Acórdão nº0001222-26.2022.8.17.2930 de Gabinete do Des. Humberto Costa Vasconcelos Júnior (4ª CC), 25-04-2023

Data de Julgamento25 Abril 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo0001222-26.2022.8.17.2930
AssuntoRescisão do contrato e devolução do dinheiro
Tipo de documentoAcórdão

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 4ª Câmara Cível - Recife - F:( ) Processo nº 0001222-26.2022.8.17.2930
APELANTE: VICENCIA MARIA DA SILVA APELADO: BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A. INTEIRO TEOR
Relator: HUMBERTO COSTA VASCONCELOS JUNIOR Relatório: QUARTA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº.
0001222-26.2022.8.17.2930
APELANTE: VICENCIA MARIA DA SILVA APELADO: BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A. VARA/COMARCA: VARA ÚNICA DA COMARCA DE MACAPARANA
RELATOR: DES.
HUMBERTO VASCONCELOS RELATÓRIO Recurso de Apelação: Trata-se de Apelação Cível interposta por VICENCIA MARIA DA SILVA, nos autos da Ação Indenizatória em epígrafe proposta em face do BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A.. Objeto da lide: Busca o demandante ser indenizado pelos danos morais e materiais sofridos em decorrência de descontos efetuados em seu benefício previdenciário, por contrato que aduz não ter firmado.

Sentença de 1º grau: O juiz da causa extinguiu o feito sem análise de mérito, por entender que houve pratica de advocacia predatória.


Fundamentos do Recurso de Apelação: Nas razões do Apelo, a parte Autora persegue nulidade da sentença, destacando a presença do interesse de agir, o princípio da celeridade processual e outros elementos.


Não houve contrarrazões ao recurso.


É o Relatório.

Inclua-se em pauta para julgamento.


Recife, data da assinatura digital.


Des. Humberto Vasconcelos Relator
Voto vencedor: QUARTA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº.
0001222-26.2022.8.17.2930
APELANTE: VICENCIA MARIA DA SILVA APELADO: BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A. VARA/COMARCA: VARA ÚNICA DA COMARCA DE MACAPARANA
RELATOR: DES.
HUMBERTO VASCONCELOS VOTO Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do Recurso de Apelação, recebendo-o em seu duplo efeito, tendo em vista a configuração da hipótese contida no Art. 1.012, caput, do CPC.

Por meio do presente recurso cumpre analisar se o caso em apreço pode ser inserido ou não nas hipóteses das chamadas demandas predatórias e se tal caso deve implicar na extinção do processo sem julgamento de mérito conforme decretado pelo julgador de piso em sua decisão sentencial.


Deve ser avaliado, em específico, se o direito fundamental do livre acesso à jurisdição assegurado pelo Art. 5º, XXXIV, da Carta Maior, encontraria óbice em outros Princípios Constitucionais e diante desta colisão quais deverão ser os critérios que prevalecerão para a melhor aplicação do direito à espécie.


É cediço que a demanda predatória ou temerária consiste em controversa prática da atividade advocatícia caracterizada, em suma, pelo ajuizamento em massa de ações, via de regra por um mesmo advogado que faz uso de petições padronizadas contendo teses artificiais ou inventadas, desprovidas das especificidades do caso concreto, distribuindo-as em várias comarcas ou varas, modificando-se apenas o nome da parte e o seu endereço.


Também é marcada pela captação indevida de clientes dotados de algum grau de vulnerabilidade, sendo comum, ainda, a locupletação pelo causídico dos valores invocados ou o não repasse da quantia aos clientes que muitas vezes sequer têm conhecimento a respeito do ajuizamento da ação.


Sobre essa questão também é importante mencionar o lecionado de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, que traz os seguintes conceitos para a definição de procedimento temerário no âmbito processual que reputo essenciais para jogar luz ao tema.


Vejamos: Condução Temerária da Causa.


Age de maneira temerária aquele que conduz o processo com imprudência, sem tomar as cautelas adequadas para vida do foro.


Já se decidiu, por exemplo, que age com temeridade a parte que distribui sucessivamente a mesma ação para juízos distintos com o fim de obter liminar em qualquer dos pleitos (STJ, 2ª Turma, REsp 74.218/RJ, reL Min.


Peçanha Martins, j. 04.10.1995, Djll.03.1996, p. 6.608), ou quando a parte interpõe por mais de uma vez, no mesmo processo e de decisão da mesma espécie, recurso já declarado incabível (STJ, 2.


ª Turma, REsp 81.625/SP, rel.


Min. Ari Pargendler, j. 20.10.1997, Djl0.11.1997, p. 57. 734). (MARINONI, Luiz Guilherme et al.

Novo Código de Processo Civil comentado.
3ª ed., rev. atual e ampl.

– São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, fl. 231 Seguindo essa mesma vereda, Nelson Nery e Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, por seu turno, também nos cedem suas contribuições.


Senão vejamos: “A norma veda ao litigante ou interveniente agir de modo temerário ao propor a ação, ao contestá-la ou em qualquer incidente ou fase do processo.

Proceder de modo temerário é agir afoitamente, de forma açodada e anormal, tendo consciência do injusto, de que não tem razão (Chiovenda.


Lacondanna nelle spese giudiziali, 1.


ª ed., 1901, n. 319, p. 321).
O procedimento temerário pode provir de dolo ou culpa grave, mas não de culpa leve (Castro Filho.

Abuso n. 43, pp. 91/92; Carnelutti.


Sistema, v.

I, n. 175, p. 454).
A mera imprudência ou simples imperícia não caracteriza a lide temerária, mas sim a imprudência grave e a imperícia fruto de erro inescusável, que não permitem hesitação do magistrado em considerar ter havido má-fé (Mortara.

Commentario CPC4, v.

IV, n. 79, p. 143).
O litigante temerário age com má-fé, perseguindo uma vitória que sabe ser indevida.

(NERY JÚNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade.

Código de Processo Civil Comentado.
3.ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 307).” (Destaquei) Também vale a pena frisar que Rinaldo Mouzalas, João Otávio Terceiro Neto e Eduardo Madruga sustentam que a temeridade da lide pode ser observada em ato processual único ou em um conjunto de atos, não importa.

O que caracteriza a lide temerária é o reconhecimento da má-fé, a qual pode ser extraída de emulações desleais, simulações ou procrastinações, e – inclusive – está sujeita à aplicação das sanções disciplinares pelo Código de Ética da OAB, In verbis: A temeridade pode ser observada a partir de único ato ou do conjunto daqueles que foram praticados no curso do processo.


Basta que seja observada num único ato para se justificar o reconhecimento da litigância de má-fé com a aplicação das sanções decorrentes.


A conduta temerária é reprovada, também, pelo Código de Ética e Disciplina da OAB, o qual, no art. 58, dispõe que, comprovado que os interessados no processo nele tenham intervindo de modo temerário, com sentido de emulação ou procrastinação, tal fato caracteriza falta de ética passível de punição.


(MOUZALAS, Rinaldo et al.

Processo Civil volume único.
8ª ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed.

JusPodivm, 2016, fl. 156).
Saindo dos aspectos doutrinários sobre o tema e já adentrando no âmbito legal, é sabido que o Código de Processo Civil é categórico em seus Arts. 4º, 5º e 6º, ao definir dentre seus princípios norteadores o dever de lealdade, da boa-fé e da cooperação processual aos quais se obrigam os atores processuais no intuito de se propiciar uma prestação jurisdicional eficiente, justa e suficientemente satisfativa de modo a atender aos anseios depositados pelo cidadão comum quando recorre ao Judiciário.

Feito esse preâmbulo, ressalto de início que apesar de ser um ardoroso defensor do livre direito de ação, a realidade com a qual os magistrados componentes deste Sodalício têm se deparado cotidianamente na atividade forense, com o abarrotamento de ações ajuizadas de modo absolutamente temerário lesando insofismavelmente aos Princípio da lealdade, da boa-fé e da cooperação processual consagrados pelo CPC, me faz reavaliar o meu posicionamento habitual.


Diante dessa situação específica, considero que o amplo acesso à justiça garantido pelo Art. 5º, XXXIV, da Carta Maior, deve caminhar ao lado de outros Princípios Fundamentais tais como a garantia do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) e da razoável duração do processo (Art.


LXXVIII, C.F./88) de modo a se evitar que o seu livre exercício não se traduza num impedimento à efetivação de um processo justo e célere.


É o que acontece, por exemplo, quando o Poder Judiciário se depara com o ajuizamento de demandas em larga escala movidas pelo mesmo advogado, que muitas vezes utiliza-se de artifícios fraudulentos como a falsificação de documentos produzidos por recortes de assinaturas de documentos pessoais manipulados de clientes capitados por meio de banco de dados, como também na tentativa de
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