Acórdão Nº 00013908020178200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 17-06-2022

Data de Julgamento17 Junho 2022
Classe processualDIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Número do processo00013908020178200000
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TRIBUNAL PLENO

Processo: DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - 0001390-80.2017.8.20.0000
Polo ativo
PREFEITO DO MUNICÍPIO DE MONTE ALEGRE
Advogado(s): KLEBER MACIEL DE SOUZA, FELIPE AUGUSTO CORTEZ MEIRA DE MEDEIROS
Polo passivo
GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s):

Ação Direta de Inconstitucionalidade 0001390-80.2017.8.20.0000.

Requerente: Prefeito Municipal de Monte Alegre.

Requerido: Estado do Rio Grande do Norte.

Relator: Desembargador João Rebouças.

EMENTA: CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARGUIÇÃO DE VÍCIO FORMAL DA LEI ESTADUAL Nº 10.134/2016, QUE ALTEROU LIMITES TERRITORIAIS DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DE MIPIBU COM OS MUNICÍPIOS DE NÍSIA FLORESTA, ARÊS, ESPÍRITO SANTO, JUNDIÁ, BREJINHO, MONTE ALEGRE, VERA CRUZ, MACAÍBA, PARNAMIRIM, DEFININDO NOVO MAPA GEOGRÁFICO OFICIAL DE SÃO JOSÉ DE MIPIBU. INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI QUESTIONADA EVIDENCIADA POR DESRESPEITO AO DISPOSTO NO ART. 14 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. DESMEMBRAMENTO DE PARTE DE MUNICÍPIO E INCORPORAÇÃO DA ÁREA SEPARADA AO TERRITÓRIO DA MUNICIPALIDADE LIMÍTROFE. RECONHECIMENTO DA NECESSIDADE DE PRÉVIA CONSULTA, MEDIANTE PLEBISCITO, ÀS POPULAÇÕES DIRETAMENTE INTERESSADAS. RATIFICAÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR ANTERIORMENTE DEFERIDA. PRECEDENTES.

- O art. 14 da Carta Estadual preceitua que: "A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios devem preservar a continuidade e a unidade histórico-cultural do ambiente urbano, fazem-se por lei estadual, obedecidos os requisitos previstos em lei complementar a esta Constituição, e dependem de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações diretamente interessadas."

- A jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal orienta no sentido de que 'a alteração dos limites geográficos de municípios jamais prescinde da consulta plebiscitária prevista no artigo 18, § 4º, da Constituição Federal, qualquer que seja a extensão da alteração territorial verificada'.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos entre as partes acima identificadas

Acordam os Desembargadores que integram o Tribunal Pleno deste Egrégio Tribunal de Justiça, por maioria de votos, em rejeitar as matérias levantadas preliminarmente pelo Des. Cláudio Santos, para que o feito fosse baixado em diligência para admissão do Município de São José de Mipibu, bem como para realização de perícia técnica. Vencidos, nesta parte, os Desembargadores Cláudio Santos e Glauber Rêgo. Por maioria, em julgar procedente a Ação Direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 10.134/2016, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste. Vencido o Des. Cláudio Santos, que a julgava improcedente.

RELATÓRIO

Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, aforada pelo Prefeito do Município de Monte Alegre em face da Lei Estadual nº 10.134/2016, que "Consolida e Atualiza as divisas territoriais do município de São José de Mipibu/RN com os municípios de Nísia Floresta, Arês, Espirito Santo, Jundiá, Brejinho, Monte Alegre, Vera Cruz, Macaíba, Parnamirim e define o Mapa Geográfico Oficial de São José de Mipibu/RN."

Aduz o requerente na inicial que:

a) a Lei Estadual nº 929 de 25 de setembro de 1953 criou o município de Monte Alegre, definindo os seus limites e, ato contínuo, a Lei Estadual nº 10.134/2016 alterou significativamente o seu território, sem que tenha sido oportunizado qualquer pronunciamento do ente municipal, tampouco dos moradores da área demarcada;

b) o Município de São José de Mipibu objetiva passar a ter em seu território a localização da Estação XV-07 da Petrobrás, com vistas ao recebimento de royalties, "(...) pois estas coordenadas apresentadas pelo Município de São José do Mipibu estão na verdade abaixo da RODOVIA RN-315 (Estrada Arenã/Cobé), que divide os dois Municípios, portanto, dentro do território do Município de Monte Alegre – RN, (...).";

c) a região abaixo da RN-315 denomina-se "Comunidade do Retiro", sendo assistida desde a sua emancipação pelo município de Monte Alegre, que vem arcando com a infraestrutura pública necessária, como pavimentação e iluminação, e também onde se localiza a Escola Municipal Ana Gonzaga, com alunos matriculados em todas as séries do ensino fundamental;

d) foram expedidas várias certidões, pelo próprio Cartório de Registro de Imóveis do município, de ônus das propriedades que circundam a aludida estação, assim como foram feitas fotos recentes que comprovam a localização exata e inequívoca das coordenadas geográficas apresentadas;

e) o Município ingressou, em 12.12.2013, com uma Ação Ordinária em desfavor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, não obtendo a antecipação da tutela requerida, razão pela qual interpôs o Agravo de Instrumento nº 0003989-58.2014.4.01.0000, passando, a partir de então, a receber os royalties mensais do gasoduto Nordestão;

f) diante desse fato, o Município de São José de Mipibu interveio no feito, alegando incidente de falsidade, mas como não teria apresentado provas inequívocas das alegações apresentadas não obteve êxito em seu intuito;

g) em 16.11.2016, a Deputada Cristiane Dantas, nora do Prefeito do Município de São José de Mipibu, Sr. Arlindo Dantas, e casada com o Vice-Governador do Estado, apresentou o Projeto de Lei nº 157/2016, que se transformou na Lei Estadual nº 10.134 de 15 de dezembro de 2016, o que comprovaria a ingerência política dada ao caso;

h) as coordenadas dispostas na referida lei estadual dividiram, propositadamente, a propriedade que situa a mencionada estação em duas partes, uma pertencente a Monte Alegre e a outra, onde está efetivamente a Estação XV-07, pertencente a São José de Mipibu, sem observância aos requisitos legais;

i) mesmo não tendo havido plebiscito em nenhuma das cidades, nem sido elaborado estudo de viabilidade municipal, como exige o art. 18, §4º da Constituição Federal e o art. 14 da Constituição Estadual, o projeto foi aprovado e sancionado em menos de um mês;

j) o aludido desmembramento gerou prejuízo financeiro ao município de Monte Alegre, que poderá deixar de arrecadar, em média, R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) por ano em royalties;

Após citar jurisprudências em favor da sua tese, segue afirmando que a plausibilidade jurídica estaria nos vícios formais e materiais de inconstitucionalidade presentes na Lei Estadual nº 10.134/2016, decorrentes da patente violação ao procedimento previsto no art. 18, §4º da CF e do art. 14 da CE, de observância obrigatória para edição de qualquer lei que verse sobre desmembramento de municípios.

Em atenção à notificação efetivada a Procuradoria-Geral do Estado apresentou manifestação informando inexistir interesse do ente estatal quanto à pretensão inicial, ressalvando a presunção de constitucionalidade do ordenamento jurídico positivo.

Por sua vez, o Presidente da Assembleia Legislativa do Estado informa, às fls. 217-220, que o Processo Legislativo nº 1978/2016, que culminou na edição da norma questionada, tramitou regularmente de acordo com os cânones do devido processo legislativo, cuja proposição teria sido apresentada pela Deputada Cristiane Dantas, proposição esta lida durante o expediente da sessão ordinária do dia 16.11.2016, e publicada no Boletim Legislativo na mesma data.

Segue afirmando que após a aprovação do referido projeto, os autógrafos foram encaminhados ao Governador do Estado para fins de sanção ou veto, tendo ocorrido sanção, promulgação e publicação no Diário Oficial do Estado.

Sustenta, em seguida, que embora tenha se originado a partir da iniciativa da Deputada Cristiane Dantas, a lei questionada teria sido produto de um processo legislativo, "(...) do qual participaram vários agentes e órgãos públicos: Deputados, Relatores, Comissões Temáticas, Plenário da Assembleia, Governador do Estado.", não constituindo mero "capricho" individual ou expressão da vontade ou interesse pessoal deste ou daquele parlamentar.

Também afirma que o art. 14 da Constituição Estadual exige a realização de plebiscito apenas nas estritas hipóteses de criação, incorporação, fusão e desmembramento de municípios, e que, no caso em análise, o objetivo da norma impugnada foi atualizar os limites do município de São José do Mipibu, de acordo com as modernas técnicas de georreferenciamento.

Ao final, requer o indeferimento da cautelar, assim como a improcedência da demanda.

Em seguida (fls. 221-224), o então Governador do Estado prestou informações, afirmando que a norma impugnada não tem por escopo desmembrar ou transferir a gestão de territórios de um município para outro, tendo apenas consolidado as divisas territoriais do município de São José de Mipibu com os municípios vizinhos.

Segue afirmando que as leis estaduais que criaram e definiram os limites dos municípios acabam tornando-se obsoletas, razão pela qual se fez necessário precisar tais limites por meio de georreferenciamento, garantindo legitimidade e segurança aos cidadãos no momento de procurar e cobrar por serviços públicos.

Acrescenta que a referida lei foi elaborada de acordo com as regras do processo legislativo, a cargo da Assembleia Legislativa do Estado, e devidamente sancionada pelo Executivo, estando hoje vigente no ordenamento jurídico estadual sem qualquer contestação ou impugnação judicial.

Requer, assim, o indeferimento da cautelar, por ausentes os requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora. No mérito, pugna pela improcedência da ação.

Instado a se manifestar (fls. 228-236), o Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer pelo deferimento da medida cautelar requerida e, no mérito, pela procedência final da pretensão, por entender que a norma impugnada, diferentemente do suscitado pelos Requeridos, promoveu um desmembramento da região, conhecida como "Comunidade do...

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