What are the main reorganization mechanisms adopted by Brazilian companies undergoing judicial reorganization?/Quais os principais mecanismos de reorganizacao adotados pelas empresas brasileiras em recuperacao judicial?

AutorGrossert, Ricardo Risso
  1. Introducao

Estudos sobre estrutura de capital das empresas e fatores que exercem influencia sobre sua definicao surgem a partir da busca pelo entendimento do funcionamento das atividades empresariais. Nesse sentido, e notavel que as decisoes das empresas em relacao a sua estrutura de capital podem ser circundadas por algumas particularidades, como existencia de fontes de financiamento diferenciadas e desenvolvimento recente do mercado de capitais. Essas particularidades sao evidentes no Brasil, e, consequentemente, demandam atencao na analise da estrutura de capital das empresas.

Empresas que solicitam recuperacao judicial devem escolher um conjunto de medidas estrategicas para solucionar o problema financeiro. De acordo com o artigo 50 da lei falimentar 11.101/05, uma empresa pode adotar mais de 15 possibilidades de reorganizacao com o proposito de apresentar uma solucao para os problemas de endividamento, solvencia e liquidez. Coletivamente, os meios de reorganizacao podem ser resumidos em venda de ativos, renegociacao da divida, nova captacao de recursos e reestruturacao da gestao. Como exemplos de renegociacao da divida, podemos elencar decisoes sobre a concessao de novos prazos e condicoes de pagamentos. De venda de ativos: a venda de maquinas e equipamentos. De nova captacao de recursos: a emissao de divida e aumento de capital social. De reestruturacao da gestao: a fusao e alteracao do controle societario.

E importante ressaltar que uma empresa apresenta dificuldades financeiras por problemas de solvencia ou liquidez ou uma combinacao de ambos (o principal termo utilizado na literatura e financial distress). Isso ocorre quando a liquidacao dos ativos atuais em valores correntes nao e suficiente para honrar os compromissos firmados com diversos credores. Neste contexto, a lei 11.101/05 (commodificacoes em 2020 segundo alei 14.112/2020) entrou em vigor com o proposito de apresentar melhores condicoes de recuperacao ou liquidacao de empresas em situacao financeira complicada. Assim, o objetivo do presente artigo e aferir os principais meios de reorganizacao utilizados pelas empresas em recuperacao judicial no Brasil a luz do artigo 50 da lei 11.101/2005.

A literatura internacional sobre recuperacao judicial e falencia expoe diferentes alternativas de reestruturacao do ativo e do endividamento (Ofek, 1993; Asquith et al., 1994; Brown et al., 1993; Bolton e Scharfstein, 1996; Gilson et al., 2015; Kruse, 2002; Ponticelli e Alencar, 2016; Ivashina et al., 2016). A decisao acerca da forma de reestruturacao nao e simples, ja que a empresa com dificuldade financeira pode enfrentar simultaneamente problemas de liquidez, altos custos de reorganizacao e dificuldade de obtencao de novos recursos. Em adicao, aspectos como assimetria de informacao, problemas de coordenacao e conflitos de interesse tambem corroboram para a complexidade da escolha da estrategia de reestruturacao em cada caso (Leland, 1994; Bebchuk, 2002; Broadie et al., 2007; Senbet e Wang, 2012; von Thadden et al., 2010). ?

Diferentemente dos estudos supracitados, cujo proposito e aferir friccoes de mercados e avaliar motivos, decisoes e consequencias que permeiam as escolhas de reestruturacao de uma empresa, este artigo apresenta uma abordagem de investigacao centrada nos mecanismos de reestruturacao efetivamente utilizados. Ou seja, o foco do presente estudo e investigar quais foram os principais meios de reestruturacao adotados pelas empresas em recuperacao judicial e como tais decisoes estao relacionadas com a divida da empresa.

Alem da evidente contribuicao no ambito pratico da tematica, este estudo contribui diretamente para a literatura sobre recuperacao e falencia de empresas. Nossa pesquisa amplia os estudos internacionais supracitados ao avaliar todas as estrategias de reorganizacao (de maneira individual e coletiva) adotadas na reestruturacao. Em especial, destacamos a apresentacao de novos resultados no Brasil em relacao aos achados das pesquisas de Funchal (2006), Funchal e Clovis (2009), Araujo et al. (2012), Jupetipe et al. (2017), Silva e Saito (2018), Silva et al. (2018) e Silva et al. (2020) que analisaram, respectivamente, relacao entre credito e falencia, estrutura de capital, nivel de endividamento de empresas apos a aprovacao da lei falimentar 11.101/05, custos diretos de recuperacao e falencia, aprovacao do plano de recuperacao judicial, relacao entre recuperacao judicial e variaveis macroeconomicas e atrasos na votacao do plano de reorganizacao.

A contribuicao empirica do artigo foi proporcionar uma analise descritiva detalhada de 622 pedidos de recuperacao e mostrar as relacoes entre as escolhas de reestruturacao e variaveis de endividamento das empresas. Os resultados indicam que a venda de ativos e o principal meio de reorganizacao adotado pelas empresas em recuperacao judicial. Alem disso, percebeu-se uma relacao positiva entre alavancagem e injecao de novos recursos financeiros como meio de reestruturacao, como venda de ativos, fusao, incorporacao ou cisao, trespasse ou arrendamento de estabelecimentos, dacao em pagamento e novacao da divida e a equalizacao de encargos financeiros.

Em linha com Silva e Saito (2018), que enfatizam a importancia da alienacao de ativos para aumentar as chances de aprovacao do Plano de Recuperacao Judicial, nossa pesquisa mostra que a venda de ativos configura uma das principais estrategias de reestruturacao. Em especial, empresas menores sao ainda mais dependentes de tal estrategia, ja que possuem maior dificuldade para obter novos emprestimos e financiamentos com credores, aspectos apontados por Senbet e Wang (2012).

Alem disso, percebeu-se uma relacao positiva entre alavancagem e injecao de novos recursos financeiros como meio de reestruturacao, como venda de ativos, fusao, incorporacao ou cisao, trespasse ou arrendamento de estabelecimentos, dacao em pagamento e novacao da divida e a equalizacao de encargos financeiros. Tais resultados contribuem para literatura ao elucidar quais estrategias de reestruturacao sao mais utilizadas por empresas com maior endividamento. Em adicao, a pesquisa aborda a associacao entre as diferentes classes de credores presentes na reestruturacao e os diferentes meios de reorganizacao apurados de acordo com o Artigo 50 da lei falimentar.

Aferimos relacao positiva entre maior proporcao de divida quirografaria sobre a divida total e a utilizacao de diferentes mecanismos de reestruturacao, como cisao, incorporacao, fusao ou transformacao de sociedade, venda parcial de bens e emissao de valores mobiliarios. Aferimos tambem que maior proporcao de divida trabalhista sobre divida total e relevante para a utilizacao de estrategias de renegociacao pautadas em governanca, como concessao aos credores de direito de eleicao em separado de administradores. Por fim, apuramos relacao negativa entre maior proporcao de divida com garantia real sobre divida total e trepasse ou arrendamento de estabelecimento e relacao positiva entre a divida com garantia real e inclusao de credores com direito de eleicao de administradores.

No que tange os credores quirografarios, o processo de barganha entre credores e mais intenso e pode culminar na necessidade de ajuste da reestruturacao com a utilizacao de diferentes meios, como apontamos acima. De acordo com Silva e Saito (2018), credores quirografarios possuem incentivo diferente dos credores trabalhistas e com garantia real no processo de Recuperacao Judicial. Como credores quirografarios recebem depois dos demais credores numa eventual liquidacao, acreditamos ser plausivel buscar meios alternativos de reestruturacao para atenuar a chance de nao receber.

Os resultados obtidos para a classe trabalhista podem elucidar a preocupacao com a manutencao do trabalho, uma vez que a associacao entre proporcao de divida trabalhista com o inciso sobre credores com direito de eleicao de administradores revela preocupacao com a gestao da empresa, responsavel pela manutencao do quadro de funcionarios.

Em adicao, identificamos que a maioria dos resultados envolvendo credores com garantia real nao apresentou significancia estatistica. A classe de credores com garantia real e geralmente formada por um pequeno numero de credores (em sua maioria bancos). Ou seja, comparativamente com os credores da classe quirografaria, os credores com garantia real sao mais homogeneos. Isso significa que a barganha entre credores com garantia real e atenuada pela maior similaridade entre o perfil dos credores e a menor quantidade de credores na classe. Com isso, acreditamos que uma quantidade menor de mecanismos de reestruturacao seja suficiente para atender as exigencias de tais credores. De fato, nossa pesquisa revela que apenas os meios de reorganizacao apontados como trepasse ou arrendamento de estabelecimento e inclusao de credores com direito de eleicao de administradores se mostraram relevantes para a classe.

  1. Literatura relacionada

    A literatura sobre falencia e recuperacao de empresas enfatiza problemas de assimetria informational, conflitos de interesse, distribuicao de recursos, liquidacao de ativos, custos de recuperacao e fechamento de uma empresa, holdout, entre outros, para aferir as escolhas de credores e devedores (Hotchkiss et al., 2008; Senbet e Wang, 2012).

    As principais razoes para uma empresa optar pela reestruturacao podem ser a preservacao de valores organizacionais e a possibilidade de oportunidades de investimentos atrativos (Chen et al., 1995). Para Gilson (1997) o incentivo para reestruturacao aparece quando os valores de mercado caem significantemente abaixo do potencial ou valor intrinseco de uma empresa.

    No geral, a venda de ativos demonstra como a empresa devedora lida com a dificuldade financeira, e embora tal medida seja feita em conjunto com a renegociacao de contratos financeiros, e possivel apontar que a venda dos ativos e um mecanismo de baixo custo para a resolucao dos problemas financeiros da organizacao (Hotchkiss et...

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