Acórdão nº0000607-81.2005.8.17.0230 de 4ª Câmara de Direito Público, 04-10-2023

Data de Julgamento04 Outubro 2023
AssuntoImprobidade Administrativa
Classe processualApelação Cível
Número do processo0000607-81.2005.8.17.0230
Órgão4ª Câmara de Direito Público
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO Gabinete do Desembargador Josué Antônio Fonseca de Sena 4ª Câmara de Direito Público Apelação 0545282-4 (0000607-81.2005.8.17.0230)
Apelante: JOSÉ MARCOLINO GOMES JÚNIOR Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
Relator: DESEMBARGADOR JOSUÉ ANTÔNIO FONSECA DE SENA
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.


PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL.


IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.


PRELIMINAR DE NULIDADE DA DECISÃO DE RECEBIMENTO DA AÇÃO PREJUDICADA.


MUNICÍPIO DE BARREIROS/PE.


DOAÇÕES ILEGAIS DE TERRENOS PÚBLICOS PELO EX-PREFEITO.


FATOS OCORRIDOS EM 2004.


DANO AO ERÁRIO E AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.


ARTS. 10 E 11 DA LIA.


DOAÇÕES SUPOSTAMENTE FEITAS A APADRINHADOS POLÍTICOS E CONHECIDOS DO EX-PREFEITO.


AFRONTA À LEI MUNICIPAL 273/79.


PRESENÇA DE VIÉS ELEITORAL.


NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO DOLO GENÉRICO OU DE CULPA GRAVE, ESTA ÚLTIMA PARA OS ATOS DO ART. 10 DA LIA.


JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ.


FEITO SENTENCIADO ANTES DA LEI 14.230/21.
AUSÊNCIA DE ABERTURA DE PRAZO PARA RÉPLICA ÀS CONTESTAÇÕES E DE PRAZO PARA AS PARTES INDICAREM AS PROVAS QUE AINDA PRETENDIAM PRODUZIR.

AFRONTA AOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.


MATÉRIA FÁTICA QUE DEMANDA DILAÇÃO PROBATÓRIA.


SENTENÇA ANULADA.

NECESSIDADE DE O JUÍZO DE ORIGEM, AGORA, OBSERVAR OS PRECEITOS DA %20AND%20('14230%2F2021'%20OR%20'14230')+fecha2:2021-01-01..2021-12-31+content_type:6+vid:877353360 OR 877361340/*' data-vids='877353360 877361340'>LEI 14.230/21.
TEMA REPERCUSSÃO GERAL 1.199 DO STF.

APELAÇÃO PROVIDA, À UNANIMIDADE.
1. Cinge-se a presente controvérsia acerca da suposta prática de ato de improbidade administrativa pelo atual ex-prefeito do Município de Barreiros/PE, afrontoso aos Arts. 10 e 11 da Lei 8.429/92 (LIA), mediante diversas doações de terrenos públicos, feitas no ano de 2004, a particulares que seriam seus conhecidos ou apaniguados políticos, em total afronta ao Princípio da Impessoalidade e com viés eleitoreiro, além de afrontar a Lei Municipal 273/79. 2. Os atos de improbidade administrativa, responsáveis por acarretar a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens, o ressarcimento ao erário e, também, a aplicação de multa (art. 37, §4º, CF/88), não pode ser confundido com mera inabilidade ou despreparo do agente ao gerir a coisa pública.

Demanda, para que seja configurado, a conduta maleficente na gestão dos recursos públicos, sendo, nas palavras do Ministro Teori Zavascki, uma
"ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente". 3. Importante salientar que quando os fatos ocorreram (2004), vigia a Lei 8.429/92 sem as profundas alterações promovidas pela Lei 14.230/2021, sendo entendimento consolidado no âmbito do STJ, à época, de que para configuração dos atos tipificados pelos arts. 9º e 11 seria necessária que na conduta do agente houvesse dolo, ainda que genérico, e, para os do art. 10, ao menos culpa grave.

Precedentes utilizados: REsp n. 1.573.026/SE, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 8/6/2021, DJe de 17/12/2021.


AREsp n. 1.722.120/SE, relator Ministro Herman Benjamin, relator para acórdão Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 27/4/2021, DJe de 3/8/2021.


AgInt no REsp n. 1.746.240/RS, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 22/6/2021, DJe de 3/8/2021.
4. Com o advento da %20AND%20('14230%2F2021'%20OR%20'14230')+fecha2:2021-01-01..2021-12-31+content_type:6+vid:877353360 OR 877361340/*' data-vids='877353360 877361340'>Lei 14.230/2021, passou a Corte de Justiça a entender que a configuração do ato de improbidade demanda a presença do dolo específico, conforme se infere de julgado proferido mediante Recurso Especial representativo de controvérsia (Tema 1108). 5. Sobre as repercussões do advento da Lei 14.230/2021 na configuração do ato de improbidade, o STF concluiu o julgamento do Tema 1.199, estabelecendo as seguintes teses: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da %20AND%20('14230%2F2021'%20OR%20'14230')+fecha2:2021-01-01..2021-12-31+content_type:6+vid:877353360 OR 877361340/*' data-vids='877353360 877361340'>Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na %20AND%20('14230%2F2021'%20OR%20'14230')+fecha2:2021-01-01..2021-12-31+content_type:6+vid:877353360 OR 877361340/*' data-vids='877353360 877361340'>Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". 6. Como se vê, o STF entendeu que a norma benéfica da Lei 14.230/2021 seria irretroativa com relação aos processos transitados em julgado, permitindo, pois, a sua aplicação aos que ainda se encontrem em tramitação no Poder Judiciário. 7. Ademais, consigne-se que, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que art. 5º, XL, da Constituição da República prevê a possibilidade de retroatividade da lei penal, sendo cabível extrair-se do dispositivo constitucional princípio implícito do Direito Sancionatório, segundo o qual a lei mais benéfica retroage no caso de sanções menos graves, como a administrativa.

Precedente: AgInt no REsp n. 2.024.133/ES, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 13/3/2023, DJe de 16/3/2023.
8. Com o advento da Lei 14.230/2021, deixou de existir a notificação dos requeridos para ofertar defesa prévia, prevista pelo art. 17, §7º, com redação dada pela Medida Provisória 2.225-45/2001, cuja inexistência, em sede de Ação Civil Pública responsável por apurar improbidade administrativa, somente acarretaria nulidade se houvesse a demonstração de prejuízo.

Nulidade da decisão de recebimento da ação prejudicada, já que sua eventual anulação, através do presente recurso, perdeu a razão de ser, diante de sua extirpação do procedimento da ACP de Improbidade Administrativa e do entendimento do STF firmado no sentido de que as mudanças trazidas pela Lei 14.230/21 são aplicáveis aos processos ainda em tramitação.
9. O estudo minucioso dos autos demonstra grave afronta ao contraditório e ampla defesa do apelante, vez que o magistrado singular, antes mesmo de intimar o autor a replicar as contestações e de intimar as partes acerca das provas que ainda pretendiam produzir, sentenciou o feito, por entender que a matéria seria manifestamente de direito, de modo a comportar julgamento antecipado, nos moldes do art. 330, I, do CPC/73, atual art. 355, I, do CPC/75, conforme requerido pelo parquet 10.

Todavia, analisar se o apelante agiu com dolo genérico ou culpa grave, para fins de configuração de ato de improbidade administrativa nos termos da exordial (arts. 10 e 11 da LIA), demanda dilação probatória, ou, ao menos, a concessão do direito às partes de se manifestarem nesse sentido.


Caso permaneçam silentes, possibilitaria o julgamento do processo conforme as regras probatórias e as balizas jurisprudenciais, legais e doutrinárias regedoras da matéria.
11. Diante da clarividente afronta aos direitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa do apelante, a anulação da sentença é medida que se impõe, com o consequente retorno dos autos à origem e abertura de prazo para as partes manifestarem sobre as provas que pretendem produzir, com demonstração de sua finalidade, a ser realizada somente após a determinação de o autor ofertar réplica às contestações apresentadas no feito, caso todos eles tenham sido citados, com observância das mudanças impostas pela Lei 14.230/21, ante as balizas dadas pelo STF sobre a matéria, através do tema Repercussão Geral 1.199. 12. Sentença anulada. 13. Apelação provida, à unanimidade.

ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação 0545282-4, em que figuram como partes as acima indicadas, acordam os Desembargadores que compõem a 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Pernambuco, à unanimidade de votos, em DAR PROVIMENTO à Apelação, nos termos do voto do Relator.


Recife, 04 de outubro de 2023.


Desembargador JOSUÉ ANTÔNIO FONSECA DE SENA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO Gabinete do Desembargador Josué Antônio Fonseca de Sena 4ª Câmara de Direito Público Apelação 0545282-4 (0000607-81.2005.8.17.0230)
Apelante: JOSÉ MARCOLINO GOMES JÚNIOR Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO
Relator: DESEMBARGADOR JOSUÉ ANTÔNIO FONSECA DE SENA VOTO-RELATOR Presentes os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, conheço do presente recurso.


Cinge-se a presente controvérsia acerca da suposta prática de ato de improbidade administrativa pelo atual ex-prefeito do Município de Barreiros/PE, afrontoso aos Arts.
10 e 11 da Lei 8.429/92 (LIA), mediante diversas doações de terrenos públicos, feitas no ano de 2004, a particulares que seriam seus conhecidos ou apaniguados políticos, em total afronta ao Princípio da Impessoalidade e com viés eleitoreiro, além de afrontar a Lei Municipal 273/79.

Ao final, o Ministério Público, autor da ação, pugnou pela aplicação das penas do art. 12, incisos II e III, da LIA, nos seguintes termos: 1) ressarcimento integral do dano; 2) perda da função pública; 3) suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos; 4) pagamento de multa
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