Acórdão nº0000126-58.2022.8.17.2450 de Gabinete do Des. Luiz Gustavo Mendonça de Araújo (1ª TCRC), 11-07-2023

Data de Julgamento11 Julho 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo0000126-58.2022.8.17.2450
AssuntoContratos Bancários
Tipo de documentoAcórdão

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Primeira Turma da Câmara Regional de Caruaru - F:( ) Processo nº 0000126-58.2022.8.17.2450
APELANTE: MARIA LOURDES FERREIRA APELADO: BRADESCO FINANCIAMENTO INTEIRO TEOR
Relator: LUIZ GUSTAVO MENDONÇA DE ARAÚJO Relatório: 1ª Câmara Regional de Caruaru – 1ª Turma 1ª CÂMARA REGIONAL DE CARUARU – 1ª TURMA GABINETE DO DESEMBARGADOR JOSÉ VIANA ULISSES FILHO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000126-58.2022.8.17.2450
JUÍZO DE
ORIGEM: Vara Única da Comarca de Capoeiras APELANTE(S): MARIA LOURDES FERREIRA APELADO(A)(S): BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.
RELATOR: DES.
JOSÉ VIANA ULISSES FILHO RELATÓRIO Trata-se, na origem, de ação declaratória de inexistência de relação jurídica, cumulada com repetição de indébito e reparação por danos morais ajuizada por MARIA LOURDES FERREIRA em desfavor de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.

A em controvérsia relativa à contratação de empréstimo consignado e aos respectivos descontos decorrentes do mútuo.


Petição inicial: narra a parte autora, em síntese, que foi surpreendida com descontos em seu benefício previdenciário decorrentes de empréstimo consignado não contratado.


Ressalta que não reconhece os descontos iniciados em agosto de 2021 no valor de R$ 19,47, decorrentes do contrato n. 1565568815, com valor emprestado R$ 685,00.


Com efeito, por não haver tido consentimento na contratação, os abatimentos se revelam indevidos, razão pela qual requer a repetição dobrada do total da subtração efetuada em sua conta bancária e a reparação por danos morais, na quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), visto que, se as reduções provenientes do empréstimo bancário, reduzem demasiadamente sua remuneração, lesionando seus direitos de personalidade, tem lesão extrapatrimonal presumida.


Em termos probatórios, colacionou aos autos extrato previdenciário do INSS e processo administrativo de reclamação consumerista junto ao PROCON.


Sentença: o MM.

Juízo a quo – após determinar a comprovação da capacidade financeira da autora para fins de concessão da gratuidade processual, bem como a ela ter se manifestado nos autos juntando documentos nesse sentido – extinguiu o feito, nos moldes do art. 485, incisos I, IV e VI do CPC, antes mesmo da integração da ré à relação processual, sob o fundamento de os patronos da parte estarem captando ilicitamente clientela, a lide ser manifestamente agressora (dado que se dá o ajuizamento de causas fabricadas em lotes em várias comarcas do Estado), sendo evidente o abuso processual da gratuidade da justiça, assim como estar-se diante “sham litigation” (ou falso litígio caracterizador de ato ilícito pelo ajuizamento abusivo de ação desprovida de fundamentação jurídica), que se revela em descompasso com a tutela judicial de outras ações mais importantes.


Ainda, obstou o MM.

Juízo a repropositura da ação com fundamento no art. 486, § 1º, do Código de Processo Civil, deliberando a expedição de ofício ao Núcleo de Monitoramento do Perfil de Demandas – NUMOPEDE, à OAB/PE e ao Ministério Público Estadual para fins de adoção das medidas de praxe dessas organizações.


Razões de apelação: defende a autora, ora recorrente, que instruiu suficientemente o feito, constituindo a decisão vergastada verdadeira imposição de barreira de acesso à justiça, em dissonância para com a primazia da decisão de mérito.


Além disso, revela-se temerária a fundamentação do MM.


Juízo ao desqualificar o ajuizamento da demanda com os documentos idôneos anexos à exordial, porquanto a atuação do advogado, nos seus limites, é irrepreensível, não se mostrando, ainda, razoável impedir o questionamento judicial dos descontos suplantados no benefício previdenciário, especialmente em circunstância que aparenta haver fraude contratual.


Com essa linha de argumentação recursal, requer o provimento do recurso para o fim de se possibilitar o regular processamento do feito.


Contrarrazões: réplica a apelada as pretensões recursais da autora, de modo que pleiteia a manutenção do julgado.


É o relatório.

Inclua-se em pauta.

Caruaru, data da assinatura eletrônica.


Des. JOSÉ VIANA ULISSES FILHO Relator 10
Voto vencedor: Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete do Des.
Luiz Gustavo Mendonça de Araújo PRIMEIRA TURMA DA CÂMARA REGIONAL DE CARUARU Apelação Cível nº 0000126-58.2022.8.17.2450
Apelante: Maria Lourdes Ferreira Apelado: Bradesco Financiamento S.

A
Relator: Des.
José Viana Ulisses Filho
Origem: Vara Única da Comarca de Capoeiras VOTO EM DIVERGÊNCIA Cuida-se de Apelação Cível interposta por Maria Lourdes Ferreira contra sentença da lavra da Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Capoeiras, que indeferiu a petição inicial e extinguiu o feito sem julgamento de mérito, com fulcro no art. 485, I, IV e VI do Código de Processo Civil.


Ação: a parte demandante narra, em síntese, que é pessoa idosa e semianalfabeta/analfabeta funcional e que foi surpreendida pela incidência de descontos a título de Empréstimo Consignado em seu benefício previdenciário.


Assevera que não celebrou com a instituição financeira ré nenhum contrato de empréstimo que pudesse respaldar os descontos realizados, razão pela qual deve ser declarado nulo o negócio jurídico apontado na inicial.


Além do pedido declaratório de nulidade, requer a restituição em dobro dos valores descontados e indenização por danos morais no importe de R$10.000,00 (dez mil reais).


Despacho: o juízo determinou à parte autora que emendasse a petição inicial, sob pena de indeferimento, com informações concernentes à hipossuficiência financeira, à comprovação da ocorrência dos descontos alegados e ao recebimento do valor do empréstimo.


Realizada a intimação, a parte autora manifestou-se parcialmente quanto às determinações.


Sentença: de acordo com o juízo sentenciante, as ações representadas pelos causídicos da parte autora classificam-se como demandas agressoras, com indícios de captação ilegal de clientela em massa, uso de tese jurídica genéricas e “fabricada”, dúvida quanto ao consentimento livre e esclarecido do suposto cliente no ajuizamento das ações, utilização indevida do direito de ação, abuso do direito de litigar, falta de litígio real entre as partes, concluindo pela ausência de pressupostos processuais mínimos, dentre eles a adequada representação processual, o interesse processual, a individualização do caso concreto, a higidez da documentação e a devida observância da boa-fé processual.


Com fundamento no poder-dever de prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias (art. 139, III do Código de Processo Civil) e nos postulados segundo os quais “as partes e seus procuradores devem observar seus deveres (art. 77, II do CPC)” e “todos devem atuar na prevenção da litigância de má-fé (art. 80, V do CPC)”, o juízo a quo extinguiu o feito sem resolução de mérito, com base no art. 485, incisos I, IV e VI, do CPC.


No ensejo, atribuiu as despesas processuais à parte autora, com suspensão na forma do art. 98, § 3º, do CPC.


Sem honorários advocatícios.


Finalmente, determinou a expedição de ofício à OAB, ao Ministério Público Estadual e ao Núcleo de Monitoramento de Perfil de Demandas – NUMOPEDE, com o encaminhamento da sentença e dos documentos anexos.


Apelação: a parte autora reitera os argumentos apresentados na inicial e destaca a necessidade de inversão do ônus da prova.


Aduz que o juízo de origem interpretou a situação dos autos de forma imprecisa.


Assevera ter feito prova da ocorrência dos descontos consignados no benefício previdenciário.


Acerca dos extratos bancários, pugna pela sua dispensabilidade para fins de propositura da ação, notadamente em razão da sua hipossuficiência, acrescentando que a sua exigência mostra-se desproporcional e desarrazoada, causando dificuldade de acesso à justiça.


Pugna pela declaração de nulidade da sentença, com o retorno dos autos à origem e imediato julgamento de mérito.


A parte Apelada apresentou contrarrazões sob o ID 24926769 alegando a regularidade da formalização do contrato e que age apenas no exercício regular de direito, .


Eis, em apertada síntese, o relatório.


Pois bem. Dispensado o preparo e presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação.

Passo à análise do mérito.


Trata-se, originariamente, de ação anulatória de negócio jurídico, com pedido de declaração de inexistência de contratação de empréstimo bancário.


O cerne da questão, contudo, diz respeito ao acerto ou não da decisão do juízo sentenciante que extinguiu o processo sem resolução de mérito, por não ter a parte autora realizado a emenda da petição inicial e promovido a juntada dos documentos solicitados, notadamente a comprovação da ocorrência dos descontos alegados e o recebimento do valor do empréstimo, em atendimento ao princípio da boa-fé processual.


Conforme relatado, a questão foi analisada à luz da caracterização de demandas agressoras e em razão de indícios de utilização indevida do direito de ação, abuso do direito de litigar e falta de litígio real entre as partes, concluindo o juízo a quo pela ausência de pressupostos processuais mínimos, tais como a adequada representação processual, o interesse processual, a individualização do caso concreto, a higidez da documentação e a devida observância da boa-fé processual.


Logo, neste recurso, sobressaem-se questões: (i) a ocorrência fática de indícios de abuso do direito de litigar, isto é, a caracterização de demanda agressora e (ii) a correta atuação do juízo diante de tais indícios.


Pois bem. Analiso. 1. DA IDENTIFICAÇÃO DAS DEMANDAS AGRESSORAS Conceitualmente, a litigância predatória é marcada, em resumo, pelo ajuizamento massivo de lides temerárias.

Diante de uma situação concreta, o reconhecimento de demandas agressoras - e todas suas consequências - requer uma análise muito cuidadosa do julgador, na medida em que uma repressão desarrazoada a este cenário fático-processual pode implicar em limitações ao direito de ação e ao livre acesso à justiça,
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