Acórdão Nº 00031671020118200001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 27-11-2019

Data de Julgamento27 Novembro 2019
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo00031671020118200001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0003167-10.2011.8.20.0001
Polo ativo
ANIZETE SILVA OLIVEIRA e outros
Advogado(s): JEFFERSON MASSUD ALVES, FRANCISCO CANINDE ALVES FILHO
Polo passivo
COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS
Advogado(s): NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. LESÃO GRAVE EM FILHO E IRMÃO DOS AUTORES DECORRENTE DE ATROPELAMENTO EM LINHA DE TREM. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA, SUSCITADA PELO APELADO. REJEIÇÃO. COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS COM STATUS DE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA QUANDO DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA. MÉRITO. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA DEMONSTRADA. DANOS MORAIS E MATERIAIS INEXISTENTES. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.

1. . A despeito da alteração societária mencionada pela parte apelada, forçoso reconhecer a competência deste juízo para apreciação do recurso, uma vez que a sentença foi proferida em 2017, portanto, antes da modificação do status da parte para empresa pública, fato esse que firma a competência recursal desse Tribunal de Justiça para julgamento do recurso.

2. A Companhia Brasileira de Trens Urbanos - CBTU, responsável pelo tronco ferroviário em que ocorreu o acidente narrado na inicial, por exercer atividade de natureza pública, consistente no transporte coletivo de passageiros e gerenciamento de toda a malha ferroviária, subsume-se aos deveres de natureza administrativa e pública decorrentes dessa atividade.

3. Por decorrência disso, responde objetivamente nos termos do artigo 37, § 6º, de Magna Carta, podendo-se ser afastada a responsabilidade na hipótese de culpa exclusiva da vítima.

4. A prova colhida nos autos é segura quanto à culpa exclusiva da vítima, apta a afastar a responsabilização da CBTU, pois o boletim de ocorrência feito pelo Núcleo de Policiamento Rodoviário dá notícia de que o condutor do veículo que se encontrava no local acionou faróis e buzina, em momento um pouco anterior ao acidente, no intuito de alertar a vítima que atravessava repentinamente na frente do trem, inclusive ressaltaram que no cruzamento encontravam-se diversos carros parados aguardando a passagem do veículo.

5. Ademais, as imagens relativas à sinalização possibilitam a constatação de que havia sinalização horizontal, vertical e luminosa, bem como passagem de nível e ainda convém destacar que o acidente ocorreu na luz do dia, circunstância que dá a convicção de o local reunia condições suficientes para a vítima saber da proximidade do trem e, mesmo assim, posicionou-se em local indevido.

6. Precedentes do STJ (AgInt no AREsp 1520197/RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 29/10/2019, DJe 05/11/2019 e AgInt no REsp 1793661/RJ, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 03/09/2019, DJe 19/09/2019).

7. Conhecimento e desprovimento do recurso.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao apelo, mantendo-se integralmente a sentença, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Apelação Cível interposta por MARIA DO SOCORRO SILVA OLIVEIRA, JOSÉ DA SILVA OLIVEIRA E ANIZETE SILVA OLIVEIRA em face da sentença (Id. 4032397) prolatada pelo Juiz de Direito da 11ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN nos autos da Ação Ordinária nº 0003167-10-2011.8.20.0001, promovida em desfavor da COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTU, cujo teor julgou totalmente improcedente o pedido inicial e, por via de consequência, condenou a parte autora/apelante no pagamento de custas e honorários advocatícios na base de 10% (dez por cento) sobre o valor dado à causa.

2. Em suas razões recursais (Id. 1429020), os recorrentes argumentaram que Adailson Silva Oliveira, filhos de dois apelantes e irmão do outro, sofreu lesão gravíssima na linha férrea, cabendo à parte apelada, na condição de concessionária do serviço público, ser responsabilizada objetivamente pelo ocorrido, uma vez que não promoveu a construção de cercas protetoras no local, já que se trata de passagem de nível utilizada por outros veículos.

3. Prosseguiu afirmando que há comprovação de falhas e defeitos na sinalização e segurança das faixas de domínio ferroviário, onde é comum a ocorrência de acidentes fatais, prejudicando o direito ao trânsito seguro da população.

4. Pugnou, ao final, pela condenação do apelado no sentido de condená-lo ao pagamento de indenização por danos morais, além de ser obrigado a arcar com as custas processuais e honorários advocatícios.

5. Em contrarrazões (Id. 4032400), a parte recorrida alegou, preliminarmente, que houve modificação do status da Companhia Brasileira de Trens Urbanos de sociedade de economia mista para empresa pública, situação que desloca a competência para julgamento dessa demanda para a Justiça Federal.

6. Continua argumentando a ausência de responsabilidade contratual no presente caso, haja vista a ocorrência da excludente de culpa exclusiva da vítima, o que exime a responsabilidade civil da demandada/apelada.

7. O Ministério Público com assento na segunda instância, pelas mãos de Dr. Herbert Pereira Bezerra, Décimo Sétimo Procurador de Justiça, declinou de sua intervenção no feito (Id. 4088008).

8. É o relatório.

VOTO

9. Conheço do recurso.

10. O apelo traz ao debate, inicialmente, a questão relativa à competência para julgamento em grau recursal, pois a parte apelada defendeu, nas contrarrazões, que a Companhia Brasileira de Trens Urbanos deixou de ser sociedade de economia mista para ser empresa pública, conforme Assembleia Geral Extraordinária realizada em 21/06/2018.

11. Destaca que referida modificação foi registrada perante a Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro em 06/07/2018 e, em decorrência disso, o foro judicial para a interposição de ações de interesse das empresas públicas, ou aquelas ajuizadas por terceiros contra si, passou a ser o da Justiça Federal.

12. Pois bem, o artigo 109, inciso I, da Constituição Federal dispõe que:

“Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;”.

13. A despeito da alteração societária mencionada pela parte apelada, forçosa reconhecer a competência deste juízo para apreciação do recurso, uma vez que a sentença foi proferida em 2017, portanto, antes da modificação do status da parte apelada, fato esse que firma a competência recursal desse Tribunal de Justiça.

14. Passa-se ao mérito do recurso.

15. Ressai dos autos que a vítima, Adailson Silva, filho de dois apelantes e irmão do terceiro, ao retornar a sua residência no dia 08/02/2011, por volta de 15h29min, sofreu atropelamento pelo trem de propriedade da parte apelada, o que trouxe graves danos na cabeça, com perda da massa cefálica, com sequelas irreversíveis.

16. A COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTU, responsável pelo tronco ferroviário em que ocorreu o acidente narrado na inicial, por exercer atividade de natureza pública, consistente no transporte coletivo de passageiros e gerenciamento de toda a malha ferroviária, subsume-se aos deveres de natureza administrativa e pública decorrentes dessa atividade.

17. Por decorrência disso, responde objetivamente nos termos do artigo 37, § 6º, de Magna Carta, podendo-se ser afastada a responsabilidade na hipótese de culpa exclusiva da vítima.

18. No caso, a despeito da constatação de que o trecho ferroviário em que ocorreu o acidente situa-se dentro do perímetro urbano, sendo, pois, inequívoco o dever da concessionária do serviço público de realizar a devida fiscalização, atuando de modo preventivo, a impedir o acesso ou a transposição das vias férreas em locais inapropriados, sem sinalização e assistência, a prova colhida nos autos é segura quanto à culpa exclusiva da vítima, apta a afastar a responsabilização da CBTU.

19. Ora, o boletim de ocorrência feito pelo Núcleo de Policiamento Rodoviário (Id. 4032389) dá notícia de que o condutor do veículo acionou faróis e buzina, em momento um pouco anterior ao acidente, no intuito de alertar a vítima que atravessava repentinamente na frente do trem, inclusive ressaltaram que no cruzamento encontravam-se diversos carros parados aguardando a passagem do veículo.

20. Ademais, as imagens relativas à sinalização constante no Id. 4032389, págs. 1 a 4 possibilitam a constatação de que havia sinalização horizontal, vertical e luminosa, bem como passagem de nível e ainda convém destacar que o acidente ocorreu na luz do dia, circunstância que dá a convicção de o local reunia condições suficientes para a vítima saber da proximidade do trem e, mesmo assim, posicionou-se em local indevido.

21. Diante de todas essas medidas protetivas justifica-se a inexistência de cercas de proteção no local.

22. Em consonância com esse entendimento, cumpre colacionar julgados no mesmo sentido:

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE. RECONSIDERAÇÃO. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INEXISTÊNCIA DE NEXO CAUSAL. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA. SÚMULA N. 83 DO STJ. CULPA PELO ACIDENTE. PRETENSÃO DE REVISÃO. ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. SÚMULA N. 7 DO STJ. RECURSO PROVIDO.

1. "A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da ...

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