriacao de terras e ferramentas, ficando privados de meios de producao. Segundo, porque o montante de dinheiro recebido pela venda de sua forca de trabalho permite apenas a reproducao diaria do trabalhador. Isso implica que, necessariamente, o trabalhador deva se apresentar dia apos dia no mercado para vender sua mercadoria, pois do contrario e sua propria existencia, como ser vivo, que se coloca em risco. O que temos entao e uma nova coercao politica, regendo a "liberdade" dos trabalhadores e sua cotidiana presenca no mercado. Terceiro, porque o trabalhador e expropriado de valor, pelo menos do valor que excede o valor de sua forca de trabalho, o que implica exploracao, e um Estado de direito (dominio) que torna possivel a exploracao.

6 A forca de trabalho repousa na corporeidade viva do trabalhador (musculos, cerebro, sistema nervoso, esqueleto, coracao, pulmoes, etc). Nao ha como separar uma coisa da outra. Portanto, quando o trabalhador vende sua forca de trabalho, o capital nao apenas recebe aquela mercadoria, mas tambem a corporeidade total do trabalhador. E tudo que aconteca com essa forca de trabalho, trabalhando, em extenuantes jornadas, intenso trabalho, sem falar das exaustivas horas de deslocamento da casa ao trabalho e vice-versa, incide no trabalhador e em seu corpo (e alma ou espirito). Aqui radica o ponto central do poder do capital sobre a vida, o "biopodef. E e por desconhecer ou ignorar esse processo que as formulacoes de Michel Foucault e Giorgio Agamben (3), mesmo em sua radicalidade, acabam deixando de lado o processo fundamental e generalizado que explica a capacidade do poder (do capital) sobre a vida, de coloca-la, permanentemente, em interdicao em nosso tempo. (4)

7 E a presenca de uma violencia institucional (consagrada por leis em um Estado de direito), de coercao encoberta, que explica que nao seja necessario que um corpo policial retire os trabalhadores de suas camas nas primeiras horas da manha ou os acoite para que se dirijam aos centros de transporte publico e dali aos seus locais de trabalho. Aquela violencia de despojo ancestral, a qual se soma agora a violencia cotidiana (expropriacao diaria de mais-valor), obriga o trabalhador a buscar um salario para sobreviver. Este e o marco de liberdade do vendedor de forca de trabalho. O que se apresenta como operacoes simplesmente economicas sao tambem operacoes politicas de submissao, violencia e coercao encobertas.

8 Historicamente, a...

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