1ª vice-presidência - Plantão judiciário de 2º grau

Data de publicação04 Novembro 2021
Gazette Issue2973
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Plantão Judiciário - Crime
INTIMAÇÃO

8037247-29.2021.8.05.0000 Habeas Corpus Criminal
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Impetrante: Ursula De Jesus Camera
Impetrado: Juiz De Direito Da Vara De Audiência De Custódia Da Comarca De Salvador
Paciente: Icaro Alexandre Monte Cerqueira
Advogado: Ursula De Jesus Camera (OAB:0047036/BA)

Intimação:


Vistos, etc.

Cuidam os presentes autos de Habeas Corpus impetrado pela Bacharela Úrsula de Jesus Câmera em favor de ÍCARO ALEXANDRE MONTE CERQUEIRA, que aponta como Autoridade Coatora o eminente Juiz de Direito da Vara de Audiência de Custódia da Comarca de Salvador, através do qual discute suposto constrangimento ilegal que vem sendo suportado pelo Paciente.

A Impetrante relata que o Paciente foi preso em flagrante no dia 26/10/2021, em razão da suposta prática dos crimes definidos nos artigos 180 e 311, ambos do Código Penal.

Narra que, em 28/10/2021, homologado o APF apenas em razão da suposta prática do crime de receptação, foi concedida liberdade provisória mediante pagamento de fiança no valor de 10 (dez) salários mínimos ao Paciente, além de terem sido impostas outras medidas cautelares.

Sustenta que o Paciente não tem condições de pagar a fiança arbitrada e não pode permanecer preso em razão de sua hipossuficiência econômica.

Aduz, ainda, que há ofensa ao princípio da proporcionalidade, pois, a constrição ora imposta é desproporcional à eventual pena a ser arbitrada.

Argumenta que o coflagranteado Igor Alves da Silva foi dispensado do pagamento da fiança nos autos do HC 8037049-89.2021.8.05.0000 e, assim, o Paciente faz jus à extensão do benefício.

Com fulcro nos argumentos supra, pede que seja deferida a liminar, com a imediata soltura do Paciente, dispensando-o do pagamento da fiança e, ao final, pugna pela concessão definitiva da ordem.

É o relatório.

O funcionamento do Plantão Judiciário de 2° Grau é regulamentado pela Resolução n.° 15/2019 deste egrégio Tribunal de Justiça, que, por sua vez, disciplina a Resolução n°. 71/2009 editada pelo Conselho Nacional de Justiça.

Analisando os fatos narrados e as pretensões arguidas na petição inicial, concluo ser hipótese de apreciação do writ neste Plantão Judiciário de 2° Grau.

Isto posto, sabe-se que a concessão de plano e liminar de ordem em Habeas Corpus é medida extraordinária, que somente se justifica por meio de verificação inequívoca, prévia e cumulativa dos seus requisitos legais – o fumus boni iuris e o periculum in mora - de forma a assegurar e tornar eficaz a decisão definitiva da ordem pleiteada.

No tocante ao aventado constrangimento ilegal suportado pelo Paciente, em virtude de sua impossibilidade financeira de arcar com o pagamento da fiança no valor de 10 (dez) salários mínimos determinada pela Autoridade Impetrada, entendo que assiste razão à Impetrante.

Inobstante a Impetração não tenha sido instruída com provas cabais da hipossuficiência do Paciente, ele declarou estar desempregado em seu interrogatório (ID 20883793, página 46) e encontra-se preso até a presente data, somente em razão de não ter efetuado o pagamento da fiança arbitrada, elementos que fornecem indícios de que se trata de pessoa economicamente vulnerável e que, de fato, não tem condições de pagar o valor arbitrado a título de fiança.

Consigne-se que o Juízo Impetrado concluiu pela ausência de pressuposto para a decretação da prisão preventiva, nos seguintes termos:

Verifico, porém, que, no caso em comento, inexiste o requisito legal previsto no artigo 313 do Código de Processo Penal, especificamente em seu inciso I, para a decretação da segregação dos Apresentados, haja vista que o delito previsto no art. 180 do CPB prevê uma pena máxima de até 04 (quatro) anos, sendo que, conforme consta na citada norma, a medida cautelar extrema de constrição da liberdade somente deve ser admitida nos crimes dolosos em que a pena máxima atribuída seja superior a 04 anos, não sendo esta a hipótese dos autos.

De tal modo, verifico que os Acusados devem ser beneficiados com o instituto da liberdade provisória, conforme nova sistemática processual penal. Por outro lado, há de se ter cautela na concessão de liberdade aos mesmos, a qual deve, pois, ser condicionada, nos termos do art. 319 do diploma processual penal.

(...) A imposição de fiança no caso presente se revela necessária considerando-se a conduta criminosa praticada, em princípio, pelos Flagranteados, haja vista o alto valor do bem (veículo), oriundo de roubo/furto, sob o qual detinham a posse e estavam usufruindo.

Diante do exposto, homologando o flagrante lavrado pela Autoridade Policial, deixo de acolher a promoção ministerial e concedo a LIBERDADE PROVISÓRIA a IGOR ALVES DA SILVA e ICARO ALEXANDRE MONTE CERQUEIRA, COM FIANÇA, QUE ARBITRO NO VALOR DE DEZ SALÁRIOS MÍNIMOS, nos termos do art. 310, inciso III c/c o art. 325, inciso I, ambos do CPP, impondo-lhes, ainda, com base no artigo 319, incisos I, IV, V e IX do CPP, as seguintes medidas cautelares: 1 - compromisso de comparecer a todos os atos processuais e manter seu endereço atualizado e o comparecimento bimestral em Juízo, para onde o processo venha a ser distribuído, até o 15º dia do mês ou primeiro dia útil subsequente, devendo o Autuado dirigir-se à CIAP – Central Integrada de Alternativas Penais, situada no 1º subsolo do Fórum Criminal de Sussuarana, nesta Capital, para os devidos fins; 2 – a proibição de se ausentar da Comarca sem prévia autorização Judicial; 3 – o recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folgas, no período compreendido entre as 19h até as 6h; e 4 - monitoração eletrônica, nos termos que seguem abaixo; tudo até posterior deliberação do Juízo criminal competente.(ID 20883793, páginas 72/76).


Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento de que a incapacidade do beneficiário da liberdade provisória para o pagamento da fiança arbitrada não constitui óbice à sua soltura (HC 496.093/SE, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 25/06/2019, DJe 01/07/2019) .

Ademais, conforme pontuado pela Impetrante, em razão das orientações constantes na Recomendação nº 62/2020 do CNJ, precisamente diante do contexto vivido com a pandemia decorrente do COVID-19, a Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça concedeu Habeas Corpus coletivo, nos autos do HC 568.693/ES, no qual houve determinação de soltura de todos os presos do Estado da Federação, cujas liberdades estivessem condicionadas ao pagamento de fiança. Segue a transcrição de trecho da ementa do referido julgado:

“HABEAS CORPUS COLETIVO. PROCESSO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. PRESOS QUE TIVERAM A LIBERDADE PROVISÓRIA CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE FIANÇA. CONTEXTO DA PANDEMIA DE COVID-19. RECOMENDAÇÃO N. 62/CNJ. EXCEPCIONALIDADE DAS PRISÕES. ORDEM CONCEDIDA. EXTENSÃO DOS EFEITOS PARA TODO O TERRITÓRIO NACIONAL.

1. No que diz respeito ao cabimento do habeas corpus coletivo, não obstante a inexistência de norma expressa, plenamente possível o seu processamento.

(...) 9. Busca-se, neste habeas corpus coletivo, a soltura de todos os presos do estado do Espírito Santo que tiveram o deferimento da liberdade provisória condicionada ao pagamento de fiança, o que se faz com fulcro na Recomendação n. 62/2020 do CNJ.

10. Não se pode olvidar que o Conselho Nacional de Justiça editou a Recomendação n. 62/2020, em que recomenda aos tribunais e magistrados a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus - Covid-19 no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo.

(...)14. Por essas razões, somadas ao reconhecimento, pela Corte, na ADPF n. 347 MC/DF, de que nosso sistema prisional se encontra em um estado de coisas inconstitucional, é que se faz necessário dar imediato cumprimento às recomendações apresentadas no âmbito nacional e internacional, que preconizam a máxima excepcionalidade das novas ordens de prisão preventiva, inclusive com a fixação de medidas alternativas à prisão, como medida de contenção da pandemia mundialmente causada pelo coronavírus (Covid-19).

15. Nos casos apresentados pela Defensoria Pública do Espírito Santo, a necessidade da prisão preventiva já foi afastada pelo Juiz singular, haja vista não estarem presentes os requisitos imprescindíveis para sua decretação. Diante de tais casos, o Juiz deliberou pela substituição do aprisionamento cautelar por medidas alternativas diversas, optando, contudo, por condicionar a liberdade ao pagamento de fiança.

16. Nos termos em que preconiza o Conselho Nacional de Justiça em sua Resolução, não se mostra proporcional a manutenção dos investigados na prisão, tão somente em razão do não pagamento da fiança, visto que os casos - notoriamente de menor gravidade - não revelam a excepcionalidade imprescindível para o decreto preventivo.

17. Ademais, o Judiciário não pode se portar como um Poder alheio aos anseios da sociedade, sabe-se do grande impacto financeiro que a pandemia já tem gerado no cenário econômico brasileiro, aumentando a taxa de desemprego e diminuindo ou, até mesmo, extirpando a renda do cidadão brasileiro, o que torna a decisão de condicionar a liberdade provisória ao pagamento de fiança ainda mais irrazoável.

18. Por fim, entendo que o quadro fático apresentado pelo estado do...

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