Acórdão Nº 00038291820098200106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 18-05-2021

Data de Julgamento18 Maio 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo00038291820098200106
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0003829-18.2009.8.20.0106
Polo ativo
MANOEL ANTÔNIO GURGEL
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS
Polo passivo
ITAU FINANCEIRA
Advogado(s): CARLA PASSOS MELHADO, CELSO MARCON


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gab. Des. Vivaldo Pinheiro na Câmara Cível - Juíza Convocada Dra. Maria Neize de Andrade


Apelação Cível nº 0003829-18.2009.8.20.0106

RECORRENTE: MANOEL ANTÔNIO GURGEL

ADVOGADO: LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS

RECORRIDO: BANCO ITAUCARD S.A.

ADVOGADOS: CARLA PASSOS MELHADO E CELSO MARCON

Relatora: DRª MARIA NEÍZE DE ANDRADE FERNANDES(JUÍZA CONVOCADA)

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL CIVIL e PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.CARTÃO DE CRÉDITO. SENTENÇA COM PEDIDOS PARCIALMENTE PROCEDENTES. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.963/2000 (ATUAL MP nº 2.170-36/2001) AFASTADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. LEGALIDADE DA CAPITALIZAÇÃO DESDE QUE HAJA PREVISÃO EXPRESSA NO CONTRATO E ESTE TENHA SIDO FORMALIZADO APÓS 31.03.2000 (EDIÇÃO DA MP Nº 1.963/2000). TAXA DE JUROS. REMUNERATÓRIOS FIXADOS NO CONTRATO QUE NÃO SE CARACTERIZAM PELA ABUSIVIDADE. CUMULAÇÃO DE ENCARGOS MORATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Desembargadores da Terceira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e dar parcial provimento à apelação cível, remetendo o referido processo posteriormente à Vice-Presidência para análise da admissibilidade do recurso especial interposto, nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.


RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por Manoel Antônio Gurgel em face da sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Mossoró, nos autos da presente ação monitória, na qual é parte autora o Banco Itaú Financeira..

O decisium, julgou procedente o pedido monitório e, consequentemente, improcedente os embargos injuntivos, constituindo o título executivo judicial no valor de R$ 10.646,56 (dez mil seiscentos e quarenta e seis reais e cinquenta e seis centavos) em favor do autor, devendo ser acrescido juros de mora de 1% (hum por cento) ao mês, a partir da citação, e correção monetária, com base no INPC-IBGE, a contar da constituição da dívida. Condenou, ainda, o réu ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios no valor de 15% (quinze por cento) sobre o valor do débito.

Em suas razões, o apelante alega que o valor do débito apresentado pelo apelado é controverso, pois apesar de se originar de um extrato de cartão de crédito, as faturas foram calculadas utilizando a prática do anatocismo, juros remuneratórios acima de 12% (doze por cento) ao ano e, ainda, a cumulação de encargos moratórios, como juros moratórios e comissão de permanência.

Explica que os honorários arbitrados, ou seja, 15% (quinze por cento) da condenação, é um valor bastante elevado, portanto, requer sua minoração. Pede pelo conhecimento e provimento do apelo.

Em contrarrazões o apelado argui que o contrato possui respaldo legal e que, por isso, o princípio do pacta sunt servanda deve ser respeitado, de modo que todos os valores apresentados são devidos pelo apelante. Requer o desprovimento do apelo e manutenção da sentença.

O Ministério Público, através da 9ª Procuradoria de Justiça, não emitiu parecer por não vislumbrar interesse público primário na lide.

Este processo já foi julgado por este colegiado.

Porém, quando interposto Recurso Especial (RESP), a Vice-Presidência deste tribunal emitiu o seguinte despacho: "verifico que a irresignação recursal ( capitalização de juros) foi objeto de julgamento no RE 592.377, havido sob o regime de repercussão geral (Tema 33/STF). Em vista disso, retornem os autos ao Desembargador Relator para que, se assim também entender, a matéria seja submetida à apreciação do órgão colegiado, nos termos do 1.039, do novo Código de Processo Civil, reservando-me à análise da admissibilidade recursal após seu pronunciamento”.

Assim, passo a adequar o referido acórdão à repercussão geral suso destacada.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do apelo.

Cinge-se o mérito do recurso na possibilidade de reconhecer a ilegalidade de algumas cláusulas contratuais e afastar a sua incidência, para que o valor devido pelo consumidor seja revisado.

A priori, vale destacar que, em virtude do envolvimento de uma instituição financeira como parte no contrato, este deve ser analisado à luz do Código de Defesa do Consumidor, como bem consolidou o Superior Tribunal de Justiça, vejamos:


"O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

(Súmula 297, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2004, DJ 09/09/2004 p. 149)"

Nesse diapasão, entende-se possível a revisão de cláusulas contratuais, pelo Poder Judiciário, as quais coloquem o consumidor em situação de desvantagem exagerada, como bem asseveram os artigos 6°, V, 39, V e 51, IV do Código de Defesa do Consumidor.

Vale salientar que até mesmo o princípio do pacta sunt servanda, que obriga as partes às cláusulas contratuais, no limite da lei, poderá ser relativizado em favor da proteção ao consumidor estabelecida pelo artigo 5°, XXXII da Constituição Federal e pelos demais dispositivos supracitados.

Logo, sendo admissível a revisão de contratos bancários, analiso agora a ilegalidade alegada pelo apelante.

Com relação à capitalização de juros, o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 592.377-RS, submetido à sistemática do art. 543-B do Código de Processo Civil, ocorrido em 04.02.2015, assentou a tese da constitucionalidade do artigo 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001.

Assim, considerada a validade constitucional da Medida Provisória n° 2.170-16/2001 (sob a ótica formal) e ausente uma manifestação de mérito do Supremo Tribunal Federal sobre a adaptação constitucional da capitalização de juros (sob o ângulo material), o tema deve ser solucionado a partir do entendimento emprestado pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da legalidade ou não da cobrança da capitalização mensal de juros.

Nessa diretriz, o Pleno desta Casa de Justiça, na sessão realizada em 25.02.2015, ao julgar os Embargos Infringentes nº 2014.026005-6, com fundamento no disposto no artigo 243, II, §1º, do RITJRN, afastou a aplicação da decisão exarada na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, para aplicar o pensamento jurídico do Superior Tribunal de Justiça.

Transcrevo a íntegra da ementa lançada pelo Desembargador Amílcar Maia, litteris:

EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE ANTE O DECIDIDO NO RECURSO ESPECIAL Nº 973.827 (ART. 543-C) E A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170-36/2001 AFIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N.º 592.377 EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL (ART. 543-B DO CPC). NECESSIDADE DE ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO DO STF POR ESTA CORTE. ART. 243, II, §1º, DO RITJRN. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.

- O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 973.827, com base no art. 543-C do CPC (sistemática de recurso repetitivo), decidiu ser permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.

- O Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 592.377 em regime de repercussão geral (art. 543-B do CPC), considerou constitucional o art. 5º da MP 2.170-36/2001, inviabilizando a manutenção do entendimento desta Corte de Justiça exarado na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, ante o disposto no art. 243, II, §1º, do RITJRN.

(TJRN. Embargos Infringentes nº 2014.026005-6. Tribunal Pleno. Relator: Desembargador Amílcar Maia. Julgado em 25.02.2015. Votação unânime)

Em sendo assim, colaciono a ementa do pronunciamento lançado pelo Superior Tribunal de Justiça nos autos do Recurso Especial nº 973.827/RS, julgado sob a sistemática dos Recursos Repetitivos, vejamos:

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO.

...

3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir...

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