Acórdão Nº 00005300620058200128 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 22-09-2021

Data de Julgamento22 Setembro 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo00005300620058200128
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0000530-06.2005.8.20.0128
Polo ativo
MUNICIPIO DE VARZEA
Advogado(s):
Polo passivo
MARIA FERRO PERON e outros
Advogado(s): NILO CEZAR CERQUEIRA DE FREITAS JUNIOR, JOSE ADAO DE OLIVEIRA, CELSO MEIRELES NETO

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO DE DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO CUMULADA COM COBRANÇA. SERVIDORES PÚBLICOS DO MUNICÍPIO DE VÁRZEA/RN. EXONERAÇÃO ILEGAL E ARBITRÁRIA, SEM OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (ART. 5º, LV, CF/88). INEXISTÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. ANULAÇÃO DO ATO E DAS CONSEQUÊNCIAS DELE DECORRENTES. REINTEGRAÇÃO DOS SERVIDORES PÚBLICOS COM O RESTABELECIMENTO DO STATUS QUO ANTE. PERCEPÇÃO DOS VENCIMENTOS CORRESPONDENTES AO PERÍODO DO AFASTAMENTO. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 20 E 21 DO STF. PRECEDENTES DO STJ E TJ/RN. DIFERENÇAS SALARIAIS DEVIDAS COMO CONTRAPRESTAÇÃO PELO LABOR EXECUTADO. ÔNUS PROBANDI DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 373, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDAS E DESPROVIDAS.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento à Remessa Necessária e à Apelação Cível, nos termos do voto do Relator, que integra o julgado.

RELATÓRIO


Trata-se de Remessa Necessária e Apelação Cível interposta pelo Município de Várzea/RN, por seu procurador, em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Santo Antônio/RN, que, nos autos da “AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ATO JURÍDICO DE DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO C/C ORDINÁRIA DE COBRANÇA, contra si interposta por João Fernandes da Silva e Isalmi Ferreira de Oliveira, julgou procedente o pleito exordial, nos termos a seguir (ID n° 9184731):

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE, com resolução de mérito (art. 487, I, CPC), a pretensão encartada na inicial, para:

A) DECLARAR NULO O ATO ADMINISTRATIVO que demitiu os autores e, consequentemente, condenar o MUNICÍPIO DE VÁRZEA/RN a REINTEGRAR DEFINITIVAMENTE os servidores JOÃO FERNANDES DA SILVA e ISALMI FERREIRA DE OLIVEIRA ao cargo do qual foram afastados/demitidos, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de incidência de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) até o máximo de R$ 20.000,00 (vinte mil reais);

B) pagar aos autores todos os vencimentos e vantagens desde o seu irregular desligamento até o seu efetivo retorno (meses de janeiro, fevereiro e março/2005), nos valores pagos à época dos seus respectivos cargos ocupados na municipalidade demandada, com a incidência de correção monetária e juros de mora.

Sobre o valor em atraso, incide juros de mora de 0,5% ao mês, nos termos do art. 1º-F à Lei nº 9.494/1997, até o advento da Lei Federal nº 11.960/2009, que deu nova redação ao referido dispositivo legal, período no qual os juros moratórios devem ser calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, contados da data de citação válida do réu (art. 405 do Código Civil). A atualização monetária deve ser calculada com base no IPCA, índice que melhor reflete a inflação acumulada do período, o que pode ser obtido pela aplicação da Tabela Modelo 1 da Justiça Federal, a partir do momento do vencimento da dívida.

Condeno ainda, a parte ré a pagar honorários em favor do advogado do autor em 10% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § § 2º e 3º, I, do Código de Processo Civil.

Isento de custas, por se trata da Fazenda Pública.

Tratando-se de sentença condenatória contra a Fazenda Pública, cujo valor da condenação é ilíquido, deve o feito submeter-se à remessa necessária, nos termos do art. 496 e ss. do Código Processo Civil. Neste sentido, determino que, com ou sem apresentação de recurso, sejam os autos remetidos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte.

Publique-se. Intimem-se.

Providências a cargo da Secretaria Judiciária.

Cumpra-se.”

Nas suas razões (ID n° 9184736), argumentou o apelante, em síntese, que inexiste nos autos a comprovação de que as verbas não foram pagas aos autores pelo Município, ônus que pertencia ao autor.

Defendeu que o não pagamento das verbas vindicadas não se reveste de ilegalidade, pois estão em consonância as disposições legais relativas à Lei de Responsabilidade Fiscal e ao limite prudencial.

Por fim, requereu o conhecimento e provimento do recurso, tendo em vista a reforma da sentença.

Apesar de intimada, a parte autora deixou de apresentar contrarrazões, conforme certidão de ID n° 9184741.

Instado a se manifestar, a 8ª Procuradoria de Justiça declinou da sua intervenção no feito.

É o relatório.

VOTO – MÉRITO


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso e da remessa necessária.

Verificada a similitude nos temas tratados no apelo e na remessa necessária, por critério de melhor exegese jurídica, recomendável se mostra promover seus exames conjuntamente.

Conforme relatado, trata-se de Reexame Necessário e de Apelação Cível interposta pelo Município de Várzea/RN contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Santo Antônio/RN, nos autos da ação de nulidade de ato de exoneração de servidor público cumulada com pedido ordinário de cobrança interposta contra si por João Fernandes da Silva e Isalmi Ferreira de Oliveira.

Pois bem.


Observa-se, de logo, que a pretensão inicial dos demandantes versou, em síntese, sobre a declaração de ilegalidade e arbitrariedade do ato administrativo (demissão imotivada) contra si perpetrado, já que a punição lhe foi imposta sem que pudesse exercer o direito ao contraditório e à ampla defesa, em sede de processo administrativo, postulando, ainda, pela percepção dos vencimentos e vantagens relativos ao período do seu afastamento da Municipalidade.

Esclareceram os autores, ainda, que foram cedidos para o Município de Jundiá/RN, pelo período de 01/06/2002 a 31/12/2004, porém, findo o prazo, o Município apelante não aceitou a devolução dos servidores, fundamentando que os mesmos tinham abandonado suas funções, procedendo com a demissão dos apelados em 03/01/2005.

Em sucedâneo, os servidores ajuizaram ação cautelar n° 128.05.000289-5, com pedido de reintegração aos cargos, sendo o pedido deferido liminarmente, e após, no mérito, a ação foi julgada procedente, ratificando-se a liminar. Desse modo, narram que foram reintegrados em 19/04/2005.

Por sua vez, em sua defesa, o Município de Várzea/RN alegou que descabida a pretensão autoral, posto que os autores já haviam sido reintegrados. Além disso, asseverou que os autores já haviam recebido os valores inadimplidos, de modo parcelado, sendo discriminado nos contracheques como “diferença salarial”.

Por sentença, o MM Juiz a quo julgou procedente o pedido, declarando a nulidade do ato administrativo que demitiu os servidores, determinando ao ente público demandado que reintegrasse destes, no prazo de 05 (cinco) dias, sob pena de multa diária por descumprimento, arbitrada em R$ 500,00 (quinhentos reais).

Sendo assim, resta evidente que o objeto do recurso em tela cinge-se, tão-somente, ao pedido de percepção dos vencimentos e vantagens relativos ao período em que os autores estiveram ilegalmente afastados de suas funções junto ao Município de Varzéa/RN.

De todo modo, por se tratar, também, de Remessa Oficial, por meio da qual toda a matéria discutida na demanda é devolvida à apreciação desta Corte de Justiça, analiso também o primeiro fundamento da demanda.

Dos autos se vê que os demandantes são servidores efetivos do Município de Várzea/RN, tendo os mesmos ingressados em 01 de março de 1987 e 02 de junho de 1997.

Narram os autos que em, 01 de junho de 2002, o réu celebrou convênio com o Município de Jundiá/RN, tendo cedido os autores com término do prazo do convênio em 31/12/2004. Todavia, quando os servidores foram devolvidos, o Município réu não os aceitou, por entender que os mesmos teriam abandonado seus cargos.

Dessa maneira, vislumbra-se que a demissão imotivada dos autores aconteceu no dia 03 de janeiro de 2005, sem que qualquer processo administrativo tenha sido instaurado, tendo em vista a apuração dos fatos.

Daí se vê que a Municipalidade, por meio do seu representante (Prefeito Municipal), praticou ato administrativo manifestamente ilegal e arbitrário, agindo em total desrespeito ao devido processo legal, na medida em impôs sanção (demissão) à servidora sem que, antes, desse início a processo administrativo próprio, já que, independentemente dos motivos que ensejaram a imposição de tal penalidade, haveriam de lhe ser garantidos o contraditório e a ampla defesa.

Nesse prisma, o disposto no artigo 5º, LV, da Constituição Federal, prevê que:

“Art. 5º. Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”

Trata-se do devido processo legal, princípio amplamente consagrado pela Carta Magna de 1988, que tem como premissa maior a garantia do contraditório e da ampla defesa em benefício de todo e qualquer litigante, não importando se em contendas judiciais ou administrativas.

Ao tecer comentários acerca do tema, especialmente no pertinente à aplicação de tal princípio no processo administrativo, o doutrinador Alexandre de Morais[1] assim leciona:

“(...) embora no campo administrativo não exista necessidade de tipificação estrita que subsuma rigorosamente a conduta à norma, a capitulação do ilícito administrativo não pode ser tão aberta a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT